— A França faz muito voo por aqui.

— Não duvido. — Balançou a cabeça de forma positiva. — Não duvido mesmo.

Acompanharam o curso d'água e visitaram cavernas dos mais variados tipos e desenhos. Zach voltou a tirar fotos e analisar as runas e desenhos que comprovavam a vida humana na região desde os tempos imemoriais.

Se eles não estivessem em uma clara missão — Yael sim, ele só era seu acompanhante — certamente confundiria a viagem como uma visita turística. Por mais que estivesse no Chade por quase dez anos, Zach jamais teve a oportunidade de sair de N'Djamena, a capital.

O tempo para lazer era escasso. Lidar com a política, fiscalizar a extração de petróleo, sem contar os diversos setores governamentais fungando no cangote minava qualquer possibilidade de uma viagem daquelas.

Yael parecia frustrada por não encontrar uma rede de túneis interconectada. Ao encontrar algumas grutas, ela se lançava a frente, empolgada por uma descoberta, apenas para notar a presença de um lago sem saída. Pelo menos essas porções de água refrescaram seus corpos e cantis.

O calor escaldante os maltratava demais. Pegar um pouco de cor era quase impossível devido seu tom frio, contudo Yael voltaria bem morena para a civilização. O bronze rico e brilhante em sua pele alva tornaria as marcas do sutiã bem mais visíveis.

Principalmente após ela se desvencilhar da camisa térmica e ficar somente com a regata simples e colada. Já havia muito tempo que Zach removera a jaqueta de sarja — servia de turbante debaixo do boné — e só manteve a camiseta esportiva para a mochila não arranhar suas costas.

Poderia ficar só de bermuda ali. Esbanjando a pequenina barriga de cerveja, depois de anos de levantamento de copo para agradar as massas políticas de um país em chamas. Precisava voltar a academia ou fazer um exercício simples. Estava muito sedentário.

Os tênis surrados venceram mais pedregulhos e adentraram em mais uma caverna. Dessa vez, para a felicidade eterna de Yael, os adinkras lhes guiaram até um local com lâmpadas correndo por toda a entrada lúgubre, tendo seus fios descendo um grande poço.

De onde vinha a iluminação?

Acharam uma pequena rampa e desceram sem grandes cerimônias. Yael ligou a lanterna de sua arma e andou na frente. A euforia da descoberta deu lugar ao silêncio enervante a cada passo rumo a escuridão. Ansioso e temerário, o coração de Zach queria sair de seu corpo, se os inúmeros batimentos cardíacos em sua caixa toráxica fossem indícios de algo.

Talvez fosse claustrofóbico e não sabia.

— Yael, por que você não chamou sua própria equipe da Sayeret? Vocês não costumam trabalhar em conjunto? A CIA tem a equipe deles aqui, Aziz é mais diplomata que espião, mas e você? — Zach preferiu a conversa do que agonizar sob o medo.

— Se eu te contar que normalmente eu sou a cavalaria, você acreditaria?

— Não. — Zach respondeu automaticamente. — Não estamos em uma série de super-heróis ou coisa do tipo.

Zach não viu, mas Yael deu um leve risinho de canto de boca.

— Normalmente eu não contaria, afinal você é um civil. — Séria, ela parava após alguns minutos de descida para ajustar os olhos a penumbra. — Porém se você é um ativo da CIA...

— Significa que eu tenho autorização?

— Não, mas significa que você sabe guardar segredos. — Yael finalizou a descida, Zach em seu encalço. — Logo, um dia, quem sabe eu abra o bico.

A majestosa fachada da caverna saltava aos seus olhos. Na luminosidade mista, entre as arestas do local iluminadas pelo sol e a lâmpadas emanando um amarelado florescente, Zach conseguia ver as imensas colunas sustentando o peso inteiro de mais de milhares de anos de história.

As paredes grossas cheias de arcos, as escadarias esculpidas no barro... As pernas tremeram com a suntuosidade. Já Yael estava impassível. Todavia notou que ela caminhava a passos mais lentos e se mantinha a dois palmos de distância dele, sempre prestes a iniciar um tiroteio.

Estava agradável ali em baixo, bem diferente do forno maldito e infernal lá em cima. Zach aproveitou e tomou um gole de seu cantil e seguiu a irresoluta soldado pelos corredores labirínticos do lugar.

Apertados, estreitos e porosos, eles maltrataram a pele. Yael teve bastante dificuldade para passar com a arma tamanha a largura de algumas das passagens.

Sério que haveria movimentação por essas estradas tão rudimentares?

Mais adinkras foram vistos nos tetos, ao lado de gravuras e imagens que elucidavam bastante o cotidiano dos antigos povos do deserto.

Deu graças a deus quando eles deram de cara com um enorme penhasco. O abismo negro era imenso e as lanternas ultravioletas lançadas por Yael sumiram ao cair nas profundezas das trevas. Uma gentil brisa esfriou as bochechas quentes e vermelhas de um hiperventilado Zach e ele pode se concentrar no que sua parceira estava fazendo.

Ela se ajoelhou, colocou a mochila e a submetralhadora no chão e buscou uma corda de rapel. Com dois dedos, ela apontou para uma saliência que poderiam utilizar para atravessar o abismo e explorar as cavernas de areia do outro lado.

Agora não era a claustrofobia que lhe atacava. Era o medo de altura, ainda mais uma que ele nem sequer enxergava o chão.

— Sério que temos que atravessar? — O som que saía de suas cordas vocais morria a cada palavra dita. Não conseguiu nem completar uma sentença.

— Sim. — Yael estava irredutível. — Eu preferia descer, mas não tenho certeza da profundidade, então, sim, atravessaremos.

— Eu acho que não.

Uma voz computadorizada, claramente modulada, ecoou diversas vezes na caverna. Yael sacou sua arma o mais rápido que conseguiu, mas foi inútil. O vulto correu e a chutou no estômago quando ela virou em direção a voz.

Zach viu sua parceira gritar e cair no vazio profundo antes de um soco o atingir no estômago e ele cair de joelhos no chão, sem ar. Ele tentou revidar, lançou a mochila de Yael para o abismo e até se levantaria para atacar a sombra se não tivesse sido lento demais. O cano de uma pistola estava apontado para sua cabeça, a poucos centímetros de distância.

— Você lê adinkras, não é mesmo?

— Como...

— Apenas aqueles que possuem a visão etérea podem ler os adinkras. — A entidade que os atacou estava todo coberto, dos pés à cabeça, com balaclava, kevlar e calças negras, e mal dava indícios de seu gênero. — Eu sei que a Sayeret Matkal não a tem...

A única coisa reconhecível de fato era sua altura: era menor que Aziz e Winston. Na verdade, tinha mais ou menos a altura de Jacqueline Andrade, a sombra de Aziz. Não que ajudasse muito, Andrade era alta para uma mulher.

— E o que você quer comigo?

— Você vai saber já, já.

Com uma coronhada na base da nuca, Zach perdeu a consciência.

Com uma coronhada na base da nuca, Zach perdeu a consciência

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O Grande JogoWhere stories live. Discover now