Meu mapa para o fim do mundo, com o X do tesouro escondido
Ela baixou o vidro do carro, ao lado de seu assento, logo depois de encerrar uma ligação.
Acendeu um cigarro, com as. pernas cruzadas, as coxas fortemente envolvidas numa saia negra de corte elegante, as pernas em meia de seda.
O sabor era definitivamente amargo e não era apenas culpa do cigarro.
Enquanto o motorista no banco da frente dirigia tentando se manter alheio a tudo isso, Jun Wu que estava ao lado dela, no banco traseiro, lançou-lhe um olhar de soslaio.
- Tem mesmo que fumar dentro do carro, Ling Wen?
- Culpe o Hua Cheng. Não acredito que você está tão calmo quanto aparenta, Jun Wu! Esse estrelismo pode custar caro, podemos ser processados pela gravadora se não entregarmos as músicas novas dentro do prazo.
Jun Wu tinha o cotovelo apoiado na porta do carro em movimento, ele olhou por um momento para a paisagem enquanto desciam a trilha pela colina.
- O que foi que o Hua disse?
Evidente que Jun Wu imaginava, quase podia adivinhar.
- Hum... Não falou coisa com coisa, se quer saber. Disse que "não podia adiar mais estar com as flores e que precisava dar um tempo no antigo ateliê". Ele acha mesmo que posso usar esse tipo de justificativa para a gravadora? Francamente!
- Sobre as flores eu não sei, mas antes de nos engajarmos no projeto da banda... Ele gostava de artes, Hua Cheng tinha um espaço que chamava de ateliê. He Xuan conhece esse lugar melhor do que eu, Hua criou esse suposto ateliê na época da escola.
Ling Wen tragou com vontade o cigarro, seu pé balançando levemente ainda com suas pernas cruzadas.
- Que bonitinho, mas até onde eu sei, histórias fofas mão pagam contas. Você não pode fazer alguma coisa? Não é considerado Band-leader? Pois, seja o líder.
- Ling Wen, não é por nada... Mas, eu pessoalmente também preciso de uma pausa. Ao menos dois dias que sejam para espairecer, posso pensar em compor depois disso, apenas preciso de um violão.
Ela olhou para Jun Wu, depois de expulsar as fumaça de seus pulmões num assopro sutil.
- Tem algo que queira me contar? É muito estranho ouvir você dizer que precisa de uma pausa.
- Nada mesmo. Só quero um pouco de espaço... Ficar um pouco sozinho.
- Sei... Vai fazer o que? Voltar para a casa da sua família?
Voltar para seus familiares era a última coisa que faria... Não, nem pensar, em hipótese alguma Jun Wu faria.
Ele não voltaria nunca no que dependesse dele.
- Não, penso em me isolar no interior. Não olhe para mim como se eu fosse sumir do mapa... Devia estar apreensiva assim com Qi Rong, não comigo.
- Fale sério... Eu devia colocar rastreador naquele bastardo. E He Xuan?
- Se ele seguir minha sugestão, vai achá-lo com Shi Qing Xuan... Mas, não perca seu tempo de ligar para ele, He Xuan atirou o telefone dele no cesto de lixo antes de sair do estúdio.
Embora Jun Wu parecesse minimamente divertido com a situação, Ling Wen franziu o cenho, tocando a testa com a mão que segurava o cigarro que sumia rapidamente de seus dedos.
- O que? Que eu saiba sou empresária, não enfermeira de hospício... Que bando de loucos.
Jun Wu prendeu o riso, desviando o olhar, ao ouvir a pergunta de Ling Wen como que vagando solta no ar:
- Já sabe para que canto do interior vai?
- Não exatamente... De preferência um onde eu seja um estranho.
Ling Wen apertou a sua guimba num cinzeiro preso a parte de trás do banco do motorista e retirou uma bloco de papel de sua pasta, escreveu com uma caneta de ponta fina, puxou a folha branca do bloco e esticou para Jun Wu.
Era melhor não mencionar em voz alta, nunca confie em motoristas que conduzem carros alugados.
O assento do meio estava vago entre os dois.
Primeiro Jun Wu olhou para o papel com certa reserva e devagar o segurou entre os dedos.
