Quando soam os sinos [Concluí...

By _Canni_Bal_

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Ela só queria ser uma jovem normal, se aventurar em um site de paquera e passar o feriado com um namorado de... More

Capítulo I
Capítulo II
Capítulo IV
Capítulo V
Escolha
Final I
Final II

Capítulo III

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By _Canni_Bal_

Assim que retorna, Akoman é posto a par de sua missão. Ele segura a arma, mantem o dedo indicador no gatilho e sorri abertamente quando os outros dois deixam a sala. 

 Respiro fundo e me atrevo a olhar em sua direção. Suas feições não mudam. Seu sorriso sádico permanece estampado no rosto alvo, contudo, seu olhar parece mais profundo e mordaz. Ele me fita como se me desafiasse, ansiasse por uma reação para que tivesse um pretexto para descarregar o pente em meu peito. 

 – Por que não atira em mim? – arrisquei, imaginando se meu desejo de hoje mais cedo se concretizaria.

 Akoman arregala os olhos e levanta as sobrancelhas, parecendo estar curioso.

 – Atire em mim. – insisti. 

 – Por que eu deveria fazer isso? 

 – Você tem uma arma e eu tenho um forte anseio pela morte. – tento convencê-lo, desejando pular a parte onde eles me torturam e ir direto para a parte onde uma bala encerra meus impulsos nervosos e enfim posso descansar em paz.

 – Mas ai não teria graça. – ele responde, e mais uma vez o meu sangue congela. 

 Agora vejo que é mentira o que dizem sobre estar perto da morte. Não passa um filme na sua cabeça e você não se lembra de seus arrependimentos em vida. Você se agarra ao presente, e apenas a ele, e luta pelo privilégio de respirar por mais um dia. No meu caso, porém, não sinto a necessidade de permanecer viva. Nunca senti. Gostaria apenas de me desligar desse mundo antes que esse trio realize suas fantasias perversas comigo.

 – Eu não era assim, sabe? Ficando sozinha em casa enquanto minha família viaja, conversando com estranhos na internet... – dissimulo, tentando despertar pena nele. 

 – Ah, é mesmo? – sua voz carrega cinismo. 

 Ele troca a arma de mão, em um visível gesto de intimidação. Engulo em seco, no entanto, mesmo assim prossigo, suando frio.

 – Já fui feliz um dia. Mas já faz tanto tempo que é como se tivesse sido em outra vida. Você tinha que ver. Eu era sorridente, cheia de vida. - forço um sorriso. – Estudava duro, tinha amigos, uma família unida... mas parece que agora não me sobrou nada. Meus dias são todos iguais. Odeio o meu emprego e parece que tudo o que faço, dentro ou fora do escritório, não é o bastante.

 Akoman estreita os olhos, umedece o lábio inferior com a língua e bate as mãos uma na outra vagarosamente, emitindo palmas sonoras e sarcásticas. De repente ele cessa as aclamações, adotando uma expressão mais dura, contudo, igualmente bem humorada.

 – Pobre e incompreendida Mallory. Vivendo em uma casa enorme com quintal com cerquinhas brancas. Ela tem tudo. Emprego, família, está quase se formando na faculdade... – ele senta-se na mesinha de centro e bate os coturnos no chão. – e mesmo assim não é feliz. – o rapaz faz beicinho. – Eu tenho pena de garotas como você, que tem o mundo nas mãos e mesmo assim são mal agradecidas. 

 – Não é tão simples...

 – Cala a porra da boca, tá legal? – seu humor muda tão repentinamente que eu me sobressalto.

 Respiro fundo e abaixo a cabeça, mordendo a bochecha enquanto reflito sobre suas palavras. Sei que de uma forma ou outra ele está certo, contudo, não consigo me desligar desses sentimentos mórbidos que insistem em me levar ao inferno. 

 Ter dinheiro não é garantia de felicidade. Ter uma família não é sinônimo de união.

 Andras e Valak retornam, avisando que vasculharam a casa e não encontraram indícios de nenhum outro ser humano nela. 

 Fico me perguntando o que acontece agora.  Sabendo que de fato estamos sozinhos, quais são seus planos para mim? 

