10_ Pintura

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O quarto estava escuro. O som das ondas se quebrando da praia era praticamente o único som a se escutar, juntamente com o cantar dos grilos. Já fazia um bom tempo que eu estava rolando na cama de um lado para o outro sem conseguir dormir.

ㅡ Arg... ㅡ Resmunguei após rolar pela cama mais uma vez. Acabei parando de barriga para cima, encarando o teto.

Por que eu não estava conseguindo dormir? Porque uma cena que vivi naquele dia não me saía da cabeça de jeito nenhum.

A fatídica cena em que irritei tanto Carson na dispensa que ele calou a minha boca. Pensei que meu coração fosse explodir naquela hora e agora não consigo dormir, porque fecho os olhos e tudo o que vejo são os olhos dele, me encarando, tão perto...

Puxei o travesseiro para o meu rosto e dei um grito abafado. Eu queria dormir, eu precisava dormir, já eram...

Peguei o celular carregando em cima da cadeira para ver o horário.

Quase quatro da manhã e eu estava ali, acordada, sem ter dormido quase nada, até porque só fui pra cama duas horas, que foi a hora que conseguimos sair da dispensa.

Será que essa história de leite quente ajuda a dormir?

Sem outra opção, me levantei da cama e fui até a geladeira. Peguei a garrafa de leite ainda fechada e coloquei um pouco para esquentar no fogão.

Me aproximei da janela para observar a noite enquanto o leite esquentava, mas me assustei quando vi uma pessoa parada na varanda. Era Carson, graças a Deus. Ele estava apoiado na grade da varanda, segurando um livro grande nas mãos e folheando as páginas. Ele suspirava as vezes, parecia triste ou pensativo. Parecia carregar um peso nas costas. Eu sempre soube que as pessoas carregam bagagens, é normal, as de algumas pessoas são tão leves que mal percebem, mas as de outros são tão pesadas que as vezes o impedem de viver a vida como gostariam. Sinto que Carson tem uma dessas. Bem pesada.

Ouvi o som da tragédia e corri até o fogão para desligar o fogo do bendito leite que ferveu mais rápido do que eu esperava, transbordando a panela e sujando o fogão.

ㅡ Ótimo... ㅡ Resmunguei.

Coloquei o leite na caneca e voltei para a janela, mas Carson já não estava mais lá. Bebi o leite voltei para a cama, certa de que esse papo de dar sono era totalmente mentira, porque rolei por mais meia hora até finalmente cair no sono.

[...]

ㅡ Aonde vai? ㅡ Ben perguntou. Devia ser umas nove e pouca da manhã, o bar estava vazio, ele estava atrás do balcão e eu estava vestida para ir até o centro.

ㅡ Comprar roupa de cama.

ㅡ Você não comprou isso ainda? Já tem cinco anos que você ta falando que vai comprar roupa de cama. ㅡ Ri de seu deboche enquanto verificava se tinha tudo o que precisava na bolsa.

ㅡ Prometo que não volto pra cá sem ela hoje.

ㅡ Sei, acredito. ㅡ Ele mexeu nos copos de vidro atrás do balcão. ㅡ E cadê seu bonitão? ㅡ O olhei. ㅡ Carson.

ㅡ E desde quando o Carson é meu bonitão?

ㅡ Ah, eu que pergunto. ㅡ Ele sorriu, subindo e descendo as sobrancelhas.

ㅡ Já explicamos o que aconteceu ontem. Só ficamos trancados e aquilo que você viu foi uma tentativa dele de me fazer a calar a boca, porque eu não parava de cantar. ㅡ Expliquei, novamente.

ㅡ Tá bom, tá bom, já sei. Eu vou fingir que acredito e vocês continuam fugindo que não rola nada. ㅡ Ele piscou.

Fiz uma careta para Ben e ajustei a bolsa no ombro. Já ia dizer um tchau quando a porta da cozinha se abriu e Carson saiu de dentro dela. Ele não estava vestido como costumava se vestir para trabalhar, estava arrumado. Era um dia frio ele estava vestida jaqueta preta, calça jeans escura, cabelo penteado e cheiro de banho recém tomado.

Um raio de Sol em minha vidaWhere stories live. Discover now