Capítulo V - Dominada

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Por: Nicolie

Algumas  vezes você sabe quando está ou não sonhando, eu sabia que estava, por que somente em sonhos estive nesse lugar, meu refúgio do consciente, onde não existia problemas com o qual me importar. Era para lá que eu ia quando meus pais discutiam, quando meu pai ignorava os remédios. Era cansativo, não só para ele mas para mim, minha mãe e minha irmã Yasmim, que sempre estava por perto, assistindo a discussão com espanto e tristeza, mesmo com apenas 6 anos ela entendia o motivo daqueles gritos, e todas as vezes eu a afastava da tristeza exposta em seu olhar.

            No seu quarto a música no fundo tentava afastar o barulho vindo do andar de baixo. Contava-lhe uma historia até que se acalmasse e caísse no sono, depois eu ia direto para o meu quarto sendo obrigada a passar pelo corredor onde os gritos pareciam estar entranhados nas paredes, quando chegava ligava meu mp4, deixava o fone de ouvido quase no máximo e quando saia do meu mundo consciente problemático entrava no meu refúgio. Lá sempre era ensolarado, aquele sol que quando bate uma brisa fria te faz querer ficar ali por um bom tempo. Lá em direção à colina, meus pés descalços tocavam o gramado, me fazendo querer rir e essa vontade aumentava quanto mais eu subia, o estranho foi que mesmo sentada meus pés ainda formigavam tentei me distrair ouvindo os pássaros dentro da floresta, de princípio consegui, mas foi sendo substituído por um bip baixo, praticamente inaudível, mas o bip foi aumentando cada vez mais tornando-se completamente irritante. Esse som que ecoava em minha mente me desconcentrava fazendo com que os pássaros, as árvores, o gramado, tudo desaparecesse, as únicas coisas que permaneceram foram a formigação nos meus pés, o bip e a escuridão em minha mente que, diferente de um quarto, não havia quatro paredes. Estava presa em minha própria cabeça.


            - Me dê a gase. – Era uma voz masculina, rouca, como se o homem não tivesse dormido. - Pinça.- Barulhos de objetos metálicos acompanhavam o bip.– Seringa. – Um beliscão fez com que a formigação sumisse, agora não sentia nada, nada mesmo, nem meu pé. - Coloque a linha na agulha, por favor. – Disse o homem.

Agora podia ouvir uma voz feminina, abafada, como se algo estivesse em

sua boca.

             - Assim está bom?- Ela perguntou.


            - Um pouco maior.

     A essa altura já havia se passado mil e uma alternativas de onde eu estava. Bom, tinha certeza que não estava morta, a não ser que estivesse fazendo um autopsia apenas no meu pé. Não estava morta, mas estava em um hospital, podia perceber pelo ar. Seria difícil não sentir o cheiro de amônia. Você passa a conhecer muito bem quando se tem um pai doente com a horrível mania de visitar hospitais. Ele não ia visitar ninguém, mas era o visitado.

     Hospitais. Odiava e ainda odeio este lugar, a maioria dos acidentados que vinham, não acabavam muito bem, muitas vezes nem saiam.

            O desespero me bateu ao pensar que eu poderia ser um desses acidentados, podia sentir meu coração acelerado.

             - Está tendo alteração no batimento cardíaco. – Disse a enfermeira.

           - Pegue o sedativo. – ordenou o médico.

 

            Já basta não conseguir me mexer voluntariamente, agora vão tirar meus movimentos involuntários também?!

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