Anos depois
- Não toca no meu irmão - Esbravejo ao afastar a mulher de perto do Treton. Seus olhos revelam fúria mas pouco me importa, prometi a mamãe que cuidaria dele
- Você deveria não se intrometer, Leonard - Diz ela mostrando o cinto para mim - Estou educando vocês como seu pai iria querer
- Casey está morto, tia - Respondo sentindo toda a dor em minhas palavras - E você não é ele
Sinto o calor tocar em meu rosto quando a mesma acerta um tapa. Travo meus instintos em reagir, não irei bater em uma mulher, não igual a ele
- Os dois já para o quarto - Grita ela. Olho para Treton que me encara entristecido - E não terão comida hoje como castigo
Corey é umas das irmãs do meu pai, assim como ele e toda sua árvore genealógica podre, Corey é uma maluca e talvez ela e seu marido sejam piores que meu pai. A obedeço com raiva mas vou para meu quarto junto a Treton
A justiça não quis deixar morar com nossa avó por parte de mãe, por simplesmente achar que a família do meu pai é melhor por ser rica. Isso me enoja, e ninguém acreditou na minha verdade e tomaram a minha mãe de mim e de Treton
Talvez isso fosse um castigo por ter matado a Cassy e o bebê, mas Treton não tem culpa de nada disso, e no dia que minha mãe foi presa ela me fez prometer que ninguém jamais iria maltratar meu irmão
Entro no quarto me deparando com Treton cheio das marcas do cinto em suas costas. Meu peito dói, eliminei Casey das nossas vidas para evitar dor e arrumei pessoas piores
- Você não precisava ter me defendido, Travis - Diz Treton baixinho. Fecho a porta do quarto e sigo para minha cama - Ao menos iria comer
- E ela não deveria bater em você - Respondo indo para o guarda roupa mofado que ela disse para usarmos ao invés do closet que é para seus convidados - Ela não é sua mãe
O som ensurdecedor começa mais uma vez, Treton e eu somos proibidos de participarem das festas que ela faz com todos os vizinhos e amigos, de acordo com ela somos umas pestes e dois frutos podres da minha mãe. Aliso meu rosto sentindo a minha barba crescer, era essa fase que minha mãe dizia que eu iria ter que virar homenzinho
Tentei fechar meus olhos para descansar, pensamentos me impossibilitam, deveria estar cuidando de Treton e não deixando ele sofrer na mão de mais ninguém
É péssimo ser um nada, queria poder salvar meu irmão e livrar nossas peles mas nem sei o que posso fazer. Meus olhos avaliam Treton que encobre seu rosto, e escuto ele sussurrar baixinho
Automaticamente meu peito dói, todas as noites ele chora, e eu não posso fazer nada. Levanto da cama e me deito ao seu lado
- Trent - Ele nem se mexe - Não chora, você é um Blake, lembra?
- Não estou chorando - Falha miseravelmente na tentativa de limpar o rosto e me controlo para não rir dele - Quero ir embora daqui, Travis
- Você sabe que isso é impossível para nós dois - Respondo olhando para o teto mofado do quarto - A gente vai ter que viver assim até a mamãe sair da cadeia
- Achei que você era mais forte, Travis - Diz ele se remexendo ao meu lado - Você me prometeu que ia tirar a gente dessa
Engulo seco. Meus dedos ficam ajeitados perfurando uns aos outros, deveria mesmo tirar nós dois dessa vida e não ter piorado ela. Fico preso dentro da minha mente por alguns momentos, quando volto a realidade Treton já está dormindo
Cassy não iria gostar que eu me prendesse a essa vida, ela era forte por mim, e preciso ser forte por Treton. Saio da cama do garoto e vou em direção a minha cama procurando embaixo a minha velha caixa de sapatos
Abro a mesma e retiro os papéis que escondem uma grana que consegui em brigas de ruas. Desde que me mudei para esse lugar e quebrei os dentes de um garoto que fazia bullying com Treton comecei a me envolver em lutas clandestinas por causa de um cara que me chamou
Demoro uns minutos para contar todo o dinheiro, tenho cerca de mil e duzentos dólares, creio que é o suficiente para sobreviver por alguns dias. Escondo novamente meu dinheiro, olho para Treton que dorme calmamente
O caminho que pretendo tomar não vai ser fácil, mas é melhor do que viver essa vida fodida. Deito na minha cama, e agora devo esperar o tempo certo para ir embora daqui
