CAPÍTULO 3

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Era fato que uma hora ou outra voltaríamos para o Rio de Janeiro. Em acordo mútuo entendemos que o trabalho do meu pai como médico seria mais confortável lá, porque teríamos a possibilidade de estar perto da família, amigos e da nossa antiga igreja, onde Deus havia colocado no coração dele para retornarmos.

Meus pais se casaram há vinte e dois anos nessa mesma igreja e nossa família é toda carioca. A irmã de mamãe, tia Vera, apesar de viúva ainda mora com meu primo Felipe no bairro Recreio dos Bandeirantes. Ela, assim como os nossos irmãos em Cristo estão felizes pelo nosso retorno.

Seguimos estrada, "tocando em frente" como uma velha canção costumava dizer. Fiz minhas orações mentalmente ao som do grupo "Trazendo a Arca" na rádio. Pedi a Deus que abrisse meus olhos para enxergar o melhor que Ele faria nas nossas vidas, obedecendo sua vontade.

Hoje, tenho dezoito anos e maturidade suficiente para entender que tudo que Ele faz é perfeito e se Deus escolheu nos guiar por esse caminho, com toda certeza, iremos sem pestanejar, sem murmurar.

— Já entramos em solo carioca! — papai estava todo animado.

Dona Laura absorveu cada sentimento devagar. Sei que para mamãe era uma alegria poder voltar, rever sua irmã, seu sobrinho e, sem dúvidas, o belo pôr do sol na praia da Barra da Tijuca que ela dizia ter muito claro na memória.

Não vínhamos com frequência à Cidade Maravilhosa porque aprendemos a nos adaptar a uma rotina puxada em Sampa. Eu lidando com escola, curso de inglês e, no último ano, o cursinho de vestibular; papai nos seus plantões do hospital e mamãe como dona de casa gerenciando toda a nossa agenda, nos apoiando em tudo.

— Ainda não é possível reconhecer tanto porque ainda estamos na estrada, só queria avisá-las mesmo — papai se justificou devido ao nosso silêncio.

De onde eu estava sentada conseguia observar perfeitamente meu pai. O sol batia em seu rosto, algumas linhas de expressão eram nítidas; seus olhos verdes brilhavam, infelizmente não os puxei. Sua alegria dirigindo e cantando hinos antigos me fizeram sorrir.

Queria me sentir como todos, empolgada com a nova vida que teria.

— Você vai gostar de andar de bicicleta na praia — minha irmã me "cutucou" mostrando-me uma foto dela e do Thiago, seu namorado, ao pôr do sol na praia. Eu estava inerte com meus pensamentos.

Melissa tinha percebido minha tristeza pré mudança nas últimas semanas, por isso tentava ser gentil comigo.

— Nossa, ficou linda a foto! Digna de Instagram.

— Obrigada! Chegando lá vamos tirar umas fotos? Para colocar no seu Instagram empoeirado? — brincou ela.

— Poxa, você sabe que não tive muito tempo para isso. Estudei muito nesses últimos meses para entrar para a UFRJ.

— Eu sei, eu sei e você vai conseguir — Melissa massageou meu braço no lugar onde havia "cutucado".

O tempo correu e eu estava concentrada em assuntos pendentes numa caixinha especial no meu cérebro, quando de repente...

— Chegamos! — papai anunciou.

A nova casa alugada que, até então, eu tinha visto apenas por fotos causou-me surpresa. Era mais linda do que eu poderia imaginar.

— Eu sempre digo que Deus faz muito mais do que pedimos ou pensamos — Melissa falou risonha me observando.

Eu admirava, imóvel, a casa amarela através do vidro do carro. Suas portas e janelas eram de madeira muito bem envernizadas e, na fachada, grama verde com caminhos de pedras para a entrada.

— Uau! Quando meu pai disse que estava se esforçado para nos dar o melhor, ele não estava de brincadeira — falei com mamãe virando-me em sua direção.

O condomínio de casas duplex de cores variadas na Barra da Tijuca com segurança de ponta e piscina não estavam nos meus planos meses atrás.

Sampa que me perdoe, mas isso aqui era o paraíso!

Deus Me Deu Você  (Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora