Um Beijo Sob O Visco - Contos...

By Isatin06

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Hey, amor, os sábios seguiram uma estrela Do jeito que eu segui o meu coração E isso me levou a um milagre Vo... More

Pretty Paper - Parte I
Pretty Paper - Parte II
Noite Feliz

All I Want For Christmas Is You

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By Isatin06

Bianca

Natal. Ah, o Natal! A época mais esperada do ano. O tempo em que as pessoas são unidas, gentis, solidárias... blá, blá, blá. Cadê isso no resto do ano? Aliás, cadê isso na própria noite de Natal? Porque tudo o que eu vejo é uma reunião de família obrigatória e a noite terminando com uma discussão idiota, provavelmente sobre política ou um assunto que eu me importe ainda menos.

Eu já ouvi algumas pessoas falarem que eu sou o Grinch, a ranzinza do Natal. Mas não é de sempre que eu detesto essa festa. Quando eu era pequena, minha mãe e meu pai adoravam decorar a casa toda e fazer festa para os amigos. Eu me divertia, me sentia feliz e mal podia esperar para viver cada momento daquela data.

Mas quando eu tinha doze anos, exatamente na noite de Natal, aconteceu o acidente que matou os meus pais e tudo o que chamavam de magia relacionado àquela data perdeu o sentido pra mim. Na manhã em que todas as crianças estavam abrindo presentes, eu estava chorando, sentada em um ônibus, me mudando do Rio de Janeiro para morar com minha tia em Goiânia. Ela não era nada agradável e todos os Natais passava bebendo. Tive que começar a trabalhar para comprar minhas coisas e guardar dinheiro para sair da casa dela.

Nunca mais decorei a casa ou sequer montei uma árvore, não ganhei mais presentes e nem dei um para ninguém. Era só mais um dia do ano em que eu passava sozinha vendo filmes de destruição do mundo e desenhos animados, porque eram os meus preferidos.

Já até tentei viajar nessa época e cheguei até a participar de uma comemoração na casa de alguns amigos, mas não era nada confortável para mim ficar vendo as famílias felizes e reunidas enquanto eu estava sozinha, me sentia não incluída naquilo, como uma intrusa.

Não me importava de ficar sozinha, já tinha me acostumado.

Tudo isso até a Rafa chegar.

Eu a conheci no primeiro ano do ensino médio e desde então ela mudou minha visão sobre várias coisas. Eu não era muito focada nos estudos e costumava ser bem rebelde, mas quando nos tornamos amigas ela me abriu os olhos para muitas coisas e me ajudou a ser uma pessoa melhor. Depois que ela começou a estudar comigo as matérias do colégio, minhas notas melhoraram muito. Eu passei a sentir que ela era a única pessoa que se importava comigo e eu me sentia bem de estar perto dela. E Rafa foi a primeira pessoa a me dar um presente depois de anos. Uma mochila que eu tanto queria e na época não tinha dinheiro pra comprar. E foi assim que a tradição de troca de presentes voltou ao meu Natal. Com ela e exclusivamente com ela.

A nossa amizade cresceu. Ela começou a me levar para passar os fins de semana na casa dela e até a viajar com sua família. Apesar disso, eu sentia que a mãe dela não tinha muito apreço por mim, ainda que não deixasse de me tratar bem. Nosso único grande desentendimento foi quando eu levei a Rafa para matar aula em um prédio em construção atrás da escola no nosso último ano. Tudo teria corrido bem se os guardas não tivessem nos encontrado por lá. A mãe dela surtou e proibiu de nos encontrarmos fora da escola por meses, então tivemos que fazer isso às escondidas até eu ir até a casa dela e fazer um pedido de desculpas formal com direito a discurso sobre a importância da minha amizade com Rafa.

Ela entendeu e precisou voltar a me aturar. Principalmente quando Rafa e eu passamos no mesmo curso da mesma faculdade em São Paulo e nos mudamos para dividir um apartamento. Foi também quando eu finalmente me livrei da minha tia.

