SICK. - 3 Caminhos Cruzados

By MukeCakesauce

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| História premiada por um Watty 2015 na categoria de Melhor Fanfiction | Primeiro volume da trilogia SICK... More

Prefácio + Roxo
Coincidências
Surpresa no relvado
Um carvalho e um banco de madeira
À beira-mar
Lareira a crepitar
Novo e reluzente
Por causa de um beijo
Às cegas
Uma proposta
Estabilidade
Confiança perdida
Doce acidente
O luar
O tempo
Calum Hood
Flocos de neve escorregadios
Uma noite diferente
Um ato de bravura
Escura tentação
Luzes brancas desconfortáveis
Contar até dez
Estaca zero
Não é o que parece
Bela efemeridade
Rivalidades
Um diabo em cada ombro
Desentendimentos amorosos
Revolta
Um desfecho inesperado
Beleza perigosa
Tesouras e longos suspiros
Conversas alheias
Tintas e punhos sangrentos
Agridoce
Sozinhos
Labirinto de emoções
Bilhetes anónimos
Crueldade
Quem será o primeiro a partir?
Irreconhecível
Fotografias e paranoia
Acidentes e enganos
Três longos minutos
Velhos hábitos
Ódio próprio
Panquecas e fugas
Plano B
Sustos a dobrar
Um quarto sem janelas
Muito doente
Adeus
Uma cama pressagiada
Ninho desfeito e um peixe
Respiração hipnótica
Fósforos e pontes
Novinho em folha
A última gota
Desnorteamento
Realidade inescapável
Vida airada
Bolos recheados de adrenalina
Ondas de más notícias
Nova chama de esperança
Acorrentada à sua ausência
Ilusões
Ciclos
Remorsos
Arrependimentos
Um lugar escuro
Último raio de sol
Epílogo - Ossos frios
Nota de edição
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um humilde trailer
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Agradecimentos

Eternidade

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By MukeCakesauce

India

Eram momentos como aquele que pretendia gravar na minha memória para toda a eternidade: eu e ele, sentados no seu quarto rodeados por nada a não ser pela nossa própria companhia. Não existiam palavras no mundo inteiro que servissem para expressar o quão grata estava por finalmente as coisas terem voltado ao seu rumo normal, algo que nunca deveria ter mudado, se me perguntarem. Aprendi a apreciar cada momento em que os nossos olhares se trocavam ou até como a sua pele se arrepiava com o meu afeto e, por mais mundano que fosse, não havia nada nem ninguém capaz de arruinar esses breves, mas preciosos segundos. Não era capaz de lidar comigo mesma ao relembrar-me que eu tinha sido – e poderia voltar a ser – uma fonte de angústia e de dor para ele. Queria-o muito bem assim: pacífico, feliz e, acima de tudo, de volta para mim. Era algo que nunca havia experienciado antes, mas estava mais do que pronta para explorar cada recanto dessa nova realidade ao seu lado.

— Em que estás a pensar?

Fui interrompida dos meus pensamentos ao ouvir a sua voz aveludada. Sem ter a certeza por onde começar, limitei-me a sorrir. Infelizmente, não tinha nascido com o dom da palavra, temendo, assim, diminuir a imensidão dos meus sentimentos se ousasse explicar as emoções ao rubro.

— Podes continuar, se não te importares. — O seu sorriso tímido formou-se e não consegui conter o meu riso perante a sua atitude.

Tal como pediu, entrelacei os meus dedos gelados nos seus fios de cabelo dourados, acariciando-o. Tinha descoberto recentemente que algo tão simples quanto um carinho assim era, para ele, uma das melhores coisas do mundo. Isso e pizza, claro.

— Dentro de pouco preciso de ir.

— Relembra-me outra vez por que tens de ir até lá? — O rapaz, outrora deitado ao meu lado, sentou-se. Tentei não rir pelo seu cabelo desgrenhado.

— Eu já te expliquei antes. Já foi combinado antes e, para além disso, não perco nada em ir.

— Tens razão...

Tinha sido agendado pelos meus pais mais uma visita a um novo médico. Com tanta insatisfação e frustração pelo último diagnóstico, a minha mãe não descansou até conseguir uma nova consulta. Não era algo que me deixasse repleta de entusiasmo, mesmo que percebesse que era para o meu bem – uma frase que comecei a ouvir hora após hora. Os dias lá em casa começaram a ser sufocantes, muito pior do que já eram. Para além de ser vigiada a cada refeição e a cada comprimido tomado, tinha passado a ser um tema de conversa das horas do café e encontros entre a minha mãe e as suas amigas. Houve alturas em que não o levava a mal, especialmente nos primeiros tempos, mas a partir do momento em que os meus problemas serviram para tornar o seu tempo juntas mais interessante...

Sinto urticária só de o imaginar.

— Sempre podes levar-me? — interroguei à procura do outro par do meu sapato.

— Já disse que não havia problema em levar-te até à clínica. — As chaves do carro balançavam nos seus dedos. — Desde que me deixes esperar por ti.

