A Síndrome de Stein

By DaniloOQuirino

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Um drama marcado pelo desafio de viver seus últimos dias após descobrir estar infectado com uma doença que va... More

A Síndrome De Stein - Episódio 1 - Piloto

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By DaniloOQuirino


A Síndrome De Stein

EPISÓDIO 1 – PILOTO

Escrito por Danilo Quirino – oqdanilo @ gmail.com



Kinshasa, República democrática do Congo

- Filhos, se apressem, ou vocês irão se atrasar. Está na hora do colégio!

São seis horas e o dia está para começar. Chinu é a mãe de Enam e Jamila, os quais estão atrasados para a escola. Desesperada, Chinu decide ir acorda-los, já que chamar da cozinha, enquanto cuidava do café da manhã não estava dando muito certo.

Subindo as escadas e chegando próximo ao quarto de Jamila, a mãe fala com sua filha, enquanto se dirige ao quarto de Enam;

- Jamila, se apresse, daqui a pouco o ônibus chega e você ainda está fazendo essas tranças.

- Enam! Enam?! Abre a porta meu anjo! – Disse ela, a frente do quarto de Enam.

- Filho? – Enam não respondia ao chamado da mãe.

Decidida e nervosa com a teimosia, Chinu decide entrar no quarto. Da porta, ela visualiza seu filho deitado na cama, ainda dormindo aparentemente. Ela então decide acorda-lo, vendo o tamanho do seu atraso para ir ao colégio.

- Chega de dormir Enam, vamos acordar. Vamos! Dizia ela enquanto retirava o cobertor e tocava seu filho.

Mas algo estava errado. Enam não reagia aos estímulos da mãe. Foi então que ela percebeu o que estava acontecendo. Ele estava gelado. Seus olhos secos. E visivelmente não respirava. Em choque, ela percebeu que ele estava morto.

Três semanas depois

BREAKING NEWS

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- Você está na CNN e este é o Breaking News! Algo muito estranho está acontecendo na África. Mais precisamente na República Democrática do Congo. Pessoas estão morrendo enquanto dormem! Vamos saber mais sobre o assunto na reportagem de Latasha Magoro.

- Estamos na capital do pais, Kinshasa possui cerca de 11 milhões de habitantes, e está no meio de acontecimentos estranhos a respeito da morte de algumas pessoas. Mais precisamente, 27. Essas pessoas morreram durante o sono. Simples assim. O curioso nessa história é que essas pessoas possuem algo em comum. Não havia sintomas. Sem dores. Sem marcas. Algumas até sofriam de alguma doença. Mas os laudos do IML local não indicaram a responsabilidade dessas doenças em suas mortes. De Kinshasa, para a CNN, Latasha Magoro.

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Cinquenta dias depois

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- Voltamos a falar sobre as mortes inexplicáveis de pessoas enquanto dormiam que estão se espalhando por toda a África. Casos estão sendo relatados em vários países do continente e hoje, recebemos uma notícia triste. Uma de nossos correspondentes veio a óbito nessas circunstâncias. Latasha Magoro tinha 35 anos, vivia na África do Sul e fazia parte do grupo CNN à três e começou a cobrir o caso há cerca de dois meses atrás. Ainda não sabemos a relação da morte da jornalista com os casos. As autoridades estão investigando os ocorridos. O grupo CNN lamenta a morte e presta solenidade a toda a sua família.

"

As notícias sobre as mortes de agora, centenas de pessoas, enquanto dormiam, começam a tomar importância internacional. O que levou as autoridades a tomarem uma providencia. No mesmo instante em que o noticiário anunciava mais mortes com as mesmas características, a ONU avançava a sua pesquisa sobre o caso em Kinshasa, onde tudo começou.

É o doutor alemão Valentin Stein que comanda as pesquisas. Sua equipe encontrou algo na análise de sangue de um dos casos que, pode indicar uma preocupação.

- Doutor! – Chamava um dos pesquisadores, enquanto observava o microscópio.

Ele então se aproxima com ansiedade e observa o que está na amostra. Assustado, ele olha para seus companheiros.

