24- LA MUSICA (A música)

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Dias depois, na casa de Piero:

Há alguns dias interroguei um suspeito, no entanto não deu em nada. O verme sangrou lentamente até dar seu último suspiro, mas não soube dizer quem havia o contratado. A quem quero enganar? Não vou conseguir descansar enquanto o mandante não for revelado. Não enquanto minha família estiver em risco. Não enquanto a cabeça da minha mulher e a minha estão a prêmio.

Saindo do momento reflexivo, o dia está lindo, todos estão na piscina, ninguém tentou me matar até agora. Fascinante!

Guero saiu ontem e até hoje não voltou, deve ter se amarrado com algum rabo de saia. Matteo foi também, mas amanheceu no quarto. Enquanto eu fiquei em casa, mofando. Ah, essa vida de casado! Que merda, hein?

Faço semicírculos com a ponta dos dedos na borda do copo de Montila, um destilado tipicamente brasileiro, adoro experimentar bebidas novas. Enquanto, vejo Matteo brincar de aviãozinho com Graziela nas costas, próximos a borda da piscina. A risada ingênua e verdadeira da menina é melodiosa e gratificante. Matteo tem um sorriso de orelha a orelha, nunca o vi tão feliz em todos esses doze anos de amizade. Lucrézia está sentada na mesa ao lado, aquelas com guarda sol no meio, olhando encantada para a cena. Cada músculo que dá forma ao seu lindo rosto demonstrava a felicidade da minha esposa. Decido chegar mais perto dela, sentando do seu lado.

Nos últimos dias estive observando o cuidado de Lucrézia com a irmã e é impressionante. A cada dia percorrido descubro algo inédito sobre a mulher com que me casei. Sei que a ordem dos fatos está alterada, em tese primeiro eu deveria a conhecer e depois casar. Entretanto, considerando que minha vida nunca foi normal, isso também não seria. Nessa semana presenciei a forma amorosa como as duas se tratam e a relação admirável entre as senhoritas. Não pude deixar de pensar no quanto Lucrézia seria uma boa mãe. Por breves segundos me veio à mente a possibilidade de ter filhos com ela. Está maluco Piero?- Me repreendi mentalmente.

- Não vai entrar, amore mio? - Olhei para piscina e em seguida para Lucrézia.

- Não sei nadar. - Me encarou com expressões serenas.

- Se quiser, eu lhe ensino.

- Outro dia. Va bene? - Ela riu fraco e eu assenti.

Queria ter um assunto para conversar com a minha esposa, mas nada passava pela minha cabeça. Somos tão diferentes e para falar a verdade não sei de nada sobre ela, ou do que é que ela gosta.

- E os negócios? Estão indo bem? - Fui pego de surpresa com a pergunta.

- Ah! Sim, estão ótimos.

- Nenhum carregamento atrasado? Nenhum traidor para torturar? O Conselho não está te enchendo o saco? Hum?

- Como você sabe de tudo isso? - Cerrei os olhos e inclinei a cabeça pro lado.

- Piero, não sou nenhuma mocinha ingênua. Eu sou uma Caccini! - Lucrézia me olhou como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

- Você não tem com o que se preocupar, querida. - Dei um beijo em sua testa e me levantei para ir embora.

Preferi evitar uma briga desnecessária, cuja essa conversa provavelmente nos levaria. Não quero, sob hipótese alguma, Lucrézia envolvida com os meus negócios. Ela já corre perigo só de estar casada comigo.

[...]

Ah, sábado! Meu dia preferido da semana. Não preciso ir para Confecção Martinelli. Posso encher a cara e não me importar com a hora.

A casa está silenciosa hoje, não vi nenhum Caccini ainda. Decido fazer algo que não faço há muito tempo, tocar um pouco de piano. Sempre me fez tão bem, tocar. Desço até a sala e me sento no banquinho de estofado branco, que já está amarelado, devido a antiguidade da peça. Passo a mão sobre o velho instrumento de madeira, sinto as ondulações deixadas pelas balas e lembro do rosto de Mamma sem vida nos meus braços.

Vendetta di Lucrézia (Vingança de Lucrézia) - 01 [Danatto Sangue]Where stories live. Discover now