Capítulo I

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Giánnis observou os portões à sua frente, com o sobrolho franzido, num jeito seu de quem avalia algo que não corresponde às suas expectativas.

Sempre tinha ouvido falar do castelo da capital e, agora que estava em frente dos portões, sentia-se desiludido. Imaginara que, ao virar aquela esquina, iria ver um enorme palácio, mas afinal era apenas um muro e uns portões, iguais aos de qualquer castelo da província.

Aproximou-se, chegando perto dos guardas que protegiam os portões fechados, que deviam dar para a alameda que desembocaria, como acontecia na grande maioria dos castelos antigos, no pátio em frente ao próprio edifício, do qual nada se via.

O caçador de recompensas aproximou-se de um dos guardas e, tirando da bolsa que levava a tiracolo um envelope aberto, mostrou-lho.

O homem, vendo a carta lacrada com o selo real, fez sinal ao outro que retirando do cinto uma chave de ferro enorme, abriu o pesadíssimo portão e fez sinal para que o visitante entrasse.

A alameda que levava até ao próprio edifício era muito comprida, com uma calçada de pedra irregular, mas melhor que o chão de terra batida da cidade. Era ladeada por um muro baixinho, que apenas evitava que uma carruagem que passasse por lá fosse para a pequena tapada que rodeava a residência real e onde o Imperador realizava as suas caçadas quando não queria sair da capital.

Quando o caçador de recompensas chegou ao final da subida que constituia a maior parte daquela avenida, pôde ver melhor o palácio. Era uma estrutura antiquada, de pedra clara, com algumas torres aqui e ali e vários estandartes a colorirem as paredes. Era bonito, à sua maneira, mas Giánnis já tinha visto alguns bem melhores.

Aliás, era essa também uma das razões para o Imperador não ter conseguido reunir uma corte como a de outros países, já que não tinha fundos para poder proporcionar o conforto que os cortesãos queriam ou para oferecer todos os divertimentos que eles esperavam. Foram pouquíssimos os que aceitaram o convite dele, já que os mais poderosos estariam bem melhor nas suas próprias propriedades.

Havia até alguns nobres ricos quase mais poderosos que o próprio monarca, como o duque de Veneia, um dos grandes do reino, que alguns diziam que planeava invadir a capital e proclamar-se ele próprio imperador.

O homem avançou pela longa rua, até chegar ao castelo, e, vendo que as imponentes e escuras portas estavam fechadas, agarrou no puxador com a efígie de um leão e bateu com ele na madeira, produzindo um som de grande intensidade.

Lá de dentro, ouviram-se alguns passos e vozes, talvez dos guardas que guardavam o interior, e a porta abriu-se, deixando entrever a escuridão que reinava lá dentro, contrariada apenas pela luz fraca e bruxuleante das tochas.

O nortenho entrou e, depois de mostrar a carta lacrada aos homens lá dentro, como fizera aos que guardavam o portão, foi acompanhado por eles até uma antecâmara da sala de audiências, ou seja, da sala do trono.

Como não havia ali muito que fazer, enquanto esperava pela sua audiência, olhou em volta, observando a sala em que se encontrava.

As paredes eram também de pedra, aplanada cuidadosamente há alguns séculos para que não se sentisse qualquer rugosidade, e a pouca luz entrava pelas estreitas frestas que serviam de janelas, estando o resto da sala iluminado pelo candeeiro de metal preto cheio de velas. As paredes ostentavam umas tapeçarias que contavam e mostravam aos seus admiradores alguma história perdida no tempo, que podia ser identificada pela legenda numa língua antiga que poucos sabiam falar e ainda menos sabiam ler.

Eram três e deviam contar todas a mesma história, já que as cores eram sempre as mesmas, tal como as personagens: uma mulher loira, vestida em tons de negro azulado, e um homem com uma coroa, que devia ser o rei ou imperador da altura.

Quando se aproximava para ver mais de perto as obras de arte, a porta abriu-se e um homenzinho de pequena estatura e vestido a rigor, com um livro debaixo do braço, saiu da sala do trono, soltando uma exclamação de impaciência e resmungando qualquer coisa para ele próprio.

Esperando ser o próximo a entrar, Giánnis decidiu regressar para mais perto da porta, mas enganou-se, porque o criado que foi falar com ele, em vez de lhe dar autorização para entrar, comunicou-lhe:

-Sua Majestade, o Imperador, encontra-se indisposto para vos receber numa audiência, por isso, oferece-vos um quarto onde podereis descansar da vossa longa jornada e, se a indisposição de Sua Majestade durar mais, passar a noite.

O caçador de recompensas ficou desanimado, queria despachar aquilo o mais depressa possível, mas concordou com a cabeça e perguntou:

-Podeis mostrar-me o aposento que me ofereceis?

O outro homem olhou o questionador de cima a baixo e mexeu a cabeça afetadamente, em concordância, mas com um ar enjoado que revelava, propositadamente, que não queria fazer aquilo.

Passou para a frente do seu interlocutor, não se dignando sequer a olhar para ele, continuando com aquele ar e aquela afetação que lhe pareciam ser tão características.

Conduziu o nortenho por uma infinidade de corredores, de salas, de salões, de escadas e de passagens, guiando-o por um caminho que ninguém poderia decorar à primeira, até chegar a um corredor com as paredes também de pedra decoradas com frescos que já quase não se viam e várias portas de madeira sobressaindo entre elas.

O cortesão abriu a porta e afastou-se, deixando que Giánnis entrasse e, assim que ele o fez, afastou-se a passos rápidos.

Fechando a porta atrás de si, Giánnis observou rapidamente o quarto e estendeu-se na cama desconfortável que lhe tinha sido cedida pelo tempo que ali passasse há espera da audiência e, embora fosse de manhã, ele estava tão cansado que rapidamente cedeu ao sono.

A Dama dos CorvosWhere stories live. Discover now