Quando em Vegas

By MariaFernandaRibeir2

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Julia é uma das advogadas mais requisitadas do estado da Geórgia, e tem uma reputação a zelar pelo bem dos cl... More

Alerta de gatilho+ aviso aos leitores
Dedicatória
Prólogo
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Epílogo
Brianna e Harvey contam sua história
Contato

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By MariaFernandaRibeir2

Dustin

Sou músico há quatro anos, desde o meio da faculdade, e este foi o meu primeiro emprego. Foi uma situação estranha vir parar aqui. Eu não desejava, só fui visto cantarolando uma música que havia escrito para um professor que me incomodava e isso se tornou uma proposta, que virou o meu trabalho e que agora, ouvindo a Julia cantar uma música no banho, é um pesadelo.

Desafinada seria um eufemismo forte, ela não acerta nenhuma nota, mas como parece não se importar, tento fazer o mesmo.

Estou na casa dela por uma razão suja. Não, não é nada disso. Eu disse a ela que o hotel em que eu estava pediu para eu devolver o apartamento ao proprietário, que voltou de férias. Sei que ela não acreditou por um segundo sequer, mas, mesmo com os olhos cerrados da falta de crença, ela fez o que eu queria e me deixou ficar no apartamento dela. Olhar as fotos nas paredes me faz ver que eu não sou feliz com o meu trabalho, se ela é um exemplo a ser seguido.

Está na postura, no sorriso e no brilho dos olhos das imagens, o quanto ama tudo que faz. Eu só faço por parecer certo usar um talento para ganhar dinheiro, mas Deus sabe que não é minha coisa preferida no mundo.

— O que você está olhando aí? — ela pergunta, de pijama, atrás de mim.

Olho bem para ela fora dos terninhos e dos saltos. É estranho, quase uma outra pessoa.

— Você ama o que faz? Se sim, como soube que é a coisa certa?

Ela me observa de maneira tão diferente que me leva a crer que não esperava receber essa pergunta de mim.

— Amo. Não sei como eu soube, só... pareceu perfeito. Venho de uma família complicada, a advocacia foi um refúgio divertido no início, que virou uma paixão. Por quê?

— Ah, é que você parece amar muito tudo isso em todos os lugares que eu vejo, inclusive no seu blog.

Os olhos dela viram duas bolas.

— Como diabos você encontrou o meu blog? Não mexo nele há anos! E respondendo a primeira parte, sim, eu amo. E me ofende ser questionada sobre o que faço como advogada.

Levanto as mãos em - mais - um pedido de desculpas, e respondo a questão do blog com honestidade.

— Pesquisei seu nome na internet, e lá na página quatro ou cinco tinha este blog. Depois de todas as notícias e condecorações, claro.

A mulher é jovem pra caramba e tem mais prêmios que anos de vida, e isso até o momento em que o blog havia sido atualizado. Ela é realmente apaixonada pelo que faz, e eu nem sei se gosto de cantar. Talvez eu devesse procurar outras coisas um dia.

— Certo. Posso só... — ela aponta o quarto que não vi ainda — ligar pra polícia? Tenho um caso de stalker da quinta página do Google aqui. A terceira é o limite da normalidade, Dustin. A quarta é muito estranho, a quinta? Anotações para um crime.

Dou risada disso, e ela até ri um pouco também. É estranhamente confortável ouvir a risada dela.

— Eu ia até mais longe para os trabalhos da faculdade.

— Não tinha uma biblioteca onde você estudou?

— Sim, mas relações internacionais é necessário saber da atualidade. Como está o mundo agora? Qual país está em guerra com qual? Gosto dos livros, mas eles não eram atualizados com a frequência necessária.

Ela empina o nariz e cruza os braços.

— Um internacionalista. Gosto de você um pouco mais agora.

Não digo que acho difícil eu atingir o patamar zero para passar a ser possível gostar de mim, do ponto de vista dela. Entraríamos em uma conversa profunda sobre uma questão que não há necessidade de vir ao caso agora.

— O que você fez pra comer? — ela parece entender o meu silêncio e muda de assunto.

— Hm, nada? Eu sou seu convidado. Você cozinha.

