⭑4

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04 ✦ O que ela deixou para trás.

O luto era uma coisa estranha, a morte era uma coisa estranha. Alguém pode desaparecer tão rápido assim? Perdeu seus pais cedo, mas era como uma dor adormecida no peito, seja um mecanismo de defesa ou não, lembrava muito pouco do que aconteceu. Mas agora...

Deu um sorriso irônico sentindo o vento turbulento do campo. Já estavam a uma hora, isso foi mais do que ela achou que aguentaria.

— Gwendolyn não veio. — Ele estalou a língua amargurado, guardando o cantil no bolso traseiro da calça escura. — Porquê não estou surpreso?

— Talvez ela não tenha recebido a notícia ainda. — Ou pelo menos esperava que fosse isso.

Gwendolyn morava no mundo humano desde que completou 17 anos, e mesmo que Ada e ela não fossem irmãs agradáveis uma com a outra, ainda eram irmãs. Asteris não acreditava que ela odiasse tanto Terslum a ponto de não vir.

— Talvez ela não tenha tido vontade.

— Talvez ela esteja devastada no apartamento em West Yorkshire. — Asteris prendeu o cabelo em um rabo de cavalo alto, respirando fundo. — Com licor de duende numa taça.

— Um cenário dramático. É, talvez. — Suspirou arrumando a gravata vermelha. Aedan não costumava vestir paletós, geralmente gostava de uma camisa de botões simples e calça; fácil de vestir e fácil de tirar. Apesar disso, ele acabou gostando de como ficava com essas roupas, embora a situação não fosse uma das melhores para se descobrir isso. — Vamos?

Ela olhou para o relógio outra vez. Apertou ele na mão sentindo a textura ser marcada na pele pela pressão. Seu amuleto de sorte. Talvez esteja ineficiente em dar boa sorte a ela ultimamente. Guardou ele e assentiu para seu irmão. Ela não queria mais sentir aquele cheiro horrível de enxofre.

Aedan tirou sua varinha do bolso do paletó, uma de madeira clara, ondulada do meio até a ponta com um carimbo da companhia Enertin's. Ela a achava linda. Gostaria que a sua fosse assim, a dela era um pouco vilanesca — angulada demais, madeira preta brilhante, a ponta fina como de uma agulha. O velho Leclair insistiu que combinava com ela.

Ao contrário dela, Ada tinha uma varinha de madeira branca, fina e delicadamente ondulada como um osso entalhado, parecia uma agulha de crochê antiga. Se perguntava onde estaria agora.

Ele apontou para sua frente com o braço estendido, segurando a varinha no alto, baixou-a bruscamente como se estivesse golpeando algo. Um rasgo espacial foi criado frente a eles mostrando uma porta escura com o número 18 entalhado na porta.

— Bem, é isso.

Aedan guardou a varinha no bolso, soltando um suspiro sem coragem. A garota olhou para as pessoas ao longe, Genevieve já tinha expulsado a Dobsherley do altar, agora ela estava falando algo com o rosto sério. Ela usava um véu sob o rosto delicado, os grandes olhos exaustos se apertavam quando ela desviava o olhar para o céu. Gostaria de saber como fazê-la se sentir melhor.

Spencer estava olhando para o túmulo sem nem piscar, a pequena Frances estava encarando os gêmeos de longe. Asteris acenou com um sorriso triste, a criança loira sorriu acenando de volta arrumando seus cachos para atrás da orelha quando um forte vento atravessou o local.

Mais longe da multidão, Asteris percebeu que estava sendo observada. O duque estava perto de uma árvore que projetava uma grande sombra, levava consigo uma bengala, bem como a maioria dos ricos, e sua famosa capa preta que — na opinião de Asteris — o fazia parecer exatamente como humanos imaginavam feiticeiros.

O duque não desviou o olhar quando ela o encarou. Asteris viu seus olhos se afiarem mais, encharcados daquela repulsa que ele sempre sentiu por ela. Ela acenou para ele com um sorriso provocador, balançando a mão alto o bastante para que não houvesse possibilidade de ele não ver. Com isso ele voltou a olhar para as pessoas que já se retiravam.

Maldições das SombrasWhere stories live. Discover now