(re)encontro

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Sana me indicou uma mesa perto das janelas e me pediu para esperar um tempo significativo para que pudesse atender os clientes que chegavam no estabelecimento, me fazendo prometer que não iria sair dali ou estaria propensa a levar uma uma surra com sua bandeja - palavras da mesma. Eu ria enquanto via minha amiga trabalhando e sorrindo docemente, mesmo antes ter feito a maior das ameaças. Era incrível como Sana fazia as pessoas se sentirem em casa apenas com sua presença. Não foi atoa que nossa amizade foi um dos combustíveis que tive ao longo dos anos em que morei aqui para suportar todos os vales e montanhas escuras que me assolaram. Não apenas ela, mas... este lugar.

Esta cafeteria ocupou um lugar aconchegante em meu coração. Eu a amo, não apenas por ser o lugar onde sei que encontrarei a minha pessoa favorita no mundo. Mas também porque a dona daquele estabelecimento foi a rocha que me segurou e sustentou quando achei que não podia aguentar mais.

Betty sempre será meu sinônimo de amor. Sempre.

E voltar aqui e perceber que sua existência já deixou este mundo, é uma ferida que ainda faz meu peito querer se partir ao meio. Ainda consigo sentir suas mãos enrugadas apertando as minhas, seus beijos em minha cabeça. Ainda vejo ela trazendo uma xícara de chá para mim enquanto eu chorava em seu colo, tentando entender porquê minha mãe me fazia estilhaçar em mil pedaços.

Noona, ela me olha com desprezo. Hoje ela disse que preferia ter Sunmy como filha do que eu. Ela nunca me quis. - eu soluçava, soluçava tanto que meu corpo tremia e Betty teve de me segurar para que eu não desabasse em seus braços.

Ela apenas me abraçou, até que disse em seguida :

– Você é a menina mais doce e incrível que conheço, Hari. Pode não ter saído de mim, mas meu coração de mãe sempre foi seu, minha filha

Meu coração sempre saltava quando eu a ouvia me chamar daquela forma. Filha.

– O tempo passa, mas você continua a mesma sonhadora de sempre. - a voz de Sana me acorda do pequeno devaneio devido a lembrança que tive. - Estava lembrando dela, não é?

– Eu sou tão fácil assim de ler? - pergunto, pegando o café quente que ela me trouxe e o assoprando.

– Você estava olhando para a mesa que ela ficava quando estava aqui. Depois que assumi o café, ela sempre quis ficar por perto para ver se eu não quebraria a máquina de Frapuccino de novo. - Sana ri, mas vejo um brilho nostálgico em seus olhos. - Também sinto falta dela, Hari.

– Ela era sua mãe, Sa. Sei que sente.

– Ela não era apenas minha mãe, ela agia e me amava como minha mãe. Assim como fazia com você. - Sana diz.

Gotículas de água colidem no vidro da janela e eu vejo a chuva começar, deixando o material transparente embaçado. Com o dedo, faço um coração com minha inicial.

Sana faz o mesmo, porém, seu coração tem a letra S. Sorrimos uma para a outra  porém, segundos depois, seu sorriso morre ao olhar para trás e meu primeiro instinto é olhar também. Entretanto, me arrependo no mesmo minuto quando vejo quem cruza a porta.

Ele ainda não tem noção do efeito que causa em mim - no meu corpo, nas minhas veias. Nas minhas emoções.

Ele ainda tem o rosto do menino de quinze anos audacioso que me chamou da janela do meu quarto para olhar as estrelas consigo. O mesmo menino que me levou à uma ponte dos desejos e me pediu para desejar que ficássemos juntos para sempre. O mesmo menino que me dedicou um exemplar de Dorian Grey, que me escreveu poemas e textos. O garoto, que agora já não tem mais quinze anos - e eu, certamente também não - que me olhou por inteiro, que me fez sentir o sentimento de mais profunda completude.

 folclore (V) Where stories live. Discover now