Hannah não havia lhe feito promessas. Não a havia seduzido explicitamente. Não havia fingido uma vanguarda que só existia na ilusão de Florence. Até aquele momento, Hannah não lhe dera nenhum sinal claro de que podia se apaixonar por uma mulher. A garota parecia uma cópia de Fannie, extremamente confortável no papel designado a ela pela sociedade e pela família.

Mas havia algo implícito no olhar de Hannah, em seus ataques, que pareciam carregar charadas. No fim, ela não era como Fannie. Era diferente. Talvez até fosse como a própria Florence. Hannah tinha um mistério que sacolejava a estudiosa de um modo que ela detestava. Ao ponto de que ela terminasse todos os dias do mesmo modo.

Entrava naquele aposento cuspindo fogo. Sentindo uma vontade incontrolável de juntar todas as suas coisas e deixar tudo para trás. Deixar Hannah e sua ingratidão para trás. Enfiar-se em um trem ou em um navio em busca de uma nova aventura.

Mas a lembrança das palavras de Hannah a detinha. Era como se, mesmo tendo o mundo inteiro como opção, a maior aventura estivesse naquele quarto. A maior aventura fosse convencer a caçula dos de Ghynne a não aceitar ser um objeto que William utilizava para proteger seus segredos.

— Seis dias, sua mimadinha! — Falou Florence em frente ao espelho. — Seis dias mais para que eu me livre do martírio que é passar horas com você. Em seis dias você finalmente estará fora da minha vida para sempre, Hannah de Ghynne.

Os olhos se fecharam involuntariamente e Florence tragou uma dose de amargura. A única coisa que lamentava era se despedir de Hannah antes de experimentar o sabor daqueles lábios tão requintados quanto selvagens.

***
Naquela noite Hannah não conseguiu dormir facilmente. A consciência sobre a finitude do tempo que lhe restava com Florence a desassossegou de uma maneira inesperada. Por mais inflexível que parecesse defendendo o fato de que um destino como o de sua mãe era inevitável, havia mais vida naqueles dias do que em toda a monótona rotina que repetia diariamente nos últimos anos.

— Seis dias, sua presunçosa! Restam seis dias para que eu te prove que sou capaz de despertar sua paixão. Ainda que meu nome seja Hannah de Ghynne.

O sono demorou tanto a vir, que a irmã do conde sequer despertou com as batidas de Clair na porta anunciando-lhe o café da manhã. Desde o início daquele isolamento, a governanta batia à porta e deixava a bandeja com a refeição sobre uma mesinha móvel que ficava ao lado da entrada de seu quarto.

Ela se retirava e Hannah a pegava. O brunch era servido poucas horas depois e normalmente, Florence chegava entre a segunda refeição e o almoço. Na manhã anterior, a irmã de Fannie havia chegado junto com o brunch, a pedido de Hannah.

Passavam boa parte do dia juntas e Florence evitava de conviver muito com os criados e lady Louisa pelo presumido medo da peste. Por mais que fosse sabido que uma pessoa não podia se contaminar com ela mais de uma vez, não se sabia muito sobre a possibilidade de contágio. E, entre a família e os criados daquela casa, ninguém havia tido a peste, exceto Florence.

Contudo, todas as tardes, durante o chá das cinco, a visitante fazia um reporte à matriarca , que se interessava muito em saber sobre o estado de Hannah.

A não apresentação de Florence à lady Louisa na tarde anterior a alarmou e foi o diálogo frente à porta do quarto que despertou Hannah. Aproximou-se do limiar de madeira e colou seu ouvido ali para ouvir o que conversavam.

— Por que você não foi me ver ontem à tarde, Florence? Aconteceu algo entre você e Hannah? — A hostilidade entre as duas não era um segredo para Louisa.

— Não, de maneira nenhuma. — Florence negou. — Eu só fiquei cansada e não consegui me reportar à senhora, mil perdões.

— Então, Hannah está bem?

Marcadas por um Segredo [ROMANCE LÉSBICO] - DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now