 – Tudo limpo. – o mais velho gira a karambit nos dedos, cessa o movimento com a lâmina apontada em minha direção e próxima ao meu rosto. Ele parece contente quando arregalo os olhos ao ver a ponta da faca quase perfurando minha íris.

 – E agora a verdadeira diversão começa. – Valak estrala os dedos das mãos e em seguida me puxa do sofá, forçando-me a me reequilibrar mesmo com as pernas bambas.

 Sou levada até a cozinha e forçada a preparar um jantar para nós quatro. Minhas mãos são soltas das amarras, e não preciso nem ser avisada de que não devo tentar reagir. 

 Caminho até a geladeira, de onde pego alguns tomates, cebola e alguns temperos que minha mãe guarda na porta. No desespero de terminar o mais rápido possível, tento equilibrar todos os ingredientes nos braços afim de fazer uma única viagem, mas quando estou me aproximando da pia deixo as cebolas caírem no chão, e por pouco não perco o vidro de ervas. Engulo em seco e respiro fundo, lançando um olhar preocupado na direção dos homens pois não quero que fiquem irritados por conta dos meus erros. Porém Akoman abaixa-se, alcança o legume próximo aos seus pés e o leva para mim, colocando-o ao lado da tábua de madeira. Ele ostenta um sorriso no rosto e estreita os olhos antes de retomar o seu posto, atrás de mim me vigiando. 

 Sua gentileza poderia ser genuína se não houvesse uma arma de fogo em seu cós.

 Mal consigo controlar os tremores de minhas mãos quando pego no cabo de plástico da faca. Respiro fundo e tento me concentrar em picar os tomates para fazer o molho. Entre um movimento e outro pego-me fantasiando em apunhalá-los com a lâmina e dar fim a esse filme de terror, ou então, cravá-la em meu próprio peito e findar minha vida. Meus lábios tremulam, mas eu o mordo. Não derramarei mais nenhuma lágrima, pois vi que o choro não os comove. Preciso ser forte e fria, já que se não conseguir escapar ilesa esta noite, ao menos partirei com o restante da minha dignidade. 

 Termino de preparar o molho de tomate e coloco o macarrão no fogo para cozinhar. Massa é tudo o que tenho para o jantar, visto que o plano original era comer pipoca ou então pedir um delivery de pizza ou comida japonesa.

 – Querida, por que não sobe para se arrumar para o jantar? Akoman e eu olharemos o fogo e colocaremos a mesa. Valak, acompanhe a moça até o quarto.

 – Não tem necessidade... – tento me esquivar, limpando as mãos no guardanapo bordado com desenhos de estrelas e trenós.

 – Agora.

 Meu sangue gela e todos os meus pelos se arrepiam. Sou capaz de sentir cada batida rápida de meu coração reverberar pelos meus ossos e o suor frio traça seu caminho pelas minhas costas. "Valak não, por favor" tenho o ímpeto de dizer, contudo emudeço diante de seu sorriso maquiavélico.

 O rapaz oferece o braço e, mesmo a contragosto, o entrelaço com o meu. Ele me conduz ao andar superior, já sabendo onde é o meu quarto. Assim que entramos ele fecha a porta e gira a chave na tranca. 

 – Senta. – ordena, apontando para a cama e eu logo obedeço. – Precisa vestir algo apropriado para essa noite.

 – Por que? – rebato timidamente.

 Assim que abre o meu guarda-roupas, corre os dedos pelos tecidos coloridos pendurados por uma dúzia de cabides, até que sua atenção se dirige a uma peça em especial. O homem a puxa, revelando se tratar de um macaquinho vermelho.

 – Por que é Natal e você tem convidados. – ele me entrega o cabide contendo a roupa que havia escolhido. – Agora se vista.

 – Tudo bem. – gaguejo. – Vou até o banheiro...

 – Aqui mesmo.

 Arregalo os olhos e aquiesço, obediente. 

 – Você pode sair só por um minuto? Prometo não demorar. 

 Valak senta-se na cadeira da minha escrivaninha, voltado em minha direção. Ele cruza os braços na frente do corpo  e inclina-o para trás, fitando-me com os olhos semicerrados.

– Não posso. E bem que eu gostaria de dizer que sinto muito. Mas não sinto.