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Quase duas da manhã, e o silêncio reina na casa. Esperei o tempo necessário para que os convidados fossem embora e a tia dormisse. Visto minha jaqueta de couro e uma roupa que me esquente durante o frio, arrumo minha mochila com poucas roupas para conseguir sobreviver o necessário lá fora
O medo ainda permanece presente dentro de mim, mas pretendo que morra assim que eu sair dessa casa e me livrar dessa parte amaldiçoada da família do Casey
- Trent, acorda! - Balanço o garoto e antes que fale alto, ponho minha mão sobre sua boca - Silêncio, por favor
Seus olhos arregalados avaliam todo o momento mas logo ele assente com a cabeça posso então tirar minha mão da sua boca
- Vamos embora daqui, irmão - Sussurro, ele passa as mãos nos olhos diversas vezes tentando acordar - Levanta, e pega o necessário - Olho para o relógio na parede - Seja rápido
Treton concorda com a cabeça levantando da cama e indo direto para sua mochila da escola tirando tudo de dentro dela. Puxo a caixa de sapatos jogando os papéis de lado e retirando todo o dinheiro e escondendo dentro da minha velha jaqueta de couro
- Eu também tenho isso - Treton aparece atrás de mim com um maço de dinheiro
- Onde conseguiu isso? - Indago com certo espanto
- Tenho meus meios, Trevoso - Diz ele rindo - Agora pega logo e vamos dar o fora daqui
Guardo seu dinheiro junto ao meu. Treton pega as nossas bolsas e seguimos lentamente para fora do quarto. Lembro de algumas coisas que a Corey tomou da minha casa quando minha mãe foi presa
- Treton, pega algumas coisas pra gente comer - Aviso ao mesmo que assente - Vou pegar algumas coisas nossas de volta
- Não é uma boa ideia - Diz o garoto sério. Dou de ombros
- O que estamos fazendo já não é uma boa idéia, Treton - Respondo com um sorriso - Vou pegar coisas que são nossas por direito
Deixo o garoto sozinho que segue em direção a cozinha, subo as escadas novamente indo para o quarto onde Corey guarda as jóias da minha mãe, ela não tinha direito de pegar nada dela
Meus olhos visitam o do quarto da Corey que dorme com um cara desconhecido. Penso de imediato em seu esposo que deve estar trabalhando, apesar de tudo, ele não é ruim e sempre tenta ajudar Treton e eu
Penso em ajudar o homem mas decido não me intrometer, posso acabar jogando meus planos pela privada. Continuo a caminhar para o quarto da riqueza - como Corey chama - meu coração pulsa assim que o ranger da porta aumenta
Olho para os lados e agradeço a Deus por Corey ter sono pesado. Deslizo pela pequena brecha do quarto e sigo diretamente para a cômoda onde vi ela esconder as jóias da minha mãe
Tento abrir a mesma mas é necessário ter a chave do mesmo. Merda, Corey. Fecho a porta do quarto e vou na direção do armarinho no canto da parede, o marido de Corey guarda algumas chaves de fenda por ali
Escolho uma que encaixe na beirada da gaveta para que eu possa quebra-lá, e assim prossigo com meu plano. Na primeira tentativa falho machucando meu braço, resmungo por conta da dor e decido tentar outra vez quebrando a chave de fenda
- Mas que merda - Resmungo jogando longe o que restou da chave de fenda. Treton esta certo, é melhor deixar quieto
Sento no chão e levo as mãos a cabeça sentindo meu braço doer. É da minha mãe e não irei deixar ela acabar com a única coisa que me faz sentir que ela esta perto
Talvez eu vá fazer a coisa mais imbecil do mundo mas é a única maneira de não deixar que as coisas da minha mãe sejam vendidas como se não fossem nada
Levanto do chão colocando um estofado velho a trás da porta logo depois de tranca-la de novo e volto novamente para o armarinho procurando algo forte o suficiente para destruir o mesmo. Encontro um machado, é mais do que suficiente
Preciso ser rápido e prático pra pegar o que é meu e dar o fora daqui. Jogo tudo que esta sobre a cômoda no chão, e aproximo lentamente o machado para ter certeza de que irei dar uma pancada certeira
Respiro fundo contando os segundos mentalmente preparado para destruir a cômoda. Utilizando minha força acerto bem no meio da cômoda que faz um barulho estrondoso no quarto, meto minhas mãos entre a madeira que as corta retirando algumas jóias e principalmente o broche da Cassy e o pingente dela de uma rosa
As lembranças das rosas que Cassy carregava nas mãos quando o tiro a acertou me entristece, ela amava rosas e morreu com elas. Passo a mão no rosto que esta ensanguentada mas não dou importância, escondo as jóias dentro do bolso da calça e no espaço que encontro no bolso da jaqueta
