Foi como tomar um forte soco no estomâgo.
Minha respiração ficou descompassada, perdi o controle do meu corpo,dos meus sentimentos e percebi que desde que cheguei naquele lugar, perdi também o da minha vida.
Rick havia me entregado o machado, o apertei firme entre meus dedos e quando me direcionei aos malditos que estavam à alguns metros de distância de mim e dos outros, minha mente me sabotou.
O momento exigia de mim coragem,força. Mas as lembranças me vieram a tona, me deixando novamente paralizada, frágil e vulnerável.
Queria que naquele momento, as pessoas que eu tanto amei e me motivaram a continuar estivessem vivas, inteiras comigo.
Mas aqueles desgraçados acabaram com isso, em suas mãos sujas e cobertas pelo sangue seco estava o motivo de meu ódio e de minha dor.
O crânio amassado de Charlie, resultado das batidas contra o concreto. Algumas gotas do líquido escarlate ainda pingavam no chão, seus olhos em um tom azul acinzentado estavam abertos, e era como se estivessem me encarando. Clamando por socorro, por misericórdia, pela sua vida novamente.
Mey, ela também estava ali.
Ou melhor, parte dela. Sua cabeça, seus cabelos grisalhos desgrenhados e endurecidos pelo sangue que o manchara, que escorria do que ainda sobrou.
Eu quis gritar, quis correr, quis me ajoelhar ali e me entregar ao sofrimento que aquilo me causou, quis que as lágrimas tirassem de mim tudo de ruim que eu estava sentindo, toda a culpa, toda a dor e toda aquela situação que a cada instante se tornava mais dura e árdua.
- Sarah? Você precisa se preparar. Porra, eles estão vindo. - Rick me balançou, tentando me fazer reagir e me fazer tomar alguma atitude.
Não, eu não consegui.
- Ok, entrem no carro logo crianças. Se seus pai souberem que eu vou levá-los para assistir O massacre da serra elétrica quem será massacrada sou eu. - murmurou Mey, como se nos contasse um segredo. Um sorriso estava em seu rosto, ela tinha um jeito leve. Capaz de contagiar qualquer pessoa.
Eu e Charlie apenas a seguimos, adorávamos estar com ela, conversar. Ela era divertida, fazia de qualquer passeio o melhor.
- Vocês já assistiram algum filme do gênero? Quero dizer, com mortes explícitas e psicopatas deformados?
- Sarah tem quatorze anos e eu tenho dez tia Mey, não somos mais crianças. Claro que já assistimos. - retrucou Charlie, seguro do que estava falando, com um ar superior.
- Mentiroso, você morre de medo. Sempre diz que se assistir terá pesadelos, não banque o garoto valente. - revirei os olhos e sorri ao ver o descontentamento em seu rosto pálido.
- Não seja má Sarah. - Mey deu uma risadinha discreta. - É normal sentir medo. Mas claro, como o Charlie disse ele não é mais uma criança. É um homem de dez anos, precisamos respeitá-lo! - a ironia em sua voz desfez até a cara emburrada de meu irmão.
- Eu não tenho medo tá? Só receio.
- E não é a mesma coisa? - indaguei fitando suas bochechas, elas estavam coradas.
- Medo é algo muito pessoal pequena Sarah, todos nós temos algum e isso é tão comum quanto respirar. - ela olhou para nós, sua voz estava calma. - Mas ele nos priva de muitas coisas também, precisamos nos libertar e enfrentá-lo, por isso quero que assistam o filme, principalmente você Charlie. Pode parecer até mesmo bobo o que eu estou falando, mas de pequenas coisas podemos tirar grandes lições.
Quero dizer, há muito para aprender. - Mey coçou a cabeça por um instante, tentando formular outra frase. - Existem muitas coisas ruins no mundo, elas estão por todo o canto. A maldade existe e sinceramente, pode ser que um dia vocês a encontrem. Eu rezo todos os dias para que isso não aconteça, que vocês estejam sempre seguros e protegidos, porém é preciso que vocês saibam disso. Se algo que os assuste e machuque cruze seus caminhos, enfrente isso. Qualquer um é capaz de vencer, de se fortalecer e enfrentar o que teme, basta acreditar que existe um significado por trás de tudo.
Mey estava certa.
Anos haviam se passado, e eu não os veria mais, nem viveria momentos como aquele com eles, mas eu precisava de forças para continuar. Para lutar, para vingá-los, para acabar com toda essa merda.
Encarei os palhaços com um ódio tão grande que seria capaz de queimá-los vivos.
Eles me fitavam com um sorriso infame, enquanto dois deles ainda estavam com a cabeça de Charlie e Mey nas mãos.
- O que fazem aí parados? Não vieram para nos matar? O façam! - arrastei o machado pelo piso liso da loja, o arranhando e causando um barulho estridente.
- O que está fazendo Sarah? Eles são muitos, precisamos de um plano se não quisermos morrer!
Olhei para Rachel de soslaio e senti um meio sorriso brotar em meus lábios.
- Não Rachel, são eles quem precisam de um plano. Vamos acabar com eles, com todos! Esses desgraçados mexeram com as pessoas erradas, e a morte será o preço que pagaram por isso.
