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LOUIS

O dia havia chegado. Eu sentia minha perna batendo involuntariamente de forma frenética no piso do ônibus, estava ansioso, era óbvio, fazia tempo que não me permitia ter qualquer tipo de relação com pessoas novas, era trabalho demais para terminar decepcionado e as vezes com um coração partido.

Assim que paramos no meu ponto eu desci e com o máximo de calma que poderia ter caminhei mais algumas quadras até o local do café. Era um local simples, mas aconchegante, uma boa escolha. Varri o local com os olhos e avistei o garoto do aplicativo, ele era realmente bonito e estava com uma carranca mexendo no celular, fui até ele e me sentei na cadeira a sua frente. Ele pareceu não notar, ou apenas me ignorou, mas assim que a impaciência bateu à minha porta eu fingi uma tosse fazendo-o subir o olhar.

Sua feição permanecera séria, quase emburrada, quando ele disse um simples "e aí?" e foi neste instante que percebi que não deveria ter dado ouvidos a Pedro. O rapaz a minha frente sem dúvidas parecia com aquele do aplicativo, corpo magro, cabelos loiros escorridos, olhos castanhos esverdeados e uma barba rala, mas a maior diferença é que no famoso tinder  ele aparentava ser alguém animado, simpático, não mais um jovem adulto amargurado...

Enquanto me perdi nos meus pensamentos sobre todas as razões de porque esse rapaz – Victor o nome dele, não que seja relevante, acredito que eu não usaria muito essa informação – estaria tão emburrado, fui retomado a realidade pelo mesmo me chamando

- Louis, não é? – fiz que sim com a cabeça, dando brecha para que ele prosseguisse – E então..?

Ele me olhou com expectativa e eu só pude evidenciar a dúvida em meu rosto, "e então" o que?

- Vamos para minha casa? Sabe como é, não gosto de perder tempo nisso, muito menos dinheiro nessas espeluncas

Eu travei. Quando conversamos em momento algum ele evidenciou que era apenas sexo, muito menos que seria tão direto, e bem... esse lance de ser apenas sexo se torna um pouco mais complicado quando é comigo, quando é com um soropositivo. Então, vítima do nervosismo eu apenas levantei – quase que involuntariamente – e sibilei que precisava ir ao banheiro e que já já retornaria.

Pelo café ser um estabelecimento razoavelmente pequeno, achei com facilidade o banheiro e adentrei-o. Me encostei na bancada de mármore da pia e respirei fundo, não deveria me deixar abalar tão rápido assim, muito menos deixar que pensamentos ruins confundissem minha mente que lutava todos os dias pela sanidade. Ergui o olhar para o espelho e resolvi lavar o rosto, não queria me demorar mais do que já estava fazendo. Abri a torneira, juntei as mãos como se fizesse uma concha com as duas unidas e molhei meu rosto, permaneci de cabeça baixa e olhos fechados sentindo as gotículas escorrendo pela minha pele por um tempo, até ouvir um rangido de porta e rapidamente levantei a cabeça. Minha gola da camiseta que usava estava manchada de pingos d'água mas não dei importância para isso, o som do rangido viera de uma das cabines do banheiro, e de lá saiu um rapaz que deveria ser quase um palmo mais alto que eu, cabelos longos com cachos caiam sob seus ombros e todo o charme que ele exalava se tornou cômico quando notei que ele estava travando um desafio contra o zíper de sua jeans skinny. Não pude evitar de rir baixo, mas foi o suficiente para atrair a atenção do cacheado, que sorriu para mim pelo reflexo do espelho, sorri fechado de volta e desviei o olhar indo pegar alguns papéis para secar o rosto. Quando ia saindo do banheiro, não pude evitar de espiar por cima do ombro o rapaz de cabelos enrolados, e, se não me falha a visão, tenho quase certeza que ele olhava em minha direção.

Logo que me deparei com a visão das mesas do café, pude perceber que a mesa que meu "date" estava a me acompanhar estava vazia, me aproximei e vi que meus pertences ainda estavam ali – ótimo, pelo menos assaltado eu não fui – mas o rapaz que teoricamente deveria me acompanhar havia me deixado, conferi o celular e não havia nenhuma mensagem justificando, nem um bilhete mal escrito em um guardanapo, então, me sentei a mesa, frustrado e segurando o choro, agarrei meu celular e meus dedos corriam para alcançarem a velocidade de meus pensamentos enquanto digitavam todas as ofensas e desabafos possíveis para Pedro.

Estava terminando de concluir que a vida era uma tremenda de uma filha da puta na vigéssima mensagem reclamando que eu digitava quando ouvi a cadeira a minha frente ser arrastada. Levantei o olhar da tela do meu celular e direcionei meu foco para as mãos que seguravam o apoio da cadeira. As mãos que pertenciam a ninguém mais ninguém menos que o cacheado do banheiro, que assim que percebeu minha atenção voltada a ela, sorriu galanteador – dessa vez ele não tinha dificuldades com nenhum zíper – e com a voz grave murmurou

- Esse lugar está vazio? – perguntou como se estivesse desinteressado, então arqueei as sobrancelhas e assenti, ele se sentou e prosseguiu – Perdão, meu nome é Harry

Ele estendeu a mão e agora o sorriso que ladrilhava seus lábios parecia mais com o que uma criança oferece ao aprontar algo, do que o sorriso de conquistador que ele exibia minutos atrás.

- Louis – Apertei sua mão e sorri, genuinamente contagiado pelo sorriso do cacheado, que eu recém descobrira que se chamava Harry.

- Bem, Louis, posso lhe fazer companhia? Se estiver esperando por alguém eu posso me retirar, afinal um cara bonito assim dificilmente não estaria acompanhado mas...

Eu ri, Harry parecia se perder entre o seu jeito galã e envergonhado, então assim que meu riso baixo ecoou, ele se silenciou e sorriu amarelo para mim. Ele parecia ter um portfólio de sorrisos.

- Adoraria companhia na verdade – me privei de maiores informações, afinal, não é um bom causador de impressão dizer que está sozinho porque fora abandonado no primeiro encontro

- Então se é assim, acho que você não ficaria incomodado comigo aqui – Neguei com a cabeça, e antes que fosse falar algo, meu celular apitou e a tela brilhou. O nome de Pedro na barra de notificações, ele havia enviado um "que merda" acompanhado de um sorrisinho triste, e a próxima mensagem era apenas uma simples pergunta:

"quer ir embora? Posso te buscar..."

Não pude evitar de resvalar meu olhar até Harry que abordava uma garçonete e fazia seu pedido, então peguei o celular e com convicção digitei um não (e um sorrisinho feliz, caso não colocasse tenho certeza que Pedro acharia que eu estava magoado ou mal). Desliguei o aparelho e me voltei ao rapaz que me acompanhava, que aguardava que eu fizesse algum pedido assim como ele. Acabei sorrindo sem nem perceber e quando a garçonete foi embora me deixando a mercê do jeito animado e envolvente de Harry, não contive um pensamento de que talvez não fosse realmente tão ruim dar uma nova chance a novas pessoas. Eu jamais admitiria em voz alta, mas Pedro talvez estivesse certo, eu tenho a vida toda pela frente. Já é hora de dar uma chance para a felicidade, sem julgamentos. 

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⏰ Last updated: Feb 25, 2021 ⏰

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