Que Droga É Essa?

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°ღ• ⚢ •ღ°

Tá muito tarde pra dizer "fica?"

Ou tá muito cedo?

Ela senta na beira da cama, esticando os braços acima da cabeça, aquela espreguiçada boa. Eu acompanho a linha da coluna descer até a base da bunda, até que ela jogue o cabelo pra trás, cascata cor-de-rosa emoldurado tudo. Como se ela precisasse ser mais perfeita do que é.

Eu devia me dar por satisfeita. São outros tempos, eu já tô meio velha e é assim que é. As pessoas vem, te fodem bem gostoso e vão embora.

Mas eu não quero deixar ela sair. Já é meio de madrugada, um pouco mais e a gente já tem que trabalhar. Eu não ligo de ir virada, eu já virei noites por motivos muito menores.

Eu não quero dizer em voz alta, não. E acho que não vou dizer. Mas se eu fosse capaz de ouvir minha vontade um tom acima da minha vaidade, eu diria.

Tô louca pra dar um beijo nela.

Querer tanto assim dá medo.

- A gente se empolgou como se amanhã ainda não fosse quinta-feira.

A voz dela ainda é um tanto arrastada, me arrasta pro inferno. Eu dou risada, tentando não pensar se ela percebe algo tão trivial em mim também.

- Ainda é duas e quarenta. Dá pra cochilar.

- Ih, até eu chegar em casa, é três. Até eu dormir, vai tá dando quatro. Pelo menos eu trabalho em casa, se eu levantar sete e quarenta e cinco, tô pronta as oito.

Ela levanta, veste a calcinha. Começa a olhar em volta, soltando um riso fraco quando percebe que não faz ideia de onde eu joguei a calça dela.

Ela tá indo embora, Marceline. Faz alguma coisa. Anda!

Eu continuo quieta. Se eu tivesse alguma coisa de marrenta além da cara, não continuaria.

- Derrubei vinho na camiseta. Merda.

Ela resmunga alguma coisa, parada à meia luz da lua, nua da cintura pra cima, a camiseta suja na mão. Eu sento na cama e, sem pensar muito, tiro a minha própria camiseta e estendo pra ela.

- Coloca na máquina - digo, apontando pra lavanderia, visível de onde ela está pela porta do quarto. - Tá com tudo pronto pra ligar, eu já ia lavar roupa amanhã. Sábado você pega aqui.

- Em casa eu lavo, Marcy.

- Vai manchar, mulher. Taca lá. Vou roubar teu top rosa, não - respondo, com um revirar dos olhos que eu tenho certeza que não soa nada irritado.

Ela ri, veste minha camiseta e vai fazer o que eu disse. Quando volta, tem um sorriso quase irônico no canto da boca.

- Não prometo o mesmo sobre a sua camiseta - diz ela, tentando não rir.

Eu mostro o dedo, ela solta a risada. Bem, ela pode se achar muito esperta, mas dessa vez eu fui mais. Garanti que vou ver ela pelo menos mais uma vez essa semana e, de quebra, tem uma peça com meu cheiro com ela.

E, só talvez, ela se pegue com o nariz enfiado nessa camiseta, do mesmo jeito ridículo que eu acordo cheirando o travesseiro toda vez que ela vem.

Ela vai indo pra cozinha, eu vou atrás. Ainda meio fraca, ainda só de calcinha, mas eu não ligo. Eu preciso de uma desculpa, rápido.

Enquanto ela vira um copo d'água, eu faço a minha tentativa fútil.

- Ei, tu não precisa sair de madrugada. Dorme aí. Eu te levo de moto de manhã.

- Não, não vou ficar te empacando. Você tem seus compromissos também.

- Não me atrapalha em nada, não. Cê tá pescando de sono, já. Larga de ser teimosa.

- Não - eu dou um tapa de leve no braço dela, ela começa a rir. - Eu tô de boa, Marcy.

- Bonnie, olha a hora. Tu não tem medo de andar na rua uma hora dessa, não?

- Eu nem moro tão longe assim!

- Cê não tá mais no interior, sabia? Na cidade grande, pra ser assaltada ou pior, nem precisa ser duas da manhã.

Dessa vez, ela parece considerar. Bem, pela lógica eu sei que dá pra ganhar. E eu nem arrisco ir pelo coração, porque a verdade é que não sei se essa via aqui é de mão dupla.

Não sei se vale a pena assumir certas coisas. Pelo menos, não ainda. Nem eu aceitei direito o que eu tô sentindo assim, tão de repente, vai que ela corre, que ela foge.

Mas a minha cabeça tá correndo no assunto, me deixando louca.

Que droga de saudade é essa que eu tô sentindo, se ela nem saiu da minha frente ainda?

E eu sei que, independente se agora ou de manhã cedo, assim que ela sair do meu campo de visão, o peito vai apertar, vai começar a contagem regressiva até sábado. Até ela voltar, até ela me beijar de novo.

- Tem certeza que não vou atrasar teu lado?

- Garota, tu pode trazer teu notebook e trabalhar dentro do meu quarto que ainda não vai me incomodar.

Merda.

Ela sorri, curva o rosto. Examina meu rosto enquanto eu faço o que eu posso pra parecer neutra. Eu acho que falhei.

Eu sei disso.

- Tá bom. Eu fico, então. Mas de manhã eu tenho que ir.

- Tranquilo.

- E você leva teu notebook lá pra casa. Minha internet é melhor.

- Joga na cara, mesmo!

Vai se foder, porra.

Vai se foder, ela e essa risada deliciosa dela. Inferno.

- Só não sei se tenho o que te oferecer pro café, lá.

Ela encolhe o ombro, quase tímida. Eu sorrio. Eu ia falar, mas deixo quieto. Só abro o armário, pego um saco de pão. Mostro a mortadela na geladeira.

- Eu levo.

Covarde do caralho.

Se eu não fosse essa cachorra assustada, eu assumia. Falava logo que, por mim, ela fica pro café, pro almoço e pro jantar. Fica pro filme no domingo, pra adotar um gato, levar meu sobrenome.

Se eu não morresse de medo da Bonnie, eu soltava pra ela o tipo de cantada barata que eu já soltei pra todas as outras.

O que eu consigo fazer é parar de só querer, pelo menos pela metade. Dou logo um beijo nela.

Deixo ela roubar meu ar e meu juízo. Cada pensamento inquieto vai derretendo no calor que ela causa, o bom senso evapora, um sorriso quebra o beijo por meio segundo, antes que ela possa roubar minha boca de novo.

Bem, eu sei um jeito de fazer ela querer mesmo ficar.

Pode ficar, amor.

Fica pro café. E, se te der vontade de ir, eu te sirvo outra coisa. Te sirvo logo um chá, pra gente conversar até a hora do próximo café.

Fica pro café, que logo eu sirvo um chá.

°ღ• ⚢ •ღ°

(Fica Pro Café - Carol Biazin)

Um Café & Um Chá (Oneshot Bubbline)Where stories live. Discover now