Cubo Mágico

By OlivinhaRodrigo

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O que você faria se pudesse moldar a pessoa "dos seus sonhos" através de um cubo mágico? Sem compreender a o... More

Capítulo 1 - O Show
Capítulo 2 - O Romântico Afortunado
Capítulo 4 - O beijo perfeito
Capítulo 5 - A Inteligente e sexy riquinha

Capítulo 3 - O Bonitão Nerd Divertido

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By OlivinhaRodrigo

Sempre tive receios de perder o amor da minha vida por uma trivialidade ou, simplesmente, por não o saber identificar. Nos filmes, a narrativa raramente esclarece como ou quando esse encontro ocorre.

Porém, Lauren... Eu, que sempre tive medo de perder o amor da minha vida, mal troquei olhares contigo naquela noite do espetáculo e já percebi algo de especial em tua essência. Descobri, através de ti, que reconhecer o amor da vida está na arte de sentir, no que se experimenta ao ser olhado por aquela pessoa.

Sempre acreditei nessas coisas, então, durante minha vida inteira, busquei indícios de que Gabriel fosse meu amor verdadeiro. Honestamente, Lauren? Nunca encontrei nada que fizesse meus olhos brilharem em meu relacionamento anterior, embora fingisse que sim. Fico agora me perguntando se esse é o destino comum das pessoas no mundo: cansadas de procurar um amor pleno e compreensivo, acabam em relacionamentos medíocres, mornos, com medo da solidão.

Hoje, isso não é mais problema meu. Contigo, o encontro foi tão natural, pois bastou um toque, um olhar, Lauren... para que minha alma se reconhecesse na tua.

. . .

Acordar cedo, se espreguiçar. Este era meu ritual matutino.

Em seguida, eu vestia minhas roupas esportivas e corria por quarenta minutos pelos quarteirões. Com quatro voltas completas, retorno à casa, tomo um banho relaxante e preparo o meu café da manhã, rico em nutrientes. Meu apartamento já estava arrumado, porque eu prefiro organizá-lo ao fim do meu expediente.

Era assim que os meus dias começavam após minha separação com Gabriel. Tinha um pico de produtividade das seis às nove, e ia decaindo com o passar das horas, principalmente após começar minha jornada de trabalho ou quando eu abria o Instagram e ficava stalkeando tanto as postagens do meu ex noivo, quanto as da sua atual namorada, muito mais nova e bonita do que eu.

Além dos remédios, Doutora Martinez tinha me orientado a praticar atividades físicas e tomar sol antes das nove horas da manhã. Ela disse que isso iria me ajudar a regular o humor, sobretudo trazer mais disposição. Sendo uma pessoa mais matutina, levei suas indicações sem muito esforço. O difícil era segui-lo para o restante do dia. Às três horas da tarde, por exemplo, minha maior vontade era de ficar em um quarto trancada, lendo meus livros favoritos de romance estrangeiro enquanto comia porcarias.

Meu consumo de doces e chocolates após o término aumentou em 300% por causa da ansiedade, isso me ocasionou maior peso, principalmente nos quadris, que estava sendo diluído dia após dia graças à ajuda da Doutora Martinez e do grupo de exercícios matinais do bairro, que vira e mexe pegavam no meu pé para "seguir firme" nessa jornada fitness.

Com o aumento de peso repentino e sua posterior perda, muitas estrias apareceram no meu corpo, principalmente nas regiões das nádegas e coxas. Eu costumava não conseguir mais me olhar nua no espelho após tomar banho. Não me achava mais atraente e saber que isso tudo era culpa de um fator externo, me enchia os nervos. Isso porque eu não queria que a perda de Gabriel afetasse ainda mais a minha autoestima. Eu já não me achava boa o bastante, agora esteticamente feia? Me tornava uma completa coitadinha, que só vivia reclamando, uma vítima enquanto ele vivia a melhor vida possível ao lado de sua nova mulher. Eu não queria mais me sentir assim.

Nessa parte meus amigos eram meus melhores aliados. Dinah estava me visitando com maior frequência desde o dia do show. Normani, que quase nunca passava aqui, também arrumava um tempo para contar suas histórias e melhorar meu dia. Até Gustavo, o irmão mais novo de Gabriel, arranjou espaço em sua agenda extremamente desocupada para falar comigo. Eu podia reclamar de tudo na minha terapia, menos dos meus amigos. Eles sempre foram presentes e bons comigo. Eu quase nunca me sentia sozinha.

— Vestido ou macacão?

