2 • Monstro

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Autor: Oimin95

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Assim que subiu na embarcação simples e um tanto irritante aos olhos do capitão, foi recebido pela parte da tripulação que sobreviveu, cumprimentaram-no com alegria, como se não tivessem o deixado à deriva como mais um cadáver.

Mas Kai dispensou as comemorações por estar vivo e a passos pesados começou a andar pelo convés imundo, fingindo analisar o estrago, pois a realidade era que ele não tinha mais espaço na cabeça. Não naquele momento em que se via atormentado por projeções que sua mente fazia, lhe mostrando como seria seu provável futuro solitário, sem ter a quem confiar e a quem amar.

Era devastador, porém a morte lhe era uma velha amiga, não a temia ou culpava. Seu único fardo era ter que viver sem aqueles que seguiram o caminho até sua fiel companheira.

— Quais foram as perdas? — perguntou, firme, tomando sua postura corriqueiramente inabalável enquanto caminhava, com certa dificuldade, até sua cabine. Caleb vinha logo atrás, como um cativo leal com seus reluzentes cabelos loiros tal qual os de um anjo.

O garoto era o mais jovem tripulante da Nau, contava apenas quinze, sem saber se já era adulto ou se permanecia criança. Enquanto seguia seu mestre, lhe listava todos os prejuízos da tormenta, mas mesmo que falasse com uma seriedade incompatível com seu eu, esforçando-se na tarefa, o capitão permanecia distraído com o que quer que se passava em sua mente.

— ... Um dos botes, algumas redes e cinco dos nossos não retornaram. — Listou, sentindo um amargo escorrer em sua garganta ao notificar o último.

Kai não o respondeu, apenas adentrou sua cabine, já procurando por um pedaço de pano para poder enfaixar os dedos contundidos de sua mão. Estavam vermelhos e inchados, doíam com um inferno, além de quase todos estarem fora do lugar, dando uma aparência grotesca e extremamente perturbadora a quem pudesse olhar.

— Hmm... — murmurou, entretido com sua procura.

Revirava, da maneira que conseguia, a gaveta da sua mesa fixada ao chão. Ele sentia o olhar curioso de Caleb que o encarava a espera de uma solução, entediado e cansado, Kai se voltou para o mais novo daquela embarcação e disse.

— Mande dois homens pegarem o bote que sobrou e irem buscar as coisas que estão boiando na água, veja o que ainda presta e o resto deixe onde está. E depois chame o navegador, precisamos sair deste limbo onde a chuva nos trouxe.

Caleb assentiu e já ia se retirar quando viu seu capitão se sentar na poltrona de madeira talhada e apoiar o cotovelo sobre a mesa. Sua face se enrugou como uma uva seca ao que viu Kai segurar firme um dos dedos, se preparando para pô-lo no lugar.

Passou lentamente por seus olhos pubescentes a imagem angustiante daquele dedo enviesado voltando ao normal com um rompante violento, acompanhado de um urrar dolorido.

— O primeiro imediato morreu — disse com a voz rouca de dor — Dinesh acabou se afogando na tempestade.

O loiro assentiu, um tanto assustado por ter a confirmação da morte de Dinesh e horrorizado pelo que seu capitão fazia. Essa não era uma de suas primeiras viagens, mas ainda não tinha uma vasta experiência para aguentar ossos partidos ou adversos de sua anatomia.

— Chame Jerry aqui, quero contá-lo eu mesmo sobre o falecimento. — Seu braço tremia de tanta dor, ardia de maneira absurda, só tinha certeza de que não estava quebrado pois conhecia a dor da fratura — Anda moleque, me ajude aqui!

Incerto, o loiro foi até seu capitão para ajudá-lo a pôr sua mão no lugar, suava nervoso, nunca fez isso. Se errasse, se fizesse qualquer coisa errada com a mão do capitão, ele sabia que as consequências não seriam nada agradáveis.

Isca Para PeixeWhere stories live. Discover now