O primeiro gole para São Valentim

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Jaehyun passava um ar de tranquilidade ímpar, estando com o rosto tão pleno quanto o céu daquela tarde. Mas, assim como o céu tinha poucas nuvens passeando para cá e para lá numa crescente, enquanto o sol ia baixando, a luz descendo, demonstrando que logo haveria de cair a noite, ele também tinha um nervosismo dentro de si.

Apesar de já ter tido 1 milhão de encontros ou coisa que o valha, aquele tinha algo de especial, ele sabia. O homem bonito sentado à sua frente tinha alguma coisa que o deixava mais desconcertado que o normal — não sabia se era o fato de ser incrivelmente bonito, incrivelmente engraçado, ter uma voz perfeita, se tudo junto ou se só eram as pintinhas que lhe adornavam a face e o pescoço e formavam uma constelação ainda mais bonita do que todas as que Jaehyun já havia em todos esses anos de astrônomo amador.

Mas não era só isso, havia também algo que soava como um empurrão do destino. Eles se conheciam há alguns meses, mas sempre que marcavam algum encontro, algo dava errado e eles precisavam adiar. E finalmente, depois de umas 5 tentativas frustradas, eles conseguiram se encontrar... em pleno São Valentim!

E São Valentim é um dia mais do especial para Jaehyun, pois é quase uma conjunção astral (ou pelo menos é o que ele diz quando finge saber de astrologia): dia de seu aniversário, dia que comemora o amor e, por coincidência, dia do Santo ao qual ele é devoto. E, se justo nesse dia o encontro finalmente aconteceu, com toda certeza queria dizer algo.

— Vinho? — Ofereceu, finalmente quebrando o silêncio confortável-mas-constrangedor que sustentavam desde que se sentaram na mesa.

— Claro. — Donghyuck sorriu, escondendo o rosto de leve por trás do cardápio.

Apesar de não ter essa ligação especial com São Valentim, o dia também era especial para ele. Donghyuck é do tipo ultra-romântico e Jaehyun... bom, ele lhe parece ser o homem perfeito.

Rapidamente o garçom atendeu ao chamado, não demorando muito para trazer a garrafa e encher as taças. Jaehyun pediu prontamente que a garrafa ficasse.

Pegou sua taça delicadamente, levando-a para fora da borda da mesa e, aproveitando que estavam nas mesas do lado de fora do bistrô chiquetoso, fez sua oferenda tradicional, derramando um pouco de vinho no chão enquanto sussurrava baixinho "Um gole pro Santo".

Era tão natural para ele que não costumava tomar muito de seus pensamentos, mas estando em um local público tornava o hábito devocional um pouco constrangedor dependendo da resposta alheia. Mesmo com a ansiedade dos olhares tortos que costumava receber, de todas as bebidas de Jaehyun, o primeiro gole era sempre do Santo.

E, falando em olhar torto, Donghyuck entortava a cabeça olhando para o vinho derramado. Não olhava com reprovação, mas com confusão.

— É um gole pro Santo, sabe? — Jaehyun prontamente respondeu. — Uma oferenda.

— Mas um gole só? Não é pouco?

A inocência da pergunta o deixou desconcertado. Sorriu bobo, o rosto quase tão vermelho quanto o vinho da taça.

Era comum que estranhassem a tradição, era comum até que ele levasse algum xingamento de leve porque alguns não entendiam. Não era tão comum assim uma curiosidade tão pura e ingênua.

— Não, é o suficiente. — Riu anasalado mais uma vez.

Donghyuck ainda parecia intrigado, mas tentou deixar para lá. Não queria que sua curiosidade fosse razão de algum desentendimento.

— Você se incomoda? — Insistiu Jaehyun, parte do coração doendo esperando pela resposta, e parte pronta para defender seu costume.

— Não. — Riu, ainda mais tímido, se possível. — É só... diferente. Na minha cabeça uma oferenda teria que ser uma garrafa ou coisa assim. — Deu de ombros, achando seu ponto de vista desnecessário.

Jaehyun se remexeu na cadeira, mais do que satisfeito com a resposta. O vento soprava calmo e quente, como se fosse um cutucão do Santo lhe dizendo "Eu disse que é ele".

— Pode deixar, no nosso casamento eu deixo uma garrafa inteira de champagne pra Ele. — Arriscou um flerte mais atacante.

Não era de seu feitio ser tão "agressivo" assim, mas ver Donghyuck assim tão tímido o fez ousar um pouco. O mais novo costumava não dar trégua e flertar o tempo todo e vê-lo assim tão quietinho tinha um sabor ambíguo; era fofo, mas ele também queria que o Donghyuck das mensagens com cantadas infinitas, das boas às péssimas, estivesse ali. E ele retribuiu a iniciativa.

— Nesse caso, — Também ofereceu o primeiro gole da taça ao Santo, imitando o gesto de Jaehyun. — um gole para Ele por providência.

E assim o encontro seguiu menos tenso, mais animado e com a benção de São Valentim.

Um gole pro SantoWhere stories live. Discover now