52- Devagar.

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Kyara.

Eu estava no andar de cima. Sozinha. Com os braços apoiados na mureta de concreto. O vento de verão soprava mansamente no meu corpo, o que fez os pelos do meu braço se arrepiarem algumas vezes.

Lá em baixo, estava acontecendo a contagem de votos. Todos os alunos aguardavam o resultado, mas eu não estava preocupada. Eu já tenho um Rei, e a coroa dele não era de plástico. E também já tenho minha Rainha, e aquela hora ela devia estar lendo um livro no quarto, esperando meu pai sair do banho.

Respirei fundo e abracei o corpo, quando um vento gelado soprou, arrancando algumas flores do arco. Depois abaixei a cabeça.

Foi quando senti algo quente sobre os meus ombros, me virei assustada e não sei se meu coração disparou pelo susto ou por ver quem era.

- Oi.

- Aí que susto! - exclamei. - Se quiser me matar me joga daqui de cima logo.

- Calma! -falou. - Eu só quero conversar com você.

Suspirei.

Ele veio até o meu lado, e o silêncio reinou por alguns instantes.

- Como você me encontrou aqui em cima?

- Eu te vi subindo a escada. E você é a única garota que está de sapatilha.

Olhei para os meus pés. Tentando não pensar que a sapatilha estava machucando meu dedo mindinho.

- Achei que você não vinha. -confessei - Por causa de ontem.

Ele virou o rosto pra mim, continuei olhando para a frente.

- Foi exatamente por causa de ontem que eu vim. Você não deixou eu dize...

- Eu não devia ter tido aquilo. Você é uma das pessoas que eu conheço que mais tem fé... Eu juguei você errado. Me desculpa. - falei encarando ele.

Ele negou.

- Não. Você não tem que pedir desculpas. O que você falou abriu os meus olhos. - disse. - Quando se tratava da minha mãe eu sempre era fraco, e por opção. Acredite, você me ajudou mesmo sem ter a intenção.

Sorri, e puxei, o que percebi ser, a jaqueta dele, para cima dos meus ombros.

- E é por isso que eu não quero mais guardar segredos. Eu vou te contar tudo que você não sabe, e depois... A gente vai ligar pra minha mãe.

Olhei para ele sem entender nada.

- Como assim? Ligar pra sua mãe como?

- Eu falei com o meu pai hoje de manhã. E ele me deu o número de telefone dela.

- E como ele tem o número dela? - perguntei devagar.

- Vem - me puxou pela mão. - Vamos sentar que eu te digo tudo.

Do lado esquerdo do arco tinha duas mesinhas pequenas de madeira, com duas cadeiras e um guarda-sol que naquela ocasião era inutilizável. Nos sentamos na mais distante e ele começou a falar. Desde o momento que a mãe dele foi embora, até o dia que a vovó deu o álbum pra ele e falou um pouco da história do Alberto e da tal da Geona. Me contou sobre a Duda ser uma possível irmã dele, sobre a viagem que o Alberto fez e encontrou com ela (foi nessa viajem que ele pegou o número), sobre o túmulo no cemitério e toda a história que me deixou muda.

Quanta coisa...

Se isso estivesse acontecendo comigo (Deus me livre) meu cérebro não ia aguentar tanta informação. Era muita coisa para alguém que tinha só 17 anos.

Aos olhos de DeusWhere stories live. Discover now