Hiatus - You're my magic shop...

By JYeomin7

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Jeon Jungkook é um promotor criminal que cresceu lidando com a ausência de sua mãe e concentrou toda a sua vi... More

Avisos
Personagens
Serendipity
Universe's providence
When you see me, when you touch me
Seven billion worlds
Winter lake
Hold my hand
But I still want you
Can I live with a broken heart?
How to live with a broken heart?
A small gesture
It's worth it
Cherry blossoms
Cracks
Just let me love you
Our hearts are on fire
The clash between two hearts
The way you look at me
Our grave
I miss your heart of doubt
Louder than bombs
Personagens (parte 2)
The key to our hearts
Our mistake
Love in intimacy

Which hell is the worst one?

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By JYeomin7

Olá! Como vão? 

*Este capítulo está um pouco tenso, mas vocês conhecerão dois personagens maravilhosos, espero que gostem deles!

*Tradução do título: Qual inferno é o pior?

*Narração: Jungkook.

***

Fascinante.

Park Jimin é fascinante.

A forma que ele enxerga a vida e enfrenta todos os seus problemas me faz questionar o modo como eu vivo.

Como eu vivia até encontrá-lo.

Ele me fez renunciar ao controle e me levou a afundar em um mar raivoso e salgado de emoções antes mesmo que eu o permitisse conscientemente. Agora, estou na costa de um continente desconhecido, observando um esplêndido castelo de areia construído longe do alcance da maré enquanto a luz solar queima minha pele e me transmite paz.

Tudo o que eu jamais imaginei sentir em uma situação como essa.

Determinação é uma força que tem os lábios grossos e macios de Park Jimin e o seu elegante jeito de andar. Ele não desiste diante da decepção, da negação ou da quebra, Jimin constrói novamente o caminho com um deslumbrante sorriso no rosto.

E é nesse sorriso que eu me perco e me encontro.

A lua crescente que seus olhos formam ao serem empurrados pelas bochechas cheias me fazem ver a mim mesmo porque ele está me ensinando a crescer e a brilhar, a me tornar uma lua cheia em uma noite digna de admiração, fazendo a minha vida ser preenchida por uma beleza única, e mesmo que eu passe por noites opacas e obscuras, ele me trará a luz da manhã.

Vulnerável.

É assim que eu me sinto.

O amor deveria proporcionar a melhor sensação, mas constantemente é esfolado em dor. O que deveria curar e suportar¹ acaba sendo uma desculpa para destruir e matar. Seja o amor que encoberta um ciúme doentio, o amor interesseiro, o amor enganoso e desleal, o amor egoísta, o amor findável, o amor insuficiente, o amor natural, porém inexistente, o amor renegado...

É negligência esquecer que o amor vai muito além de relacionamentos interpessoais: esse sentimento destinado a uma única etnia levou à perseguição e à tentativa de extermínio de outra na Segunda Guerra Mundial, o amor, anseio e deslumbramento pela ciência é o que nos levou a criar a arma capaz de arruinar nossa própria existência e o amor do ser humano por si mesmo e pela sua ilusória grandeza mata o planeta, antes aos poucos, agora sem nenhum remorso ou preocupação em parar².

Como se entregar a um sentimento tão deturpado com alguma esperança? Como acreditar que eu não serei machucado novamente depois de vivenciar a rejeição tão de perto?

Nunca entendi e almejei a euforia de se apaixonar por alguém. Qual o sentido em entregar sua vida para uma pessoa arruinar? A confiança é passível de ser alcançada, mas a tentativa te expõe à decepção. Mantive-me forte o suficiente para não me deixar ser abatido por sentimentos e apesar das consequências que isso me trouxe, afastar as pessoas e ter machucado a única que deixei se aproximar, a segurança e o controle que eu tinha ainda me soam reconfortantes.

No entanto, sinto que talvez já não sejam suficientes.

E isso me assusta.

De repente, tudo o que eu sabia se perdeu em um vácuo deprimente e a minha concepção de vida se tornou questionável. Em vez de sustentar minha visão, como eu naturalmente faria, sou capaz apenas de questionar se eu realmente desabei no vácuo ou se sempre vivi em um.

Apaixonar-me por Jimin abalaria o meu presente, o meu futuro e principalmente o meu passado. É o mesmo que assumir que desperdicei meus anos com nada. Porém, meu receio não se resume a isso simplesmente. Ele tocou a minha alma com tanta graça e sutilidade que tenho medo não só de cair, mas de derrubá-lo comigo.

Ele é o remédio que fará o meu coração bater de novo, ainda mais forte e vivo, mas desconfio que cheguei em um ponto no qual a minha doença avançou o estágio terminal e, por isso, mesmo que o meu coração insista, ele vai parar.

