Capítulo 8

90 19 6
                                        

A manhã seguinte encontrou o castelo em frenesi. Lady Isabelle havia decidido que um banquete de boas-vindas em sua honra seria realizado ainda naquela noite  uma jogada clara para reafirmar sua posição como futura rainha.

— Ela quer te colocar em seu lugar — Marie sussurrou enquanto me ajudava a vestir um simples, porém elegante, vestido de lã que Filipe enviara. — O banquete é uma armadilha.

— Tudo nesta corte é uma armadilha — respondi, ajustando o decote. — A diferença é que desta vez, eu sei cozinhar.

Os aposentos que Filipe me concedera eram adjacentes aos dele, com uma porta interconectada que ambos sabíamos ser vigiada. Mas era a cozinha que se tornara meu verdadeiro território. Ao entrar, senti os olhares dos outros cozinheiros  alguns curiosos, outros abertamente hostis.

Bertrand, o mestre-cozinheiro, aproximou-se com seus braços cruzados.

— A nobreza quer um banquete que impressione — anunciou, despejando uma cesta de ingredientes exóticos na mesa. — Fazendas de faisão, cisne real, veado... Tudo providenciado por Lady Isabelle.

Examino os ingredientes com olhos profissionais. Tudo da melhor qualidade, mas...

— Algo está errado — murmurei, pegando um faisão. — O cheiro.

Marie cheirou e fez uma careta.

— Está... estranho.

Chamei um dos gatos da cozinha e ofereci um pedaço de carne. O animal cheirou, recuou e fugiu.

— Envenenado — concluí, sentindo um frio na espinha. — Isabelle está disposta a envenenar seus próprios convidados para me incriminar.

Foi quando Filipe entrou na cozinha, sua simples presença silenciando todos os sons.

— Problema? — perguntou, seus olhos imediatamente encontrando os meus.

Mostrei-lhe a carne estragada. Seu rosto endureceu.

— Ela ousou... — começou, mas interrompeu-se quando viu os outros cozinheiros ouvindo. — Sofia, comigo.

Na privacidade de meu aposento, sua fúria explodiu.

— Eu a enviarei de volta para Provença hoje mesmo!

— Não — contra-argumentei, surpresa com minha própria ousadia. — Isso só provaria que eu sou uma ameaça ao seu relacionamento.

Ele pegou meu rosto entre as mãos, sua fúria dando lugar a algo mais intenso.

— Você não entende? Eu me importo mais com sua segurança do que com qualquer aliança política!

A declaração pairou entre nós. Seus dedos afundaram em meu cabelo, puxando-me para perto.

— Desde que você chegou, eu voltei a me sentir vivo — ele sussurrou, sua testa encostando na minha. — O simples facto de você existir  aqui comigo, me deixa em êxtase.

O som de passos do lado de fora nos separou. A realidade invadindo nosso momento frágil.

— O banquete — eu disse, minha voz trêmula. — Preciso de ingredientes ...não contaminados dessa vez .

Ele assentiu, seus olhos ainda escuros com a vontade  contida.

— Você terá o que precisar. Mas, Sofia... — sua mão agarrou a minha com força possessiva — hoje à noite, você não será apenas a minha cozinheira. Você se sentará ao meu lado.

O banquete daquela noite tornou-se o evento mais comentado do castelo. Não pelos pratos incrivelmente elaborados que criei com ingredientes substituídos, uma torta de faisão com frutas cristalizadas, pães temperados com ervas do jardim real , mas pela disposição dos assentos.

Filipe ocupava o centro da mesa alta, com Isabelle à sua direita. E eu... à sua esquerda. Um lugar jamais concedido a um plebeu.

— Isto é um insulto! — Isabelle sussurrou para Filipe, embora eu pudesse ouvir cada palavra.

— É minha vontade — ele respondeu, servindo-me pessoalmente uma porção de torta. — Prove, Sofia. Quero ouvir sua opinião.

Enquanto eu descrevia os sabores, senti o ódio de Isabelle como um calor,minha orelha até aqueceu  de tanto ódio. Suas aliadas entre a nobreza cochichavam, lançando olhares venenosos em minha direção.

Foi durante o terceiro prato que a crise aconteceu. Um dos nobres  um aliado de Isabelle  começou a tossir violentamente, alegando que sua comida estava estragada.

— Envenenamento! — ele gritou, apontando para mim. — A cozinheira plebeia tentou nos matar!

O salão caiu em silêncio. Todos os olhos se voltaram para mim. Isabelle escondia um sorriso triunfante atrás de seu leque.

Filipe levantou-se lentamente.

— Você tem prova dessa acusação? — sua voz era perigosamente calma.

— A comida tem um gosto estranho! — o nobre insistiu.

Foi quando Marie entrou no salão, carregando os ingredientes estragados que escondêramos.

— A prova está aqui, Majestade — ela anunciou, a voz trêmula mas firme. — Lady Isabelle trouxe carne estragada para o castelo, tentando incriminar a senhora cozinheira.

O escândalo que se seguiu foi histórico. Isabelle negou, é claro, mas as evidências eram esmagadoras. Enquanto a arrastavam para fora do salão, seus olhos encontraram os meus, prometendo vingança.

Mais tarde, na privacidade de seus aposentos, Filipe bebeu um gole de vinho e me estudou sobre a taça.

— Você sabia que ela tentaria isso — afirmou, não perguntou.

— Suspeitei — admiti. — Uma cozinheira aprende a reconhecer ingredientes estragados.

Ele pousou a taça e fechou a distância entre nós.

Seu beijo foi uma afirmação de posse, de proteção, de algo tão antigo quanto o próprio tempo. E quando suas mãos se moveram para o cadarço do meu vestido, eu não resisti.

— Fique — ele ordenou entre beijos. — Fique esta noite,Fica comigo, Fique para sempre aqui .

Eu não queria mais voltar para casa.

Voteeemmmm
👇

You've reached the end of published parts.

⏰ Last updated: Oct 05 ⏰

Add this story to your Library to get notified about new parts!

A Cozinheira do ReiWhere stories live. Discover now