Mais tarde, durante um vídeo conferencia. O doutor está reunido com outros especialistas que também estão à procura de respostas e então, disserta sobre as suas descobertas.

- Caros companheiros. Eu convoquei esta reunião de emergência porque nossa equipe aqui do Congo achou algo relevante. Como podem ver no vídeo. Adicionamos um ativo à amostra de sangue colhida de vários pacientes e então encontramos o que estávamos à procura, ou pelo ao menos parte dela.

Neste instante, ele se levanta, e movendo o holograma, mostra o que encontrou.

- Se trata de moléculas invasoras no organismo. Que se adapta as condições encontradas e consome toda a essência do hospedeiro. Simplificando, posso dizer que elas são células mutantes, que se transformam e se tornam independentes. Letal para o ser humano. Somente para o ser humano. Senhores, posso dizer que nunca vi nada parecido em toda minha vida. Observem, não há um padrão. Cada uma delas é diferente da outra. Talvez estamos falando do fim da humanidade.

- O senhor está me dizendo que este é um vírus novo doutor? – Pergunta um dos membros daquela reunião.

- Sim! Algo inteiramente novo. Claro que precisamos fazer novos testes. Ter outras opiniões. Mas sem dúvida é algo novo. – Dizia Stein, enquanto se expressa com gestos agitados.

- Como podemos mudar isso. Se ele não possui uma formula completa, como podemos mover algo para combate-lo? – Diz outra cientista.

- Não podemos! Por enquanto, estamos atados. Devemos intensificar nossas pesquisas. Estarei enviando os dados obtidos em breve e espero que possamos agir o mais rapidamente possível! – Termina o doutor. Que desliga a chamada de vídeo e expõe em sua face a sua preocupação.

Dois meses depois

"

Interrompemos a nossa programação para um comunicado do Secretário-Geral da ONU, o qual irá fazer um pronunciamento sobre o surto de mortes do sono, como está sendo chamado o vírus que já matou milhares de pessoas. Vamos acompanhar.

"

Neste instante, o Secretário-Geral se apresenta no púlpito da assembleia extraordinária convocada para discutir o assunto.

- Bom dia! – Inicia ele – Hoje trago a todos as respostas que buscamos. Nossos especialistas na África fizeram importantes descobertas que nos ajudarão a superar mais este mal na humanidade. Sem delongas, peço que prestem atenção nas próximas palavras, pois são importantíssimas para os nossos dias de hoje e do futuro! Entendam, isso não é apenas mais uma doença. O que estamos enfrentando é algo inteiramente novo. Uma nova espécie de vírus. Algo que nunca vimos.

- De acordo com nossas intensas pesquisas, que são realizadas 24 horas por dia, em mais de 15 países. O vírus se trata de uma mutação, que se adapta ao hospedeiro e se torna invisível. Agindo e matando a pessoa em até sessenta dias. Não possui sintomas. Não sabemos como é transmitido e nem como ele é. Suas moléculas são apenas partes de sua formula e como está em constante mudança, suas variáveis são infinitas.

- Posso afirmar, a toda a população, que estamos lutando incansavelmente para combater a sua expansão e posso garantir, que encontraremos a cura. Por enquanto, pedimos a todos que ouçam seu governo local. E que façam os exames mensalmente, conforme o saudoso doutor Valentin Stein, que descobriu o vírus e faleceu pelo mesmo mal, recomendou em sua tese, a qual não concluiu, mas deixou a solução laboratorial para detectar a presença no vírus no organismo humano através dos exames de sangue.

- Por este motivo, em sua homenagem, decidimos nomear está enfermidade com seu nome. Por tanto informamos que, a Síndrome de Stein, como chamamos, já se espalhou por quase toda a África e alguns países da Ásia. Mas pedimos que se mantenham em calma, viva sua vida normalmente e previna-se, faça os exames assim que disponível em seu local. E que Deus nos abençoe.

