Mississippi, 1932.
— Talvez ele só esteja caído em algum lugar… Não seria incomum.
Argumentei, arrumando os pratos com sanduíches em cima da bandeja circular.
Cat se inclinou e resmungou, balançando as mãos.
— Não… Alguma coisa aconteceu com ele. Eu sinto.
— Ele tinha esse comportamento que colocaria a vida dele em risco uma hora ou outra. É triste, mas…
Manny parou de falar de repente, apoiado com os cotovelos no balcão e pareceu desconfortável demais para continuar.
Imediatamente percebi o que ele queria dizer.
Mesmo triste, achava que o bebum Ed mereceu o que quer que tenha acontecido.
A bebida não anulava o comportamento idiota e os brancos pouco se importavam com isso.
Equilibrando a bandeja em uma única mão, deixei um Manny particularmente interessado no assunto com Cat. E antes de partir, a ouvi dizer:
— Você não acha que tá muito fofoqueiro, homem? Vai cuidar da entrada!
Ri baixo, contornando as pessoas e como estava fazendo desde o começo do turno, entreguei mais um pedido.
— Letty, você tá linda hoje! — Um garoto jovem de sorriso bonito se inclinou da mesa onde jogava cartas com outros homens. — Não que não esteja sempre mas… Você tá deslumbrante essa noite!
— Agradeço pelo elogio. Só que eu sei bem o que você tá tentando fazer.
Os outros homens presentes na mesa o sacanearam com tapinhas e dedos apontados, gritando.
— Qual é, Letty, ele só quer te pagar uma bebida!
Assenti, fingindo estar convencida, sem dar muita abertura para os flertes descarados.
— Tente entrar debaixo da saia de outra mulher.
Comecei a me virar, com as tranças balançando e quando já estava distante, consegui ouvir o mesmo garoto gritando:
— Você é a preta mais linda daqui!
Revirei os olhos, resmungando e ao dobrar, esquivando de um grupo de jovens, dei de cara com o par de olhos azuis antes de esbarrar no corpo alheio.
A bandeja que eu segurava voltou contra o meu corpo e quase gritei bem alto um xingamento péssimo.
Dei alguns passos para trás mas uma pressão me parou, bem no pulso.
— Desculpa, eu tava distraída com…
— Senhorita Lafayette… — Disse, inclinando o rosto. — Mesmo sendo quase levado ao chão, estou bastante lisonjeado com a sua presença! — Brincou.
Levantando os olhos, dei de cara com o rosto branco e sorridente.
Percebi de relance que, a mão grande envolvia meu pulso e movi o braço para me soltar rapidamente.
— Tá fazendo o que aqui?
O sorriso de Remmick falhou mas não diminuiu tão consideravelmente e endireitou a postura, passando as mãos pela camisa de botões com as mangas arregaçadas.
De novo.
— É uma noite quente. Pensei em sair, tomar uma bebida…
— Sei… Você podia ter ido pedir sua bebida pra Cat. — Retruquei, com uma careta. — Não pra…
— Na verdade, eu estava indo fazer exatamente isso antes de você me atropelar! — Focou o olhar em meu rosto.
Minhas sobrancelhas se uniram em descontentamento e senti certa vergonha por deduzir que ele estava atrás de mim para pedir uma mera bebida.
Pigarreei, girando a bandeja na mão e indiquei o bar, começando a caminhar até lá, sentindo a presença dele logo atrás de mim.
De relance, notei quando Remmick acelerou o passo para caminhar ao meu lado e o observei com atenção, descendo os olhos para as mãos grandes e com veias salientes, seguindo para os antebraços visíveis onde reparei em alguns arranhões avermelhados porém, sutis.
— Andou brigando?
A pergunta saiu antes que eu pudesse conter minha própria curiosidade e ele me olhou, parecendo lembrar do estado dos braços.
— Ah, isso? Me arranhei em alguns arbustos, nada muito preocupante. — Indicou, erguendo o braço tão perto que até recuei o rosto. — A briguenta aqui parece ser você. — Comentou, divertido.
O encarei um tanto estática e minha curiosidade evaporou no mesmo instante em que aquelas palavras foram proferidas.
Desacelerei o passo, com Remmick indo até o bar de forma calma, já sendo recebido por Cat.
Miseravelmente, o suor começou a ser produzido em grandes quantidades entre as minhas curvas e dedilhei discretamente minha bochecha quase que de forma automática, ainda sentindo um incômodo ao tocar.
Os arredores pareceram se estreitar e varri as proximidades com as orbes inquietas, percebendo que ninguém reparava em mim no meio daquele mar de pessoas cantando e dançando.
Isso me acalmou de maneira mínima, bem mínima mesmo pois quando voltei o olhar para frente, Remmick havia se acomodado no bar e isso me deixou com uma sensação estranha no estômago.
Não sabia explicar ao certo mas o jeito como ele falou parecia que sabia de algo.
Transpirando aos montes, coloquei as tranças mais uma vez para frente e parti na direção dos dois, com a dúvida pesando o peito.
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This Bitter Eden | Remmick.
VampireEla vivia em um jardim repleto de regras, medo e angústia. Quando aquele homem branco cruzou seu caminho, ninguém precisou sussurrar "morda" - bastou o olhar. Como a serpente do Éden, Remmick não ofereceu salvação, mas escolha. E no mundo de Lafayet...
