O2: Quarto 403

168 17 4
                                        

O som distante da chuva ainda caía pesado quando Isagi despertou, assustado por um trovão. Seu corpo reagiu no mesmo instante, levantou rápido, o coração acelerado, e só relaxou quando viu o garoto ainda adormecido na cama. Suspirou, passando uma mão cansada pelo rosto, e trocou o soro e as ataduras com cuidado. O quarto estava silencioso, exceto pelo bip regular do monitor cardíaco e o som abafado da tempestade lá fora.

Quando olhou o relógio, já marcava pouco depois das cinco da manhã. O turno da noite se arrastava, e ele mal percebia o cansaço que se acumulava. Saiu do quarto ajeitando o jaleco, os passos lentos ecoando pelos corredores desertos. Parou na máquina de café, pegou um copo quente e deu um gole rápido, tentando espantar o sono antes de seguir para a sala do médico responsável.

Bateu na porta, ouviu um “entre” abafado e empurrou a maçaneta. O médico estava curvado sobre uma pilha de relatórios, o rosto cansado e os olhos avermelhados de quem não dormia há muito tempo. Quando levantou o olhar e o viu, abriu um pequeno sorriso.

— Eu vi que estava dormindo — disse o homem, com um cansaço evidente na voz — Então não quis te acordar antes.

— O senhor conseguiu falar com o irmão dele? — Isagi sorriu fraco, servindo-se de outro gole do café.

— Consegui, sim. O senhor Itoshi foi… difícil de lidar. Estressado, impaciente, mas nos forneceu as informações necessárias — disse, estendendo uma pasta grossa sobre a mesa — Esse é o prontuário dele. Mas antes…

Ele fez uma pausa breve, olhando diretamente para Isagi.

— Itoshi Rin vai precisar de observação constante. Quero que me ajude a salvá-lo.

Aquelas palavras pesaram no ar.

Isagi ficou imóvel por alguns segundos antes de pegar a pasta. Abriu devagar, e o primeiro impacto foi a foto do paciente. O mesmo rosto que agora dormia no quarto 403, mas ali, na imagem, ele parecia mais vivo, ainda que sério, com um brilho inconfundível nos olhos verdes. Havia algo neles que parecia pedir socorro, mesmo em silêncio.

Mas o olhar de Isagi parou logo abaixo da foto.

“Degeneração Neuroimune Progressiva.”

Isagi sentiu o corpo inteiro congelar. A pasta tremia levemente em suas mãos, e a voz do médico chegou distante, abafada.

— Sae, o irmão dele, nos trouxe esse prontuário — continuou o homem, a voz pesada — Faz apenas alguns meses desde o diagnóstico. Eu não entendo o motivo de ele ter tentado… talvez o desespero, talvez o medo. Ele é tão jovem, Isagi. Tem a idade do meu filho.

Ele fez uma pausa longa, olhando para a janela, o reflexo da tempestade reluzindo no vidro.

— A gente tenta não se envolver, mas às vezes… não dá.

Isagi não respondeu. O olhar fixo nas linhas do relatório, o coração apertando a cada frase:

“Doença neurológica rara, caracterizada por inflamação crônica e degeneração das conexões nervosas no sistema central, causada por resposta auto imune anormal. Progressiva. Irreversível. Sem cura conhecida.”

A visão começou a embaçar. Ele piscou rápido, respirando fundo, tentando manter a compostura. O papel nas mãos parecia mais pesado do que deveria.

— Eu não entendo… — Isagi murmurou trêmulo.

— O organismo do Rin ataca o próprio tecido neural — explicou o médico — Isso causa a perda gradual da coordenação motora, da sensibilidade, do controle muscular… O corpo dele luta contra si mesmo. Vou solicitar novos exames para avaliarmos o estágio da doença, mas ainda há o que fazer. Ainda podemos tentar salvá-lo.

Quando A Chuva Cai | RinSagiOù les histoires vivent. Découvrez maintenant