Ah, esqueci de comentar uma coisa importante. Sim, você adivinhou. Eu sou apaixonada pela Rafa. Há anos. Eu acho que desde o dia em que ela se ofereceu para fazer o trabalho de biologia comigo no primeiro ano e nós rimos a tarde toda de aleatoriedades. Demorei a entender o que eu sentia, mas quando finalmente o fiz, no dia em que trocamos um selinho na festa de formatura, entendi que a amava muito mais do que como uma amiga e quis ficar ainda mais perto dela. Sem dizer nada, é claro, ela é hétero. Tá, eu sei, é uma droga. Obrigada pelas suas condolências. Vamos continuar.

Durante a faculdade, eu precisei esconder o quanto de ciúmes eu sentia dos namoradinhos que ela arrumava vez ou outra e que acabavam por sempre magoá-la. Me obrigava a tornar a vida deles um inferno naquele campus. Não que eu não quisesse fazer isso de graça.

Nós crescemos juntas como pessoas e profissionais depois da formatura e nos unimos para abrir uma empresa de maquiagens, a Boca Rosa Beauty, que tem crescido no mercado mais do que a gente poderia ter imaginado. A nossa parceria funcionava em absolutamente tudo. Só faltava uma coisa.

O meu sentimento por ela parecia se tornar mais intenso a cada dia, o que tornava tudo mais difícil. Principalmente pelo fato de que agora ela namorava Caon, um ex-colega da faculdade que ela encontrou depois de um tempo. Adivinhem mais uma vez. Sim, o pior tipo de macho existente. Tá, tá, eu já sei, é horrível, vocês não precisam ficar me lembrando.

Agora eles estavam juntos em Goiânia para passar o Natal com a família dela. E lá vai eu outra vez ficar sozinha na pior época do ano. Não que eu me importe, né? Eu já tô acostumada mesmo... Tá, a quem eu quero enganar? Eu me importo sim. Eu deveria estar no lugar dele.

Fui tirada dos meus pensamentos quando ouvi meu celular tocar. Era a quarta vez naquele dia que Rafa me ligava. Por alguma razão eu ignorava todas as chamadas, acho que não estava muito no clima. Me parecia menos esforço emocional continuar no sofá assistindo tv, vestida confortável com minha calça xadrez de pijama. Até ouvir o barulho da porta sendo aberta e paralisar por um momento até ela me chamar. Anos e eu ainda não havia me acostumado.

– Vem Bia, me ajuda com as coisas. Obrigada, Sr. Joca, a Bia vai dar uma gorjeta para o senhor. Feliz Natal! – Entrou com uma caixa na mão e me lançou o olhar, indicando para a porta.

Sem contrariar, fui até a bolsa, que estava na mesinha perto do corredor de entrada, e peguei uma nota de vinte para entregar ao homem.

– Boa noite Sr. Joca, pode deixar que eu pego essa caixa e a mala. Um bom feriado para você e sua família – peguei a caixa da mão dele e entreguei o dinheiro.

– Obrigado Senhorita, não precisava. Feliz Natal para vocês duas – assim, apertou o botão do elevador, que logo fechou a porta.

Terminei de pegar as coisas e a mala dela que tinha ficado na porta, coloquei tudo na sala e fui até a cozinha para tentar entender o que estava acontecendo. Ela não deveria estar em casa.

– Rafa, o que você está fazendo aqui? – Me apoiei no batente e fiquei observando ela tirar algumas coisas da caixa, demorando a responder minha pergunta.

De repente parou o que fazia e caminhou até mim, me envolvendo em seus braços. Retribui o contato mesmo sem entender.

– Oi Rafa, tudo bem? Eu tô bem sim, Bia, obrigada – dizia divertida, alternando os tons para fazer uma voz que não se parecia nada com a minha. – E respondendo sua pergunta, eu moro aqui, uai – me deu um beijo na bochecha e voltou a mexer na caixa.

– Desculpa, mas é que eu achei que você estava em Goiânia – comentei enquanto pegava as coisas que ela deixava no balcão e guardava na geladeira.

– É, eu estava, mas vim passar a véspera de Natal com você – olhou para mim e eu senti meu corpo ficar mais fraco.

– Mas e sua família? E o Caon?

– Eu e o Caon terminamos – respondeu simples, voltando a se focar nos itens da caixa, como se aquilo não fosse nada demais.

– Que? – Perguntei assustada, os olhos arregalados. – Como assim? O que ele fez com você?