Essa mínima incerteza me seduz da mesma forma que o loiro cativante de sorriso hipnotizante e coxas pecaminosamente esculpidas. Estou sendo egoísta em querê-lo de acordo com meus termos e não me entregar completamente, mas a ciência disso não apaga a minha fraqueza em deixá-lo.

A porta do escritório se abre abruptamente, interrompendo meus pensamentos, e papéis se espalham pelo chão. Reviro os olhos ao saber quem é antes mesmo de vê-la.

- Seu amigo gostoso está aqui, Jungkook-ssi. – A mulher de cabelos castanho-escuros e caídos sobre os ombros, sobrancelhas e lábios finos e a capacidade inacreditável de me irritar diz, encarando as folhas bagunçadas pesarosamente.

- Por que você me obriga a escutar esse tipo de comentário, Srta. Kim? – Ela me encara e estreita os olhos grandes.

- Porque eu não preciso da sua permissão para falar, mas nesse caso é porque ele é muito lindo, é impossível não comentar. – Suspiro.

- Preciso concordar, mas você tem que superar ou então chamá-lo para sair. Além disso, chame-me de Sr. Jeon. – Ela finalmente se abaixa e começa a recolher os papéis.

- O problema é que eu estou superando um término recente... Você se lembra da minha ex-namorada, certo? Já te disse para desistir, será Jungkook ou oppa. – Aproximo-me para ajudá-la.

- Eu sou mais novo do que você! – Exclamo, indignado.

- Eu sei, mas odeio regras e adoro te irritar... – Curva os lábios em um sorriso debochado, fazendo-me revirar os olhos e sorrir ao mesmo tempo.

- Diga a ele para entrar, por favor. – Ela inclina a cabeça e me observa com um olhar curioso antes de se levantar.

- O que foi? – Faço o mesmo, entregando a ela os papéis que recolhi.

- Você está... Estranho? – Franzo o cenho e ela ajeita a saia azul-clara e a camisa branca que exibe um de seus ombros.

- Deixe-me trabalhar, Srta. Kim. – Abre a porta mal fechada e antes de sair completamente, encara-me.

- Até mais, oppa. – E sai.

- Yah! Eu não sou seu oppa, Kim Yongsun! – Ela me ignora e continua caminhando elegantemente pelo corredor com seus saltos altos e finos até a recepção do andar.

Taehyung logo aparece no corredor, trajando uma camisa e calça sociais brancas, sapato de couro da mesma cor e um casaco longo e azul-claro. Deixo a porta aberta e sento-me no sofá.

- Você é um péssimo amigo. – Acusa assim que entra na sala e fecha a porta.

- Sinto muito. – Dá um leve tapa em minha testa e se senta ao meu lado, abraçando-me. – O que faz aqui?

- Não posso sentir saudades?

- Você só apareceria despretensiosamente assim no meu apartamento. Na verdade, em lugar nenhum, já que me usa como seu cozinheiro pessoal.

- Não me culpe por adorar a sua comida. – Franze os lábios finos em chateação e olha para o chão. – Lisa me contou que foi vê-la.

- Ela contou? – Ele assente, olhando para o teto.

Taehyung se perde em seus próprios pensamentos com facilidade, mas agora parece estar fazendo isso propositalmente como se quisesse desviar do assunto, embora ele o tenha iniciado.

- Eu pedi desculpas a ela. Estamos bem, nós precisávamos de um encerramento. – Lembro-me do nosso treino mais recente e sorrio. – Sinceramente, achei que ela me mandaria para a puta que pariu.

- Ela deveria... Mas fico feliz que continuam amigos. Lisa é incrível. – Diz seriamente.

- Sim, ela é. – Ficamos em um silêncio estranhamente tenso por um momento enquanto ele vagueia o olhar pelo escritório. – O que há de errado com você? – Taehyung balança a cabeça negativamente, ainda sem me encarar, e suspira.

- Meu pai perguntou sobre você e minha mãe disse que você os esqueceu já que não vai visitá-los. – Muda de assunto, olhando para mim.

- Em minha defesa, minha vida está uma confusão nas últimas semanas. Em breve irei cozinhar para eles. – Ele sorri amplamente, espantando toda a hesitação estranha de momentos atrás.

- Como foi o encontro na sexta-feira? – Franzo as sobrancelhas em confusão.

- Eu não te disse que iria em um encon... Aish! Não foi um encontro, nós só queríamos conversar e... – Interrompo-me, desesperado com a minha falta de argumentos, o que faz o loiro rir, exibindo todos os dentes. – Pare de rir, Taehyung!