No mesmo instante, o clima de medo e de desconfiança assola a todos que viram o pronunciamento. Muitas discussões sobre o assunto se espalham por todo o mundo. Na TV, nas ruas, na internet, o assunto é o mesmo. A pergunta sobre o que fazer, como lhe dar com essa situação é a mais recorrente e o assunto mais falado em todos os lugares.

No programa de TV de Juan Luiz Cablero, da Espanha, o jornalista sócio-político, Pedro Soares, é o convidado da noite. A Síndrome de Stein é o assunto e sobre isso ele disserta;

"

O que podemos fazer?

Vestir mascaras?

Roupas radioativas?

Não sair de casa?

E se você for diagnosticado, o que vai fazer?

Se matar, mesmo sabendo que você tem até sessenta dias de vida?

Na verdade Juan, creio que este vírus veio para salvar a humanidade e não para matar, como todo mundo está dizendo! A morte já era uma certeza, não era? Agora, com a Síndrome de Stein, sabemos quando vamos morrer! O que você vai fazer com isso é problema de cada um. Mas se você está diagnosticado com esta doença, entenda, muitas vezes tivemos a oportunidade de mudar. De ser melhor. De realmente sermos uma sociedade, agir pelo outro. O mundo se tornou um lugar egoísta. Viva mais. Seja corajoso e gentil com quem está a sua volta. Isto não é Deus te dando uma sentença e um prazo para se arrepender de seus pecados. Mas compreenda o significado da perca. Da dor de quem fica. Do fim, sem volta!

"

Três anos depois de Enam, primeiro caso da Síndrome de Stein

Três anos se passaram desde a primeira contaminação. O vírus se espalhou por todo o mundo. Milhares de pessoas perderam as suas vidas dormindo. Mas, por algum motivo. O vírus da Síndrome de Stein freou e, não está matando como as autoridades imaginavam. Suas especificações foram sendo mais precisamente detectadas. Nos dias atuais, já se sabe que o vírus só é capaz de infectar seres humanos. Com idade entre 21 e 56 anos. Governos de todo o mundo mantem os exames com o ativo criado pelo doutor Stein disponível para a população. Porque, apesar de não ser tão cruel como todos imaginavam, o vírus está aí, mortal, sem cura e sem saída.

Estes três anos que se passaram trouxeram novas vertentes para a morte. Culturas que celebram a passagem de um ente querido para o outro plano podem festejar a ida dos seus ainda em vida. Bancos e instituições financeiras, lojas e provedoras de credito exigem seguros contra a Síndrome de Stein, como exames do último mês, juros mais altos e todos, que necessitam pegar dinheiro emprestado, acabam pagando mais, por conta do seguro de Stein, contra a morte causada pela doença. Empresas mudaram a forma que contratam seus funcionários. Muitos locais do mundo, agora proíbem a entrada de pessoas que contém o vírus, indo contra todas as indicações da ONU, que pede para que todas as nações abram as suas portas para portadores do vírus, para que essas pessoas realizem seus desejos, vejam pessoas para se despedir, comprem suas obsessões que sempre sonharam, ou que simplesmente possam morrer em paz. Já que não é possível conter a contaminação, por não ser possível compreender a formula do vírus.

Todos imaginam que ele pode se espalhar pelo ar. Pelo tato. Por relações sexuais sem preservativos. Pelas formas tradicionais de contágio, mas até o momento, nada foi oficialmente confirmado como forma de contágio. As pessoas se previnem como podem. Fazem a higiene básica para se manterem limpos. Muitas pessoas mantem sigilo quando são diagnosticadas com a Síndrome de Stein, por medo do preconceito, da rejeição e das consequências negativas. Algo que não deveria existir, já que não se sabe como, quem, ou o porquê o vírus contaminou aquela pessoa ao invés de outra. Pessoas que vivem perto e são próximas de contaminados podem não contrair o vírus, enquanto uma ou outra que se aproximo apenas uma vez, pode sair dali contaminada. Não é seletiva, é aleatória a forma que a contaminação acontece. Algo inexplicável para a ciência.