– Calma, ele não fez nada – ela riu, voltando a olhar para mim. – Só não estava rolando, a gente não tinha química e ele tinha pensamentos totalmente diferentes dos que eu acredito, então decidi acabar. Ele também não se importava muito, acho que se acomodou assim como eu... Mas você saberia antes se me atendesse, né trem?

– Sinto muito por isso, Rafa – peguei sua mão e fiz um carinho. – Desculpa não ter te dado atenção, mas você sabe que eu fico off nesses dias. É uma época meio pesada. 

– Eu sei e tá tudo bem, eu estou aqui para tentar deixar as coisas mais leves – ela respondeu me olhando com carinho.

– E como você está se sentindo com o término? – Eu me aproximei para pegar a mão dela e fazer um carinho na parte de trás.

– E eu tô bem, Bia, relaxa, estou bem melhor na verdade. Eu só não queria mais ficar com ele pra manter o status de ter um namorado - retribuiu o carinho na minha mão e sorriu. - Agora vai lá tomar um banho e tirar esse pijama, vou terminar de guardar as compras e depois nós vamos arrumar os enfeites – falou agitada, já se encaminhando de volta para a sala.

– Você sabe que eu não gosto de decoração de Natal – suspirei.

– Mas eu adoro. Acho lindo e como eu vou passar a véspera de Natal aqui nós vamos arrumar as coisas. Vai logo, Bia – apontou em direção ao meu quarto.

Achei que era melhor não questionar mais, melhor era fazer o que ela mandava... Não, eu não sou cadela da Rafaella, não sei de vocês estão tirando isso... É claro que não é óbvio. Será que eu posso continuar? Obrigada.

Fui até o meu quarto escolher uma roupa confortável – calça jeans e camiseta – e tomar um banho rápido. Não demorei muito para me arrumar e fazer uma maquiagem simples. Sai do quarto e voltei para a sala, notando que Rafa também já tinha tomado banho e trocado de roupa. Estava desencaixotando uma árvore de Natal e alguns enfeites.

– Vem me ajudar Bia, depois que a gente terminar aqui vamos fazer uma lasanha de berinjela, que eu sei que você adora – dizia com um sorriso no rosto ao abrir um caixa com bolas vermelhas.

Confesso, era impossível não ser contagiada pela alegria dela. Sempre que estou perto da Rafa eu me sinto mais leve, mais disposta. Com ela as coisas eram tão fáceis que simplesmente me encantava. Ela colocou uma playlist com músicas natalinas e ficamos arrumando as coisas na sala, pendurando bolinhas na árvore e pisca-piscas pela casa toda. Não era uma decoração muito elaborada, mas estava muito bonita, assim como tudo o que ela faz.

I don't want a lot for Christmas
(Eu não quero muito para o Natal)
There is just one thing I need
(Só tem uma coisa que eu preciso)
I don't care about the presents
(Eu não me importo com os presentes)
Underneath the Christmas tree
(Embaixo da árvore de Natal)
I just want you for my own
(Eu só quero você para mim)
More than you could ever know
(Mais do que você jamais imaginou)
Make my wish come true
(Faça meu desejo se tornar realidade)
All I want for Christmas is you
(Tudo o que eu quero de Natal é você)

Depois que terminamos de arrumar a decoração, fui para a cozinha ajudar ela com a lasanha. Eu não era muito boa preparando as coisas na cozinha, mas ajudava. Sempre foi assim: a Rafa cozinhando e eu mais atrapalhando do que ajudando.

Em certo momento, perguntei despretenciosamente.

– E sua família, Rafa? Tá tudo bem?

– Sim, estão bem – respondeu sem prolongar.

– Queria entender como a dona Genilda não surtou com o fato da filha querida abandonar ela no Natal para vir ficar com a amiga delinquente – falei divertida, mas ela me repreendeu com o olhar.

– Foi minha mãe quem falou para eu vir te buscar, então não se preocupe. Amanhã eu volto pra lá e você vai comigo ficar até o ano novo. Eu sei que se ficar aqui não vai fazer nada além de ficar de pijama e ver filme, então pelo menos lá você faz isso com companhia.

– Tá... – respondi em automático, mas só depois minha ficha caiu. –  Espera aí, como assim você veio me buscar?

– Não precisaria vir se a senhorita me atendesse. Era só você pegar o avião e ir me encontrar, mas todo final de ano é esse negócio que você chama de retiro espiritual, então resolvi vir te buscar.

