55. Você Confirma?

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Agora eu é que tô com um pressentimento. Tomara que dessa vez eu esteja errada.

Foi quando Suzy veio correndo em minha direção e, no momento que eu iria perguntar a ela sobre o que era a tal conversa, seu Agenor me chamou.

— Você não está sozinha, viu? Lembre-se disso! — disse Suzy para mim enquanto eu me dirigia à sala da gerência.

Chegando lá, Laura parecia estar chorando, com as mãos no rosto do mesmo jeito que fez na festa da empresa. Sentando-se na cadeira de Ulisses, Agenor perguntou:

— Flor de Lis... Você é a funcionária mais recente, certo?

— Certo.

— A que foi contemplada com uma bolsa para o curso de barista, confere?

— Sim, senhor! Inclusive, eu quero muito agradecer, porque eu não tinha condição de fazer um curso desse e agora tenho muito mais oportunidade de me realizar tanto pessoal como profissionalmente.

— Em algum momento, Ulisses falou de abrir uma franquia pra você?

— Como é que é a história? E ele por acaso é dono pra abrir franquia?

— Em algum momento, alguém da Comissão lhe deu a entender que iria abrir uma franquia pra você?

— De jeito nenhum! Por quê?

— Em algum momento, você deu a entender que abriria sua própria cafeteria para os seus colegas de trabalho? — continuou Agenor.

— Um dia eu realmente quero abrir minha cafeteria, mas meus colegas de trabalho não têm nada a ver com isso.

— Viu só, seu Agenor? — falou Laura, apontando para mim. — Diga agora na minha cara que você não falou pra mim que abriria sua própria cafeteria!

— Nós temos algumas testemunhas confirmando isso — disse Agenor.

— Sim, seu Agenor... Um dia eu pretendo fazer isso, não agora.

— No caso, uma franquia da SB Koffee?

— O senhor cismou com essa da franquia da SB Koffee. Me diga por quê!

— Porque pelo que eu entendo, se você não está dizendo a seus colegas que vai abrir uma franquia nossa, então, na verdade, está dizendo que vai abrir uma concorrência, certo?

— Não é uma coisa que eu vá fazer na semana que vem, até porque eu não tenho dinheiro pra isso. Mas eu tenho o sonho de um dia abrir meu próprio negócio e não vi isso como concorrência, não — respondi.

— Então você confirma?

— Como plano futuro, sim.

— Você também confirma que se ausenta com frequência do seu posto de trabalho?

— Só me ausentei algumas vezes porque eu tenho uma filha e, como eu sou separada, eu mesma tenho que resolver as urgências.

— Viu, seu Agenor! Mais uma vez ela mesma acabou de confirmar.

Deus! Me segure, meu pai. Venha cá, acalme meu coração ou eu parto essa tua criatura no meio.

— Você também confirma que tudo isso foi feito em cumplicidade com seu até então gerente, Ulisses?

— Como assim até então?

— Você confirma que isso tudo foi feito em cumplicidade com o Ulisses? — repetiu Agenor.

— Me responda! O que foi que aconteceu com ele? — insisti.

— O caso de Ulisses, por ora, vai ter que ser mantido sob sigilo. Mas você confirma que tudo o que foi citado anteriormente foi feito em cumplicidade com ele?

— Não confirmo nada disso, não. Eu me responsabilizo por tudo o que eu faço. — Encarei Laura. — Diferente de certas pessoas!

— De acordo com algumas testemunhas, ele não só estava a par, como também agiu em parceria com você. Você também confirma que se envolveu sexualmente com um de nossos clientes?

— Eu tava saindo com um cara que frequentava a cafeteria, mas eu nunca trepei com ele nas mesas, não, meu senhor!

— Viu só, seu Agenor? Ela acabou de confirmar mais uma vez.

Deus! Eu tô pedindo... Tô implorando...

— Flor de Lis, infelizmente, é com grande pesar que eu, em nome da Comissão da SB Koffee, declaro você desligada por justa causa da SB Koffee e a sua matrícula no curso de barista está cancelada.

Senti todo o meu corpo tremer e estava começando a ficar muito angustiada, até perceber a comemoração de Laura, que deixou seu Agenor confuso e, antes que ele perguntasse qualquer coisa, quase fiz um buraco na parede com o soco que eu dei no rosto de Laura, que depois de bater com a cabeça na parede, cuspiu um dente.

— Que sandice é essa?! — questionou Agenor, levantando da cadeira de Ulisses.

Enfiei o dedo na cara dela e berrei a plenos pulmões:

— Eu vou foder tu e essa empresa! Sua racista, xenofóbica, homofóbica, caluniadora, mentirosa e difamadora! Eu vou te foder nos tribunais!

— Do que você está falando, Flor de Lis? — insistiu Agenor, com as sobrancelhas erguidas.

— A gente se vê nos tribunais e tu vai cagar cada centavo da indenização que eu vou receber pela humilhação que essa mulher fez não só a mim, como muita gente passar nessa empresa!

Saí pisando duro da sala da gerência e, quando cheguei no salão, os funcionários e os clientes olhavam para mim estupefatos. Suzy correu na minha direção, com os olhos arregalados, eu devia estar assustadora.

— Lis? O que aconteceu?

— Vocês aqui que se calaram diante de todos os abusos cometidos por pessoas como essa mulher! — gritei, apontando para Laura. — São coniventes de crimes que acontecem diariamente bem debaixo do seu nariz! Vocês não têm ideia quantos pretos, mulheres, gays, trans, nordestinos, orientais, indígenas, deficientes, religiões afro, moradores de comunidades carentes e qualquer outra pessoa que está às margens da sociedade sofrem! Somos vítimas de agressão verbal, espancamento e até morte, diariamente! Vocês e qualquer outra pessoa que se cala diante disso são coniventes! Racismo é crime! Transfobia é crime! Homofobia é crime! Xenofobia é crime! Se qualquer um de vocês se calar por achar que é frescura, saiba que o seu pensamento de merda está colocando em risco a vida de outras pessoas. Eu! Flor de Lis Silva, nasci pra brigar e dessa vez a briga vai ser nos tribunais!

Dito isso, sacudi a poeira dos meus saltos e saí da SB Koffee com sangue nos olhos.

Fé, Lis! Um Romance Quase ClichêOnde as histórias ganham vida. Descobre agora