Um caminho para Odilon

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- Vou lhe contar, mas só desta vez. Então, ouça bem. - Disse Odilon para o homem no bar.

- Ouço cada palavra que me dirige, Seu Odilon, mas não sei dizer se prestarei atenção. O senhor sabe que tenho outros clientes...

- Não há caminho que os afortunados com as palavras não percorram, para reencontrar consigo mesmo. - Continuou Odilon, ignorando o comentário do outro sujeito. - E o que é um literato, sem seus sonhos? É um poeta sem inspiração, um músico sem canção. Não é nada, digo. Nada!

- Seu Odilon, pare de bater no balcão, por obséquio. Está assustando os poucos homens que ainda vêm aqui.

- E eu mesmo tive o desprazer de passar por tal estigma... desconfio, inclusive, que a aflição que sofri seja tão comum, entre os homens de arte, quanto é um resfriado para todo homem e mulher do mundo. Pelo menos, foi o que me contaram. Mas minha mazela foi acompanhada de uma estória que foge tanto do senso comum, que nem mesmo meus amigos mais peculiares poderiam conceber. Começa com um grito: ahhhhhh!

- Seu Odilon! Meus clientes estão indo embora. Pode falar um pouco mais baixo?

- Não sei se teria o mesmo efeito sobre o senhor e sobre os outros, se eu fosse menos enfático!

Agora, continuando... eu gritei na minha cama.

📚📚📚

Anunciei meu tremendo pavor para todos que pudessem me ouvir e meus pais abriram a porta do quarto, de sobressalto. Já mencionei que eu tinha não mais do que oito anos de idade? Pois agora sabe! Não era mais do que um humano em miniatura, absorvendo tudo que via e ouvia, aprendendo a engatinhar nas asas da criatividade. Ah, e eu já era muito bom nisso. Não havia um único dia no qual não reservava algum tempo para escrever. Muito embora, em sua grande maioria, fossem frases e textos desconexos, alguns dos quais me envergonhei, por vezes, de ter sido o autor, havia aqueles que se caracterizavam, e ainda se caracterizam, como verdadeiras pérolas brilhantes, rubis ainda não lapidados pelo tempo.

E a fonte disso tudo se manifestava, em primazia, por meio de meus estranhos e maravilhosos sonhos. Até aquele momento no tempo, não conseguia me lembrar de uma noite sem sonhos e a simples ausência daqueles incríveis devaneios era o suficiente para me fazer gelar até os ossos.

- Onde estão meus sonhos? Onde estão? - Lembro-me de berrar, no quarto. - Não consigo pensar em nada de novo para escrever sobre! - O abraço de minha mãe e as palavras de meu pai só tornaram aquilo mais difícil do que era, para mim.

- Todos nós temos momentos de bloqueio criativo, meu filho. Tenho certeza de que suas palavras não demorarão a abrir caminho para a superfície.

- Mas e se isso nunca voltar a acontecer?! - Tornei a berrar.

Silêncio.

Repensando aquele momento, entendo agora que, realmente, não havia muito a se dizer. Somente o tempo diria o que seria de mim, poeta sem palavras.

E o tempo disse.

Muito bem, claro como o dia.

Não havia salvação imediata para aquele artista esquecido pela terra dos sonhos, lar das maravilhas. Os dias vieram e foram embora, as semanas desvaneceram como a cor das estações.

E eu me vi diante de dois caminhos, naquele momento, mais do que nunca: a conformação ou a persistência.

Conformar-se nunca foi algo natural para mim, então eu decidi pensar em um meio para reaver minha antiga glória.

Um caminho para OdilonWhere stories live. Discover now