Comecei a me olhar no espelho ainda de toalha e com pingos de água escorrendo pelo meu corpo. Estava verificando os modelitos que tirei do guarda-roupa para usar durante o almoço com Lauren que eu teria mais tarde no restaurante da Dona Olga.

— Melhor o vestido mesmo... — era florido, de mangas caídas no braço e de cabimento longo, cobria até meu calcanhar. Como era verão e eu gostava de cores e estampas, optei por aquela opção sem hesitar. Além de ser soltinho, o tecido dele não me esquentava e modelava bem as curvas que eu estava retomando com ajuda das corridas matinais. — Acho que está bom... — olhava para o vestido e depois para o macacão jeans que mostraria às minhas pernas com celulite e estrias. Respirei fundo, fechando os olhos. — Está ótimo, Camila. Okay.

Após Jauregui me pegar desprevenida ontem à noite, usando uma camiseta do Santos e um chinelo gasto, eu queria parecer minimamente deslumbrante para ela. Para tanto, havia feito minhas unhas, porque acredito que seja algo que uma amiga repare. Diferente da aparência vitimista e cabisbaixa que eu sustentava com meus verdadeiros amigos, para Lauren eu gostaria de ser, nem que fosse momentaneamente, uma mulher confiante e independente, igual a ela.

Ela falava de todos os assuntos com muita propriedade e bom humor, energias negativas não duravam muito tempo em suas conversas, não era algo que prezávamos no assunto. Era uma mulher sonhadora, que enxergava gentileza em todas as pessoas e lugares que conhecia, e eu gostava disso, gostava de como a personalidade animada dela me contagiava a ser uma pessoa igualmente sonhadora e gentil.

Seu gesto de me visitar ontem à noite, presenteando-me com a caixa de bombons e um desenho de seu aluno Marcos, mudou completamente o término do meu dia. Nem a surpresa de Jonas e as memórias da péssima noite na cama que tive com ele foram capazes de apagar o sorriso que se desenhava no meu rosto sempre que eu lembrava dela, chegando toda despretensiosa com aqueles presentes, mal sabia que faria o meu mês com aquela atitude.

Essa mulher de uma maneira estranha me fazia se sentir especial. E ao me sentir especial, eu me sentia viva novamente. Aquilo foi a melhor sensação que um ser humano poderia fazer por mim, com ela por perto, parecia que eu não precisava das medicações para me sentir bem. Eu reagi, por isso estava me arrumando para encontrá-la, extremamente ansiosa para rever uma pessoa que, com o seu modo de ser, levantava meu astral.

Passei perfume, me olhei umas quatro vezes no espelho para arrumar meu cabelo escovado. Encontrar Lauren na tarde de hoje passou a soar como o evento mais esperado do meu dia. Eu mal podia contar os minutos para ouvi-la falar do seu dia na escola ou de como foi sua noite após deixar meu apartamento.

Por Whatsapp, ela era causa perdida. Não respondia, não ficava online. Ela tinha me dito antes de ir embora que não gostava de conversar por ali e que geralmente não tinha tempo para ficar olhando o celular. No exato momento, achei que estivesse exagerando, afinal, todo mundo fala isso para as pessoas que não queremos responder, mas em seu caso, especificamente, ela estava falando a verdade. Ela desaparecia das redes sociais e não respondia ninguém. Se eu não tivesse visto e tocado ela no show e ontem à tarde, eu diria que Lauren é fruto da minha imaginação.

Pego minha bolsinha e celular. Checo minha carteira, tudo estava em seus devidos conformes. Deixo meu apartamento e vou caminhando com bom humor pelas calçadas do Morumbi. O dia está ensolarado e diante de tantas pessoas usando as cores verde musgo, cinza elefante ou azul marinho, cá estava eu, iluminando aquele bairro com um vestido florido de cores claras: branca, amarelo e azul, com detalhes pretos nas folhas das flores. Calcei uma rasteirinha que quase não era vista devido ao comprimento do vestido. Meu cabelo estava divino, eu tenho certeza que Lauren não deixaria de notar assim que pusesse os olhos no meu corpo.

Próxima ao restaurante de Dona Olga, cumprimento alguns moradores e já chego mais para perto da porta de entrada. Era meio dia e doze. Tínhamos combinado de se encontrar meio dia e quinze, então eu estava adiantada três minutos, enquanto ela, certamente presa na sala com as crianças que tanto adorava.

— Boa tarde, senhorita.

Estava esperando por Lauren quando um belo rapaz de cabelo morenos e olhos azuis me abordou na portaria. Ele trabalhava no restaurante, estava uniformizado com as cores vermelha e preto, além de segurar o cardápio.

— Olá, boa tarde. – respondo em educação.