Fuzilo-o com olhar até que ele se acalma e respira fundo, olhando-me sem conter um sorriso mínimo.

- Jiminie me ligou no sábado e contou que vocês foram ao Beullualala. Nós conversamos ontem sobre a aparição do seu irmão, porque não disse nada sobre o encontro?

- Eu já disse que não foi um... – Suspiro em desistência. – Eu não sabia o que dizer. Ele me confunde tanto e ao mesmo tempo parece tão certo. Isso não faz sentido algum. – Apoio os cotovelos nas coxas e afundo o rosto em minhas mãos, frustrado.

- Pare de procurar lógica no amor, Jungkook. – Meu corpo se tenciona imediatamente.

Não posso deixar chegar a esse ponto. Eu não deixei chegar a esse ponto. Encaro-o com uma expressão impassível.

- Não há amor, Taehyung. Jimin e eu somos amigos. Que transam. – Ou pelo menos querem transar.

- Então quer dizer que você está fazendo com ele o mesmo que fez com a Lisa?

- O que? Não! É diferente... – Taehyung junta as sobrancelhas e se inclina em minha direção.

- É diferente como?

É diferente porque Jimin me aquece mais do que a forte luz do sol, eu enxergo apenas o preto e o branco e ele me mostra as cores mais exóticas que apenas um pintor experiente consegue criar, meu coração passou a lutar novamente para que a pequena flor de pétalas amarelas desbotadas como a cor dos cabelos dele cresça em mim, a expectativa e a fé dele quanto à vida me levam a pensar que eu possa reaprender a... Amar.

A escolha é minha, no entanto, e não quero prestar atenção ao que me está sendo ensinado.

- Eu não estou apaixonado por ele porque eu não quero me apaixonar por alguém. Não sei como me envolver dessa forma, Lisa é a maior prova disso.

Ele agarra meu braço, puxa-me para si, deixando minha cabeça em seu peito, e me abraça, afagando meu cabelo carinhosamente. Meu primeiro impulso é afastá-lo imediatamente, mas me lembro de que se trata da mesma pessoa que dormiu comigo inúmeras vezes, escutando o meu choro incansável pela falta de amor quando eu era apenas um menino, e afagou meus cabelos com a mesma suavidade e proteção.

- Limites não mantém os outros de fora, Jungkookie, eles te prendem dentro. Se estiver disposto a arriscar vai descobrir que a vista do outro lado é deslumbrante, ainda que não seja fácil chegar lá.

Permanecemos assim por alguns minutos até que eu me afasto e ele segura meu pulso, sentindo o sangue fluir em minha veia como se existisse uma corrida interna, e sorri docemente.

A porta se abre, mas não vejo quem entra. Minha mente só consegue focar no descontrole causado pelas sensações que Jimin desperta em mim e que Taehyung me fez relembrar.

- Oh! Você ainda está aqui, lindo? – Ouço Taehyung rir, mas tudo o que vejo são os arquivos cinzentos ao fundo da sala.

- Já estou indo, preciso deixá-lo trabalhar antes que ele me expulse... Jungkook? Jungkook? – Sinto sua mão em meu ombro e o encaro. Inclino a cabeça em um movimento rápido em uma vã tentativa de afastar o que me atormenta.

- Hum? Ah, sim, eu preciso trabalhar. – Finalmente noto uma caixa metálica no chão ao lado de Yongsun. – E você precisa aprender a bater na porta antes de entrar. – Aponto para ela, que me ignora sem qualquer esforço.

- Certo. Conversaremos depois, Jungkook-ah. – Já em pé, ele se inclina e beija minha testa, logo indo até a porta. – Tchau, noona.

- Eu achei o que você me pediu. – Yongsun diz após fechar a porta.

Pisco algumas vezes e me recordo sobre o que ela está falando.

- Mesmo?

- Foi bem complicado, acho que minha traqueia está obstruída por poeira e a culpa é sua.

Pedi a Yongsun para me ajudar a procurar o caso da mãe do Jimin na sala de arquivamento, já que o processo é de quase trinta anos atrás, depois de andar pelos corredores empoeirados entre as prateleiras altas completamente perdido.

- Muito obrigado, Srta. Kim. Você é a única pessoa nesse prédio que consegue entender a lógica organizativa daquela sala. – Ela exibe um sorriso convencido e divertido.

- Esses são os casos de tentativa de suicídio abertos em outubro de 1990³, como pediu.

Uma rápida pesquisa na internet me possibilitou descobrir quando ele nasceu.

- Todos? – Ela encara a caixa.