Bufei pela sua insistência e evitei olhar para ele por já saber que resistir-lhe era uma tarefa difícil. Em vez disso, segui até à porta de casa, pronta para ir.

— India — chamou-me, seguindo-me. — O que aconteceu à nossa conversa sobre-me deixares entrar e estar presente?

Cerrei os olhos ao ouvir as palavras que já temia. Ele tinha razão e sabia disso. Não era a minha intenção voltar atrás na minha palavra, não depois de tudo o que construímos ao longo destes longos meses, mas não podia mentir sobre esperar que o seu esquecimento colaborasse comigo.

— Eu já te expliquei o porquê de preferir ir sozinha. — Voltei-me de braços cruzados. — Lido melhor com as notícias quando estou cara a cara com o médico no gabinete.

— Eu só vou ficar à tua espera no corredor – rematou com um sorriso convencido. — Isso não me podes negar.

Desprovida de contra-argumentos, deixei que me abraçasse. A verdade é que eu ansiava pela sua companhia e pelo seu conforto mal os meus pés levavam-me para fora de qualquer hospital. Decidi ignorar a pequena voz na minha cabeça que me ameaçava chamar egoísta e, pela primeira vez, abandonei a minha resistência.

— Está bem, pode ser — desisti, descansando a minha cabeça sobre o seu peito. — Mas é só desta vez!

Ele riu perante o meu dedo quase nos seus olhos e segurou-me pela mão, guiando-me até ao seu carro. Já estava habituada àquilo: passar o dia imersa na sua companhia, observar cada detalhe seu e gastar a pouca energia que me restava em fazê-lo feliz. Com ele, todos aqueles meses de espera pareceram tão descomplicados e rápidos que, por momentos, esqueci-me da ansiedade que outrora me perseguiu dias e noites. Gargalhei ao ouvir os familiares acordes e vozes do velho álbum dos Mayday Parade apoderar-se dos nossos ouvidos. Sorri pela maneira como ele murmurava todas as letras de cada música e batucava com os dedos no volante ao ritmo da melodia. Era bom ter essas pequenas coisas para focar a minha atenção ao invés de desgastar-me em nervos até ver o letreiro da clínica ao fim da rua. Tal como foi combinado entre o hospital, ao fim de um tempo, teria de voltar a repetir os exames para análise, sendo aquela tarde o derradeiro momento de resultados. Foi curioso como houve dias em que não chegava a rezar para que o tempo passasse mais depressa – tal era a ânsia – mas quando o dia finalmente se avizinhou, dei por mim a evitar acordar sequer. Não soube ao certo que expectativas seriam realistas para a ocasião, especialmente por não ter a capacidade de apontar grandes melhorias no meu estado de saúde. Por um lado, reconhecia como o meu corpo parecia mais resistente, mas, por outro, desanimava ao aperceber-me do peso que ia perdendo misteriosamente. Assim sendo, resolvi que o mais sensato seria descartar qualquer expectativa e estar aberta para o que desse e viesse. Quem sabe? Ainda poderia dar a volta a tudo.

— Estás a usá-lo. — Michael comentou ao desviar a atenção da estrada para me encarar.

O seu sorriso era contagiante e as familiares borboletas surgiram ao rememorar o pequeno colar por ele oferecido.

— Claro que sim — assegurei-o, acariciando o pequeno pendente suspenso no fio de prata. — Foi o melhor presente que recebi.

O colar era simplesmente belo e delicado, decorado com um pequeno globo em tons dourados. "Para nunca perderes essa tua vontade de voar e descobrir o mundo. Quem sabe ainda o fazemos juntos?", disse Michael depois de me ter ajudado a pôr o colar ao pescoço. Nessa noite, no meio de tanta confusão e de desentendimentos, estava longe de mim imaginar que ele tivesse algo planeado para mim. Para além de ter estado comovida pelo seu gesto, tinha-me prometido que o globo jamais deixaria o meu pescoço.

— Já estamos aqui.

Não eram comuns os dias de sol durante o inverno. Talvez isso fosse um bom presságio para o que se seguia? A sua mão segurou a minha num aperto caloroso e inspirei fundo, encarando-o. Ele nada disse para além dum sorriso rasgado que me deu a certeza de que era capaz. Após ter comunicado com a receção sobre a minha consulta, foi-me indicado aguardar na sala de espera, mas após ter observado atentamente os indivíduos que lá também aguardavam, senti um longo arrepio. Apertei a mão de Michael com toda a força à espera de que isso me fosse ajudar a regular as fortes emoções que me assolaram ao ver todas as pessoas com um aspeto doente ao nosso redor.

— Vamos sentar-nos, por favor.

— O que se passa? – inquiriu, aflito pelo meu semblante carregado. — Não fiques tão nervosa. Está tudo bem. — Assenti ao tentar interiorizar as suas palavras, mas tudo era demasiado.

— Desculpa, eu preciso de ir à casa de banho. Volto já.