– Rafaella, a sua mãe me odeia, eu não vou não.

– Bianca, ela não te odeia e você vai sim, porque eu já comprei as passagens.

– Ela me chamou de delinquente, Rafa.

– Supera, Bia. Isso foi há quase dez anos e ela só estava brava por você ter me levado para matar aula.

– Rafa, não vai rolar, eu não posso ir. Eu...ainda não arrumei a mala e... –  tentava achar mais desculpas, mas ela me interrompeu.

– A sua passagem já está comprada e não vou perder essa grana. Se você for arrumar sua mala agora ainda dá tempo a gente jantar à meia-noite – falou, me olhando com aqueles olhos verdes penetrantes e uma carinha fofa de piedade. –  Vai Bia, por favorzinho.

– Nossa Rafaela, não sei como que eu aguento você na minha vida – suspirei derrotada. –  Tá bom, eu vou, mas você vai preparar o meu café todos os dias em que a gente estiver lá.

– Me aguenta porque me ama – me envolveu de lado, em um abraço esmagador. –  Mas tudo bem marrenta, eu preparo seu café todos os dias e até levo na cama se você quiser - respondeu sugestiva e em seguida colocou a lasanha no forno.

Eu percebi que ela queria dizer alguma coisa com aquela última afirmação, só não sabia o quê. Demorei por um momento pensando, mas depois decidi ir até meu quarto preparar minha mala para não me atrasar com isso. Depois voltei para a sala e encontrei Rafa dançando com uma taça de vinho na mão.

– Vem Bia –  ela me puxou e começamos uma dança de movimento suaves. – Peguei uma taça para você.

– Obrigada – tomei a bebida de sua mão e dei um gole.

– Ei! A sua taça é aquela ali – apontou para a mesinha no centro da sala.

– Foi só um golinho, pô! – Gargalhei da sua carinha de brava e meu riso logo a contagiou.

I don't need to hang my stocking
(Eu não preciso pendurar minha meia)
There upon the fireplace
(Ali perto da lareira)
Santa Claus won't make me happy
(Papai Noel não me fará feliz)
With a toy on Christmas Day
(Com um brinquedo no dia do Natal)
I just want you for my own
(Eu só quero você para mim)
More than you could ever know
(Mais do que você jamais imaginou)
Make my wish come true
(Faça meu desejo se tornar realidade)
All I want for Christmas is you
(Tudo o que eu quero de Natal é você)

– Eu amo essa música – ela se aproximou mais e envolveu seus braços em volta do meu pescoço. Falou com a voz baixa e suave: – Ei, Bi... Fiquei com saudades de você.

– Também fiquei, Rafa –  apertei ela em meus braços e apoiei minha cabeça em seu ombro.

A música romântica foi, em seguida, substituída por uma um pouco mais agitada que nos fez rir por coreografarmos uma dança estranha e sem ritmo. Terminamos nos jogando no sofá e eu insisti para que nossa ceia fosse ali mesmo. Ela aceitou com a condição de que ao invés de assistirmos um filme de destruição do universo fosse um romântico de Natal. Protestei um pouco, mas acabei aceitando. Tá, confesso, eu até que tinha gostado.

Quando o filme acabou, me levantei para ir até a varanda e Rafa me seguiu. Por um tempo observamos as luzes de São Paulo em silêncio, enquanto música tocava e dividíamos um pouco de pavê que ela havia comprado no mercado.

– Bia, você conhece a lenda do visco? – Ela perguntou depois de um tempo, olhando o ramo artificial que estava pendurado ali, acima de nós, decorado por ela há pouco.

– Conheço, acho que é só um pretexto para as pessoas se pegarem – acabei rindo da cara que ela fez.

– Ei! Claro que não! – Brincou de fazer um protesto indignado. – É fofo e dizem que dá azar não beijar.

– Nem vem Rafa, não vou beijar você – desviei o olhar já sentindo minhas mãos tremendo.

Ei, ei, calma. Pausa aí. É claro que eu queria, vocês sabem, não briguem comigo. Mas eu sabia que meu coração não ia dar sossego se eu beijasse ela. Eu precisava manter um limite, entendem. Ok, despausa.

– Por que não? Você já me beijou bêbada várias vezes – ela achava graça.

