24. Minha anjinha

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Há amores que são grandes demais para uma vida. O meu amor por mamãe eu tenho certeza que ultrapassa as barreiras do tempo e do espaço. Não é tudo uma ilusão de qualquer jeito? Não é tudo relativo de alguma forma?

Vocês se lembram da história do meu bebê? Pois é, essa mesma, a história de um lindo bebê puro que eu salvei das mãos de uma assassina e entreguei para uma enfermeira que trabalhava comigo no hospital, cujo maior sonho sempre fora ter filhos, mas não conseguia engravidar. Essa enfermeira, linda e bondosa, era um legítimo coração puro, na máxima extensão da palavra.

Bom, eu trabalhava com ela no hospital e ela me contou a história de ter recebido um presente de Deus na sua porta. Ela me contou que quando viu o pequeno bebê na sua porta, ficou tão emocionada que a primeira coisa que fez foi cair de joelhos e agradecer a Deus por sua infinita generosidade. Depois disse que pegou o pequenino no colo e lhe jurou, por tudo que fosse santo e sagrado, que dedicaria sua vida para cuidar dele e que sempre estaria lá para ele.

Bianca, era esse o nome da minha anjinha. Eu sentia imenso prazer na sua companhia. Sempre que a via no café ia atrás, queria beber da sua energia, presenciar a vida verdadeira pulsando forte, sentir o amor por seu filho e secretamente saber que eu era o anjo dessa história.

Minha anjinha era dessas criaturas raras de se ver, mais do que um coração puro, que transmite energia, alegria e vida, minha anjinha transmitia também paz e amor. Sua presença tinha o poder de melhorar o mundo à sua volta. Era lindo, mágico. E tê-la ao meu lado no hospital, sem dúvida, era um presente divino. Eu era grato por isso, imensamente grato.

Eu gostava de fazer pequenos agrados para ela só para lhe roubar um sorriso, nada muito frequente, muito forçado ou muito estranho. Apenas pequenos mimos para que, de vez em quando, eu recebesse a magia do seu sorriso, me recarregasse, e especialmente me lembrasse de que eu não era só escuridão, às vezes eu era luz.

 Eu realmente sinto um misto de tristeza e prazer quando percebo que a escuridão alcançou um coração puro, mas no caso da minha anjinha só veio a tristeza. Eu queria que ela ficasse por aqui para sempre, por mim, pelo seu menino, por todos aqueles que ela contagiava diariamente.

Sinto que agora cabe a mim fazer um juramento diante de você e farei. Eu juro por tudo que me é sagrado que, quando vi a escuridão da Bianca, pedi ao meu Criador que permitisse nesse mundo de dor e escuridão que alguns anjos Seus aqui ficassem, não todos, mas aqueles com fartura de amor e paz, exatamente como minha anjinha. Eu disse a Ele que ela era forte e que ela poderia suportar. Mas Ele não respondeu às minhas preces, há mesmo alguma lei que proíbe os corações puros de ficarem muito tempo por aqui, é como se houvesse o risco de que pudessem se contaminar com o negrume que nos embala, é como se houvesse o risco de perderem sua pureza para sempre e se tornarem mais um de nós. Eu não sei por que pedi isso a Ele. Sei que Ele cuida dos seus anjos e jamais largaria um dos Seus por aqui tempo demais.  Eles não são obrigados a ficar nesse mundo para sempre.

Eu e ela estávamos no café quando vi sua escuridão pela primeira vez. Fiquei triste. Subitamente comecei a chorar. Ela não entendeu. Passou as mãos nos meus cabelos e disse com aquela bondade divina que tudo ficaria bem. É claro que não ficou. Foi só depois de um mês que ela me puxou de lado e disse que queria conversar.

—O que houve? —eu perguntei já imaginando que ela me contaria sua desgraça.

—Eu estou com câncer. Ele é muito forte, André. Cresce rápido demais —Ela começou a enxugar as lágrimas dos olhos e emendou: —Isso é uma despedida, meu amigo. —Então ela me abraçou com emoção. —Posso ir a qualquer hora.

—Como assim, Bianca?

—É uma laranja no meu cérebro que só cresce.

—Não dá para operar? Tem que haver algum jeito —disse agitado e nervoso.

MORRA POR MIMOnde as histórias ganham vida. Descobre agora