Posso ouvir a Corey gritando por conta do barulho. Corro para a janela e vejo que Treton cuidou de colocar a escada para mim. Noto a agonia do garoto que esta andando de um lado a outro
- Trent, estou aqui - Grito para ele que ergue as duas mochilas e mostra uma sacola do seu lado. Corey começa a bater fortemente na porta, me apresso para descer as escadas evitando ser pego em flagrante
Tento descer o mais rápido possível mas quando vejo Corey esta na janela gritando meu nome e xingando todas as palavras mais terríveis que já escutei
- Leonard, é melhor você voltar - Grita a mesma ameaçando derrubar as escadas. Treton grita alguma coisa de volta e antes que eu raciocine Corey empurra a escada para trás
Respiro fundo vendo que minha única chance é pular, e assim a faço. Minhas pernas me apoiam na queda, Treton corre na minha direção e me olha assustado
- Gatos caem de pé, maninho - Sorrio e ele revira a cara, puxo o mesmo e aponto meu dedo do meio para Corey - Vadia
- Vamos dar o fora daqui, Travis - Treton joga uma das mochilas pra mim e a coloco nas costas pegando a sacola e correndo pela rua na tentativa de fugir da Corey e seus vizinhos de merda
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- Entra, garoto - Diz Mike puxando Treton e eu para dentro da sua casa. Minhas mãos e minha perna direita estão doendo pra caramba - O que vocês dois fazem na rua a essa hora?
- Você sabe muito bem, Mike - Respondo ele apontando meu rosto para a televisão. Consegui me esconder com Treton por algumas horas mas não dá pra cuidar dele fodido como eu estou - Preciso daquele emprego
Mike nos encara sério por alguns minutos. Ele é um dos maiores traficantes da Califórnia, e o único que me ajudou em muita coisa, inclusive com a fome que passávamos na casa da Corey
- Desse jeito aí você não vai me servir pra nada, garoto Blake - Diz ele indo até sua cozinha - Mas vou te ajudar e então você pode trabalhar pra mim
Ele retorna da cozinha com um dos seus cigarros na mão. Preciso entrar nessa, nem que seja temporário para poder cuidar do meu irmão
- Toma, Blake - Estende o cigarro na minha direção - É maconha das boas, garoto - Olho para o mesmo meio assustado com isso - Vai melhorar sua dor
Penso em negar esse cigarro, nunca coloquei substância ilícita alguma na boca mas agora preciso desse emprego e preciso que Mike confie em mim. Seguro o cigarro como já vi fazendo na televisão e mesmo não tendo prática evito tossir com a fumaça
- Isso aí, garoto - Mike bate no meu ombro - Vamos dar um jeito nesses machucados e logo você vai estar novo em folha
Mike pega o seu celular e demora alguns segundos digitando para alguém. Em seguida oferece o cigarro para Treton que me olha sem entender nada
- Ele não - Aviso a Mike que concorda com a cabeça - É meu irmão caçula
Não demora muito para que uma galera entre na casa dele e começa a mexer na minha perna e nas minhas mãos. Mike levou Treton para um dos quartos da casa e passou boa parte daquele dia conversando comigo e explicando como as coisas iriam funcionar
Os dias se passam, meus ferimentos não demoraram para cicatrizar e aos poucos Mike me ensinava algumas coisas. Lembro bem de como ficou surpreso quando me viu atirar, e o quão difícil foi para mim
Lembrar do dia que usei a arma pela primeira vez e também de como pensei que jamais a usaria de novo quando a usei para matar Casey e por acidente matei Cassy e o bebê
- Pra onde estamos indo? - Indaga Treton quase caindo na floresta. Dou risada do desastre que esse garoto é
- Vamos dar um passeio de irmãos - Respondo ajeitando a mochila nas costas - Mike me deu uma folga e acho que precisamos conversar
Treton me olha confuso, suspiro pesadamente olhando em volta atrás de um bom lugar para ensinar o garoto a atirar. Ele sempre quis fazer parte da gangue e não custa nada deixar ele aprender a ser um de nós
- Que milagre foi esse do Mike te dar uma folga? - Pergunta rindo - Você é a Trevosa dele, seu braço direito
- Esta na hora de ter mais um Blake no trabalho, Treton - Encosto em uma das pedras do riacho jogando a bolsa no chão - Mas para isso você tem que saber atirar
Abro a bolsa para Treton que escolha uma das minhas armas. Puxo um cigarro da minha jaqueta de couro junto com o isqueiro e levo a boca acendendo o mesmo
