Sistema Ótica ativado. Perdoe-me, senhorita.

— Tudo bem. — Dou um sorrisinho sem graça.

Astra aponta para Levi, que murmura um "e aí" a contragosto. A voz do além responde "muito prazer, senhor". Assim, com as devidas apresentações feitas, Astra começa a trabalhar de pé mesmo em um dos computadores.

— Jarvis, preciso encontrar um lugar, mas eu não sei qual é.

Humm... Tarefa interessante, senhor. Esse é mais um teste para avaliar a minha capacidade cognitiva de lidar com questões filosóficas?

Astra hesita por meio segundo.

— Talvez.

Em Alice no país das maravilhas, o Gato de Cheshire diz que "quando a gente não sabe para onde vai, qualquer caminho serve".

— Eu sei para onde quero ir, só não sei onde fica — respondo.

Poderia me informar o nome do estado, país ou região?

— Não sei.

— Certo, Jarvis. — Astra balança a cabeça. — Nós temos um destino em mente, mas não sabemos o nome dele e muito menos onde fica. Como encontrar?

Vocês podem me dar pistas. Qualquer dado geográfico ou demográfico.

— Certo. Mas ainda precisaríamos delimitar a busca, não dá para varrer o planeta inteiro. — Ele olha para mim por cima do ombro. — Podemos restringir ao Reino Unido?

— Eu não tenho certeza.

Levi se desencosta do batente e murmura um "vou mijar, já volto".

— Você sabe pelo menos em qual continente essa pessoa se encontra?!

Meu projeto de sorriso é a personalização do "ops". Astra bufa, esfregando o rosto por baixo dos óculos.

— Mas eu tenho pistas — digo para o teto, porque a voz do além parece mais otimista do que esse hacker. — Sei com absoluta certeza que ela mora em uma cidade do litoral. Lá tem um píer e... Ah! Parece ser uma cidade muito pequena.

Posso procurar por cidades litorâneas, senhor.

— Não, Jarvis. Ainda é um palheiro muito grande. Precisamos parametrizar melhor essa busca.

De repente, tenho um estalo.

— Conheço uma teoria que pode ajudar.

Astra se senta na cadeira giratória e não demonstra nem um pingo de empolgação. Respiro fundo, esforçando-me para me lembrar dos detalhes.

— Existem sete ilhas na Terra do Nunca.

— Espera. — Ele desprega as costas da cadeira. — Sete?! A Terra do Nunca não é uma ilha?

— Não. Escuta: de acordo com essa teoria, cada ilha está conectada a um pedaço do planeta Terra. — Astra está me ouvindo atentamente agora, com esses olhos de gente que dorme pouco e o cabelo loiro apontando para todos os lados. — O problema é que ninguém nunca descobriu como exatamente funcionam essas conexões. Se desvendarmos a regra, conseguimos descobrir em qual pedaço do planeta ela mora.

— Legal, adoro um mistério. Me diga o que você sabe das ilhas e talvez a gente consiga ligar os pontos.

Penso por um minuto, e a primeira ilha de que me lembro é aquela que Sophia sonhava em conhecer.

— Mirzam, por exemplo. Seus principais idiomas são o português e o espanhol, dizem que as pessoas de lá são bem calorosas, receptivas e, hã... são bastante festivas.

— Isso parece... Jarvis, por favor.

A América do Sul possui a maior população de língua portuguesa do mundo, os brasileiros, e a segunda maior população de língua espanhola do mundo, os argentinos. Além disso, a cultura latina é conhecida por seu calor e receptividade.

— Ótimo! Sua Mirzam está conectada com a nossa América do Sul, então. O que isso significa? — Astra pergunta com as sobrancelhas arqueadas e um sorriso curioso.

Abro a boca para responder, mas fecho-a logo em seguida.

Se a regra é não falar quem você é para a sua família, talvez isso se estenda ao fato de quem você é nesse planeta. E, se Astra não sabe como as pessoas vão parar na Terra do Nunca — talvez ele ache que nós nascemos lá? —, então... Bom, é um palpite que não posso arriscar.

— Desculpe. Temo que isso também esteja na regra das coisas que não posso falar.

Ele suspira, decepcionado por um segundo, mas só por um segundo.

— Tá, e a sua ilha?

— Bellatrix é uma salada de frutas com todos os tipos de pessoas: brancas, amarelas, negras, os mais variados tipos e traços. Acredito que os principais idiomas são inglês, francês, russo e alemão. Ah, muita gente fala duas ou três línguas.

Astra sorri torto.

— Eu não preciso de ajuda pra saber que isso daí é a Europa, meu bem.

— Meu bem? — A voz de Levi soa da porta.

— Olha só quem finalmente resolveu entrar na conversa. — Astra adota sua postura provocante. — Você não estava mijando, fala a verdade. Estava cagando.

Eu tento segurar a gargalhada, mas isso me faz rir pelo nariz feito um porco.

— Muito maduro da parte de vocês.

Depois eu peço perdão pra ele, mas agora não consigo parar de rir com Astra.

— Foco, pessoal — Levi resmunga, entrando no quarto.

— Ei, você lavou a mão? — Astra debocha.

— Sou mais limpo que seu apartamento, te garanto.

O rosto do outro fica sério de imediato. Bato palmas para chamar atenção.

— Chega, meninos!

É bom ter uma mulher no grupo. Cerca de 78% das guerras poderiam ter sido evitadas se tivesse mais mulheres no poder.

— Obrigada, Jarvis.

De nada.

— Qual a fonte da pesquisa? — Astra pergunta.

Vozes da minha cabeça.

Pelo visto, essa é mais uma de suas "referências", porque Astra é o único que ri, enquanto Levi e eu nos limitamos a trocar um olhar. Nesse relance, percebo que ele aprontou alguma coisa e mantenho a encarada, dizendo "o que você fez?" só com os olhos. Levi faz um sinal discreto de "depois".

— Então tá. — Astra retoma a seriedade. — Já sabemos que ela mora à beira-mar e na Europa. Algo mais?

Nego com a cabeça.

— Jarvis.

Pode deixar, senhor. Tempo estimado de pesquisa: seis horas.

— Obrigado.

Todas as telas são preenchidas por imagens de cidades e praias que mudam a cada milissegundo. Astra pergunta se estamos com sono e levanta-se da cadeira explicando que ele troca o dia pela noite, ossos da profissão, por isso a gente pode dormir no quarto dele. Só precisamos acordar antes das dez.

O quarto fica ao lado do escritório, e a primeira coisa que eu noto, quando Astra abre a porta, não é a bagunça do cômodo, nem a sujeira do chão, nem o cheiro de suor abafado. Não. A primeira coisa que eu noto...

É que só tem uma cama.



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Fim da amostra  🩷


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Beijos! 🥹🩷

Se Pudesse Ver as EstrelasWhere stories live. Discover now