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✦ Olhos sem vida.

Asteris levantou seu tronco em um salto e viu suas sombras escapando pelas frestas de seu corpo, tomando conta de seus lençóis, sussurrando por liberdade. Tropeçou nos panos, perdendo a força quando o choque térmico a atingiu ao pisar no chão e caindo sobre seus cotovelos, rangeu de dor com o impacto.

— Calem a boca! — Ela gritou para a névoa.

A escuridão em forma de serpente dança ao seu redor e se esgueira pela sua pele. Sua visão gradualmente escurecia e ela pensou que finalmente iria sucumbir à eles.

Rastejando até as gavetas de seu guarda-roupa, rangeu os dentes começando a se desesperar. "Mais um pouco, me deixem em paz só mais um pouco", suplicou nos pensamentos enquanto enfiava a mão nas roupas íntimas até encontrar.

Tick. Tack. Tick. Tack. Tick. Tack.

"Ouça os estalos. Combine com sua respiração." Quase pôde ouvir a voz dele, sentir sua mão em seu rosto. Asteris sufocou um soluço. O pânico estava a atrapalhando, ela não podia enlouquecer. Foi só um pesadelo. Um pesadelo e nada mais.

Não era mais real, aquilo já tinha passado.

Tick. Tack. Tick. Tack.

Grudou o relógio de bolso na orelha e fechou os olhos se encolhendo em posição fetal no meio da sala. Algumas lágrimas escaparam quando se forçou a pensar em coisas que ela amava. Sua família. Genevieve, Spencer, Ada, Aedan, Gwendolyn, Francesca. Mãe, pai. Alguma lembrança feliz.

Tocar piano com Gwen, cavalgar com Gen, caçar vagalumes com Dan e Ada, desenhar com Frances ou aprender a soletrar com Spencer. Qualquer coisa. Tudo para depois lembrar que perdeu tudo.

Aos poucos o calor a alcançou, deixando seu corpo relaxar e parar de tremer. Elas foram embora, mas ela continuou a chorar no chão.

Ela fez duas tranças com algumas mechas do cabelo, prendeu-as com uma fita marrom escura formando uma coroa de tranças. Vestiu uma camisa de botões branca um pouco surrada, continuava frio então optou por colocar uma meia calça escura. Escolheu entre os 3 únicos conjuntos que tinha e depois, em frente ao espelho, arrumou a saia e o colete verde marinho.

Calçou suas botas vermelhas preferidas do qual sempre achavam destoante dela e depois pegou o relógio de seu pai, colocando-o no bolso interno da saia.

Deu uma volta na frente do espelho. Como sempre, estava impecável como gostava. Mesmo que participasse de momentos onde havia sangue, armas e — por vezes — fogo, precisava estar apresentável.

Sentiu-se um pouco melhor, dias como esse nunca eram muito prazerosos. Principalmente quando sabe que neles sempre acontecem coisas mais ruins do que o normal. Desde que começou a ter crises como essa, se tornava cada vez mais difícil conviver consigo mesma.

Apesar de odiá-la, pensava que a juíza Ávalon em algum momento teve razão em fazer as marcações. No entanto, sua falta de coragem  a irritava profundamente. 

Ela deixou de pensar nisso, não a faria bem continuar. 

Asteris saiu de seu apartamento, cumprimentando Cecilla que carregava uma cesta de tecidos nas mãos. 

— Encomenda nova?

— As irmãs Dobsherley. Nunca vi alguém que ama tanto renda quanto elas. — Suspira cansada — Pelo menos eu só faço os bordados da bainha, minha companheira de atêlie tem que medir elas.

— Ah, que pesadelo. Sinto muito por ela — Asteris lamenta — Ela saiu com alguma comida na roupa dessa vez?

— Não, só alguns xingamentos. — Dá de ombros segurando a maçaneta da porta — Não volte muito tarde hoje.

Maldições das Sombras | ⛥Where stories live. Discover now