- Tem mais três caixas dessas na minha sala, direi ao meu secretário para trazê-las. Se todos os casos fossem documentados haveriam muito mais. Atualmente ainda é difícil aceitar essa realidade, imagine como era naquela época. – Sua expressão se converte em tristeza. – O que está procurando exatamente?

O que eu estou procurando exatamente?

Encaro a caixa, ponderando se devo contar a ela ou não. Não somos exatamente próximos, mas Kim Yongsun é uma das melhores promotoras do nosso distrito e, profissionalmente, é confiável. Além disso, ela não possui relação alguma com Jimin.

- Quero verificar se a tentativa de suicídio foi realmente isso. Por ser um assunto que ninguém quer falar a respeito, seria cabível atribui-lo a uma situação com algum acontecimento difícil de solucionar ou sem importância para os responsáveis. A vítima era uma mulher. Uma mulher grávida de quase sete meses e aparentemente sem família. Quem questionaria uma tentativa de suicídio naquela época? – Balanço a cabeça, consternado.

- Quem é a mulher?

- Alguém importante para uma pessoa que é importante para mim. – Digo simplesmente.

- Você terá que analisar todos os casos... Tem informações que pode usar para reduzir as possibilidades?

- Ela foi socorrida no National Hospital. – Yongsun me encara, obviamente esperando por mais. – Posso conseguir o nome completo, o endereço e identificar a delegacia onde o caso foi investigado.

- Certo. Quando tiver essas informações me avise, irei te ajudar. – Aperto as sobrancelhas em confusão.

- Por que?

- Porque é importante para você e eu sou uma ótima profissional, não há razão para recusar minha oferta. – Arqueio uma sobrancelha e ela revira os olhos, suspirando. – Ok, eu estou curiosa. – Dá de ombros.

- Não comente sobre isso com outra pessoa. – Ela assente e sai da sala.

Finalmente sozinho, pego meu celular.

- Jungkook?

- Oi, pai. Preciso te perguntar algo.

- Sim?

- Você sabe qual é o nome da mãe biológica do Jimin? – Ele fica em silêncio por longos segundos, assimilando o que eu disse.

- Por que não pergunta a ele?

- Não quero falar sobre isso com ele sem saber do que exatamente estou falando.

- Ele não sabe. – Dessa vez, eu permaneço em silêncio. – Jimin nunca perguntou o nome dela. Ele só sabe que ela não sobreviveu, nenhum parente apareceu e Sang Won e Hee Ae decidiram o adotar. Sang Won me disse que ele perguntou como ela era e o que aconteceu quando ela chegou ao hospital, mas nunca o nome. Ele guardou a foto dela do prontuário para dar a ele, mas Jimin não quis e pediu que jogasse fora.

- Ele me contou o que sabe.

- E por que quer saber o nome dela?

- Pai... – Pelo meu tom de voz, ele compreende que explicar não é uma opção.

- Vocês... Há algo que eu deva saber? – Suspiro.

- Não sei.

- Quando souber, converse comigo. O nome dela era Choi Kang Hee.

- Sang Won jogou a foto fora?

- Ele não me disse se jogou ou não.

- Obrigado, pai. – Desligo a chamada e encaro a caixa sem saber se estou fazendo a coisa certa.

*

As portas do elevador se abrem no térreo, exibindo a recepção do prédio. As paredes brancas contornam o enorme espaço onde há um balcão de mármore preto à direita dos dois elevadores e oposto às portas automáticas de vidro. Do outro lado, cadeiras com estofados azul-marinho estão ordenadamente dispostas sobre o piso de pedra acinzentada.

Aceno com a cabeça para os funcionários que se curvam, cumprimentando-me, e ao sair o vento fresco me atinge, bagunçando meu cabelo. O sol ainda domina o céu apesar do fim da tarde estar próximo. Distraidamente, ajeito minha bolsa de couro enquanto me afasto do prédio.

- Jeon Jungkook? – Olho para trás a procura da voz que me chamou e franzo as sobrancelhas em confusão ao me deparar com um garoto de cabelos escuros e bagunçados usando um suéter preto e calça jeans escura e carregando uma mochila vinho. – Jeon Jungkook. – O tom questionador cede ao afirmativo.

- Quem é... – Pisco várias vezes antes de arregalar os olhos em choque.

- Sou Lee Jong Suk. – Ele sorri.

Meu corpo se tenciona em alerta. Observo atentamente os olhos pequenos, curiosos, com um lampejo de tensão e vidrados em mim por um momento e retomo a postura impassível, disfarçando meu desespero.

- Você não deveria estar aqui. Vá para casa. – Continuo andando, ignorando-o.