A risada dela é barulhenta agora, como uma orquestra.

— Que piada! Eu não cozinho, Dustin. É por isso que gosto de comida pronta. Posso pedir uma? Conheço um restaurante que...

— De jeito nenhum. Você vai explodir suas artérias se comer comida pronta todos os dias, e como eu vou conseguir o divórcio de você assim?

— Bem. — ela avalia minha colocação com uma seriedade fingida — Considerando o meu estado postum mortem, você será um viúvo, e viúvos técnica e legalmente falando, não são mais casados. Ops, acabei de te dar uma ideia.

— Eu não vou te machucar, mulher. É tão difícil entender isso? E o que você quer comer?

Ela dá pulinhos de felicidade.

— Posso mesmo escolher? Macarrão com queijo.

E é claro que ela não sabe fazer nem um macarrão com queijo. Pff, como pude pensar o contrário?

— Vem cá, como sobreviveu ao período da faculdade, onde não cozinhava, claro, e nem recebia tanto para bancar a sua alimentação de rua? A não ser que recebesse da sua família.

Os olhos dela escurecem.

— Eu não... falei há pouco que a minha família é complicada, e é mesmo. E o Pierre cozinhava para mim.

Não deixo passar.

— O que você quer dizer com a sua família é complicada?

— Não quero falar sobre isso. Não tenho remédio para dor de cabeça aqui, e é o que são. Por favor, não insista. — e o pedido é tão firme que não insisto mesmo.

A refeição inicia em silêncio, depois que cozinho sem sinal dela, e penso no que dizer para quebrar isso. Antes que eu possa, o celular dela toca. Ela grunhe e levanta da mesa, conversando baixinho com alguém. Volta e enrola o macarrão no garfo sem muita vontade.

— Quem era?

— Um cliente. Ele acha que vai perder o caso, e me liga em pânico todos os dias para saber se já perdemos.

Faço um "hm" e pergunto algo que quero saber desde que descobri estar casado com ela, nada a ver com nada que já disse a ela antes.

— Você tem algum grau de parentesco com Ernest Rutherford?

Ela deixa o garfo no prato e me encara enquanto mastiga.

— Você é a primeira pessoa que me pergunta isso. Que estranho. E sim, ele é meu tio algumacoisa-avô. Não sei exatamente o grau de parentesco, porque essa é uma informação que o meu pai tem e digamos que não converso muito com ele.

Avalio essa fala, ligando com outras coisas que ela disse.

— Você era uma rebelde inveterada, né? Única explicação para ser brigada com toda a família.

Ela me olha nos olhos, e vejo que falei merda. Me pergunto se o pai dela está morto ou o quê, ou se ele fez algo com ela, ou se toda a família fez algo com ela.

— Meu pai está preso. — finalmente diz, e parece envergonhada por fazê-lo.

Ah Deus. E eu falando de criminosos como se fossem... bem, criminosos, ela é uma criminalista, não pode negar que são maus. Há algo no olhar dela que me faz ver que errei de alguma forma ao dizer algo.

— Você quer falar sobre isso? — questiono com cautela.

— Não.

Ela termina de comer e leva o prato para a cozinha sem me esperar. Merda, eu apertei algo muito errado. Termino de comer no meu tempo, o que não demora muito, e felizmente ela ainda está na cozinha, terminando de fechar a lava-louças. Coloco o meu prato lá e encaro ela. Ela encara de volta, nenhum sinal de abalo nas feições ou nos olhos.

— O fato de você não querer que a mídia saiba que estamos casados, tem a ver com o seu pai, certo?

— De certa forma. Não quero mesmo falar sobre isso ou sobre nada relacionado a isso. Bem, você me ajudou a faltar a reunião de condomínio.

— Bastante responsável da sua parte. — provoco.

Os olhos dela me perscrutam, e eu me pergunto o que ela tanto olha. Estou prestes a perguntar a ela quando ela responde a minha provocação.

— Você foi a primeira vez que eu fui irresponsável. Acabou como acabou, mas acredito que não possa ser muito pior que isso, considerando que você já está aqui. E não é como se a reunião fosse obrigatória.

