O poço - Releitura de Dom Qui...

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Análise do filme "O poço". Більше

O poço - Releitura de Dom Quixote

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Contém spoilers, cuidado :) ♥

Sinopse

O filme aborda a história de Goreng ao acordar em uma prisão vertical que adota o sistema de castas. Basicamente, os presos são separados por níveis, começando do nível 0 até o 333. Os mesmos são trocados de cela aleatoriamente todo o mês, e além disso, uma plataforma com um banquete permanece em cada nível por 2 minutos antes de descer para o próximo.

Sendo assim, a prisão funciona da seguinte maneira: os níveis superiores recebem a maior quantidade de comida, os níveis intermediários recebem os restos, e os níveis inferiores não recebem nada, forçando os presos a cometerem canibalismo para sobreviver. Em suma, o principal conflito de O Poço é a luta de Goreng pela sobrevivência, enquanto tenta corromper o sistema.

O poço

Embora possuir dinheiro seja insignificante no Poço, há diferentes formas de representar as classes e o "status" que cada uma obtém. Ademais, a redistribuição de comida é totalmente definhada por aqueles que estão temporariamente nos níveis acima, obrigando os presos dos níveis inferiores lutarem intrinsecamente pela vida. Essa representação pode ser interpretada como uma metáfora das lutas diárias para sobreviver em um sistema hierárquico e explorador: o capitalismo.

Porém, não pense que o filme é um pedido de desculpas à compaixão humana. Não, não se engane. O Poço mostra o que há de mais REAL e cruel no comportamento humano, essa é a mensagem, isso é o que somos. Podemos perceber a relatividade da concepção de bem ou mal na frase do Trimagasi: "Você é um daqueles que acreditam que tudo o que a administração faz está errado." A administração, por si só, não é boa nem má. É apenas constituída por seres humanos com oportunidade e poder.

Dom Quixote

Aqui, é importante tomar um breve conhecimento sobre uma das maiores obras (senão a maior) já escrita - se você já tiver lido essa belezinha, é só seguir adiante, ok? ;).

"E assim, do pouco dormir e do muito ler se lhe secou o cérebro, de maneira que chegou a perder o juízo." - Dom Quixote

Dom Quixote mistura fantasia e realidade, através do protagonista: um fidalgo sonhador e idealista que encara os livros de cavalaria como um refúgio da vida banal. Depois de tanto ler, acaba enlouquecendo e convence a si mesmo de que é um cavaleiro. O fidalgo utiliza a imaginação para reinventar o mundo que o rodeia, cria inimigos e duelos imaginários, porém, no mundo moderno não há mais espaço para um utopista, o âmbito mudou, Quixote não mais se encontra no mundo idealizado. Sendo assim, podemos resumir Dom Quixote em uma frase: um herói numa época onde não existiam herois.

Goreng x Quixote

Quixote, totalmente deslocado na sociedade, continua sonhando e lutando pelas causas perdidas, e assim como ele, Goreng é esperançoso e mantém sua humanidade em meio ao caos. As demonstrações de afeto (por exemplo, a cena em que ele se preocupa com a Himaru) são as provas de que Goreng se difere dos outros presos, isso também fica explícito na fala de Trigamasi, que antes o insultava por ser bondoso: "eu gosto de você, você tem um bom coração". Além de não se entregar ao sistema, ele também luta pelo fim do mesmo, o que o torna idealista, um lutador das causas perdidas.

Podemos encontrar as principais características de Dom Quixote em Goreng, uma vez que o personagem depois de um determinado tempo começa a alucinar e, por conseguinte, fantasia que é o "Messias", que tem como objetivo enviar uma messagem à administração, a fim de corromper o sistema do poço.

Entendemos que os fantasmas são parte da alucinação de Goreng, então assim como Quixote, ele mesmo fantasia o seu próprio papel e o seu próprio objetivo. O que não é algo necessariamente ruim, pois, a utopia serviu como ferramenta de sobrevivência, uma forma de despertar a vontade de cumprir o seu pseudo propósito.

"À força de tanto ler e imaginar, fui me distanciando da realidade ao ponto de já não poder distinguir em que dimensão vivo." - Dom Quixote

Barahat x Sancho Pança

"Quando se sonha sozinho é apenas um sonho. Quando se sonha juntos é o começo da realidade." - Dom Quixote

Sancho Pança, fiel escudeiro de Dom Quixote, embarca na ilusão de seu amo e resolve acompanhá-lo, acreditando que será recompensado. Assim como Sancho, Barahat acompanha Goreng em sua jornada no intuito de sair do poço.