- Yah! Jungkook! – Viro-me para ele, irritado.

- Yah? Respeite-me garoto, sou mais velho do que você! – Ele coloca as mãos nos bolsos frontais da calça e me encara com diversão dançando em sua expressão.

- Posso te chamar de hyung então? – Solto o ar bruscamente e arqueio uma sobrancelha.

A semelhança é inexistente. Somos completamente diferentes e isso me deixa aliviado. Seus olhos pequenos, lábios acentuadamente afilados nas extremidades e queixo fino não são familiares para mim, mas sua mandíbula marcada, cor do cabelo e sobrancelhas grossas denunciam o nosso laço sanguíneo.

- Não me chame.

Sem saber o que fazer e irritado por isso e pela audácia do garoto, começo a seguir meu caminho novamente.

- Eu só quero conversar, por favor. – O tom angustiado de sua voz me faz parar. Respiro fundo e fecho os olhos, preparando-me para encará-lo.

- O que você quer? – Pergunto rispidamente.

- Eu... – O garoto não desvia o olhar de seus pés enquanto arrasta um deles freneticamente no chão, sem saber o que falar. Então, eu vejo o reflexo da criança tímida e confusa que eu era anos atrás. – Eu só quero te conhecer, sabe... – Dá de ombros.

O reconhecimento da sensação de procurar por algo que sempre lhe foi negado me atinge, fazendo-me engolir em seco. Ele finalmente foca o olhar em meus olhos e ficamos por longos segundos dessa forma em um encontro do passado com o presente dela.

- Eu sei que você não tem contato com a nossa mãe, mas... Eu só queria saber quem você é e... Sempre quis ter um irmão e agora isso está acontecendo, mas a verdade é que eu sempre tive... – Franzo o cenho, tentando inutilmente entender o que ele quis dizer e desconsiderando o jeito como se referiu a ela.

- O que você sabe exatamente sobre mim e sua mãe? – Minhas mãos começam a tremer com medo da resposta.

- Vocês não eram próximos e quando ela se separou do tio No Min, não tiveram mais contato. Foi uma escolha sua e mamãe me disse que você tinha razão. Ela nunca me contou o porquê.

"Tio No Min". "Tio No Min". "Tio No Min".

Meu pai realmente esteve presente na vida dela por todos esses anos da maneira mais ridícula possível. A raiva felizmente me toma, fazendo o meu sangue ferver e dispersando o medo.

- É isso o que você quer? Saber o porquê? – Ele inclina a cabeça enquanto pensa em uma resposta.

- Não. Quero dizer, se alguém um dia quiser me contar eu com certeza irei ouvir. Imaginar como as coisas seriam caso vocês não tivessem brigado e nós crescêssemos juntos é um pensamento que me acompanha desde que eu soube da sua existência, mas nada disso importa. Você continua sendo meu irmão mais velho independentemente do que aconteceu, então eu achei que talvez você pensasse o mesmo.

Seus olhos brilham com uma esperança que me dilacera. Massageio minhas têmporas e olho para o céu em busca de uma solução que a lógica não pode me oferecer no momento.

Se ele soubesse da verdade e que minha decisão não se fundamenta em um simples desentendimento, ele a rejeitaria?

Claramente a relação dele com ela é diferente da que eu vivi e a simples possibilidade disso ser arruinado por minha causa não me é satisfatória como eu achei que seria. Jamais me perdoaria se o brilho intenso de seus olhos pequenos se perdesse em opacidade e umidade, embora eu não possa afirmar o que sentiria em relação ao sofrimento dela.

O medo suavemente retorna e pega a minha mão, mas decido puxá-lo para onde eu quiser ir se recusar-se a soltá-la. Encaro-o e suspiro pesadamente.

- Eu não serei esse alguém que te contará sobre o que aconteceu. – Jong Suk assente e olha para o chão. – Mas...  Qualquer dia nós podemos... – Ele me interrompe, desesperado e sorrindo largamente.

- O que acha de comermos pizza agora, Jung... Ham... Hyung? Jeon Jungkook? Espera... Sr. Jeon! Isso, Sr. Jeon. Eu conheço um lugar próximo. É um pouco feio, mas garanto que a massa é ótima e bem recheada e... Você vai gostar, eu juro. Podemos ir a pé, eu fugi do meu motorista e vim andando da escola até aqui porque estava sem dinheiro, já que estou de castigo por ter mentido sobre dormir na casa de um amigo na semana passada para ir até a sua casa... Minha mãe ligou para a dele porque eu esqueci de levar o meu remédio e descobriu... – Ele estapeia a própria testa, frustrado, e então arregala os olhos, aproximando-se de mim e agitando as mãos. – Mas ela não sabe onde eu fui, eu não falei. Na verdade, eu disse que estava com uma garota, o que só piorou a minha situação... Aish! Eu vou parar de tagarelar agora...

