Tarde demais

By MarilierDale

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Retratada no século XIX, inspirada nos livros de Jane Austen, das irmãs Brontë, Charles Dickens, entre outros... More

#01 - Bedfordshire: mais do mesmo!
#02 - Um momento peculiar
#03 - Uma boa companhia
#04 - O jantar
#05 - Um bom amigo
#06 - A aposta
#07 - Ele gosta de você!
#08 - Um soco no estômago!
#09 - Tarde demais
#10 - O convite
#11 - Jantar de noivado
#12 - O cavalheiro certo
#13 - A sala de música
#14 - Um pesadelo disfarçado!
#15 - Próximos, porém distantes
#16 - Nosso segredo
#17 - Uma carta para Sophie
#18 - Caça ao bolo
#19 - O Broche de esmeraldas
#20 - Mais um aniversário
#21 - Um convite inesperado
#22 - Onde ele está?
#23 - Sem mais segredos
#24 - Confabulando
#25 - Seis canecas de cerveja
#26 - Fogo
#28 - A carta
#29 - Meu lar

#27 - Como nos velhos tempos

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By MarilierDale

      No dia de natal, a família Evans me acordou com um belo café da manhã e diversos presentes. Arthur e George fizeram desenhos em um pedaço grosso de papel. Nele, podíamos ver Sophie e eu sentadas no parque fazendo um piquenique. Rabiscos quase incompreensíveis, se os garotos não nos tivessem descrito cada elemento no papel. Sophie me presenteou com um retrato de minha pessoa, montada em Odin e Mr. Evans me deu um livro intitulado "A contabilidade moderna".
     Os gêmeos pularam em minha cama, se aninhando entre os lençóis, enquanto os pais se acomodavam em duas poltronas que havia no aposento. Mrs. Daltry nos trouxe uma bandeja cheia de guloseimas e doces.
     - Não se fala em outra coisa em Londres! - exclamou minha irmã. - Apenas na jovem que salvou a vida de uma mulher e uma criança, filha dos Sharman.
     - Ouvi dizer que até o rei se pronunciou quanto ao assunto. - Mr. Evans se servia de uma fatia de torta de cereja. - Algumas pessoas dizem que a senhorita deveria ser condecorada pelo ato de bravura.
     Nada respondi. Aquilo não me parecia um ato de bravura. Apenas tentei não deixar que uma criança e sua tutora convalescessem em meio ao fogo. Qualquer pessoa poderia ter feito aquilo. E eu não fizera nada sozinha. Miss. Thomas - descobri o nome da mulher depois - também fez a sua parte para salvarmos Madeleine. Edward, Jane e seus criados também deram o melhor de si.  Era um grande feito, é verdade. Mas não foi realizado sozinho.
     Minha mão direita ainda doía, porém com menor intensidade. No entanto, não havia sinal de regeneração de minha pele. Talvez ainda fosse muito cedo para esperar uma melhora significativa. Dr. James decidiu que não deveríamos cobrir a queimadura, para que ela cicatrizasse mais rápido, apesar de, com regularidade, colocar unguentos para aliviar as dores.
     - Anastácia pensou em dar um baile de agradecimento, se você concordar!
Claro que não. Eu não forçaria Jane à me oferecer um baile, não depois de tudo que fiz para com ela. Salvar sua filha não desfaz os momentos que passei com seu esposo, nem diminui a culpa em meu coração.
     Uma batida à porta, leve, mudou a atenção de nossa conversa.
     - Miss. Saunders. - Mrs. Daltry disse, com voz suave. - A senhorita tem uma visita lá embaixo. Mr. Sharman está aqui para agradecê-la pelo ocorrido.
     Sem muita vontade de sair da cama, concordei em recebê-lo. Sophie me auxiliou a colocar o vestido, enquanto seu esposo descia para conversar com Mr. Sharman. Alguns minutos depois, cheguei à sala de visitas.
     Mr. Sharman estava olhando através da janela enquanto conversava com Mr. Evans de forma descontraída. Quando entrei no aposento, Mr. Evans pediu licença para se retirar e ficamos à sós. Eu e Edward.
     - Joana, preciso agradecê-la. - Ele fez uma reverência educada. - Essa foi a segunda vez que você salvou alguém muito importante para mim. Talvez eu nunca consiga compensá-la.
     A imagem de Anastácia em um cavalo desgovernado, anos antes, passou pela minha memória. Parecia ter acontecido em um livro de histórias muito antigo.
     - Só fiz o que era certo, Mr. Sharman. - Lhe respondi com sinceridade.
     - Você mudou, Joana. - ele observou enquanto eu me aproximava da janela. - Algo em você está diferente agora, mas o ímpeto de ajudar o próximo ainda permanece. Eu sempre pude ver que haviam coisas maravilhosas dentro de você e que as escondia, com receio de encará-las.    Você é uma heroína para mim e nunca poderá mudar este fato.
     Corei de vaidade diante de suas palavras. Meu coração pareceu aquecer com seu olhar sincero e gentil. Não havia sinal de frieza, nem controle em suas expressões. Eu estava diante de meu amigo do passado.
     - Vim aqui para convidá-la a me acompanhar em um passeio. Se estiver disposta.
     Seus olhos azuis e travessos de outrora me fizeram sorrir. Acho que eu podia acompanhá-lo, não? Afinal, eu era a heroína dele! E de Londres, ao menos naquela semana!
     Ao ver o meu sorriso, ele respondeu com uma risada e disse:
     - Sugiro que coloque suas vestes de montaria!