A forma como as religiões lidam com a morte também mudaram. Missas são realizadas para quem está para partir e por todo o mundo, novas crenças foram criadas. Muitos acreditam que a Síndrome de Stein foi enviada por Deus, para que o ser humano seja melhor como pessoa e os sessenta dias que são contados desde o contagio servem para que a pessoa se arrependa de seus pecados.

A grande intriga de quem contrai o vírus da Síndrome de Stein diz respeito a incerteza de que a vida valeu a pena. Apesar de ter um prazo estipulado, não é certo de que quem estiver contaminado morrerá em 60 dias. Talvez dure um pouco menos, ou nem isso. E por ser um prazo tão curto e incerto, a grande maioria das pessoas não mudam o seu dia a dia. Uma vez que é certa a morte, isso não quer dizer que a pessoa não possa morrer de outra forma. Se ela sofrer um acidente, ela vai morrer. Se ela atirar contra a sua cabeça, ela vai morrer. Como muitos casos são registrados. Pessoas que são diagnosticadas com a doença acabam tirando a sua própria vida. Por não saber lhe dar com sua realidade. Com suas escolhas. Em não entender que a mensagem é;

"Você vai morrer sim, como você já sabia que iria acontecer, mas antes, você pode aproveitar esta vida mais um pouco. Abrace quem você ama. Diga que ama. Sorria. Assuma suas escolhas. Fuja para algum lugar. Faça feliz e seja feliz. Essa é a última oportunidade que você tem de deixar a sua marca na vida de alguém. Que ela seja boa."

De certa forma, mas aleatoriamente, o vírus da Síndrome de Stein seleciona as pessoas. E assim, transforma suas vidas e de quem está a sua volta. Morrer é algo certo, esperado. Mas quando descoberta contaminação, o ser humano é forçado a sair da sua zona de conforto. Encarar seu destino que já era certo, porém sem previsão. E assim, transforma a vida de todos. Sabendo que vai morrer e que isso tem um prazo para acontecer, cada um age da forma que escolher. Sem a certeza de que irá acordar amanhã e ter outra oportunidade de ser melhor.

"SENHORAS E SENHORES, RECEBAM, NO PALCO DO 'TONIGHT LIVE SHOW', ELE, O IRREVERENTE, ICONICO E UM POUCO DESENGONÇADO... JHONY THOMPSON!"

O locutor do programa anuncia a entrada do apresentador e humorista Jhony Thompson. Seu talk show é o mais assistido de todo os Estados Unidos. O apresentador entra, enquanto uma música animada toca ao fundo, a plateia vai ao delírio pois, Jhony se aproxima para cumprimenta-los. Já no centro do palco, enquanto abotoa o seu terno azul marinho, ele sorri, e espera até a histeria do público diminuir.

- Sejam todos muito bem-vindos, este é o "Tonight Live Show" e hoje vamos falar sobre a Síndrome de Stein! – Jhony inicia seu monólogo.

- Poderíamos dizer que este é o mal do século, mas para isso ele deveria entrar na fila, temos muitas coisas, como a depressão, o câncer, o HIV e o nosso presidente! - Diz ele com ironia. A plateia reage de forma adversa.

- Alguém aqui soube o que aconteceu? Está em todos os lugares, não é? Mais uma vez, o governo do presidente Born cortou verbas importantíssimas! É ou não um mal? – Diz ele.

- Porém – Continua o apresentador – Estou aqui para te fazer uma pergunta. O que você faria se fosse diagnosticado com a Síndrome de Stein? Hmm... Alguém aqui da plateia poderia me dizer? E você de casa, como reagiria? Tenho certeza de que isso já passou pela sua cabeça por ao menos uma única vez. Talvez na época do surto da África, quando milhares de pessoas e inclusive o doutor que deu nome à doença, faleceram contaminados pelo vírus. Ou quem sabe agora você possa estar se perguntando. O que eu faria se soubesse que iria morrer em até sessenta dias?

Fez-se então um breve silencio. Jhony não estava brincando como sempre fazia. Seu tom de voz e sua expressão facil demonstravam aflição e era nítido o seu estado emocional alterado.

[...]

[...]