Ele me encara com a ansiedade transbordando de seus olhos e apesar de sentir uma necessidade repentina e sem sentido de atender ao seu pedido, decido adiar essa situação. Eu preciso de tempo para entender o que está acontecendo e para aceitar isso.

- Eu tenho um compromisso agora, já estou atrasado inclusive. – Recorro à verdade. Seu sorriso se converte em decepção e um aperto no peito me assola. – Nós podemos fazer isso em um outro dia, sim? – Ele sorri e assente com o entusiasmo renovado.

Entrego a ele meu celular para que digite seu número e salvo o contato logo em seguida.

- Promete, hyung? Oh, desculpe-me...

- Pode me chamar como quiser, pirralho. – Seu sorriso se intensifica enquanto ele ajeita a mochila em seu ombro. – E eu prometo.

- Certo, hyung! Eu vou embora agora, ok? Por favor, não demore muito, eu preciso dormir e não vou conseguir...

- Tudo bem. – Assinto. – Chamarei um táxi para você. E não fuja mais do seu motorista. – Poderia levá-lo, mas preciso de espaço e realmente não quero saber onde ele mora. Onde ela mora.

Aproximo-me da avenida onde há um táxi estacionado e peço ao homem para levar o garoto para casa, pagando a ele uma quantia altíssima. Jong Suk entra no veículo e acena, ainda sorrindo, deixando a visão de sua esperança e empolgação gravada em minha mente.

*

Antes de sair de casa, avisei Jimin que iria buscá-lo no hospital em meia hora já que eu estava atrasado. Optei por usar uma camisa preta, de mangas longas e com pequeninas pedras cintilantes espalhadas pelo tecido, calça jeans escura, cinto de couro preto e sapatos da mesma cor. Deixo o carro no estacionamento interno do PMC e direciono-me à cafeteria, tentando com todas as minhas forças não me lembrar de que conheci meu irmão mais novo e pretendo vê-lo de novo. Merda, eu nem sei como aquilo terminou dessa forma.

Observo o local amplo não tão lotado e vejo, surpreendentemente, Lisa e Taehyung em uma das primeiras mesas, um de frente para o outro, conversando. Lisa usa uma blusa branca, calça preta de cós alto e barras alargadas, tênis brancos e um jaleco. Seus fios castanho-claros estão presos em um coque desajeitado enquanto ela bebe o que imagino ser a quarta dose de café já que há três copos sobre a mesa e Taehyung segura o dele, vestido como estava hoje de manhã.

Pela distância não tão expressiva, vejo-o passar as mãos pelos fios loiros e se inclinar sobre a mesa para pegar o copo da mão dela. Lisa diz algo, uma provável reclamação, mas logo em seguida sorri.

Por algum motivo desconhecido, hesito em me aproximar deles e como Jimin não está ali, penso em me afastar e ligar para ele, mas Lisa nota minha presença e sua surpresa faz Taehyung olhar para mim.

Caminho até eles calmamente enquanto envio uma mensagem para Jimin.

- Jungkook. – Lisa diz quando me sento à mesa. – O que você... O que você está fazendo aqui? – Franze o cenho em confusão.

- Eu estou esperando o Jimin. – Respondo, encolhendo os ombros. – E você? – Pergunto para Taehyung.

- Eu estava perto do PMC, então vim conversar com Lisa... – Ele a olha, sorrindo, mas então aperta as sobrancelhas. – E aparentemente evitar que ela tenha uma overdose de cafeína. – Continua, retirando novamente o copo das mãos dela.

- Yah! Eu estou aqui há quase treze horas e tenho uma cirurgia em breve, não posso desmaiar de sono.

- Você precisa descansar. – Ele retruca com a preocupação notável em sua voz.

- Todo médico sempre precisa descansar. – Uma voz até então não participante da conversa soa. – É um ciclo infindável.

O cheiro forte da canela suavizado pelo doce sutil da baunilha invade meu olfato e sinto seu corpo atrás de mim. Contenho o impulso de fechar os olhos, inebriado, para me levantar, mas Taehyung se adianta.

- Jiminie! – Ele abraça Jimin calorosamente, tirando-o do chão e sendo correspondido com o mesmo fervor e um riso doce. – Como você está? Senti saudades!

- Não seja dramático, nós conversamos no fim de semana!