Lendo numa passada de olhar.
- Isso não fica numa área rural? Tipo fim de mundo?
Ling Wen descruzou as pernas, sorrindo espertamente de lado.
- Um figurão da gravadora se hospeda numa pousada nessa região. Vai por mim, nessa região ninguém se liga em astros da música. Pode até chamar atenção por ser bonito... Mas, lá você não vai passar de um forasteiro bonito.
Sem mídia obsessiva? Sem jornalistas famintos por furos ou paparazzi?
Definição de paraíso.
Jun Wu tornou a fitar o papel, sorrindo sem mesmo perceber.
- Então? - Ling Wen sacou sagaz seu celular da bolsa, sacudindo de leve entre os dedos - Faço uma reserva para ontem?
- Se eu for com reserva feita... Meu paradeiro não vai vazar para a mídia?
- Não me subestime, Jun Wu... Vou fazer a reserva com um pseudônimo. Mas, acho bom que não deixe seu telefone desligado, nem dê uma de He Xuan. Além disso, a dona da pousada e de uma das maiores fazendas na região, tem fama de ser muito discreta... Ela gosta de manter o lugar em mora sossegado e distante de badalações.
Jun Wu franziu levemente a tez, encostando o dedo de leve na têmpora enquanto fitava Ling Wen.
- Você é assustadoramente competente, Ling Wen... Tem algum feitiço aí na sua bolsa para me teleportar para outra época?
- Hum, não seja bobo... Jun Wu já é também assustadoramente famoso e reconhecido, você pode ter tudo que quiser, não precisa ir para outra época.
Ling Wen foi acessando rapidamente os contato em seu Iphone, com um sorriso esperto nos lábios cobertos de batom.
E antes que o carro pegasse o caminho para a autoestrada, a reserva já estava feita e o destino traçado.
Embora... Traçado... Muito antes desse dia.
**************
Aldeia Gangkou do distrito de Anji, província de Zhejiang
Dia seguinte
Quilômetros de plantações passavam bem diante de seus olhos, enquanto "Come to Me" do Goo Goo Dolls tocava em seus fones de ouvido.
O ar tinha um aroma diferente, Jun Wu podia sentir pelos vidros do carro de tração 4x4 que o conduzia pela estrada de terra.
Mas, não era ele quem dirigia. Como de costume, estava ocupando sozinho o banco traseiro, observando a paisagem se modificar, ou nesse caso, ela quase não mudava... Só ficava mais bonita.
A música nos fones parecia combinar tanto com o instante, que mesmo que ele nem tivesse chegado, tinha a sensação que estava fazendo a coisa certa.
Não era bem uma fuga, mas gostava de imaginar que era.
E ele nunca conhecia o motorista, os rostos sempre mudavam.
A poeira subia na estrada, ele viu quando olhou para os vidros atrás do banco... Ele gostava de guardar os detalhes na mente.
Nunca se sabe, tudo podia virar música.
E bem que em meio aquela paisagem aparentemente inerte e abundantes em plantações, ele viu um cavalo marrom e brilhante à luz do dia, passando do outro lado da estrada.
Jun Wu pediu para o motorista desacelerar um pouco e por um momento o carro e o cavalo ficaram no mesmo limiar em pontas diferentes da estrada de terra.
Evidente que o cavalo era uma beleza, mas a pessoa que o montava que chamou sua atenção.
Era um rapaz, de cabelos longos, mas presos numa trança frouxa. Naquele breve vislumbre reparou que ele vestia um hanfu azul e que não devia ter mais de vinte anos.
Havia algo nele que fazia Jun Wu pensar num destemido herói de alguma fábula antiga.
E não conseguiu desviar o olhar, até subitamente o cavalo disparar pegando uma outra via, talvez um atalho entre um quase distante campo de papoulas.
Jun Wu teve a impressão que o rapaz olhou por cerca de dois segundos na direção do carro antes de sumir.
Seus olhares teriam se cruzado?
Tão rápido... Jun Wu tinha quase certeza que não.
A música nos fones havia mudado, o campo de papoulas desapareceu.
Mas, ele ainda olhou para trás por um tempo.
Até que ele chegou a pousada de destino, de nome Yulong.