Está tudo bem, tu consegues fazer isto, pensei. Comecei por tentar ignorar o meu coração exaltado, mas quase que me assustei com o meu próprio reflexo. Sacudi a cabeça em reprovação ao reparar nos tons pálidos e nos olhos baços e cansados que olhavam de volta para mim; o cabelo fino e a cara mais magra. Não era diferente dos que estavam lá fora. A vontade de fugir foi astronómica, mas tinha de aprender a encarar a realidade mais cedo ou mais tarde.

— Trouxe-te um copo de água. — Veio com um copo de plástico na mão.

— Eu falei com a enfermeira e ela diz que não teremos de esperar por muito tempo.

— Quanto mais depressa fores atendida, mais depressa saímos deste lugar...

Tentei ocupar o meu tempo de todas as formas possíveis, desde tentar perceber o que era dito no filme antigo na televisão com um volume extremamente baixo, a reler as únicas revistas datadas há dez anos sobre moda e alimentação disponíveis. Se tivesse sorte, teria cinco mensagens consecutivas de uma Ella impaciente por notícias e uma chamada a cada meia-hora de uma mãe preocupada. No entanto, quando ouvi o meu nome no altifalante, petrifiquei.

— Vai correr tudo bem. — A sua mão acariciou a minha face e depositou um beijo na minha testa. — E se não correr bem, estarei aqui para ti.

Engoli em seco, assentindo. Procurava respirar fundo e manter as mãos secas do suor nervoso persistente, mas tornou-se gradualmente mais difícil ao aproximar-me da enfermeira que me guiava até ao gabinete. Voltei a secar as minhas mãos nas calças e tentei forçar o meu melhor sorriso ao avistar o homem de batina branca sentado à minha espera.

— Entre, entre — convidou-me o senhor que, pelo seu crachá, descobri ser chamado de Dr. Lee. — Esteja à vontade, eu só estou a terminar de preencher algo na sua ficha e já vamos ao que interessa.

Consenti mais uma vez, totalmente perdida por palavras que poderiam ser ditas, mas que me faltavam nas piores alturas. Senti a minha cabeça andar à roda ao observar a quantidade de papéis que estavam nas suas mãos e ao tentar adivinhar qual daqueles relatórios seriam os meus. Por favor, diz lá de uma vez por todas.

— Muito bem, India. — Ele tinha um sorriso convidativo. — Vejo que já andou a fazer vários exames do género, não é assim?

— Sim, é verdade.

Observei a sua expressão atentamente, desde o momento em que tudo nele era neutro e sereno até que os seus lábios foram pressionados e as sobrancelhas unidas pelo que lia. Quando finalmente pousou os papéis, voltou toda a sua atenção para mim, desta vez com um sorriso ligeiramente diferente.

— Então? O que dizem os relatórios?

— Bom... — Limpou a sua garganta, prosseguindo. — Tenho boas e más notícias. Qual delas quer ouvir primeiro?

— As boas, por favor.

— As boas notícias são que não há sinais de que a sua situação esteja a piorar. No entanto, as más notícias são que não consigo identificar grandes sinais de melhoria.

O quê?

— Espere, nada mudou?

— Estou a dizer-lhe que o caminho ainda é longo... — respondeu com o mesmo sorriso. — O lado positivo é que, de facto, não denoto sinais de pioria, o que já deve ser algo a que nos devemos agarrar.

— Eu não percebo... A outra médica que consultei disse-me que esta nova medicação iria fazer efeito, que eu ia ficar melhor.

— India, não lhe estou a dizer o contrário. Apenas quero que entenda que há percursos mais longos do que outros e, provavelmente, o seu percurso é mais longo do que outros pacientes na mesma condição. — Soltei um riso seco perante tal conversa. — Não desanime. O importante é a ausência de aspetos negativos, algo que podemos voltar a rever dentro de poucas semanas se aumentarmos a dose da sua medicação mais um pouco. Iria pedir-lhe, então, que volte depois de refazer os exames médicos.

Agarrei nos papéis que me tinham sido dados, levantando-me da cadeira, pronta para sair até que ele disse:

— Ah, e se me permite, tenho uma sugestão a fazer. — Pousou os óculos de novo na secretária. — Com pacientes numa situação semelhante à sua, costumo sugerir um corte de cabelo, sabe? Espero que não me leve a mal, mas na sua situação, quanto mais curto, melhor.

Não houve mais nada que pudesse dizer ou fazer. Nem sabia ao certo o que pensar de tudo o que me tinha sido dito. Estava grata por não ter tido expectativas algumas, mas arrependi-me por sequer ter pensado que tudo poderia ter voltado ao normal. Para além de tudo isso, era recomendável cortar o meu cabelo. No passado, haveria uma India em mim que estaria tão presa a coisas fúteis como o cabelo e que iria enlouquecer só com a ideia. No entanto, a India do presente já tinha perdido qualquer vontade ou interesse, por isso, podiam até rapar a minha cabeça, se assim o quisessem. Quando as portas automáticas se abriram e desvendaram-me o Michael ali, em pé, ansioso por novidades, corri até aos seus braços, deixando que as minhas lágrimas falassem por mim.

A maneira como queria afundar-me no seu peito e agarrar-me a si com unhas e dentes falava por si.

Com amor,

MukeCakesauce

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