 – Por favor, não. -– minha voz sai trêmula, denunciando o choro que eu luto para conter.

 – Vai começar a tirar a roupa? Ou vai me obrigar a ir até ai e tirar para você? – se insinua, passando os dedos nos lábios de forma lasciva, apenas me causando enjoos.

 Suas palavras são o suficiente para me calar. Lutando mais uma vez contra o pavor, levo os dedos até a barra da minha blusa e a ergo, passando-a pela minha cabeça e braços, revelando meu torço pálido e completamente desnudo. Evito olhar para o demônio a minha frente, pois sei que a visão que me espera é a de sua completa satisfação em me ver nessa posição. Levanto da cama e fico de costas para ele para terminar de retirar as calças.

 – Vire-se para cá. – ele pede, mesmo sabendo que eu não tenho escolha.

 Reviro os olhos e mordo as bochechas, em seguida cubro os meus seios com os braços e me viro. 

 – Abaixe as mãos. – Seus olhos se igualam aos de feras selvagens, cujas pupilas espreitam suas presas que em breve serão destroçadas.

 Reluto, porém faço o que ele manda.

 Andras pode até me torturar. Akoman pode me ameaçar e assustar. Mas Valak é sem dúvidas o pior de todos eles.

 Termino de vestir o macaquinho, que cobre parcialmente minhas coxas e exibe um grande decote em "V". Eu amava essa roupa, contudo me sinto exposta com ela neste momento. 

 A pedido do rapaz coloco uma sandália de salto com pedras prateadas nas tiras e me posiciono na frente do espelho para passar o batom vermelho que ele pega na minha mesinha de cabeceira. Pelo reflexo o observo se aproximar por trás e parar próximo a mim. Ele está tão perto que consigo sentir seu hálito putrefato em minha nuca. Fecho o batom, o coloco no chão e assim que fico ereta novamente, os dedos de Valak vão em direção aos meus cabelos presos em um coque. O homem desmancha o penteado e joga os fios por cima dos meus ombros, permitindo que meu rosto fantasmagórico seja emoldurado pela cascata negra e levemente ondulada.

 – Bem melhor. – ele sussurra próximo ao meu ouvido, causando-me repulsa.

 - Obrigada. - respondo quase inaudível e tento me desvencilhar de seu toque, contudo, suas mãos fecham-se em meus pulsos.

 Debato-me e puxo os meus braços, no entanto, ele é visivelmente mais forte do que eu, como se o mal que ele carrega em seu corpo o fizesse irrefreável. Sou empurrada até a cama onde caio de costas com tanta força que o ar é retirado com violência de meus pulmões. Ao tentar me levantar, sou impedida por Valak, que se rasteja pelo colchão, vindo em minha direção.

 – Eles não vão se importar se demorarmos só mais um pouquinho. Não é?

 Arquejo e procuro em volta algo que eu possa usar como arma, até que me deparo com a luminária ao lado da cama. Enquanto ele se aproxima, fico imóvel e tento me acalmar. Minhas ações seguintes precisam ser extremamente calculadas e certeiras se eu quiser ter o mínimo de sucesso. Então quando o homem já está quase sobre mim, estico o braço, alcanço o objeto, e com um movimento rápido o golpeio com a base metálica. Ele grunhe e rapidamente recua, levando as mãos até o local onde eu o havia ferido. Isso me dá abertura e tempo o suficiente para correr até a porta, girar a chave e sair do quarto.

 Não posso descer e fugir pela porta. Os outros dois provavelmente me pegariam. Não conseguiria descer pelo telhado coberto de neve. Eu provavelmente escorregaria e cairia do segundo andar. Sendo assim, corro com dificuldade até o fim do corredor, puxo as escadas do sótão e subo os degraus com o máximo de agilidade que consigo devido aos saltos que estou usando. 

 No interior frio e escuro do ambiente, arregalo os olhos e ando de vagar enquanto minha visão se acostuma com a penumbra. A luz do poste atravessa uma pequena vidraça, ajudando-me a diferenciar os contornos dos móveis e objetos cobertos por poeira. Sei que em algum lugar daqui temos um rádio, e se eu conseguir encontrá-lo poderei pedir ajuda, e quem sabe ser socorrida.

