Duas Vampiras Desabrigadas

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Século XVIII, proximidades de Lyon, centro-sul da França.

- Marcy, não volte tarde e cuide bem da sua irmã.

- Está bem, mãe. - respondeu a menina - Vamos, Lique! Vamos procurar as fadas!!!

Marceline estava realmente ansiosa para mais uma caça às fadas na floresta com sua irmã Angelique. Desde que ouvira histórias sobre essas criaturas mágicas, ela ficou fascinada pela possibilidade de encontrá-las.

Era uma manhã de outono e após terminar suas tarefas matutinas, Marceline Blanch saía para brincar na floresta próxima à sua casa. Mas nesse dia em particular algo diferente ocorreu. Ao entardecer, ela não voltou para casa. Algo chamou sua atenção: ela podia jurar que acabara de ver uma "pessoinha" sair de um buraco entre as raízes de uma árvore próxima. Estava certa de que finalmente encontraria uma fada. Seus olhos azuis brilhavam de emoção.

Em sua pressa para encontrar a fada, Marceline foi se afastando de sua irmã menor, que acabou por se perder e ficou sozinha chorando. Enquanto isso, a irmã mais velha se deparou com algo que não esperava: Não era uma fada, mas uma criatura alta e sombria, especialmente assustadora ao crepúsculo, e sedenta por sangue.

* * *

Já era tarde da noite quando a garota acordou, com uma camada de folhas secas sobre si. Parecia que ela teve um sonho ruim e passou da hora de voltar para casa, mas algo estava errado. Uma enorme sede a dominava e suas roupas estavam manchadas com algo escuro. Estranho também era sua visão no escuro, pois o luar não estava tão forte e mesmo assim ela conseguia ver bem o seu caminho. Marceline queria voltar para casa, mas não sabia onde se encontrava.

Seguindo apenas seus instintos, a jovem tomou uma direção e seguiu até se convencer de que era o caminho errado. Então voltou e tentou por outro caminho. Ela conseguiu chegar em casa, mas a recepção não foi como esperava. Sua irmã havia voltado para casa e, assim como seus pais, ficou assombrada ao ver Marceline chegando em casa. Além de toda suja, com seus longos e ondulados cabelos negros cheios de folhas e manchada de algo que parecia sangue seco, a garota estava extremamente pálida e com os olhos de cor diferente: estavam de cor púrpura, com um leve brilho nada natural. Ao se aproximarem da menina, seus familiares não sentiam mais seu calor humano, mas um frio que penetrava em suas almas e transmitia a sensação de perigo.

Ignorando a sensação ruim, a família Blanch se reuniu para o jantar, mas a sede de Marceline não passava por mais que ela bebesse água. Perto da mesa, estava o coelho que as duas garotas ganharam de presente e Angelique já brincava com ele. Marceline se aproximou para brincar também, mas logo o pêlo branco do coelho estava todo vermelho e um grito de sua mãe rompeu a estase da desconfiança da família. A filha havia se tornado um monstro.

Caída no chão, com o coelho tentando escapar de seus braços, estava Angelique, com sua irmã atacando seu pescoço e sorvendo o sangue que escapava de sua jugular. Ao retomar o controle sobre si, Marceline percebeu o que havia feito e se afastou. O terror em sua face não era menor do que aquele que seus pais expressavam.

- Eu sabia! O diabo tomou sua alma! Ela virou um demônio! - gritava a mãe desesperada.

- Vá embora, demônio! Saia já dessa casa! - gritou o pai, chutando a filha mais velha, que ainda estava chocada pelo que ela havia feito, para que se afastasse do corpo de sua filha mais nova.

Marceline correu para fora de casa chorando, mas com o sangue da irmã ainda escorrendo pelo queixo. Porém, não sabendo para onde ir, se escondeu no celeiro do vizinho. Ela passou o restante da noite pensando sobre o que acontecera com ela e chegou a uma conclusão a partir de uma história que ela não gostava: ela fora assassinada por uma criatura demoníaca que se alimenta de sangue e voltou da morte. Ela havia se tornado uma vampira.

* * *

Ainda naquela madrugada, Marceline se aproximou novamente de casa, para saber como estava sua irmã. Consternada ao perceber que sua amada irmã estava morrendo, a garota irrompeu janela adentro, assustando seus pais, que ainda estava acordados e cuidando de Angelique.

- Lique! Lique! - Marceline chorava e soluçava enquanto chamava pela irmã já pálida, sobre quem ela se debruçava.

Os olhos de Angelique se abriram um pouco. Aqueles olhos de cores diferentes, um azul e outro castanho, que antes apresentavam vivacidade, perderam seu brilho característico e ela mal conseguia compreender o que estava acontecendo. Os pais das meninas ficaram acuados em um canto da sala, observando a cena. A coragem que lhes permitiu expulsar Marceline não estava mais presente.

- Pegue o meu sangue! Tome de volta o que roubei de você! Mas, por favor, fique bem! - Rasgando sua própria carne, a garota fez derramar seu sangue na boca da irmã, fugindo novamente logo em seguida.

A recuperação de Angelique foi rápida. Antes da alvorada, a menina já estava se sentindo bem, mas sua palidez e seus olhos brilhantes, agora nas cores lilás e púrpura, mostravam que ela teve o mesmo destino de sua irmã. Seus pais não sabiam o que fazer, pois ela também se tornara uma vampira.

Na tarde do dia seguinte, o pai das garotas apareceu com um caixão e, enquanto a filha dormia, colocou a menina lá dentro e o selou com pregos. A família tinha um mausoléu no cemitério e os pais decidiram deixá-la trancada naquele lugar. Entretanto, ao chegarem no local, encontraram a outra filha morando na cripta e fugiram, deixando suas duas filhas para trás.

Para os pais, as meninas estavam mortas. Para elas, o mundo estava morto. Só podiam contar uma com a outra. Apesar do apego que sempre teve por Marceline, uma mágoa estava presente em Angelique, por sua irmã ter feito aquilo com ela. Se Marceline não tivesse desobedecido sua mãe, ela não teria se tornado aquilo e deixado-a sozinha na floresta! Ela não a teria atacado, para depois torná-la um monstro também!

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⏰ Last updated: Aug 05, 2014 ⏰

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Rose NoirWhere stories live. Discover now