- Yah! Adoro apertar suas bochechas e não dá para fazer isso por ligação. – E é exatamente isso o que ele faz. Levanto-me e encaro Jimin, que aparentemente ainda não notou a minha presença. Ele olha para Lisa sem saber como agir. Eu disse a ele, sem dar muitos detalhes, que tinha conversado com ela e estávamos bem.

- Dr. Park. – Ela se curva, cumprimentando-o.

Jimin arregala os olhos e balança a mão negativamente.

- Por favor, não há necessidade de se curvar. – Ela sorri e assente.

Jimin usa uma blusa fina de mangas compridas, gola alta e preta, calça jeans e coturnos pretos. Seu cabelo está dividido lateralmente, o que deixa alguns fios loiros pendendo sobre seus lindos e adoráveis olhos. Ele passa a mão por eles inutilmente, já que retornam para frente.

- Jungkook. – Ele inclina a cabeça e sorri, praticamente fechando seus olhos, o que me faz esquecer de tudo momentaneamente.

Aproximo-me dele, coloco uma mão em sua cintura e deixo um beijo em sua bochecha, ficando ao seu lado.

Lisa e Taehyung me encaram, sorrindo discretamente, e trocam um olhar cúmplice entre si, o que faz minha face esquentar, mas não solto Jimin.

- Vocês irão jantar? Eu estou morrendo de fome! – Taehyung diz, divertido.

- Na verdade, não sei. Não combinamos algo especificamente. – Jimin responde.

- Ótimo, eu escolho o lugar! – Ele se aproxima de Lisa e diz a ela algo que não entendo por estar focado no homem deslumbrante ao meu lado, que os observa atentamente.

- Nós não nos importamos de esperar, Dra. Manoban. – Jimin me traz de volta à conversa que se desenrola ao meu lado, surpreendendo-me com a sua fala.

- Você precisa comer bem depois de passar o dia tomando café, Lisa. – Taehyung completa.

- Eu disse que agora foi a única vez que tomei café hoje. – Revira os olhos. 

- Quatro vezes. – Digo, apontando para os copos sobre a mesa.

Lisa me fuzila com o olhar e cruza os braços, batendo um dos pés no chão freneticamente.

- Jiminie, diga a ela que isso não é bom. Ela não me escuta! – Taehyung pede.

- Dr. Park, diga a esses dois irritantes que os médicos aqui somos nós e que cafeína é vital para o nosso funcionamento, por favor?

- Ela tem razão, parem de irritá-la. – Lisa sorri, vitoriosa, e Taehyung revira os olhos. Controlo minha vontade de rir diante dessa situação inusitada.

- Yah, não se preocupe, jantarei assim que eu chegar em casa, hum? – Ela tenta tranquilizar Taehyung, que assente e suspira, conformado.

- Vamos? – Ele pergunta.

- Preciso pegar minha jaqueta e minha bolsa. – Jimin diz.

- Certo, vamos com você. – Taehyung responde.

Jimin e Lisa caminham em direção a um dos corredores, enquanto Taehyung, que mexe em seu celular, e eu os seguimos.

- Doutora? – Jimin sussurra. – Não abuse do café, hum? – Lisa sorri em cumplicidade e assente.

Entramos em outro corredor comprido, de piso e paredes em um tom acolhedor de bege e portas dispersas. Há um balcão de madeira com computadores ao lado direito e armários dispostos ao fundo.

No final, vejo um homem abrir a última porta do corredor. Atrás dele, uma mulher de cabelo preto e curto, usando uma camisola branca com bolinhas cinza, notadamente grávida, acaricia sua barriga e a encara, ou talvez, o chão. Uma enfermeira a acompanha e o homem entra na sala.

A mulher levanta a cabeça e ao ver seu rosto, eu caio em uma mentira.

Imediatamente paro de andar pois minhas pernas não mais obedecem aos comandos do meu cérebro. Um alarme ensurdecedor soa em minha cabeça como se eu estivesse diante de um perigo iminente. Minhas mãos começam a tremer significativamente e consigo sentir as glândulas sudoríparas expelirem suor através da minha pele agora hipersensível. Sinto o controle que sempre prezei e dominei se esvair junto com as gotas salgadas.

Lee Young Ae não direciona seu olhar cabisbaixo a mim e entra na sala com um semblante derrotado e desolado, sendo seguida pela enfermeira.

Uma dor latejante e abrupta atinge minha cabeça, fazendo-me dar dois passos para trás, cambaleando. Apoio minha mão direita na parede ao lado e sinto uma mão segurar meu outro braço.

- Jungkook?

O último feixe de consciência me permite identificar o tom desesperado de Taehyung e ver Lisa e Jimin se virarem, encarando-me confusos e em seguida, preocupados.