 Pouco a pouco torna-se possível me locomover com mais confiança. Alcanço a velha escrivaninha da minha mãe, repleta de objetos de trabalho como materiais escolares, cola glitter e cartolinas, assim como alguns livros pedagógicos da época de sua graduação. Mais ao canto, quase que oculto pelas infindáveis pilhas de discos de Jazz, me deparo com o antigo rádio comunicador. Dou um sorriso vitorioso e corro até ele.

 – Por favor, esteja funcionando. – suplico, tirando o objeto da base.

 Eu sequer sei como usá-lo, contudo, recordo-me do meu pai dizendo que ele seria nossa saída em alguma emergência. 

 – Tem alguém me ouvindo? Cambio. – falo próxima ao transmissor. – Eu preciso de ajuda. Alguns homens invadiram a minha casa e estou presa no sótão. Por favor, alguém na escuta? 

 Peço ajuda, aliviada e ansiosa por obter uma resposta, mas quando dou um passo para trás percebo que o fio que deveria ligar o rádio ao transmissor foi sabotado. Arregalo os olhos, entreabro os lábios e me viro a tempo de ver Akoman saindo de trás de uma estante, emergindo da escuridão.

 – Você! – sussurro em assombro. – O que está fazendo aqui? 

 Com passadas lentas e lábios curvados, o vulto flutua até onde estou parada. Suas íris azuis se demoram nas minhas. Pisco repetidas vezes afim de escapar da intensidade de seu olhar.

 – Queria testar uma teoria. – responde.

 Sem nem pensar duas vezes, dou-lhe as costas e corro em direção às escadas, entretanto, paro abruptamente ao colidir com algo no meio do caminho. Dou um passo para trás e quase desfaleço quando me dou conta de que quem me impede a liberdade é aquele denominado Andras.

 – Andras contou que ele e Valak encontraram o rádio aqui no sótão, e estávamos nos perguntando quanto tempo você demoraria para tentar usá-lo. Você não tem amor à sua vida?

 – Não. – respondo, parcialmente sincera. – Só não quero ficar sozinha com aquele homem de novo. – permaneço cabisbaixa, fitando o chão sujo com uma grossa camada de pó e jornal.

 Akoman ri, passando os dedos nos lábios e arqueando as sobrancelhas. 

 – Eu avisei, não foi? Ele nunca consegue se controlar. Qualquer dia vai acabar estragando tudo por ser tão impulsivo.

 – Calado. Vou conversar com ele quando acabarmos aqui.

 O mais novo torce os lábios e levanta as mãos na frente do corpo como quem diz "você quem sabe.

 Em apenas um passo, Andras alcança meu rosto com as mãos, e com um movimento bruto e dolorido, ele agarra meus cabelos e pinça minhas bochechas, apertando-as com força enquanto obriga-me a encará-lo.

 – Agora nós vamos descer para comer. – sibila. – Você vai ser uma boa garota e vai se comportar, entendido? Entendido? – balanço a cabeça, concordando. – Bom. É assim que eu gosto. Então depois do jantar você vai me entregar seu celular.

 Pisco algumas vezes, e com uma centelha de coragem dou um tapa em seu braço e desvencilho-me de seus toques. 

– Não.

 – O que? 

 – Não. – repito.

 – Como assim, não? – o homem parece confuso e demonstra achar que eu sou louca por estar dizendo isso.

 A última vez que vi meu celular foi em meu quarto, antes de descer até a lavanderia com a roupa suja. Sei que Valak e Andras vasculharam a casa inteira, então se não o encontraram significa que o aparelho deve estar caído debaixo da cama, ao lado do colchão ou então enrolado nos lençóis. Se ele é a minha única salvação, não o entregarei por nada neste mundo, afinal de contas já estou morta mesmo.

 – Vocês podem me matar, mas eu não entrego. – prossigo, tentando manter a voz firme mesmo que ela não passe de notas dissonantes e trêmulas.

 Tento dar um passo para trás, porém minhas costas se chocam contra algo grande e duro. Não é preciso sequer me virar para saber que eu estou entre Akoman e Andras.

 – Se esse é o problema, tenho certeza de que podemos resolver. – a voz do diabo soa próxima ao meu ouvido, vinda de trás.

E por uma fração de segundo meu coração para de bater.

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