– Em minha defesa, foi a Jennifer que te beijou e não passaram de selinhos.

– Que seja, vai Bia só um selinho para não dar má sorte – colocou a taça na mesinha e se aproximou.

Agora respondam: adiantava eu discutir com essa garota? É, eu sei que não.

– Tá – depois de suspirar, também inclinei meu corpo mais para perto dela.

Senti nossos olhares conectados em uma troca intensa, sem desviar fomos nos aproximando até eu sentir sua respiração, ela desviou o olhar para os meus lábios e não consegui evitar de fazer o mesmo. Fechei meus olhos e senti o toque dos seus lábios macios com os meus.

De repente, o que era para ser só um selinho foi se aprofundando. Senti sua mão enrolar nos fios de cabelos do meu pescoço e pedi passagem com a língua. O beijo ficou mais intenso, nossas línguas se exploravam.

Apertei sua cintura e senti meu corpo esquentar, dei uma leve mordida no seu lábio inferior e ela finalizou com alguns selinhos. Me afastei ainda de olhos fechados até que entendi o que tinha acontecido, abri meus olhos um pouco assustada e ela me encarava de uma forma que eu não consegui decifrar.

Oh, I won't ask for much this Christmas
(Oh, eu não vou pedir muito nesse Natal)
I won't even wish for snow
(Eu nem vou desejar ter neve)
And I'm just gonna keep on waiting
(E eu só vou continuar esperando)
Underneath the mistletoe
(Embaixo do visco)
I won't make a list and send it
(Eu não vou fazer uma lista e mandar)
To the North Pole for Saint Nick
(Para o Polo Norte para o Papai Noel)
I won't even stay awake to
(Eu não vou ficar acordada para)
Hear those magic reindeer click
(Ouvir os sininhos das renas)

– Bia...

– Desculpa... eu só faço merda – bufei frustrada. – Isso não vai mais acontecer... não pode mais acontecer. Que droga, que droga – voltei para a sala e comecei a andar pesado de um lado para o outro. Sem coragem de encará-la, senti que ela me seguiu. Finalmente me sentei no sofá e abaixei a cabeça. Sabia que ela estava ali de pé, me olhando sem entender. Eu precisava dizer.

É, obrigada pelo incentivo de vocês. Não foi nada pressionado. Continuando.

Não, espera.

Eu tava sendo irônica, espero que tenham entendido.

Ok, agora sim, continuando.

– Desculpa, não dá mais, eu não consigo mais esconder isso – falei baixo, com o olhar ainda voltado para o chão, tentando controlar a ansiedade que fazia o meu coração se agitar.

– Bia, esconder o que? – Sua voz expressava a confusão que provavelmente estava acontecendo em sua cabeça naquele momento.

– Mas que merda... – cobri meus olhos sentindo-os começaram a marejar. – Eu te amo, Rafa – disse de uma vez, antes que minha voz começasse a se embargar e eu não conseguisse dizer o que eu precisava. – Eu te amo muito mais do que como uma amiga, muito mais, Rafa e há muito tempo. Droga! Eu não consigo mais esconder isso de você. Sinto muito se eu confundi as coisas, mas é isso Rafa eu te amo como nunca amei ninguém. E eu sei que acabei de estragar tudo – esfreguei as mãos nos meus longos fios castanhos e me levantei sentindo o máximo de frustração possível. – Eu odeio essa época, odeio! Tudo dá errado.

E não adianta vocês falarem que eu podia ter ficado só no selinho! Eu sei disso! Cansei de falar com vocês também! Eu vou me trancar no meu quarto.

Acabou a minha narração.

Rafaella

Flashback on

Sentada sozinha na varanda da casa da minha mãe em Goiânia, eu observava Sofia correr com Alfredo pelo gramado. Apesar de ter os olhos fixos na cena, minha mente, pelo contrário, não parecia estar nenhum pouco fixa nesse mundo. Tinha algo que me preocupava mais.

– O que foi filha? – Minha mãe perguntou ao se sentar ao meu lado e notar o meu semblante aflito.

– É a Bia que não me atende desde ontem. A última mensagem que mandei foi dizendo que ia jantar com o Caon – respondi e suspirei frustrada, bloqueando a tela do celular.

– Então ela não sabe que você terminou com ele?

