CENA IV

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(Acampamento francês. Uma tenda. Entram, com tambores e bandeiras, Cordélia, um fidalgo – médico e soldados.)

Cordélia: Ai, é ele! Foi encontrado agora mesmo, louco como um mar de tempestade. Cantava alto, coroado de fétidas ramagens, urtigas, folhas secas, agrião, cicuta, joio, campainhas e todas as ervas daninhas em nosso trigo de sustento. Mandem uma centúria procurá-lo nos campos cobertos de espigas. Procurem palmo a palmo, em todos os sentidos; eu o quero diante de meus olhos. (Sai um oficial.) Que pode o conhecimento humano para restaurar a razão que ele perdeu? Quem o curar pode ficar com tudo que possuo.

Médico: Há recursos, senhora. A cura natural é o repouso, que há tanto ele não tem. Para acalmá-lo existem ervas medicinais cuja eficácia fechará o olhar da sua angústia.

Cordélia: Que todos os benditos segredos e todas as misteriosas virtudes da terra germinem com minhas lágrimas para socorrer e remediar a desgraça desse homem de bem. Procurem, procurem por ele, antes que seu furor descontrolado destrua essa vida que a razão já não governa. (Entra um mensageiro.)

Mensageiro: Notícias, senhora. As forças britânicas marcham nesta direção.

Cordélia: Já se sabia. E estamos preparados para enfrentá-las. Querido pai, é por teu interesse que eu luto. Por isso o grande Rei da França se apiedou de meu pranto, de minhas lágrimas insistentes. Não é a ambição incontida que impele as nossas armas, mas o amor, o terno amor, e o direito do meu pai envelhecido. Em breve possa eu ouvi-lo e vê-lo! (Saem.)

Rei Lear (1606)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora