As paredes azul marinho, o quadro de um desenho que fizera na infância, um beliche velho e, finalmente, o espelho em que Pietro costumava encarar enquanto prometia a si mesmo que mudaria de vida,onde prometia que não ficaria nesta pequena casa sob influencia de seus pais que queriam que o mesmo vivesse a vida que eles não puderam. Pietro, viveu durante vinte e três anos uma vida que não era dele, e sim, de seus pais, no entanto, durante esses longos e frustrantes anos, ele juntou dinheiro e trabalhou arduamente sabendo que conseguiria mudar de vida, viver em outro lugar onde não pusessem um rotulo de "Nerd" simplesmente por ele gostar de ler livros e jogar jogos online. Ele sabia que mudaria o jeito que as coisas eram.
Pietro para de encarar o espelho, como tipicamente fazia durante todos esses anos. "Adeus", ele se despede com um olhar saudoso e nostálgico. Já tendo se despedido de seus pais, Pietro pega suas coisas e vai ao aeroporto para dar uma "Olá" para seu novo lar, sua nova vida da qual ele pretendia abraçar.
Já no avião, Pietro coloca os fones de ouvido e aproveita o voo que deve durar entre uma hora e duas horas. Ele olha a janela e pode sorrir. Ele não sente o vento com as janelas fechadas, mas sente como se pudesse realmente voar sob o vasto céu, alcançar estrelas das mais brilhantes,mas também como se pudesse cair a qualquer momento. É sua insegurança, no entanto, faz parte do processo de "desmame". Por sorte, Pietro sabe bem disso, sabe de sua decisão, dos riscos, mas também das oportunidades.
Uma senhora de meia idade o encarando fazendo com que Pietro olhasse para a mesma confuso.
A senhora ri de seu comportamento.
– Eu tinha um filho igual a você. Ele nunca penteava o cabelo e ficava com o cabelo ruivo todo bagunçado. – ela comenta.
Pietro ajeita seu óculos, uma mania que tem adquiriu na adolescência e manteve na vida adulta. Sempre que se sentia desconfortável, Pietro ajeitava os óculos azuis.
– Ele usava aquele sabonete pra tirar espinha – a mulher continua a falar rindo de maneira estranha.
– É mesmo? – Pietro responde de maneira breve.
– É só um garoto né?! – a senhora falava e parecia se divertir com as próprias falas então Pietro tenta apenas concordar com um sorriso, ara olhando para ela e ora olhando para a janela.
A mente de Pietro viaja para lugares inimagináveis rumo a diferentes caminhos enquanto a senhora falava. Em sua mente, ele pensava na nova vida que teria, em como seria ver finalmente sua casa que, embora pequena, era dele e de mais ninguém. O antigo Pietro não fazia amizades, não era sociável, era um "nerd", mas será uma nova cidade, sua nova chance de se esforçar para ser melhor do que o mesmo era anteriormente. Seria seu recomeço com um bom emprego numa editora de livros local e quem sabe, novas amizades e novas paixões. Ele sabia que o que quer que acontecesse lá, não seria igual. Seria único,seria seu, onde suas pegadas estariam registradas para sempre, assim, apagando as antigas que já não lhe afetavam.
Pietro estava tão absurdamente concentrado em seus pensamentos, sonhos e ambições, que não nota que a senhora já não está falando ao seu lado, e que o avião já havia pousado. Já não era a cidade em que seu passado iria apodrecer. Agora estava na nova, onde tudo era possível, onde poderia crescer, florescer e dar frutos.
Ele segue o resto dos que estavam no avião em fila indiana. Tudo ocorreu de maneira rápida e não demorou muito para que o mesmo estivesse no táxi a caminho de sua casa. Sim, sua casa.
– Aqui estamos – o taxista diz estacionando em frente a casa com um tom de amarelo desbotado e detalhes de madeira – Primeira vez aqui?
– Sim. Acabei de me mudar – Pietro responde.
– Vai gostar daqui. O pessoal é bem amigável e acolhedor. – Ele comenta balançando a cabeça – Bom, aproveite e seja bem vindo!
– Obrigado – Pietro sorri amigavelmente se sentindo verdadeiramente acolhido. As pessoas aqui realmente falavam mais do que em sua cidade natal. Havia uma sensação boa dentro dele, uma sensação de que ele gostaria do local, de que se acostumaria e criaria raízes fundas por esses cantos.
Entrando em no conforto de sua casa, que por ser nova não possui muitos moveis, ele se senta em uma cadeira simples de plástico que havia lá. Ele observa a frente de sua casa pela janela e observa o tempo mudar, as nuvens antes brancas ficarem mais escuras e pesadas. Não demora muito começou a chover.
A chuva era agradável trazendo consigo o cheiro de terra molhada. Não era fraca nem forte. Trazia apenas consigo poças de água, folhas que vinham com o vento e uma gatinha. Uma gatinha molhada pela chuva que embora não ameaçasse Pietro, que estava sob um teto, ameaçava a segurança e saúde daquele animal.
A gata estava sentada numa poça e parecia estar assustada. Pietro observava de sua janela a espera de que a mesma fosse para um local seco, como era de esperado, mas vendo que a gata permanecia imóvel, ele sai rapidamente para o lado de fora e, com cuidado, pega a gata em seu colo e traz para sua casa.
– Ei, gatinha...cadê o seu dono? – Pietro pergunta colando-a no chão já coberta por uma toalha para que a mesma pudesse se secar.
Ela parecia desconfiada. Seus olhos lhe diziam que foi abandonada, eram olhos de quem já experimentou a dor.
Pietro reconhece seu olhar.
– Tudo bem, não vou te colocar pra fora. Não vai mais ficar sozinha. – Pietro fala de maneira calma enquanto acaricia a gata, que a cada toque a conquista fazendo com que ela chegue mais perto.
Agora com a gata no colo quase dormindo, Pietro pensa num nome que poderia dar a ela. Como numa numa visão divina ou um sussurro do diabo, um nome surge em meio a tantos outros em seus pensamentos: Laís.
– Ei Laís – ele sussurra a chamando – agora você tem um nome.
A gata boceja fazendo um miado um tanto desajeitado, fazendo Pietro rir.
– Laís, eu tinha que ter gravado isso!
Embora Pietro não soubesse, o mesmo tinha a sensação de que a gata se divertia tanto quanto ele se divertia. Agora, não só a gata não estava só, mas também Pietro poderia ter uma companhia. Teria alguém o esperando depois de um longo dia de serviço. Teria a pequena Laís.