[...]

- Eu estou no dia 52! – Expressa ele emocionado - Foram os dois meses que se passaram da forma mais rápida em minha vida! Mesmo que isso seja impossível, pois os dias tem 24 horas, todos eles. Mas me senti assim! – Anuncia ele, que foi diagnosticado como positivo para a contaminação.

- Eu poderia ter me afastado. Ter comprado tudo o que eu poderia com o dinheiro que tenho. Ter feito compras a prazo, mesmo com todas as exigências que as lojas agora exigem por causa dessa doença. Poderia ter ido até Vegas e gastado tudo nos cassinos. Poderia ter ido curtir meus últimos dias numa praia tropical. Mas a verdade é que eu escolhi ficar. Viver minha vida como se nada tivesse acontecendo! Mas hoje é o fim. Hoje foi o último programa que comandei. Quero que se lembrem de mim como sempre fui. Continuem vivendo suas vidas normalmente e, encarem essa doença de forma madura. A Síndrome Stein poderia ser o mal do século sim! Mas não, ela é o mal de toda a história humana. Ela veio para nos dizer que estamos aqui apenas de passagem. Veio para dar um tapa na nossa cara e pôr um fim em toda a ganancia, arrogância e ignorância. Eu não sei se hoje eu irei para a minha cama dormir pela última vez, mas não deixarei de fazer aquilo que sempre fiz antes de dormir.

- Todos nós temos nossas escolhas. Nossas prioridades. A nossa forma de enxergar o que acontece a nossa volta. A Síndrome de Stein não foi uma sentença em minha vida. Eu estou bem, feliz! Contente com as coisas e o legado que deixarei. Acredito que cada um, que passe por isso vai encarar da sua própria forma. Mas essa doença... – Ele diminui o tom de sua voz, olha para baixo. Respira e continua – Temos sorte de ser dormindo e sem dor. É o fim mais digno para qualquer ser humano.

Imediatamente a gravação foi cancelada. Ninguém sabia que Jhony iria falar em seu monologo, pois, como de costume para causar maior impacto e arrancar mais risadas da plateia, ele não é ensaiado. Mas esta noite, todos ficaram chocados.

Jhony Thompson – DIA 1

- Senhor Thompson? – Pergunta a enfermeira do hospital particular em que Jhony possui convenio, ao abrir a porta do laboratório de diagnosticação da Síndrome de Stein.

Jhony aguardava sentado, na sala de espera, nervoso, com a cabeça baixa e dedos entrelaçados. Apertando uma mão contra a outra. Por ser branco, seu fluxo sanguíneo alterado tonava sua pele para tons avermelhados. Ele então se levanta, aflito, como em todas as vezes que foi realizar o exame, à espera do resultado.

Sim! – Responde Jhony.

Assim como a maioria das pessoas, Jhony aderiu ao pedido do governo e realiza mensalmente o exame para detecção da infecção pelo vírus da Síndrome de Stein. Mas muitas pessoas preferem não saber, e viver sem o peso de saber que pode não viver por muito mais tempo.

Pode me acompanhar por favor? – Diz a enfermeira, que pede para que ele a acompanhe para uma sala reservada.

- Entre, sente-se! – Pede ela enquanto abre a porta.

Jhony entra na sala. Apreensivo, talvez esperando o pior.

- Aguarde um momento Okay?! – Pede ela, enquanto fecha a porta ao sair.

Sob a mesa, estava o nome de quem aquela sala pertencia. À doutora Sandy Steven, psicóloga de desenvolvimento humano e do setor social da entidade. Neste momento, em que Jhony leu o cartão sob a mesa, ele teve certeza de seu diagnóstico.

- Jhony Thompson, o humorista? – Diz a doutora enquanto entra na sala, com os exames de Jhony sob suas mãos.

Ela então se senta de frente para Jhony, que neste momento esboça suas emoções em seu rosto.