"A liberdade, Sancho, é um dos dons mais preciosos, que aos homens deram os céus: não se lhe podem igualar os tesouros que há na terra, nem os que o mar encobre; pela liberdade, da mesma forma que pela honra, se deve arriscar a vida, e, pelo contrário, o cativeiro é o maior mal que pode acudir aos homens." - Dom Quixote

Por que a garota não existe?

Imoguiri, a ex-funcionária da administração, afirma que a filha da Miharu não existe. Devido a rigorosidade no momento do cadastro para entrar no poço, é improvável que a administração realmente tivesse permitido a entrada de uma criança. Porém, ainda assim há a possibilidade de ela estar mentindo, então, continuemos:

Criança sozinha no nível 333

Chegamos ao ponto que mais inquetou a minha mente: como uma criança conseguiria sobreviver sozinha nesse lugar? Existe algumas hipóteses de que talvez, a Miharu a alimentasse todos os dias, por isso as constantes viagens na plataforma. Porém, existem certas regras que se aplicam às celas, duas delas são: em cada nível há pelo menos 2 presos; é proíbido manter qualquer alimento na cela após a descida da plataforma. Diante disso, vemos que algumas peças não se encaixam, já que há somente 1 pessoa na cela (e nenhum cadáver), e mesmo mantendo a panna cotta, não houve nenhuma alteração na temperatura.

Faria sentido existir uma cela assim? Somente 1 cela diferente das 332, por quê? Chegamos a conclusão de que a garota, na verdade, era parte da ilusão do Goreng. Olha só, pensa comigo: ele idealizou que era o Messias, recrutou um escudeiro e lutou bravamente por 333 níveis para salvar uma...... panna cotta. Nada heroico, né? Porém, seria muito mais honroso salvar a vida de uma criança, certo?

Confunde também, o fato de o Barahat ter visto a garota, porém, ele aparece para o Goreng em forma de guia. O que nos leva a entender que Barahat morreu antes, já que todos os guias que o Goreng via estavam mortos.

Ainda não está convencido? Vem cá dar uma olhada nessa cena:

Pana cotta com fio de cabelo

Essa cena é incrível por ser tão imperceptível, já que ela aparece dessincronizada. Reparem que, se fosse somente para retratar a impecabilidade com que era feito os pratos, o roteirista poderia ter escolhido qualquer uma das dezenas de guloseimas, certo? Por que ele escolheria justamente a bendita pana cotta?

Concluimos que a pana cotta foi enviada, assim descarta a existência da garota. Ademais, a "mensagem" não alcançou as expectativas de Goreng, na verdade, foi totalmente o oposto. O contraste. Nesse mundo não há espaço para idealistas, nem para heroismo ou romances de cavalaria. Essa cena contrapõe o idealismo do Goreng e a realidade do mundo atual (do filme). Exatamente como acontece na obra de Dom Quixote.

Cena final

Diante disso, creio que seja óbvio que o Goreng morreu. A questão é: quando ele morreu? Acredito que tenha sido quando leu o livro pela última vez. Goreng lê o seguinte trecho:

"O grande que for vicioso, será um grande vicioso, e o rico não generoso será um avarento mendigo, que ao possuidor das riquezas não o faz feliz possuí-las, mas sim despendê-las, e não ao gastá-las como quiser, mas saber empregá-las bem" -Dom Quixote.

Novamente, o filme usa a obra de Cervantes para repassar uma mensagem, e talvez a mais importante. O trecho acima fala sobre virtudes, riquezas e liberalidades - qualidade ou condição de liberal ('generoso, pródigo'); disposição daquele que, em seus atos ou em suas intenções, dá o que não tem obrigação de dar e sem esperanças de receber nada em troca.

Eis aqui um resumido final de Dom Quixote:

No final da narrativa, quando perde um duelo e é forçado a deixar a cavalaria, o protagonista fica deprimido e doente. Nesse momento, recupera a consciência, percebendo que nunca foi um cavaleiro andante.

Sendo assim, é válido concluir que Goreng finalmente entende que não existe um Messias, um heroi e nem uma mensagem. Quando Trigamasi diz "sua jornada terminou, meu caramujo", logo depois ocorre um diálogo como se o Trigamasi estivesse tentando convencer o Goreng de que realmente a ilusão dele chegou ao fim. E ele aceita, sai da plataforma e vai embora. Como no final de Dom Quixote: recupera a consciência, percebendo que nunca foi um cavaleiro andante.

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