- Escolhe ai, tenho coisas para fazer hoje ainda - Treton agacha metendo a mão na minha bolsa e escolhe a velha escopeta
- Acho que essa aqui é boa pra começar - Diz ele tentando segurar a mesma me fazendo rir
- Coloca essa daí de volta, Treton - Gargalho e ele fica com sua cara de retardado. Termino de tragar meu cigarro e retiro da bolsa a minha Taurus - Usa essa cabeção, é menor e mais fácil
Jogo na direção dele que consegue aos poucos apoiar a arma entre seus dedos. Levanto tirando a sujeira da minha roupa e jogando o que sobrou do cigarro para longe
- Atirar é questão de ódio ou defesa - Pego a escopeta e atiro logo atrás de Treton fazendo o garoto se tremer - É assim que você deve fazer, ser prático e rápido, pensa em alguém que você odeia pra caralho e imagina que esteja bem na sua frente e aperta o gatilho
- Tipo assim? - O garoto mira na pedra do outro lado do riacho e antes de apertar o gatilho segura a arma com duas mãos errando o tiro
- É, tipo isso - Falo ajudando o mesmo em como deve se apoiar - Só tenha firmeza e certeza do que quer, Trent, ai você consegue com êxito
Deixo Treton praticar o suficiente enquanto o observo, ele é cabeça dura e chato pra caralho mas é um mini gênio. Olho para o lado assim que ouço um barulho estranho, um cervo passa correndo por nós dois, Treton se assusta e atira na minha direção
- Seu filho da puta - Grito assim que tento desviar mas a bala acaba cravada bem no meu braço esquerdo. Treton fica pálido no mesmo instante e deixa a arma cair no chão - Não fica ai parado, porra, pega essas merdas e vamos dar o fora
- Puta merda, Travis - Diz ele passando a mão na cabeça - Me desculpa - Ele tira sua camiseta e enrola no meu braço e pressiono a mesma pra tentar estancar o sangue
- Só anda, garoto - Reclamo e ando em direção ao carro - A chave esta na bolsa, pega ai e vamos pra casa do Mike resolver essa merda
Não demora muito para que o garoto guarde a bolsa no porta malas. Ele abre a porta do carro pra mim e depois entra no banco do motorista
Do nada Treton começa a rir enquanto dirige o carro. Encaro o garoto sem entender nada
- Esta vendo graça onde, porra? - Pergunto com raiva. Treton gargalha ainda mais alto. Acerto o mesmo com um tapa na cabeça
- Não me diga que é proibido rir - Diz ele controlando sua risada - Você gritou de um jeito tão fino que eu acho que nenhum cantor ou cantora alcançou esse tom
- Hahaha, nossa engraçadinho - Forço um sorriso falso - Se você não parar de rir, vou fazer você alcançar o grito de dor mais alto da história
Mike se juntou a Treton para rir da minha cara enquanto um dos caras estava tirando a bala do meu braço, por sorte não atingiu nenhum nervo e nem houve hemorragia
Assim que o procedimento termina, olho para meu braço enfaixado pensando no passado, teve uma vez que minha mãe apareceu com o braço quebrado em casa, não sabia o que era aquilo tinha meus seis anos e achava legal ter gesso no braço. Hoje entendo que foi aquele miserável que fez aquilo com ela, minha mãe é uma guerreira e até hoje faz e fez o que pode pelos filhos mesmo sendo eu o pior filho do mundo
- Derek está esperando você lá no estúdio de tatuagens - Mike diz batendo na parede - Você e o atirador
- Quero Treton longe de mim - Brinco e ele ri - Aquele garoto quer é me matar
- É quem sabe - Diz Mike rindo - Irmãos sempre se matam mesmo
No estúdio, Treton está ansioso e eu permaneço com raiva dele. Os outros capangas de Mike também vão fazer tatuagens e Mike saiu com uma de suas garotas
- Vai fazer quais tatuagens? - Treton senta do meu lado
- Uma rosa negra em homenagem a Cassy e a mamãe - Respondo a ele, ajeito meu braço para que não fique doendo
- Porquê uma rosa negra? - Ele para pensativo. Suspiro pesadamente tentando pensar em algo correto para dizer a Treton
- As duas amam rosas, sem contar que existe simbologia nessa tatuagem - Minha mente viaja em diversos momentos da minha vida - Rosas são bonitas, Treton, mas tem espinhos e podem ferir, apodrecem e morrem, então não importa onde a rosa nascer ou estiver, ela sempre vai voltar para a escuridão
Escolhi a rosa também por conta da família que éramos, para a sociedade éramos a família mais perfeita do universo, mas só quem morava lá dentro sabia dos espinhos e de como essa 'rosa' apodrecia, tanto que morreram