— Poderia lhe ajudar? Temos mesa para dois vazias.

A voz dele era grave e bonita, de uma maneira que me atraía profundamente.

— Eu estou a espera de uma amiga. Você acha que está muito lotado? Provavelmente em dez minutos ela chega. — olhei o celular e nenhum sinal de Lauren Jauregui. Talvez demorasse mais que dez minutos... provavelmente demoraria uns vinte ou trinta, eu tenho um afilhado pequeno e sei bem como crianças funcionam.

— Acho que seria bom a senhorita reservar a mesa de vocês duas. Hoje, geralmente das doze e quarenta até uma e meia da tarde, lota. É o horário que o pessoal sai para almoçar.

— Tudo bem, vou querer uma mesa, então.

O rapaz me cedeu passagem, direcionando um sorriso perfeitamente branco e alinhado em minha direção. Eu sabia que estava bonita, mas não para um homem fortão, alto, moreno e de olhos azuis sorrir daquela maneira para mim.

— Podemos regular a temperatura do ar, caso necessite. — ele comentou baixo, assim que chegamos na mesa em frente à janela de vidros fechados. Coincidentemente, a mesma que eu e Lauren nos sentamos ontem. — Aqui está o seu cardápio, senhorita.

— Muito obrigada, Michel.

Li seu nome pelo crachá pendurado em seu uniforme. Um belo nome, um lindo homem. Lauren ficaria de queixos caídos se o visse também, mas provavelmente Michel perderia o interesse em mim e passaria a senti-lo em Jauregui. Eu não o julgo. De fato, ela é uma mulher de arrancar suspiros.

Passou minutos, entrou minutos, e nenhum sinal de Lauren passar por aquela porta. Deu uma hora da tarde. Ela não me avisou nada por celular. Me senti extremamente frustrada. Muito. Eu sabia que ela tinha furado comigo.

Decidi pedir meu almoço, não faria uma viagem perdida. Feijoada acompanhada de uma coca gelada e uma rodela de limão no copo de vidro. Quem serviu o meu prato não fora Michael, mas um outro rapaz, tão jovem que parecia estagiário.

Ficava olhando o celular na esperança de ela aparecer, mas isso não aconteceu no dia 26 de setembro de 2023.

— Ainda sozinha?

— Pelo jeito minha amiga furou comigo. — esbocei um sorriso amarelo. Michel estava de volta, desta vez sem a roupa de expediente.

— Posso te acompanhar? — o homem alto e moreno perguntou.

— Não se incomode, eu almoço rapidinho.

— Isso é uma maneira educada de falar "não"?

Sorri sem mostrar os dentes, até parece que eu iria rejeitar um homem bonitão desses que queria me fazer companhia.

Me ajeitei mais para o lado e em seguida Michel já estava com seu prato, almoçando comigo.

Assim como Lauren, Michel era uma pessoa falante e espontânea. Beirava ao charme por ser extremamente inteligente e engraçado. Ele estudava enfermagem e era apaixonado pela Marvel. Eu não entendia nada desse universo de super-heróis, mas me senti convidada a aprender um pouco mais sobre o homem de ferro após ele me contar que era seu personagem favorito.

Era raro encontrar pessoas com um papo interessante, que te distrai de tal forma, que te faz esquecer os problemas. Foi isso que aconteceu comigo. Eu esqueci o tempo sob a presença de Michel. Não estava mais furiosa que Lauren havia esquecido de mim, furado o nosso almoço. Michel era uma companhia tão boa quanto a dela.

Após terminarmos o nosso almoço, trocando sorrisos, me levantei para pagar a conta. Michel não precisou pagar a sua, o almoço no restaurante em que trabalhava era por conta da casa. Comprei um picolé para mim e outro para ele, que me fizera se sentir especial nesta tarde do dia 26 de setembro.

Ao final, agradeci sincera sua companhia durante o almoço. Trocamos nossos números de WhatsApp e prometemos continuar nossa conversa por lá, visto que eu precisava voltar a trabalhar, cerca de 25 artigos me esperavam para serem corrigidos antes de publicados no portal. Michel não me falou para onde estava indo, mas suponho que seja ou para sua pós graduação, ou para outro trabalho, uma vez que cumpria meio período no restaurante de Dona Olga, e para se manter em uma região do Morumbi, três salários mínimos ainda não eram suficientes, ainda mais se você pagasse aluguel, que era o caso do homem de acordo com suas palavras durante o nosso maravilhoso almoço.

Sai do restaurante acenando para Michel, completamente deslumbrada por tê-lo conhecido nesta tarde.