Calafrios percorrem o meu corpo e já não sou capaz de identificar ou entender os chamados direcionados a mim.

Mesmo que eu tente fugir, ainda que eu tente correr, mesmo que eu me sinta tão distante e livre, ela vem ao meu encontro. É interminável. As correntes que me prendem à indiferença e à frieza ao mesmo tempo me acorrentam à angústia, tristeza, culpa e dor, pegando-me em minha própria mentira, em meu inferno particular.

É como se eu estivesse fora da realidade durante toda a minha vida. O que eu vivi, o que achei que senti, no que acreditei, o que pensei ter superado são apenas rotas íngremes e cavernas oblíquas de uma escalada que nunca existiu.

Fábula.

Ilusão.

Miragem.

Mentira.

Dê-me o Jeon Jungkook que viveu a escalada porque eu não quero sair daquela verdade, eu quero que essa em que eu desabei seja uma ficção, uma narrativa alternativa, uma rota fantasiada.

Por favor, dê-me quem está sendo punido. Aquele Jungkook.

O meu eu inocente se perdeu há dezenove anos atrás. O seu sorriso foi tomado quando ainda era uma criança a espera de amor, quando ainda ansiava por carinho, beijos suaves, adormecer aquecido e após ouvir uma história, abraços, conforto e cuidado quando minha garganta ardia, meu peito pesava e coriza escorria do meu nariz, consolo após ralar o joelho em uma brincadeira, um toque, uma risada, um olhar doce e por uma expressão orgulhosa por conseguir nota alta em alguma prova, apesar de odiar a escola profundamente, ou por conseguir ligar o fogão sozinho e esquentar água para o lámen, meu primeiro prato como chef de cozinha.

Eu continuo o mesmo que sempre fui.

Mentira.

Por favor, ache o meu eu que foi inocente. Por favor, devolva o meu sorriso.

A mentira que cresce mais e mais está ameaçando me engolir.

Minhas mãos dormentes começam a formigar e meu coração bombeia o sangue em um ritmo inacreditavelmente possível. As palpitações reverberam em meus ouvidos e sinto como se eu pudesse escutar o sangue deslizar desesperadamente por meus vasos sanguíneos.

Minha garganta se fecha e me sinto sufocado, impossibilitado de inspirar oxigênio. Meu corpo se aquece consideravelmente e uma dor maçante toma os meus pulmões imobilizados. Minhas pernas deixam de serem sentidas e controladas e eu caio de joelhos no chão teso como se estivesse em queda livre.

Cheguei ao fundo da mentira em que me joguei.

Por favor, liberte-me desse inferno.

***

Inspirações:

All Night – BTS, Juice WRLD

Anpanman – BTS

Jamais Vu – BTS

Lie – BTS (Jimin)

Make It Right – BTS

Reflection – BTS (RM)

Série Grey's Anatomy

*Notas textuais:

¹Suportar: usado no sentido de dar suporte, apoio.

²Refiro-me ao regime nazista alemão, ciência nuclear e destruição do meio ambiente, respectivamente, principalmente sobre os acontecimentos recentes do rompimento da barragem de Brumadinho e as queimadas na Floresta Amazônica que levou fumaça às cidades do estado de São Paulo, acontecimentos ignorados por essa merda de governo.

³Jimin tem 29 anos na contagem coreana, portanto em 1990, quando nasceu, ele já tinha um ano. Na contagem que usamos, ele teria um ano apenas em 1991, tendo 28 anos hoje.

*O Jong Suk é o meu neném, é isso. Ele é inspirado no meu irmão caçula de treze anos.

*Quando o Jungkook pede por favor e para ser liberto, ele não está falando com alguém específico. As feridas que ele tem só ele é capaz de curar e o correto mesmo é ele buscar ajuda profissional. Jimin, Taehyung, seu pai e quem quer que ele permita podem apenas ajudar. Que isso fique bem claro porque romantização de transtorno/crise de pânico e traumas psicológicos não é correto.

*Explicação do título (às vezes nem eu entendo o que eu escrevo): O Jungkook viveu achando que estava bem apenas por não ter contato com a mãe e se afastar de envolvimentos com outras pessoas (que não se resumem ao relacionamento amoroso). Ele acreditava ter superado os traumas de sua infância e essa ilusão é um inferno por causa de tudo que ele precisou abrir mão. O outro é a realidade em que ele percebeu que não superou e ainda se perdeu. Ele não é mais o garoto inocente e sorridente de anos atrás, tornou-se alguém fechado e desconfiado. A resposta fica a critério de vocês.

*Votem e comentem!

Até mais!

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