     A carruagem parou diante do Hyde Park e dois cavalos negros estavam à nossa espera. Edward me auxiliou a subir em um deles, pois eu ainda não tinha tanta força, por causa de minha mão queimada. Em seguida, ele montou no segundo cavalo e trotamos para o interior do parque.
     Era maravilhoso sentir o vento gelado do inverno bater em meu rosto. Apesar de frio, aquela manhã estava ensolarada e sem sinal de chuva. Enquanto dávamos a volta no parque, conversávamos sobre os últimos cinco anos. Edward me falou sobre sua residência na França, sobre o noivado de sua irmã. Contou como foi o nascimento de Madeleine e sobre sua saudade de Woodcottage. Disse que a ala oeste da mansão em Kensington estava sendo reconstruída e que o fogo conseguiu ser controlado antes de chegar à outras partes da residência.
     - O que disse a Jane esta manhã? Aonde mentiu que estaria? - perguntei com o intento de provocar-lhe.
     - Ela sabe que estou aqui, Miss. Saunders. Não lhe menti. Disse que precisava agradecer a senhorita pelo que fizera por minha família.
     Ele aumentou o galope e o segui, sentindo uma confusão de sentimentos tomar conta de mim. A raiva que Jane sentia era tão fraca à ponto de me perdoar após eu salvar a sua filha? Ou o amor por Madeleine venceu qualquer outro sentimento de amargura em seu coração?
     No meio da manhã, apeamos e sentamos na grama, próximos ao Serpentine, para comermos algumas maçãs. Apesar do sol estar brilhando naquela manhã, o frio estava intenso. O que mantivera os cidadãos londrinos afastados do local. Ninguém queria estar ao ar livre com aquele tempo congelante.
     Conversamos ainda mais, parecia que tínhamos uma vida inteira para contar um ao outro. Descobri que, mesmo com a minha vida monótona em Clarence Hill, eu tinha muita coisa para ser dita. Edward sorria com aquele sorriso que fazia meu estômago afundar de nervosismo. O tempo lhe fizera muito bem. Estava ainda mais bonito do que nos anos anteriores.
     A tarde chegou e não percebemos. A brisa do lago nos cobria como se uma névoa mágica pairasse pelo ar. O sol começou a se esconder por entre as árvores e percebemos que deveríamos retornar para nossas vidas.
     Edward me acompanhou até Chelsea e nos despedimos na entrada da propriedade. Nos abraçamos, como se não importasse outros vizinhos estarem bisbilhotando. Ele me deu um beijo na testa e aguardou enquanto eu entrava na residência de minha irmã.

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