- Você deve imaginar o que eu vou dizer, não é? – Diz ela, observando a tristeza no olhar de Jhony e continua - Nós, aqui do hospital, seguimos o protocolo e nos reservamos junto ao paciente positivo para Síndrome de Stein. A partir de hoje, você contará com toda a nossa assistência psicológica para passar da melhor forma possível pelos dias que estão por vir. Conte conosco Jhony! Você pode ter certeza de que nos manteremos este diagnostico sob sigilo absoluto. Não por você ser uma figura pública, mas sim por respeito ao ser humano. É o protocolo. Enquanto você precisar de nós, para tirar suas dúvidas, para se abrir, para o que for preciso para que fique bem. O que nós dizemos para os pacientes nestes dias é que faremos de tudo para que eles realmente vivam seus últimos dias. Sei que é forte, é dolorido, mas muitos não têm a ideia de como são passivos durante toda a vida e quantas oportunidades de ser feliz passa diante dos olhos durante todo o tempo, e nós vamos deixando para depois. Mas agora Jhony, não existe um depois. Agora não dá para esperar. Seja feliz, escolha viver da forma que te agrade mais. E conte conosco para isso! – Explica ela, ao diagnosticar o apresentador como positivo para a Síndrome de Stein.

Jhony se levanta, atordoado e sai. Sem dizer uma única palavra, apenas acenando com a cabeça. Nitidamente abalado. Já em sua casa, no começo da tarde, em um condomínio de luxo de Los Angeles, onde mora com seus dois cachorros, Jhony liga para a emissora em que trabalha e pede para que o programa desta noite seja uma reprise de algum outro. Ele não está em condições para gravar nada naquele momento.

- Jhony, está tudo bem? Como foi no hospital? – Pergunta seu empresário, que o aguardava no estúdio para a gravação.

- Sim, estou bem. Deu tudo certo... Olha, eu só estou um pouco indisposto. Não quero que o público me veja assim! – Exclama ele no telefone, com a voz debilitada. Enquanto faz carinho em um de seus cachorros. Na varanda, olhando para o horizonte.

O grande dilema para Jhony neste momento era a aceitação e a forma que ele iria encarar essa doença, sua nova realidade. Contar e tornar isso público tornaria seus últimos dias um caos, e por isso, ele preferiu manter em segredo, até mesmo dos seus mais próximos. Como uma pessoa que vive com uma aparência sempre feliz e que precisava manter uma imagem de alguém que transmite alegria para os outros, Jhony precisava manter o sorriso e alegria estampada em seu rosto sabendo que vai morrer em breve.

Jhony Thompson – DIA 12

O relógio que está na cabeceira ao lado da cama de Jhony aciona o despertador. São cinco horas da manhã, e para cumprir com todos os seus compromissos e ainda manter uma forma física saudável, Jhony levanta cedo. Corre pelas ruas do condomínio aonde mora e depois frequenta a academia.

Após o seu treino, Jhony escuta uma conversa entre algumas pessoas no vestiário da academia;

- Você ficou sabendo do que houve, parece que a mulher do Billy está com a Síndrome de Stein. Cara essa doença é muito cruel! Imagina como vai ser a vida deles sem ela. Seus filhos, sua família, seus amigos! – Comenta dois rapazes.

Jhony olha para os rapazes, escuta tudo com atenção e absorve tudo com muita calma. Já se passaram mais de uma semana desde o diagnóstico e ele se acostumou com aquilo que vive. Depois de aceitar a sua nova condição, Jhony não sentiu raiva. Por ter uma personalidade diferente da maioria, ampla e bem resolvida, o que o tornava notável entre os humoristas, e que justifica todo o sucesso de seu programa, ele, desde o princípio entendeu que seu diagnostico era natural. A morte para Jhony era encarada como parte do processo da vida. Todos a sua volta encara a doença como algo mal. O que é comum e mais obvio. Mas Jhony não via daquela forma. Ele preferiu seguir a sua rotina, viver como se nada estivesse acontecendo, ou melhor, ele decidiu ser mais feliz. Aproveitar cada momento de sua vida ao lado das pessoas que ele ama. Em suas consultas de análise no hospital, com a doutora, Jhony falava sobre o que ouvia e o que aquela experiência trazia para seus últimos dias.

