chapter one

229 26 69
                                    

Querido Diário,

São exatamente 8:30 da manhã de um sábado gelado, e eu realmente queria ficar embaixo das cobertas, mas graças as vozes e pensamentos que rondam a minha cabeça, eu preciso levantar e tomar meus remédios.

Não é fácil manter os horários e os remédios em ordem, mas se eu não fizer isso, sinto que posso acabar enlouquecendo, e essa parte é muito mais real do que pensam.

Eu tenho esquizofrenia desde os dez anos de idade. Sim, eu era só uma criança quando fui diagnosticado, e desde então, minha vida virou de cabeça para baixo. Meus pais ficaram mais protetores, minha irmã não me largava e meus amigos não me deixavam andar sozinho pela escola.

Hoje as vozes estão mais calmas, nenhuma gritaria, choro ou briga, só diálogos esquisitos, os quais não consigo entender, por causa do efeito da pílula. Mas tem uma única voz, aquela voz, a voz dele.

Louis.

Meu Louis, o meu melhor amigo desde o começo dessa luta. Eu sei algumas coisas sobre ele, mas acho que a maioria é coisa da minha imaginação, já que um dos sintomas, é alucinação. Não sei se ele é real, ou apenas mais um dos personagens que vivem na minha cabeça.

A gente é amigo desde os quinze anos. E podemos dizer que, a uns cinco anos atrás, eu percebi minha paixão por ele. Chega a ser cômico, um alucinado estar apaixonado por um ser imaginário. Eu sei, é piada né? Mas o que eu posso fazer? O problema está no meu cérebro, não no coração.

As vezes me pego pensando, será que ele gosta de mim também? Mesmo sendo uma voz qualquer, sinto que estamos mais perto do que esperamos.

Hoje eu fui trabalhar na biblioteca, como todos os outros dias. Foi o único trabalho que me aceitou, por causa da doença que carrego

Eu sou apaixonado por livros, pelas histórias deles e principalmente pelo jeito que me envolvo com os personagens. As vezes até esqueço que vozes rondam minha cabeça, por isso passo meu dia inteiro lendo.

Depois do meu turno, eu vou ao hospital. Tenho consultas com o Doutor Liam, desde que fui diagnosticado. Ele me ajuda a entender e acalmar as vozes.

Comentamos sobre elas, os remédios, e se estão melhoram em algo, infelizmente não. Mas já estou acostumado com isso, não acho que um dia eu vou ser curado, nem sei se existe cura pra isso.

X

Crise. Vozes. Gritos. Choros. É isso que está acontecendo. Não comigo, com as vozes. Mas ao mesmo tempo que elas sofrem, eu sofro. Mil vezes mais forte. Só queria dormir e não acordar mais.

"Você é horrível"
"Você vai morrer"
"Porque você insiste em buscar ajuda?"
"Porque você insiste em ficar vivo?"

Essas são as coisas que escuto diariamente. Já estou acostumado.

Niall chegou vinte minutos depois das mensagens. Ele sabe como me acalmar, como fazer elas pararem.

X

Dois dias se passaram desde aquilo. Não gosto de voltar ao assunto. Não é algo que me agrade.

Estou a caminho a biblioteca, hoje eu trabalho mais do que o normal. Não é algo que eu goste, mas é algo que me ajuda.

Passo a tarde inteira lá, vendendo e arrumando livros. Limpando e guardando. Na hora do almoço, eu comi um bolinho de leite ninho e suco de laranja. Voltei para casa, tomei banho, fiz minha janta e resolvi conversar com Louis.

Não é um processo fácil, falar com um ser inexistente. Mas por incrível que pareça, ele é a única voz que consigo me conectar, que consigo sentir ao meu lado, mesmo sendo apenas uma voz.

Já me perguntei inúmeras vezes se ele existe no mundo real, ou se ele é apenas uma voz sabe? Porque, se ele existir, eu posso encontrar ele, posso ficar com ele, na verdade não, não sei se ele gosta de mim, ou se ele tem namorada ou namorado.

Fiquei trinta minutos tentando "entrar em contato" e quando estava prestes a desistir, eu escutei. Escutei ele.

"Hazz?" Harry o que aconteceu? Você quase nunca me chama, e quando chama é pra te ajudar, não que eu esteja reclamando, eu gosto de te ajudar, não sei como eu te ajudo, eu sou apenas uma voz, meu deus Harry, eu sou uma voz"

"Hey Lou. Eu to bem, só queria falar com você, por mais que isso seja estranho né? Não sei, você me acalma e eu preciso disso"

"Oh Hazz, não tem problema, você também me acalma, mesmo não conhecendo você. Quer conversar sobre algo?"

"Sim, na verdade, queria falar algo mas não sei como, e talvez isso piore nossa comunicação, você tá comigo a tantos anos e quando recebi a notícia que o tratamento não tava ajudando, eu meio que entrei em desespero, não quero perder você sabe?"

"Harry, eu sou uma voz. Eu gosto muito de você, até temos esse rolo de "namorados" que até agora não entendi muito bem, mas gosto disso, gosto de saber que estamos juntos, mesmo achando impossível"

"Lou.. eu queria que você fosse real, queria poder te abraçar, te beijar, sentir seu cheiro sabe? As vezes sinto que você está próximo, mas ao mesmo tempo sinto que é algo da minha cabeça. Entende?"

"Lou? Louis você tá aí?"

Silêncio. Foi isso que recebi por dez minutos. Depois disso foi só crise.

Crise. Choro. Gritos. Pedidos de ajuda. Várias vozes ao mesmo tempo. Já estava acostumado, mas não com a voz de hoje. Aquela voz. Aquele choro. Me causou arrepio, e é por isso, que to sentado no chão do corredor, chorando.

Louis foi embora. Foi embora da minha cabeça.

Imaginations of the heart. {l.s}Nơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