PARTE II: MAYA

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PARTE II: MAYA

Você tem 14 horas e 45 minutos gratuitos restantes, dizia o holograma que se projetou em sua frente, deseja renovar seu plano?

Não, ela pensou, em um tom irritado. A imagem se desfez.

Aurora tinha parado em uma cafeteria para descansar. Na verdade, ela não se sentia cansada, apesar de ter passado as últimas nove horas andando pela cidade. Só queria se sentar, espairecer um pouco em um lugar tranquilo.

Estava tomando um chá de camomila na intenção de se acalmar com a inquietação da simulação. No entanto, não sabia se ele tinha o mesmo efeito do que o da vida real. Pelo menos o sabor continuava igual, apesar de estar melhorado por conta dos ingredientes que adicionaram.

Nem parecia que ela tinha perdido tanto tempo. Talvez tivesse se distraído demais no caminho com os cães robôs, ou com a rua que simulava o fundo do mar com hologramas super realistas. Ou com as incontáveis perseguições da polícia que ocorrem a cada cinco minutos nessa cidade. Como as pessoas gostavam de viver naquele caos?

Enfim, tudo que ela conseguia pensar era no que aquele homem do bar falara pra ela. "Sem os contatos certos você não encontra ninguém nessa cidade." Ela precisava conhecer alguém. Uma pessoa que fosse capaz de rastrear outras.

Seus pensamentos foram brutalmente interrompidos quando um corpo foi lançado sobre sua mesa, destruindo sua xícara de chá. O líquido quente espirrou nela, que não conteve o gemido de dor.

— Dessa vez você não escapa! — falou o cara que lançou a pessoa. Ele estava bem do lado dela, era alto, tinha cabelos platinados e luzes verdes saindo de frestas do seu rosto. Com rapidez, tirou uma pistola da cintura. Não teve tempo de atirar, pois seu adversário acertou sua barriga com um chute.

Algumas pessoas se aproximaram para ver o que estava acontecendo, sem parecerem preocupadas com a presença de um homem armado. Aurora não ia esperar para ver o fim daquela maluquice. Desesperada, levantou-se e partiu em direção à saída. Seus pulmões começaram a trabalhar com mais velocidade, junto com o coração. Estrondos ocorreram às suas costas, junto com clarões. Tiros. Era só o que faltava... Ela correu o mais rápido que pôde, em vão. Num piscar de olhos estava no chão, chorando de dor. Uma bala a acertara nas costas.

A luta entre os dois continuou mesmo com a garota se esperneando no piso, clamando por ajuda, tentando puxar o ar de volta. Ninguém se moveu para ajudá-la. Alguns até andaram até ela, mas só a encararam com desprezo ou segurando o riso, como se ela estivesse fazendo um escândalo exagerado.

— O que tem de errado com vocês?! — ela gritou, cuspindo sangue. — Eu vou morrer, porra! Façam alguma coisa!

Uma garota de cabelo azul soltou uma risada baixa e deu de ombros.

— Já que você pediu...

Ela se aproximou enquanto puxava uma arma de seu coldre. A última coisa que Aurora viu foi um clarão.

E de repente, a garota se viu de pé, ainda puxando o ar para seus pulmões com força. Não sentia mais dor. No entanto, suas pernas tremiam e seu corpo ainda não se acostumou com a gravidade. Ela havia morrido. Sabia que levara o tiro na cabeça. Mas estava de volta. Novinha em folha. Com mesmas roupas, só que limpas e sem furo de bala.

Mas que porra... Aurora se sentou na grama com as mãos na cabeça, esperando seus pensamentos voltarem ao normal. E então percebeu. Grama? Onde vim parar?

Ergueu o olhar para frente, vendo que estava em um morro vazio, sem ninguém por perto. Havia poucas árvores ali, e aparentemente nada construído por um humano. A garota acreditaria facilmente que havia saído de Cybercity, se não fosse pelo enorme amontoado de edifícios no horizonte distante. Ela via os carros voadores — minúsculos dali — percorrendo o céu ao redor dos prédios, os hologramas dançantes, as luzes... Atrás de tudo aquilo, o sol da tarde ia se pondo, manchando o céu com fragmentos laranjas e dourados.

Uma Noite em Cybercity (CONTO)Where stories live. Discover now