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     Andamos pela floresta por um bom tempo, durante quase todo esse tempo, Yuri me falava mais sobre essa coisa de semideus, a cada palavra que trocamos, eu sentia que podia confiar nele. É estranho pensar isso sobre um cara que acabei de conhecer, mas… parecia fazer sentido. Ele me contou que o motivo de tanta coisa estranha ter acontecido comigo, era por culpa de eu ser filho de algum deus, me explicou que todas as histórias épicas de heróis aconteceram, e, às vezes, se repetem. Também me falou que, assim como eu, ele tinha fugido de casa, por não se encaixar, ele falou rapidamente sobre seu pai nunca estar em casa, e provavelmente nunca ter sentido sua falta, pois ele tinha fugido há um ano, e nunca haviam procurado por ele.
     Ele me contou um pouco mais sobre o lugar seguro que ele havia ouvido falar. Segundo Yuri, ele conheceu uma garota, que estava levando ele pra lá, para ajudá-lo, mas ela foi morta por algum monstro que eles enfrentaram, ao que parece ela já tinha estado lá. Me contou que o lugar era como uma fazenda, ou um sítio,  que treinava semideuses e os mantinha em segurança, esses semideuses aparentemente podiam morar ou usar essa fazenda como local de férias. Yuri tinha uma boa ideia de como chegar lá, por isso esse era seu objetivo.

     — Então… se você é filho de algum deus, sabe qual é? — acabei perguntando enquanto andávamos.
     Ele sorriu. Por que esse garoto sorri tanto? Não que eu esteja reclamando, mas…
     — No meu caso é uma deusa, e na verdade eu sei sim, um tempo depois que eu saí de casa, encontrei uma mulher, ela me ajudou, me disse pra onde eu podia ir, e me deu comida. — ele mexeu no brinco em sua orelha direita, um brinco prateado com o pingente em forma de um pássaro — antes de ir embora, ela falou que era minha mãe. Afrodite, deusa do amor e da beleza.
     — É estranho pensar que isso é verdade. — Comentei — Eu sempre pensei que meu pai tivesse me abandonado depois de descobrir que minha mãe estava grávida. E que ele fosse um idiota, porque minha mãe sempre agiu como se ele fosse um monstro.
     — Na verdade ele ainda pode ser tudo isso, só que imortal, ou não. Talvez você tenha a sorte de conhecer ele, e daí vai poder tirar suas conclusões.
     Assenti e continuei andando. Seguimos por um bom tempo em silêncio, tempo o qual eu passei pensando e relembrando algumas coisas. Como quanto eu dia seis anos, e, pela primeira vez, perguntei sobre meu pai à minha mãe, ela gritou e me ordenou a nunca falar sobre "aquele demônio", quando eu perguntei sobre para minha vó, já tinha uns dez anos, ela contou que ele era um capeta como eu. Relembrando isso eu comecei a pensar, será que minha mãe sabia que meu pai era um deus? Talvez por isso ela achasse que ele era um demônio, até porque toda minha família eram extremamente católicos — o pior tipo deles — e era horrível conviver com eles. Uma vez minha avó encontrou um dos meus desenhos, e literalmente me lavou com água benta e pediu para o padre da capela que frequentavam me exorcizar.
     De fato eu nunca me encontrei naquele lugar, era tudo sobre eles, e nada sobre mim. E ficou ainda pior quando minha mãe casou e eu tive uma irmã. Não por ela, Sara sempre foi incrível, ela sempre foi a única coisa daquele lugar. Mas minha família piorou, não queriam me ver perto dela, com medo que ela ficasse tão perturbada quanto eu. Adorava seus brinquedos, as bonecas e que eu sempre quisera, mas nunca pude ter, e quando ela ganhou, me convidou para brincar com ela, foi divertido, até descobrirem. Afinal, para eles, aqueles não eram brinquedos apropriados para um garoto.
     Mas eu nem tinha muita coisa, meus brinquedos favoritos eram um Max Steel sem uma das pernas, que ganhei de um de meus primos porque ele não quis mais, e um boneco do Ben 10 com um braço faltando. Mas o único jeito que eu sabia brincar era como se eles fossem um casal, por sorte, isso nunca descobriram. Mas meu padrasto já havia mexido nos meus desenhos, e em algum deles, aqueles que não eram estranhos e assustadores, ele achou um desenho no qual o Charlie e o Marv — sim do Charlie e Lola — se beijando, e esse foi um dos muitos desenhos que ele rasgou na minha frente. A bela infância que eu tive.

     — Acho que tamo chegando — Yuri falou quando saímos da floresta e chegamos em uma pequena estrada de terra.
     — Você sabe exatamente onde é essa fazenda?
     Ele balançou a cabeça.
     — Não exatamente, mas acho que vamos conseguir chegar lá.
     — Cuidado— aquela voz estranha voltou a falar em minha volta, logo em seguida, ouvi um barulho perto das árvores.
     Yuri não parecia ter ouvido o mesmo que eu, então não esbocei reação.
     — Acho que é por ali — ele falou indo por um caminho estreito, eu o segui sem pensar muito.
     Não andamos muito, e nos deparamos com um portão, e uma placa que dizia "Fazenda Nevoeiro ", assim que paramos em frente ao portão, pude ver que lá dentro havia um grupo de adolescentes, eles nos olharam meio surpresos e logo depois seus rostos ficaram assustados. Ouvi passos pesados, nos viramos ao mesmo tempo e vimos o que parecia ser um homem gigante, devia ter pelo menos três metros, vestia trapos rasgados, tinha cicatrizes por todo o corpo e no meio da testa um grande olho azul, o cabelo grande e loiro estava totalmente desgrenhado, seu rosto era sujo e horroroso de um jeito assustador.
     Do lado de dentro do portão ouvi um apito alto, um dos adolescentes lá dentro gritou:
     — Ataque na entrada principal!
     Era uma garota, grande e forte, logo após gritar, correu em nossa direção. Estava tão chocado e assustado que travei por alguns segundos, tempo suficiente para que, seja lá o que fosse aquilo, chegasse até nós. Yuri não estava mais ao meu lado, sim a minha frente, eu não com que rapidez ele fez aquilo, mas ele já estava com sua faca na mão, e com ela fez um corte fundo na mão gigantesca que vinha em nossa direção, quando o monstro ergueu sua mão outra vez, Yuri estava pendurado nele pela própria faca.
     E eu não conseguia me mexer, nunca vi nada daquele tipo. Minha respiração ficou acelerada, eu quase fiquei sem ar, então ouvi um barulho vindo do chão, a terra em frente aos meus pés se abriu, e daquela fenda, surgiram três esqueletos, que se puseram em minha frente, em posição de combate. Eu me senti tonto. Então o monstro me acertou com sua mão e eu voei para o lado de dentro do portão, quando meu corpo chegou ao chão, senti tudo doer.
     — Precisamos de um médico! — foi a última coisa que ouvi antes de apagar totalmente.

A JornadaWhere stories live. Discover now