relação às crianças, elogiando-lhes a beleza, a inteligência e satisfazendo-lhes todas as vontades. E quando podiam poupar seu tempo das importunas imposições da boa educação, elas o dedicavam a admirar qualquer coisa que a lady estivesse fazendo, caso acontecesse de ela estar fazendo alguma coisa, ou a tirar o modelo do elegante vestido que a anfitriã havia usado na noite anterior e que as encantara por sua inefável beleza. Afortunadamente para aqueles que prestam homenagens a pessoas fracas, como mães extremosas em contínua veneração aos filhos, os mais gananciosos seres humanos podem parecer dignos de crédito; essa mãe será capaz de engolir tudo; assim, os excessivos afeto e dedicação das srtas. Steele em relação aos seus pimpolhos eram vistos por lady Middleton sem a menor surpresa, nem desconfiança. Observava, com maternal complacência, todas as impertinentes invasões e maldosas exigências às quais suas primas se submetiam. Viu os cintos delas amarrados um ao outro, seus cabelos puxados, suas facas e tesouras roubadas e não teve dúvida de que as alegrias eram recíprocas. E também não teve surpresa alguma ao ver que Elinor e Marianne mantinham-se compostas, sentadas, sem demonstrar disposição para participar do que estava acontecendo. - John está tão terrível hoje! - comentou, enquanto ele pegava o lencinho da srta. Steele e o jogava pela janela. - Parece até um macaquinho. E quando o seu filho mais novo pisou com violência em um dedo da mesma senhorita, ela enterneceu-se: - Willíam é tão brincalhão! - E a minha doce e pequenina Annamaria! - acrescentou, amorosa, acariciando a cabecinha da menina de três anos que não fizera barulho apenas nos dois últimos minutos. - Ela é sempre tão graciosa e quieta! Nunca vi uma criancinha tão comportada! Infelizmente, graças aos empolgantes abraços, um alfinete espetado no vestido da lady arranhou de leve o pescoço da pequenina e obteve desse modelo de meiguice e comportamento uma série de gritos selvagens que só poderiam ser emitidos por uma criatura barulhenta. A consternação da mãe foi exagerada, mas não conseguiu ultrapassar o alarme das srtas. Steele. Tudo que se pode imaginar foi feito pelas três, naquela emergência tão aflitiva, na qual a profunda afeição pela garotinha sofredora exigia que minorassem as suas agonias. Ela ficou sentada no colo da mãe, o ferimento foi lavado com água de lavanda por uma das srtas. Steele, que se pôs de joelhos para cuidar dela, enquanto a outra enchia-lhe a boca com torrões de açúcar. Diante de tais recompensas por suas lágrimas, a criança era esperta demais para parar de chorar. Continuou berrando e soluçando bravamente, chutando os irmãos que tentavam acariciá-la. Todo aquele esforço reunido demonstrou-se inútil, até que lady Middleton felizmente lembrou-se de que, em um momento de sofrimento como aquele, um pouco de geléia de abricó havia resolvido as dores de uma testa arranhada. O milagroso remédio foi imediatamente proposto para aquele infeliz arranhão e uma leve interrupção no escandaloso choro, no momento em que a menininha ouviu falar no doce, criou a esperança de que ele não seria recusado. Ela foi carregada para fora da sala, sempre nos braços da mãe, em busca do remédio, e os meninos decidiram segui-las, apesar da lady dizer-lhes repetidamente que ficassem. As quatro jovens damas permaneceram na sala e encontraram-se em uma tranqüilidade que não tinham havia várias horas.

- Pobre pequenina criatura! - exclamou a srta. Steele, assim que eles saíram. - Poderia ter sído um acidente muito grave. - Não vejo como - retrucou Marianne -, a não ser que acontecesse em circunstâncias completamente diferentes. Mas sempre acontece toda essa loucura quando, na verdade, não há motivo para preocupação alguma. - Lady Middleton é a pessoa mais doce do mundo! - elogiou Lucy Steele. Marianne manteve-se calada. Era-lhe impossível dizer o que de fato não pensava, por mais simples que a verdade fosse. Como Elinor também era incapaz de dizer as mentiras que a fina educação exigia, também passou por cima do comentário. Fez o melhor que pôde falando sobre Lady Middleton com toda afeição que lhe tinha, mas com muito menos empolgação do que Lucy. - Sir John também! - exclamou a outra irmã. - Que encanto de homem! Nesse ponto, do mesmo modo, o simples e justo comentário da srta. Dashwood não foi nada vibrante. Simplesmente, ela observou que se tratava de um senhor muito bem-humorado e amigo. - E que família encantadora eles têm! Nunca vi crianças mais bem-educadas em minha vida! Confesso que fiquei apaixonada por elas no instante em que as vi. Aliás sempre gostei muito de crianças. - Acredito - respondeu Elinor, com um sorriso -, principalmente depois do que vi esta manhã. - Percebo - comentou Lucy - que a senhorita considera os pequenos Middleton mimados demais, e talvez eles o sejam mesmo, um pouco mais do que o normal. No entanto, isso é bem natural em lady Middleton. Quanto a mim, adoro ver crianças cheias de vida e energia. Não suporto quando elas são retraídas e quietas. - Devo declarar - Elinor foi sincera - que sempre que venho a Barton Park, jamais considero aborrecidas as crianças retraídas e quietas. Uma curta pausa seguiu-se a estas palavras. Quem rompeu o silêncio foi a srta. Steele, que parecia muito disposta a conversar e que disse, abruptamente: - Gosta de Devonshire, srta. Dashwood? Suponho que tenha ficado muito, muito triste, quando teve de sair do Sussex. Surpreendida pela familiaridade da pergunta e pela maneira que a jovem dama falara, Elinor respondeu que, de fato, sentira por ter vindo embora. - Norland é um lugar de prodigiosa beleza, não? - voltou a srta. Steele. - Ouvimos sir John falar nele com enorme admiração - acrescentou Lucy, que parecia achar que era necessário apresentar uma espécie de pedido de desculpa pela liberdade que a irmã tomara. - Acredito que todos devem admirá-lo - respondeu Elinor - quando conhecem Norland, se bem que ninguém seja obrigado a achar bonito o que uma pessoa considera bonito. - Por acaso, encontrou muitos homens bonitos por aqui? Suponho que não existam muitos nesta parte do mundo. Quanto a mim, acho que eles estão sempre em falta. - O que a faz pensar - perguntou Lucy, parecendo estar envergonhada pela irmã - que há menos cavalheiros gentis em Devonshire do que em Sussex? - Não, minha cara. Tenho certeza de que não pretendo afirmar que é assim, como tenho

Razão e sensibilidade- Jane AustenOnde as histórias ganham vida. Descobre agora