Capítulo 2

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Meus olhos estavam vermelhos de tanto lacrimejar. Eu aproveitava cada minuto de solidão para chorar. Estava no refeitório exclusivo dos funcionários, quando a Carla e a Josi praticamente me sequestraram, segurando uma em cada braço meu, e me arrastaram para um dos dormitórios, os quartinhos minúsculos a que a gente tinha acesso para dormir durante os intervalos dos plantões. A Karine nos encontrou no caminho.

– Pronto! Agora você não vai mais se fingir de morta! – Josi exclamou ao fechar a porta conosco dentro.

– Hmmm. – Ouvimos um gemido vindo da cama. Alguém dormia em plena hora do almoço.

– Isso é uma reunião, Gustavo. – Josi, que não tinha papas na língua, disse. – E você não foi convidado.

Ele, sonolento, sentou na cama, arrumou os cabelos castanhos, penteando-os com os dedos, e colocou os óculos de aros finos marrons.

– Que horas são? – perguntou em meio a um bocejo, com uma expressão carrancuda.

– Meio-dia – Karine respondeu com uma voz estranhamente meiga. Parecia encantada. Que estranho... Seus olhos verdes estavam fixos em algo que ela observava no Gustavo, mas que eu ignorava o que era.

Gustavo Calderas, aliás, era o cirurgião abdominal do hospital. Ele era meio esquivo e antissocial. Não que não fosse simpático, ele até que era, mas evitava se misturar muito. Nunca ia nas festas ou em qualquer evento social. Eu não sabia muito a respeito dele. Mas eu sabia que ele não usava aliança, estava na faixa dos trinta e era extremamente competente em sua profissão.

Ele colocou o jaleco branco enquanto três mulheres olhavam para ele. A Carla e a Josi, as casadas, com um olhar nada amistoso. A Karine daquele modo esquisito. Eu olhava para o chão.

– Gustavo... – a Josi já estava impaciente. Ele se atrapalhava para colocar as mangas do jaleco – Nós temos pouco tempo, quer fazer o favor de sair?

– É. – a Carla disse – Vaza, Gustavo.

Ele, contrariando as minhas expectativas, ao invés de ficar irritado, sorriu. E então se levantou e se despediu. Saiu e fechou a porta.

Sentei na cama em que ele antes dormia. A Carla e a Josi sentaram uma de cada lado. E a Karine continuava olhando para a porta, em pé, como se visse um rastro invisível do Gustavo.

– E então? – Carla chamou minha atenção, mas eu continuava observando a Karine. Ela parecia ter algo a dizer.

– Vocês viram? – Karine falou. Pelo visto, eu não me enganei. Ela tinha algo a dizer.

– Viram o quê? – eu disse, achando graça. Um sorriso mínimo se formava nos meus lábios. Um dos únicos nos últimos dias.

– O Gustavo... – Karine continuou – Vocês não viram? Caraca! Ele sem os óculos é muito gato! E o que são aqueles músculos do braço dele? Como eu não tinha visto isso antes?

– Ah... – a Carla comentou olhando para as próprias unhas – Ele corre na praia de vez em quando, no calçadão de Ipanema. Já esbarrei com ele algumas vezes. – Ela assoprou as unhas, de modo displicente.

– Então... – eu concluí, ainda achando graça – Temos dois médicos gostosos no hospital?

– É. – As três concordaram. A Karine, com um aceno de cabeça mais enfático.

– Que bom que eu sou solteira – Karine afirmou – Porque você três podem olhar, e eu posso, quem sabe, provar, não é?

– Bom... – eu baixei meus olhos e observei meus pés – Eu não me interesso por eles no momento – murmurei – Mas eu também estou solteira... Eu acho...

Como superar um amor em 3 listas (Degustação)Where stories live. Discover now