A ruiva, Dylan e Josh formaram uma linha reta cobrindo a entrada do local, caminhei até o centro e assenti com a cabeça para eles.
- Não é a primeira vez que fazemos isso, e nem vai ser a última. Por favor, fiquem vivos!
- Vamos ficar.
O grupo dos internos nos observava, pareciam estar nos analisando. Estudando a melhor forma de nos atacar, aparentemente, eram mais ardilosos que os que haviamos enfrentado antes.
Apesar de sentir minha espinha gelar ao me dar conta da quantidade deles, eu estava convicta.
Eles não iriam mais machucar ninguém.
- Se os esperarmos começar algo ficaremos encurralados. Teremos certa vantagem se os enfrentarmos primeiro! - murmurou Rick.
Dylan e Rachel estavam com grandes facões, não sei aonde conseguiram mas seriam de grande ajuda. São bem mais práticos de usar.
- Não podemos vacilar aqui. - fiz a eles um sinal para avançar, então os guiei.
Suas armas eram diferentes, tacos de beisebol envoltos com arame farpado, machados maiores que o meu, e grossas barras de ferro.
Fui pega de surpresa ao ouvir um zunido, algo como uma motosserra, era um barulho estridente.
- Porra, a gente tá fodido. - balbuciou Dylan ao avistar o interno com tinta escorrendo pelo rosto, manuseando a serra elétrica ao se aproximar.
O barulho, o calor, os movimentos rápidos dele.
Sua agilidade era impressionante, era fugaz e amedrontadora, e me tinha como alvo.
Fiz um sinal para que Rick e os outros se afastassem, e sussurrei para mim mesma.
" Eu cuido desse "
Avançava sobre mim, investia em ataques velozes e em meus pontos vitais.
Senti o vento gélido causado pela serra atingir minha pele, ecoava em minha mente, ecoava pelo local, e naquele momento senti uma adrenalina intensa invadir minhas veias.
- Agora sei porque Phill te quer tanto, você luta bem boneca. - ele exibiu os dentes de uma maneira repulsiva, aquilo não era um sorriso. - Mas não por muito tempo.
Meus sentidos se aguçaram e em um descuido bobo, cai próxima aos pés do maldito.
Em uma luta pela minha vida, vi a serra barulhenta e afiada cortar minha pele. Aquilo era um presságio?
Não, definitivamente aquilo não aconteceria.
Tateei o chão à procura de meu machado, com minha queda ele escapou de minhas mãos.
O interno pressionava minha barriga com o pé, me impedindo de levantar e por alguns minutos, e também de respirar.
Ao alcançar minha arma, a segurei forte e me mantive firme, mirando no único lugar onde eu seria capaz de acertar naquele momento: em sua perna.
- Você acha mesmo que vai acabar comigo? - gritei, acertando o aço grosso em sua coxa, sentindo seu sangue espirrar em minha face. - Hoje não.
Em um movimento repentino e desesperado, ele largou a serra, a deixando cair próxima a minha cabeça, acertando os pés de um de seus colegas.
Ao ver sua brecha o empurrei abruptamente, vendo seu corpo pousar de forma violenta sobre o chão.
Ele não gritou, mas em seu rosto a dor estava estampada. Suor escorria de sua testa e com os dentes cerrados, ele tentava inutilmente estancar o sangue.
A carne vermelha e viva me deixou instigada, seu estado era deplorável.
Seu corpo se contraia e de seus lábios gemidos de dor escapavam.
Levantei-me sem hesitar, a serra ainda ligada agora estava em minhas mãos.
- Espero que encontre seus amigos no inferno. - com as mãos trêmulas de excitação, ergui o objeto motorizado e em seguida, o corpo do interno sentiu seu impacto.
Fiz um corte limpo, dividindo a cabeça do restante de seu corpo. O barulho de ossos sendo serrados e o liquído escarlate viscoso formando uma imensa poça no chão me lembrou que aquilo só estava começando.
Os olhos brilhantes dos outros palhaços fitavam o chão, estavam ludibriados.
- Gostaram? É a vez de vocês agora.
Esqueci meu machado, o deixei no chão. Com a motossera matá-los seria bem mais divertido.
Pressionei o acelerador, liberei o freio e os encarei. Eu estava pronta para outra.
Ao invés de recuarem, eles caminharam em minha direção.
Conseguia sentir o cheiro de suas carnes sendo rasgadas logo após o corte, o piso da loja já não estava branco. O tom de vermelho vivo coloria toda sua extensão.
No êxtase do momento, vi tudo a minha volta girar. Algo sólido acertou minha cabeça, e não demorou muito para que eu sentisse o líquido quente escorrer pela minha nuca.
Minhas pernas fraquejaram e tudo se escureceu.
Antes de cair no chão ensanguentado, uma voz grave se tornou audível:
" Leve-a de volta, ela nunca devia ter saído do circo. "
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Me desculpem pela demora para postar, eu estive trabalhando muito nesse capítulo. Então espero do fundo do meu coração que vocês gostem! ❤
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