– Ainda não. Todo ano ela inventa de ficar nesse tal de retiro espiritual, se isola de todo mundo.

– Você sabe que é uma época difícil para ela, filha.

– Eu sei, mas seria tão melhor se ela viesse passar o Natal aqui com a gente. O problema é que ela pensa que a senhora detesta ela.

– Eu não detesto ela... Tudo bem, confesso que não era a maior fã dela quando vocês eram mais novas, mas sei o quanto ela te faz bem. Se preocupa e cuida de você, então só quero que ela esteja feliz.

– Ela é muito carinhosa mesmo, só tem cara de marrentinha, mas é um amor.

– Eu sei filha, só implico com ela porque eu tinha medo.

– Medo do que? – Perguntei confusa.

– Dela ter te levado para o mal caminho – desviou o olhar.

– Mãe, a gente era adolescente, só matamos aula uma vez e ela pediu desculpas para a senhora. Nunca mais fez nada de errado.

– Eu sei, mas não é esse tipo de mal caminho...

– Não estou te entendendo, mãe.

– Ela ficava com meninas, não queria que ela fizesse sua cabeça.

– Eu não acredito que a senhora está falando isso – me levantei nervosa.

– Rafa, calma, eu sei que julguei errado. Na época minha cabeça era muito fechada. Eu usei da desculpa de vocês matarem aula pra colocar na minha cabeça que eu não gostava dela. Me desculpa, Rafa.

– Não é para mim que a senhora tem que pedir desculpas, é pra Bia – respondi firme.

– Senta aqui filha, deixa eu terminar. Vou pedir desculpas. Com o tempo eu percebi que não tinha o porquê de ter esse medo, de pensar desse jeito, ela é a melhor pessoa que eu poderia querer para você, minha filha.

– Como assim?

– Ela te ama Rafa e não só como uma amiga. Ou você é muito devagar, ou não quer enxergar.

– Claro que não mãe, somos só amigas.

– Rafa, ela cuida de você de uma forma que nenhum namorado seu cuidou. Foi ela quem ficou ao seu lado nos piores momentos, quando você passou por suas piores crises, inclusive por causa de homens que não sabiam tratar de você, que te faziam mal. A Bia se importa com você, te faz feliz, te faz rir tão facilmente. Eeu sei que sua amizade com ela é diferente de como é com a Manu ou a Gi, por exemplo.

– Mãe... não... é que... – eu não sabia exatamente o que dizer, mas não precisei procurar palavras porque ela me interrompeu.

– Eu sei que você também ama ela, só acho que precisa admitir isso para si mesma. Eu só quero o seu bem e sei que é ela quem te faz bem. Então vá buscar essa menina, tá cedo e dá tempo de pegar o voo de meio-dia.

As mães de vocês sempre sabem de tudo também?

Como assim eu que sou muito lerda?

Tá, melhor continuar a narração.

– Não vou conseguir voltar hoje – respondi, finalmente aceitando o que minha mãe dizia.

– Volta amanhã com a minha nora. E tenha coragem, minha filha. Você merece ser feliz e ela também

Abracei ela e fui arrumar minhas coisas com pressa, tinha que saber se ela também sentia.

Ah, agora vocês ficam mudos, né?

Pelo menos é o fim do flashback.

Flashback off

Ainda estava em choque com o beijo e as sensações do meu corpo, fiquei tentando entender tudo o que ela tinha dito.

Ok, acompanhem comigo, estou um pouco devagar... Sim! É só um pouco sim! Então, ela gosta de mim... há anos. E minha mãe estava certa... como sempre. Bom, quase sempre. Ai, meu Deus, ela gosta de mim. O que significa isso pra nós? Porque é, eu também gosto dela há mais tempo do que eu era capaz de imaginar. Alguém pode me ajudar com essa resposta? O que? Eu tenho que fazer isso sozinha? Ok, vamos voltar a cena.

Caminhei apressada até a porta do quarto dela e percebi que estava trancada. Pensei, por um momento, em desistir, dar o espaço dela. Mas eu não queria que ela pensasse nada ao contrário do que eu sentia verdadeiramente. Então, dei algumas batidas na porta, mas ela não respondeu.

– Bia, abre aqui, vamos conversar.

– Depois Rafa, quero ficar sozinha um pouco – ouvi sua voz embargada.