Naquele mesmo dia, no começo da noite, Jhony estava pronto para gravar mais uma edição do seu programa:

- COM VOCÊS, JHONY THOMPSON! – Anunciava o Locutor.

Mas Jhony não entrou no palco. Algo abateu seus pensamentos. Seus sentidos ficaram confusos e ele correu para o banheiro sentindo ânsia de vomito. Em seguida, ele sentou no canto e começou a chorar.

No estúdio, todos ficaram sem entender. Parecia estar tudo bem. Um clima desagradável se instalou e todos ficaram confusos. A banda parou de tocar.

Foi como se todo o peso que Jhony segurava até então desabasse sob as barreiras psicológicas que ele colocou durante toda sua vida para que seus problemas pessoais não transparecessem. Não somente por sua condição sobre a Síndrome de Stein, mas também sobre todas as coisas que aconteceram em sua vida. Cada vez que ele teve que engolir situações a seco, cada desaforo, cada desilusão, cada situação que ele teve que superar. Mas, por estar tão próximo do fim, talvez ele tenha chegado ao seu limite. E seguir dali em diante era como pisar no escuro.

Jhony Thompson – DIA 35

- Então Jhony, como se sente? Pergunta a doutora Steven.

- Estou melhor, parece que estou mais livre. Eu não consigo entender. As crises deram um tempo. Tem dois dias que não tomo os remédios, como a senhora recomendou. É estranho, mas estou bem! – Responde Jhony.

Depois da primeira crise, durante a gravação de seu programa. Jhony procurou a doutora do hospital para que algo fosse feito. Ele não queria que a depressão afetasse a sua rotina, e então, ele aceitou que teria que tomar remédios para controlar os seus nervos e inclusive para garantir que ele dormisse. O que naquele momento se tornava seu maior risco. Mas Jhony superou essa fase rápido. Talvez por ser tão amado e com a ajuda da doutora Steven, ele conseguiu manter o seu ritmo, sua rotina e seu humor para escrever as suas marcantes piadas.

Naquele mesmo dia, Jhony falou sobre o ocorrido em seu programa;

-Outro dia eu tive uma crise antes de começar o programa e muitos falaram que eu estava doente! - Começou ele.

- Mas não! Não era isso... Era algo muito pior! – Exclamou, enquanto todos prestavam extrema atenção.

- Eu fiquei enjoado com a má qualidade das piadas que os roteiristas escreveram naquele dia! – Terminou ele, mostrando que havia superado o mal momento que havia passado.

Todos riram e a banda tocou algo completamente fora do tom. A notícia de que Jhony havia excitado em entrar no palco enquanto sentia uma crise de existência se espalhou rápido. Por se tratar de uma pessoa notável, qualquer coisa que acontecesse com ele era motivo de muita especulação, e por ser tão reservado, Jhony não queria que aquilo que realmente aconteceu fosse noticiado e, com essa piada, ele matou qualquer dúvida que pudesse existir. Ele estava bem e sua saúde mental também.

Aceitar que tudo estava acabando tornou a vida de Jhony mais leve. Cada momento era vivido comais intensidade. Cada bom dia era dado com mais alegria e Jhony, assim, tornou-se melhor. E sua mudança era nítida para quem estava a sua volta. Todos os seus amigos, conhecidos, equipe de trabalho e seu público notaram a diferença. Jhony estava vivendo seus melhores dias.

Jhony Thompson – Dia 48

Era hora de falar. Jhony estava convencido de que estava em paz e que havia cumprido o seu dever em sua vida. E que agora, poderia tirar seus últimos dias para descansar. Mas isso não era algo simples de se fazer. Por ser uma pessoa notável, Jhony possui muitos compromissos, acordos e contratos. Por ser uma pessoa muito exigente, ele sempre fez questão de cumprir com seus compromissos, ou cancela-los caso não pudesse realiza-los.

