Red

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a noite
se pôs
vermelha.
vermelho céu escaldante do cerrado em setembro, fazendo queimar tudo e escorrer suor pelas costas, descendo torturante como os bons homens fazem.
vermelho flor rosa desabrochada, vivo, cortante, e de pontas levemente murchas, acastanhadas e mortas, somente se o observador for bem inconveniente-
como sou.
vermelho batom de donzela que não aguenta ser donzela, e brinca de puta de meia noite às cinco borrando bocas tantas para se sentir Lucíola, a que todos desejam e ninguém quer.
vermelho maçã de conto de fada, reluzente na casca perfeita, gritando me coma e pingando veneno da mordida simétrica que matou a mais famosa albina de nossas infâncias.
vermelho sangue, que corre em nossas veias e pulsa nossas artérias como nossa maior essência de querer pulsar e correr a vida e o relógio inteiro antes que pinguemos hemofílicos e anemiemos até esvair.
vermelho assim
admirante.
intocável
que só serve de longe.
mas a noite se pôs vermelha e estou dentro da noite. bem, bem perto. estou dentro do vermelho. o suor o batom borrado o veneno os espinhos o sangue quente i want it all.
quero estar e quero ser
hoje eu sou vermelha.
A vida que pulsa e pulsa porque corro mesmo no mesmo lugar.
imersa.
noite vermelha em toda sua vermelhidão mergulho em ti
como se não houvesse outra escolha
porque no fim do dia, melhor, da noite, não há.
quando me vi já estava aqui infundida em todo seu vermelho que me contorna lambendo meu pescoço salgado, ou salgando meu pescoço molhado, não sei. se suor ou sangue
porque avermelhou tudo.
a noite se pôs vermelha
e o vermelho se pôs aqui, no peito no corpo no amêgo.
a noite se pôs vermelha
e mulheres vermelhas
não querem dormir.

Amor tem mais que quatro letrasWhere stories live. Discover now