Bufei. Não era nenhum pouco justo. Então tomei uma decisão que talvez não fosse tão correta em outros casos, mas nesse não me deixava escolha. Fui até a gaveta da cozinha, onde ficavam as chaves reservas do apartamento e peguei a do quarto dela. Parei em frente a sua porta e respirei fundo, buscando coragem. Finalmente abri devagar e vi que ela estava deitada na cama, virada para o lado oposto.

– Desculpa, você me obrigou a fazer isso – falei, mas ela não se virou para me dar atenção. – Bia... – chamei e me sentei na ponta da cama ao seu lado.

Ela inclinou o corpo para se sentar e passou a enxugar as lágrimas como desculpa para não me olhar.

– Eu odeio ficar tão sensível no final do ano. Acabo só fazendo merda – suspirou ainda esfregando as mãos nos olhos e evitando contato visual comigo.

– Você não faz ideia do porquê eu realmente voltei pra cá, né? – Ela negou com a cabeça. – Minha mãe conversou comigo e... acho que ela já tinha percebido isso, percebido que você gosta de mim muito mais do que só como uma amizade – fiz um carinho em suas costas.

– Que ótimo, mais um motivo para sua mãe me odiar. Grande noite, como sempre!

– Acontece que ela não te odeia. Nenhum pouco. Me fez vir aqui te buscar e foi quem me fez abrir os olhos para enxergar o que eu também sinto.

– Como assim? Rafa, o que tá dizendo? – Finalmente ela levantou a cabeça para me olhar e eu enxuguei suas lágrimas com meu polegar.

– Você é a pessoa que faz com que eu me sinta bem, leve e feliz. Quando acontece alguma coisa ruim eu só quero o seu conselho e o seu abraço, quando acontece algo muito bom é a primeira pessoa que eu quero contar. Eu só quero você, o tempo todo. Você sempre esteve do meu lado, cuidando de mim quando eu mais precisava e quando eu mais queria. Todos os dias eu não vejo a hora de chegar aqui e assistir um filme com você e criticar as cenas ruins, de cozinhar com você me atrapalhando, de ter você no meu quarto de madrugada porque não conseguia dormir, então eu tinha a obrigação de não dormir também pra te fazer companhia. Bi, eu nunca gostei das suas namoradas e você nunca gostou dos meus namorados. Fui muito lerda para perceber, mas agora eu sei que eu te amo e você é muito mais do que uma amiga, Bia.

Por que é que vocês estão chorando? Assim não consigo continuar a cena. Limpem as lágrimas, por favor.

– Rafa... – devagar ela chegou mais perto de mim. Parecia atônita.

– Quero ficar com você Bia – continuei. – Você é a pessoa que mais me faz bem. E me desculpa se eu demorei muito para perceber isso – senti as lágrimas molhando meu rosto.

Sim, eu posso chorar, sou a protagonista da história. Vocês só os leitores.

– Rafa, meu Deus, eu te amo tanto. Você é a minha pessoa favorita no mundo inteiro – foi sua vez de passar o polegar no meu rosto limpando as lágrimas que insistiam em cair.

Sem aguentar mais a distância colei nossos lábios em um beijo cheio de sentimentos, que durou tempo o suficiente pra eu ter ainda mais certeza de que eu sempre precisei dela assim para mim. Tinha demorado muito tempo, mas agora eu não queria perder tempo algum. Nenhuma de nós queria

Quando o ar se fez necessário, ela finalizou o beijo com alguns selinhos e distribuiu vários no meu rosto. Não pude evitar de sorrir com o carinho.

– Então, sua mãe que te empurrou para os braços da amiga delinquente – disse rindo.

– Como cê é besta, trem – empurrei seu ombro, fazendo a cair na cama e me joguei por cima, rindo junto.

– Que horas são?

– Meia noite e um – falei olhando a tela do meu celular. – Feliz Natal, Bi.

– Acho que tô começando a gostar desse dia.

Cause I just want you here tonight
(Porque eu só quero você aqui essa noite)
Holding on to me so tight
(Se abraçando em mim muito forte)
What more can I do?
(O que mais eu posso fazer?)
Baby, all I want for Christmas is you
(Amor, tudo o que eu quero para o Natal é você)
You, baby
(Você, amor)

Fim

Acabou, vocês gostaram?

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