Quando Jhony começou a cancelar seus compromissos para os dias seguintes. Algumas pessoas perceberam o que estava acontecendo. Ou pelo ao menos imaginar que algo estranho estava mexendo com a cabeça de Jhony. Foi o caso de seu empresário, que foi até a sua casa, para que pudessem conversar em particular.

- Entre Stuart. Quer beber algo? – Pergunta Jhony, enquanto se dirige para o bar da residência.

Stuart está junto com Jhony desde os primeiros passos do humorista. Conhecia cada expressão e por isso sabia que ele estava escondendo algo.

- Conta Jhony, o que está acontecendo com você? Desde aquele dia, que você teve a crise no estúdio, todos os outros dias que você sumiu. Você está estranho cara! Você sabe que quem realmente te conhece, como eu, notou essa mudança, então me conta, pode confiar em mim para isso também. Você sempre confiou em mim, não vai ser diferente agora, ok? – Pede ele.

Jhony e Stuart são amigos. A confiança que um tem no outro é maior do que qualquer outro laço que eles possuem. Tudo começou quando Stuart e Jhony se conheceram em um bar, onde os dois se apresentariam para uma noite de stand-up. Jhony se saiu muito bem, mas Stuart não foi tão engraçado. Jhony então fez de tudo para que Stuart saísse dali feliz, e apesar da negação pelo seu fracasso como comediante, Stuart entendeu que poderia contar com Jhony. Dali em diante, Stuart e Jhony selaram uma parceria que dura até o momento, onde eles se ajudam e confiam um ao outro.

Jhony pega uma garrafa de whisky. Em silêncio ele serve uma dose ao amigo, pega dois cubos de gelo, suspira e continua em silencio. Stuart visivelmente incomodado com aquela situação, volta a pedir ao amigo que se abra;

- Jhony, por favor. Por nossa amizade! Confie em mim! – Disse ele.

- Ta bem... Você quer realmente saber o que aconteceu? Eu vou te dizer! – Exclamou Jhony.

- Aquele dia no estúdio. Os dias que estive mal. Eu estar cancelando meus compromissos que aconteceram daqui um mês tem um motivo sim! – Conta ele, enquanto Stuart observa atentamente apreensivo.

- Eu... – Continua ele – Eu contraí o vírus, a Síndrome de Stein, Stuart... Eu vou morrer daqui alguns dias meu amigo! – Expõe ele.

Stuart então começa a chorar. Assim como o próprio humorista que não consegue segurar a emoção. Os dois se abraçam, um abraço longo e sincero.

- Como você não me contou? Porque escondeu isso de mim? – Pergunta Stuart.

- Eu não podia. Eu precisava entender e passar por isso sozinho. São meus últimos dias aqui, não sãos seus e nem de ninguém. Sou eu que preciso ser melhor! – Dizia ele até ser interrompido pelo telefone.

Era Patrícia, sua namorada. Que Jhony mantinha em segredo, por conta de sua exposição. Ele ignora a chamada e continua;

- Olha Stuart, quantas pessoas estão na minha vida agora. Minha família, meus amigos, a patrícia. Como a minha vida mudou desde aquele dia no barzinho em que nos conhecemos. Não era justo vocês passarem por isso junto comigo. Foi a alegria que nos aproximou, não a dor... – Dizia ele até ser interrompido por Stuart.

- Sim Jhony, foi a alegria. Mas também te amamos cara! Na alegria e na dor. Sei como você é reservado sim. Compreendo a sua escolha de não contar para ninguém. Mas saiba que estaríamos aqui de qualquer forma. Porque te amamos acima de tudo e de qualquer doença! – Stuart estava emocionado e mesmo assim, manteve o tom forte, em apoio a atual situação melancólica do amigo.

- E agora? O que vai fazer? – Perguntou Stuart, depois de um breve silêncio.

Voltamos ao presente. No dia em que Jhony contou ao público em seu monologo durante a abertura do seu programa, sobre a doença.

Após se retirar da vida pública, Jhony desligou-se de suas redes sociais e se isolou ao lado dos seus entes queridos. O apresentador e humorista faleceu no dia 57. Dormindo em sua casa, durante uma tarde chuvosa.


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