Capítulo 28

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 A parte boa do meu emprego era a previsibilidade dos meus afazeres, que por vezes eu ficava desmotivado. Criar roteirização, agendas, contratos e planilhas viviam a estar na minha conta porque eu era muito bom nisso. Se as pessoas soubessem que era mais fácil do que imaginavam eu não teria meu emprego. Mas ao olhar para o lado e ver Patrick criando os seus desenhos, se é que posso chamar assim, pois pareciam uma obra de arte de tão perfeito.

Sua tela era uma bagunça completa para mim, minha alma organizadora queria muito limpar todas aquelas abas abertas em cima do que ele criava, mas parecia estar dando extremamente certo.

- Como você entrou para a área de design ? É algo que sempre quis ou foi por conveniência ? - Patrick não se perde no que faz, sua voz soa calma, tão calma quanto seus movimentos.

- Eu sempre gostei de desenhar, minha mãe achou interessante estimular esse meu lado, cheguei a ir para faculdade de artes, mas não curti muito. Eu gosto de desenhar, mas eu não sou muito afeito a produção subjetiva, pelo menos desde que entrei na adolescência preferia copiar meus personagens de anime preferidos ou recria-los sob uma nova ótica. O design veio anos depois de cursar artes, parecia ser um campo que me daria melhor. Eu gosto, o cliente me pede, eu faço e é isso.

- Você faz muito bem. Você sabe animar ?

- Eu até posso, na verdade eu fiz alguns, mas ainda preciso melhorar, animar é muito mais difícil. São tantas sequencias que chega a dar dor de cabeça.

- Realmente um homem de vários talentos. - Aprecio o sorriso dele enquanto focava em sua tela.

- Como você consegue ser tão organizado em seus afazeres, mas completamente perdido e confuso na cotidiano ?

- Não sei. - Admito. De fato eu era uma completa confusão na vida, no entanto, sabia me virar perfeitamente com cronogramas no serviço.

Patrick levanta seus olhos para mim, uma sombra de curiosidade. - Está confortável ? -

Sorrio envergonhado.

Havia deixado meu notebook de lado e agora estou deitado em sua cama, abraçando seus travesseiros contra meu peito. O que eu posso fazer se a cama dele é extremamente confortável.

- Tony é muito injusto, cada quarto deveria estar equiparado com o mesmo nível de conforto. Vou reclamar.

- Se quiser dormir aqui não será um problema. - Cair por Patrick Taylor era um poço sem fundo. O cara não disse nada demais e eu já me sentia estranho por dentro. Ele com certeza era um bruxo, isso explicaria seus olhos escuros e o estranho brilho que recai em mim toda vez que o vejo.

- Uma má ideia às vezes é melhor que nenhuma ideia. - Murmuro.


                                                                                                 °°°°



- Essa cerveja é horrível. - Tony diz após entornar metade do copo gigante em um único gole.

- Prova essa, tem um gosto bom. - Patrick entrega a ele seu copo igualmente gigante, Tony o bebe mais uma vez num único gole.

- Realmente, mas essas cervejas são tão aristocráticas. - Sua face indignada me fez rir.

- De quem foi a ideia de vir para a noite das bebidas artesanais mesmo ? - O olho indicando meu sarcasmo propositalmente. Tony bufa como resposta.

Até três dias atrás ele estava animado com a ideia de provar cervejas artesanais, tudo por causa de um panfleto aleatório que foi parar no carro de Olivia. Tony convidou Patrick, que era o tipo de pessoa que gostava de sair com seus amigos, e depois me convidou, acho que ele fez o movimento estrategicamente, eu não viria se não fosse pela oportunidade de ficar bêbado com Patrick e nos pegarmos loucamente depois.

O bar era como Tony disse: aristocrático. O preço das bebidas exorbitantes, lanches mais caro que meus tênis, sinceramente eu nem sabia o que estava fazendo aqui. Mas Tony de alguma forma conseguiu cinquenta por cento de desconto em quase tudo e esse é o tipo de amigo que todos deveriam ter em suas vidas.

- Aquela loira não para de olhar para você Tony. - Patrick assinala com um aceno de cabeça para a mulher alguns metros de distância. Ela nem ao menos disfarçou quando viu que estávamos olhando de volta, um sorriso - falsamente - tímido em sua face ao encarar Tony.

- Acho que enjoei de mulheres loiras depois de morar com Olivia. Elas parecem todas iguais. - Murmura sorrindo de volta.

- É o padrão de beleza, todas as meninas estão ficando parecidas. - Comento, ainda sentindo o gosto da cerveja cara e ruim.

- Ela é bonita. - Patrick diz. O olho curioso.

- Ela é bonita e deve ter 1,62 de altura. Pensei que gostasse de mulheres altas. - Ele sorri para mim, virando seu corpo em minha direção.

