Ela sorri e balança a cabeça.

"Como você é cliché," dispara, aproximando seus lábios dos meus.

Eu a beijo suavemente e com gentileza, como se seus lábios fossem feitos de cristal. Mas a babi para de me beijar e olha nos meus olhos. Ela não apenas olha nos meus olhos, sinto como se estivesse observando a minha alma. Me vejo hipnotizado por ela, me encontro em transe.

"Algum dia você vai me contar sobre a sua mãe?" Ela pergunta, de repente.

"Nossa, era na minha mãe em quem você estava pensando agora?" Brinco, mas minha expressão logo fica séria.

Ela sabe que eu não gosto muito desse assunto, por isso evita perguntar sobre isso. E para ser sincero, nunca me abri disso com ninguém, nem mesmo com meu pai, absolutamente ninguém além do meu reflexo no espelho.

Apenas de ouvir o nome mãe sinto meu coração pesar. As últimas lembranças que tenho dela não são boas, na verdade não são algo que eu queria ter experienciado, mas ela é a minha mãe, minha mãe..

Sinto meus pulmões se reduzirem e o ar fica curto. E de repente não encontro ar limpo em lugar nenhum. Uma vontade imensa de me
despedaçar em um milhão de pedaços me invade, e tudo que eu vivi com ela, durante o tempo que eu estava lá, volta de uma vez, como um simples empurrão, mas que me faz bater a cabeça e o corpo no chão e me destrói por dentro.

Babi percebe como mudei desde que ela fez a sua pergunta e chega mais perto de mim, até me abraçar.

"Não precisa me dizer, eu não quis que você ficasse desse jeito," ela diz, passando as mãos pelas minhas costas.

"Eu, eu estou bem," respondo, tentando me recompor e filtrar meus pensamentos. Separar as lembranças dos sentimentos, mesmo que os dois sempre estarão interligados. "Quero te contar, você merece saber isso, já está na hora. Eu mereço tirar esse peso dos meus ombros.

Eu repito fundo e a babi fica calada. Ela se afasta um pouco, mas continua perto de mim, como se fosse me segurar caso eu acabasse caindo.

"Não sei qual foi a história que te contaram quando eu me mudei," começo. "Mas eu fui morar com a minha mãe porque não a via fazia dois anos, desde que meus pais se separaram. Estava passando por algumas coisas aqui que não eram muito boas para mim, então resolvi passar as férias na casa dela, por mais que meu pai fosse extremamente contra aquilo, insisti ate que ele deixasse."

Olho para a paisagem e para babi, que nem pisca direito enquanto me ouve contar sobre a minha mãe.

"Aquelas férias foi a melhor coisa que aconteceu comigo. Esqueci de quase tudo que havia ficado aqui e me diverti muito lá. Conheci minha mãe melhor - porque ela foi embora tão cedo de casa que nem me lembrava dela direito. E eu me lembrei de como ela era incrível. Sempre sorridente e positiva. Eu até resolvi me mudar para lá um pouco depois, porque naquela época, a vida lá era melhor da que eu vivia aquí. Por mais que eu sentia muita falta do meu pai e das pessoas daqui. Mas...." Faço uma pausa, pois acabei de ser atingido por mais memórias ruins. "Mas eu... um tempo depois, vi o que a separação tinha feito com ela. Meu pai não era um bom marido, nenhum pouco. Aquilo a fez ir embora e nunca mais se recuperar. Descobri que aqueles dias maravilhosos tinham sido apenas encenação, e descobri que sempre que eu dormia, ela saía para se drogar e encher o corpo de bebida. Agora, babi, imagine o que era aquilo para um menino de treze anos. Eu era uma criança, eu estava sozinho em um país desconhecido com uma mãe desconhecida, porque não queria aceitar que aquela era a minha mãe, não queria."

Babi aperta os olhos e os vejo ficando vermelhos. Ela quer chorar, e aquilo também faz eu querer chorar, mas me seguro.

"Comecei a colocar a culpa em mim mesmo," continuo. "Achei que ela tinha começado a fazer aquilo porque eu a lembrava do meu pai, e achei que eu tinha que ir embora para que ela parasse com aquilo. Mas não queria ir embora, ela era a minha mãe. Então eu continuei lá, com ela, tentando fazer ela largar aquilo e ficar comigo, tentei fazê-la mais feliz de todas as formas. Até me lembro de pintar o meu cabelo e mudar de aparência para que ela não se lembre tanto do meu pai, mas nada adiantava. E então, os vicios dela foram só piorando. Ela havia começado a me bater constantemente e a beber tanto que jurava que a bebida uma hora iria começar a sair de seus ouvidos. As marcas de agulha estavam no corpo inteiro dela. Por dentro ela era um cadáver. Mas eu continuei lá, porque ela era a minha mãe," repito. "Ela tinha depressão, ela não estava em um lugar bom naquele momento. Comecei a fumar no meu último ano lá, e acabei a entendendo. Aquelas coisas realmente melhoravam o que estávamos passando no momento. mas aquilo era momentáneo demais, não melhorava coisa nenhuma. Então eu... eu vi que não tinha mais nada a fazer a não ser mandá-la para um centro de reabilitação. Ela odiou por eu de feito aquilo com ela, ela me odela por isso, me odeia e já deixou isso claro. Ela falou na minha cara que se fosse para ter um filho que nem eu, preferiria ser torturada até a morte antes de ficar gravida, olha e gravida, porque assim eu talvez sentiria um pouco de dor também. Mas, mas não era culpa dela, ela não estava falando aquilo, era a bebida."

Nesta hora eu não aguento mais, toda e qualquer gota de lágrima de estava presa dentro de mim acabara de ser jogada para fora de mim brutalmente.

Tento continuar falando, mas acabo me engasgando com tudo o que está acontecendo. Eu apenas deito no colo da babi e me derramo em lágrimas espessas e volumosas.

Alguns minutos depois, continuo falando. Tenho que tirar isso de mim por completo, só assim conseguirei seguir em frente.

"Depois disso," falo. "Depois disso eu fui embora, sentia como se eu fosse morrer se continuasse naquele lugar, naquela casa. Então voltei para cá. Sei que ela já saiu da clínica, mas não sei se estou preparado para vê-la de novo, não sei se ela me perdoou por eu ter feito aquilo."

Não consigo falar mais nada, fico calado e em silêncio. Mas não espero a babi falar algo, já que não acho que existe muitas palavras para serem faladas agora.

"Você fez a melhor coisa que poderia ter feito, Victor. Não se culpe por ser um filho ruim, você não foi, você foi o melhor filho que alguém gostaria de ter," ela diz, me abraçando com toda a força que possui.

Eu balanço a cabeça em positivo, tentando me convencer que ela estava certa.

"E eu te amo, e tudo vai ficar bem, nós vamos fazer ficar bem."


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