Processo o que acabei de ouvir com bastante choque.

— Você tem um jeito "faço o que quero" que faz ser difícil acreditar que nunca fez nada louco antes. É totalmente a sua cara fazer tudo por impulso.

Ela me olha sob os cílios, o dedo roçando a boca de um copo que não coube na lavadora distraidamente.

— Não com as pessoas que a lei me faz chamar de família por perto, como estiveram no início da minha juventude. Ainda sou bem jovem, uma jovem-adulta pela minha idade, mas tenho medo de acabar cometendo outro você.

Pelo visto, eu virei uma ação na vida dela. Uma ação ruim. Não gosto disso. Levanto da minha posição sentada numa mesa e estendo minha mão a ela.

— Venha, vamos fazer algo louco. Nos parâmetros da lei, claro.

— E por que eu faria isso? — a pergunta soa entediada. Tento com mais afinco.

— Porque você, Juzinha, é jovem. E eu também sou. E mais do que seu amigo, sou seu marido, ou seja, você não vai acabar cometendo outro eu comigo perto.

— Não. Por que você acha que eu confio em você o suficiente para fazê-lo contigo? Até onde eu sei, isso pode ser uma armadilha.

Entorto a cabeça e olho para ela.

— Meu amor, não sei se fico lisonjeado por você pensar que eu sou inteligente o suficiente para ser capaz de montar uma armadilha, ou ofendido por você achar que me faltam escrúpulos o suficiente para montar uma armadilha. Você quer chamar alguém para nos acompanhar, chame. Você vai voltar inteira de qualquer forma. É um exercício de confiança que você precisa começar a praticar, se quisermos que isso não vire uma coisa muito ruim.

Julia

Infelizmente confiei nele, que me levou para comer comida mexicana. Ele me disse o quanto de pimenta eu deveria colocar, eu confiei. Erro grave.

— Você queria que eu queimasse por dentro, é isso? Grande amigo você.

— Eu coloquei o dobro de pimenta e estou bem, como você esperava que eu soubesse que você é peso pena?

Há poucas situações que não sou, tenho vontade de responder. Problemas da estatura reduzida.

— Você me fez chorar, e nem foi por uma boa razão! Meu Deus, o que estou fazendo casada com você? Quero dizer, um homem que me faz chorar por uma razão errada merece mesmo estar tão comprometido comigo? Se eu soubesse que você faria isso, eu teria corrido no momento que se aproximou de mim pela primeira vez.

Ele me olha de um jeito esquisito.

— O pouco que me lembro indica que não, você não teria. Estava em um salto enorme, cansada de um julgamento e em um bar cheio. Só se eu fosse alguém bem mau para você fugir.

Aponto meu rosto manchado de lágrimas.

— E você considera isso bondade?

— Eu te apresentei tacos deliciosos, sabe? Não é minha culpa se você se jogou na pimenta.

Caminhamos em silêncio pela orla do rio, e eu penso quando foi a última vez em que caminhei por tanto tempo sem motivo algum para tal. Uns oito anos atrás, talvez? Mais?

— Obrigada.

— Uau, isso é novo. Posso até ver a manchete, "Julia Rutherford agradece o marido por apresentar os melhores tacos do mundo, que a fizeram chorar até". Meu jornal é um pouco sensacionalista, chama Jornal do Ego.

Escondo o meu sorriso como uma profissional.

— Não. Obrigada por me dar uma noite de descanso.

— Ora, não há de quê. Você precisa trabalhar menos mesmo.

Não sei por que eu continuo falando, a comodidade do momento, talvez.

— Provavelmente a última noite de descanso que tive foi na formatura da faculdade, onde beijei um carinha que cuspiu em todo o meu rosto. Pior beijo da minha vida. E é um pouco engraçado eu pensar justamente nesse beijo como um descanso, foi o meu pior, horrível e...

Em um momento, ele está ao meu lado, com as mãos no bolso, ouvindo a minha história. No seguinte, está segurando o meu rosto, os lábios tão perto dos meus que ativam a minha única reação possível.

Erguer o joelho direto nas bolas dele.

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