Prólogo

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 Olá, amadas. Como falei antes, esse romance é a continuação do livro "À espera de um adeus". Quem o leu entende bem a necessidade de "Desfiados a Amar". Se você já conhece o casal Samantha e Douglas Cadore você irá devorar as próximas páginas; tenho certeza, rsrsr. E se não conhece ainda, se apaixonará da mesma forma. Conheça mais um pouco do nosso trabalho vsitando nossas redes sociais. É só digitar o nome do livro "À espera de um adeus" ou Jorgeana Jorge no Google que dará certo. Bjuu e boa leitura!

              “A melhor maneira de realizar seus sonhos é acordar.” Paul Valéry

“Tenho, porém, contra ti que deixaste o primeiro amor. Lembra-te e onde caíste! Arrepende-te, e pratica as primeiras obras.” (Ap 2,4-5a)

                                                                                  Outono 2013, Guarapuava - PR.

                                             

Nunca havia me perturbado tanto com um sonho como aconteceu com o daquela noite. Mesmo mergulhada em tantos afazeres, as imagens eram rebobinadas involuntariamente. Simplesmente não conseguia pensar em outra coisa. Flashbacks em câmera lenta. Esse estado de letargia me dominou pelos diasque se seguiram. O relógio continuava a correr célere como sempre, mas tinha a sensação de estar em suspenso o tempo todo. Meu mutismo incomum foi percebido até mesmo pelos menos achegados.

Estava difícil me concentrar no trabalho ou nas conversas mais triviais. Perdi a conta das desculpas que dei na tentativa de me despistar sem parecer uma lunática. De uma maneira inexplicável, minha  mente continuava cativa. Lutei, em vão. Permaneci vagando perdida em algum lugar naquele mundo imaginário.

Eu seria mesmo essa personagem tão desentoada na sinfonia do meu lar? Teria realmente condições de reverter o quadro caótico em que se encontrava o meu casamento? Haveria chances para reconquistar meu esposo? Essas perguntas me acompanhavam dia e noite. Pena que o gabarito com as respostas corretas não vinha anexado.

O que mais me doía era ter chegado à dura constatação que tinha me tornado alguém tão insípida e distante dos princípios que haviam sido tão amorosamente semeados durante toda a minha vida.

Ponderei sobre a possibilidade de conversar com a Tânia acerca do ocorrido. Só não sabia ainda como iniciar a conversa. Montei campana na sala dos professores e sempre chegava alguém. Resolvi ir à reunião de oração. Tinha certeza que a encontraria lá. A presença de minha mãe e de Cristine seria um inconveniente, neste caso. Daria um jeito de se sair sem despertar suspeitas.

Sente-me no lugar que era costumeiro e logo avistei Tânia junto ao pessoal do louvor. Apenas acenei quando ela me abriu um sorriso de franca admiração pela minha presença ali. Baixei a cabeça tentando iniciar uma oração particular. Também queria evitar encarar os olhares curiosos. A turma da santa inquisição deveria estar deliberando sobre qual deveria ser a minha sentença depois de tanta ausência e omissão na obra que o meu pai ajudou a consolidar.

O véu da vergonha estava sobre mim. Sentia-o queimar meus ombros, mas foi minha  face que enrubesceu externando meu sincero pesar interior. Ponderei se deveria me levantar e ir embora. Minhas pernas pesaram e continuei no mesmo lugar. Sempre perdia o controle delas quando mais precisava. Ao final, agradeci pelo amortecimento dos meus músculos. Eles me preveniram de um vexame que seria muito maior. Não podia ser tão covarde assim. Respirei fundo e abri os olhos quando o som dos louvores tomou conta do templo. Como uma brisa suave, aquele som me invadiu e tive uma tênue sensação de levitação. Meu espírito foi atraído ao altar do Senhor. Foi bom recordar o prazer de estar no Seu santo átrio outra vez.  Senti meu coração se aquietar e então me permiti largar o fardo pesado por uns instantes. O tempo passou rápido. As possíveis introduções que ensaiei para a conversa com a Tânia me pareceram vexatórias demais. Desisti de seguir nesse caminho. Decidi que resolveria esse dilema, sozinha.

                                                                    …

 A fita da agastada rotina voltou a rodar. Não conseguia olhar para Douglas sem sentir o peso do meu fracasso como esposa. Minha inércia diante de meu maior dilema me constrangeu. Um nó se instalou na minha garganta, sufocando-me. Parecia que estava cheia de espinhos. Senti-me péssima. E esse sentimento era uma constante. Nossa vida estava completamente distante de tudo que eu havia sonhado.

Meus olhos vagaram confusos e tristes. Tentei me encontrar em algum cômodo daquela imensa casa. Todos aqueles móveis foram projetados com tanta expectativa e empenho. Lembrei-me das horas debruçadas sobre revistas e sites de decoração escolhendo cada detalhe, cada estampa, cada combinação. Queria que ao final tudo ficasse de bom gosto e aconchegante. E consegui. Superei-me em todos os quesitos. Menos um.

Eu, Samantha Braatz Cadore, tinha uma belíssima casa, mas não um lar. Não conseguia me achar em lugar algum. Não tinha a mínima ideia aonde havia me perdido. Aquela constatação me rachou ao meio.

Os dias se passavam insossos e o aborrecimento de Douglas se revelava tão claro quanto o meu. Continuamos seguindo naquela rota desgovernada. Para nós, dar a volta parecia uma tarefa dispendiosa demais.

Depois de avaliar bem os fatos que me foram expostos de um modo tão peculiar é que percebi que havia deixado de viver a muitos anos atrás. E o pior é que tinha levado minha família junto ao abismo comigo. Um suspiro longo escapou dos meus lábios. Larguei-me sobre o sofá da sala. Agarrei uma pequena almofada e fitei o teto. Minha vista ficou temporariamente nebulosa. O verde dos meus olhos já não apresentava aquele brilho tão vivo e que ele tanto gostava. Senti-me cansada como em todas as manhãs, tardes e noites que me recordava.

Desejei era ter continuado no êxtase daquela noite.

- Por que não permaneci dormindo por todos aqueles dias? – as palavras me escapuliram e ouvi a minha própria voz reverberar pelo amplo cômodo.

 Fechei os olhos e não precisei me esforçar muito para que as cenas retornassem a minha mente. Um sorriso quase imperceptível fez curvar o meu lábio. Não me importava se o script seguido a partir dali fosse exatamente o proposto naquele sonho bom. Pelo menos podia contar com a certeza de um final feliz. Só que a vida real nem sempre era tão generosa. Infelizmente.

Abri os olhos, sobressaltada. As batidas do meu coração tamborilavam em meus ouvidos. Preciso pensar em alguma coisa. E, acima de tudo, fazer alguma coisa! Mudar. Mudar a rota, o script, os diálogos, o figurino. Tudo. Não podia continuar dentro daquele dramalhão fracassado.  E essa foi minha meta.

                                                               ...

 Por pouquíssimo tempo tive êxito em meus planos. Quando menos imaginei, já havia caído no ciclo insano mais uma vez. Entre o querer e o executar existe uma ponte que precisa ser atravessada. E para alguns, ela pode ser penosa demais. Principalmente, porque precisamos  enfrentar nossos medos se queremos de fato chegar ao outro lado. Ao que tudo parecia, eu ainda não estava preparada, pois parei pouco depois dos primeiros passos.

Só que a partir dali não haveria mais um despertador no roteiro. Eu estava prestes a viver os piores e mais desafiadores capítulos da crônica de minha vida. E dessa vez, eu estava bem acordada.

Desafiados a AmarWhere stories live. Discover now