- Eu disse que ela é bonita, não o meu tipo. - O sorrisinho zombeteiro me deu uma leve vontade de morder seu rosto.

- Pera ai, você não é gay ? - Nos direcionamos a Tony que olhava para Patrick como se ele acabasse de contar uma novidade.

- Não.

- Prova.

- Você já está bêbado ? - Pergunto rindo de sua resposta idiota.

- Fala sério, você não é hétero! - Patrick rebate.

- Eu fui hétero até os dezessete anos de idade. - Tony começa a rir e Patrick se junta a ele. Decido beber minha cerveja para ver se conseguia alcançar o nível de alegria dos dois.

- Eu fui hétero até os doze. - Patrick diz.

- Eu fui hétero até os vinte e três. - Digo encarando minha bebida na metade. O recipiente era tão grande que mesmo com a sensação de ter bebido dois litros ainda estava cheio.

- O que a bíblia diz sobre os não gays convertendo os héteros em não héteros ? - Encaro Tony confuso com sua pergunta.

- Acho que é pecado. - Patrick responde de modo sério.

- E o que acontece com os não gays e não héteros que pegam héteros ? - Ele continua e eu juro que meu senso de interpretação já está fora de alcance.

- Acho que os anjos parcelam a porcentagem de quantas vezes você pegou o gênero oposto ao seu e quantas vezes vocês pegou o mesmo gênero que o seu. Deve rolar uma subtração, se você ficar com maior porcentagem por ter pego o gênero oposto do seu você tem chances de ir para o céu.

Patrick explicava com tanta calma, Tony escutava atento, e por um momento achei que eu fosse burro. Mas eles estavam começando a ficar bêbados.

- De onde tirou isso ? - pergunto.

- Às vezes eu fico pensando nisso. Mesmo não sendo religioso, parece uma explicação razoável, não acha ?

- Na perspectiva cristã ? Talvez. - Tony bate palma chamando nossa atenção.

- Mas bíblia é contraditória. Por que Deus fez a próstata no cu se não queria que os caras dessem o cu ? Qual o sentido ? - Tony arregala seus olhos castanhos. - Há prazer no cu.

- Minha mãe diz que Deus faz tudo certo. - Afirmo.

- Então dar o cu é certo. Amém. - Patrick levanta seu copo e brindamos com ele.

- Deem seus cus. - Tony grita.

- É isso aí cara! - Alguém responde de algum lugar. Por sorte eu estava achando muita graça para me sentir envergonhado.

- Oi rapazes. - A moça loira de antes surge ao lado de nossa mesa junto de mais duas outras meninas. - Vocês se incomodam se a gente se juntar a vocês ?

- Não vejo problemas, amo fazer amizades. - Tony sorri simpático para elas.

Do nada nossa mesa se expandiu para um grupo. As garotas eram até legais, a loira estava conseguindo prender Tony em seus charmes, mas possivelmente ele só estava alterado e iria terminar ficando com ela porque ele era assim, recusar uma pessoa não era de seu feitio.

Como ainda estou atento e mais sóbrio que os outros dois, percebi que a amiga ruiva de olhos medonhamente verdes focavam em Patrick. Ela estava deixando bem óbvio com o decote enorme e toques inconvenientes. Para somar a isso ela era veterinária e eles entraram num assunto que eu não fazia ideia do que significava. Nem sabia que Patrick entendia de medicina veterinária!

- Sabe, eu até tentaria dar em cima de você. - Uma voz melodiosa surge ao meu lado e lembro da terceira amiga do grupo. - Mas sou esperta o suficiente para saber que você está com ciúmes do bonitinho ali.

- Eu não estou com ciúmes do bonitinho ali. - Digo a ela.

- Huhum, o que foi ? Está no armário ? Não eram vocês que estavam gritando que dar o cu é bom ? - Não me aguento e começo a rir. Só a lembrança era o suficiente.

- Espertinha, por que vieram até aqui então ?

- Elas não se tocam, garotas gostosas que  se acham gostosas o suficiente ao ponto de conseguirem converter a sexualidade dos outros.  - Ela levanta os ombros. - Mas são minhas amigas. 

Entendi o que ela falou, as amigas dela eram  completamente dentro do padrão estético, corporal e socialmente preferíveis, provavelmente a rejeição não fazia parte do repertório de vida delas. Garotas com ego elevados e certificados pela sociedade podiam ser um saco de tanta reafirmação pessoal. No entanto, preferia a que estava ao meu lado, sua pele era de um castanho escuro, os cabelos presos em tranças num coque bem feito. Os lábios grandes e bem delineados pintados de vermelho a tornavam sexy. 

- Você é linda.

- Eu sei. Pelo amor de Deus eu não tenho problema com o padrão social. - Ela levanta seu copo em minha direção com um leve sorriso em seus lábios. 

Beije-me da forma como quer ser amado (EM BREVE NA AMAZON)Where stories live. Discover now