Parte XXIII (FINAL)

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Caminhando pelas ruas em direção àquela loja, pude perceber que eu era uma Agnes diferente até mesmo para os olhos da comunidade. As pessoas me encaravam e falavam sobre mim, mas eu não me importava se era algo bom ou ruim. Como não sabiam dos meus erros cometidos e das intervenções mágicas que eu havia sofrido, o pior que poderiam dizer era que eu era uma idiota/pervertida/esquisita por largar o barão às vésperas do casamento e anunciar noivado com outro.

Eu não me importava realmente com que os outros pensavam, especialmente porque eu sairia daquela cidade em breve, logo depois do casamento. Nesse momento nada podia estragar minha felicidade por estar a poucos dias de embarcar com Loran em uma viagem por terras que eu nunca pensei que iria conhecer, até mesmo o norte, de onde ele vinha.

Wes estava bem, melhor do que nunca, e as garotas da vila também, agora que viam seu caminho livre para o barão. Sorri ao vê-las se aprumando todas à passagem dele, que acenou para mim, fazendo as expressões nos rostos delas ficarem azedas.

Eu tinha certeza de que ele logo estaria com uma garota nova, pois, apesar das abelhudas zanzando em torno dele, havia algumas moças bacanas disponíveis que pareciam agradá-lo. Entre nós não havia mais nenhum vínculo senão amizade, já que o efeito da poção tinha mesmo sido totalmente anulado.

Ele não chegou a saber que havia sido enfeitiçado, e Loran me aconselhou a não contar, pois não havia necessidade. Wes passaria a vida acreditando que se desencantou comigo de repente, ao saber do meu problema, e as coisas seriam provavelmente melhores assim.

E mesmo tendo ido atrás da "minha espécie" com uma frota armada, eu não o culpava. As histórias de sereias existiam há muito tempo, e ao me revelar para ele provei que elas eram reais. É claro que eu podia ser uma assassina quando me transformava, então, como barão de Rasminn (seja lá o que isso significasse), ele achou que tinha o dever de ajudar a população a se livrar daquele mal. Não mais estando apaixonado por mim, não lhe restaram muitos sentimentos de proteção para comigo.

Mas a boa parte é que os homens dele, ao verem Loran se afogando, o tiraram da água, e Wes, ao me ver humana de novo lutando contra as sereias, me salvou. Fiquei me perguntando como ele soube, como me viu, e ele contou que estava nadando com uma lança na mão para atingi-las. Admirei sua coragem.

Terminei meu caminho até a Encantos & Sonhos, abri a porta e me dirigi ao balcão. Salizar estava agachado na outra extremidade, e se levantou sorrindo.

– Agnes... estava te esperando.

Eu não tinha ido vê-lo ainda desde que tudo aconteceu, estava organizando minha vida. Depois desses dias de mudança e reflexão, enfim me sentia pronta para encontrar com o Encantador.

– Vim lhe trazer isto. – Coloquei o envelope com o convite do meu casamento sobre a bancada. Seus olhos o fitaram rapidamente.

– Eu soube. – Ele sorriu de lado.

– Gostaria que você fosse.

Ele assentiu. Ficamos em silêncio por um instante.

– Obrigado – falou. – Você é muito gentil comigo, mesmo depois de tudo que lhe fiz...

– Eu vejo agora, Salizar. Eu finalmente compreendo. E sou eu que lhe devo um agradecimento.

Ele sorriu.

– Então vê que eu lhe dei o que você queria, amor e sabedoria?

– Bem... de uma forma estranha e dolorosa, sim – eu disse de modo leve. Não o odiava mais. – A pergunta é: você sabia ou teve apenas sorte de eu ter consertado as coisas no fim?

O Lado Escuro do MarOnde as histórias ganham vida. Descobre agora