O homem metido a alto e bonitão, além de inteligente, era muito engraçado. O tipo de companhia que te faz sorrir e parar de pensar nos problemas. Eu adorava pessoas assim. A primeira que conheci desse tipo foi Lauren, que por sinal, não havia me mandado mais mensagens. Tentei não focar nisso e não precisei fazer muito esforço, sendo bem sincera. Assim que cheguei em casa, Michel havia me mandado mensagem. Ele mandou um emoji de "👋".

Camila: Oi! — 02:00 p.m

Era um alívio falar com Michel, após ter conhecido Jonas. Embora nada romântico, o garçom do restaurante da Dona Olga tinha simpatia e isso o deixava ainda mais charmoso. Inteligência e bom humor eram duas das características que mais me atraiam e isso, aos meus olhos, o deixava ainda mais bonito.

Camila: Gostaria de agradecer pela milésima vez sua companhia no almoço de hoje.

Camila: Foi um prazer conhecê-lo.

Preparei minha mesinha com o notebook e garrafa de água. Sempre gostei de ter as minhas coisas todas nos lugares. Minha casa nunca estava bagunçada, só quando por ventura alguma visita se hospedava aqui e eu ficava com receios de corrigi-la de dois em dois minutos. Eu precisava de um ambiente limpo, claro e organizado para conseguir trabalhar ou o que quer que fosse.

Michel: Meu pix pelo serviço prestado durante o seu almoço, ou seja, minha companhia, é meu número de telefone😉 ficou no total de R$80,00, senhorita. – 02:02 p.m.

Camila: Bobo!😁

Soltei uma gargalhada alta e sincera ao ler aquela idiotice toda. Ele era assim: não perdia a oportunidade de fazer uma piadinha.

Michel: Você me agradece como se eu tivesse te feito um favor😔 Mas o prazer foi todo meu em ter almoçado ao lado de uma companhia tão boa. Eu fiz o meu trabalho e ainda conheci uma ótima pessoa.

Ele era um pouco mais novo do que eu. Tinha vinte e quatro anos. E isso de verdade não era um problema para mim, se caso um dia fôssemos nos conhecer melhor. Desde que a pessoa tivesse maturidade, mais de dezoito anos e soubesse se virar com as próprias pernas, o fator idade numa escala de até nove anos de diferença não iria importar para mim, apesar de preferir pessoas mais velhas.

Conheço amigas que namoram caras sete anos mais velhos do que elas, e outras que namoram rapazes oito anos mais novos. Algumas tem muitas dores de cabeça e reclamam de não se identificarem com a personalidade de seus pares, mas todas são muito felizes no final das contas.

Não acredito que a idade seja o principal fator para um casal viver o seu "felizes para sempre". Eu e Gabriel, por exemplo, tínhamos a mesma idade praticamente. Frequentamos a mesma faculdade, construímos o mesmo ciclo de amizade, para no final, após sete anos e nove meses de união, ele me trair e terminar a nossa relação em prol de começar uma nova com uma mulher mais bonita e jovem.

Lauren: Oi? Tudo bem? — 02:09 p.m.

Noto as mensagens da professora de história aparecerem na barra de notificação. Espero alguns minutos antes de abri-las. Ela demorou para responder as minhas, nada mais justo, certo?

Enquanto isso, passei a ligar meu notebook. Precisava terminar de corrigir logo alguns artigos, do contrário eu ficaria trabalhando até tarde. Minha sorte era que os artigos com mais de doze páginas eu já havia concluído pela manhã. Meu trabalho não envolvia apenas corrigir os erros ortográficos, mas saber se as informações descritas no artigo era, no mínimo, coerentes. Eu não poderia aprovar uma matéria que afirmasse que o planeta terra é plano ou notícias extremamente sensacionalistas, por exemplo. Qualquer erro de comunicação da matéria para com o público seria crucial e posteriormente colocado nas minhas costas. Minha função exigia sensibilidade e coerência, para que o máximo de pessoas pudessem compreender as informações presentes no artigo, e que, necessariamente, fossem informações verídicas, cientificamente comprovadas se fosse o caso.

Camila: Oi, Lauren. Tudo bem e você? — 02:14p.m.

Lauren: Tudo sim. — 02:14 p.m.

Lauren: Me desculpe ter furado o nosso almoço. Uma das crianças passou mal ao ter comido o lanche que trouxe de casa, e eu precisei esperar os pais dela chegarem para explicar toda a situação. Espero que entenda.

Eu digitei uma mensagem e depois a apaguei. Eu não sei de onde surgia esse cuidado todo que eu tinha com as palavras quando o assunto era essa mulher. Bastava agradecê-la por se justificar, não é?

Camila: Não precisa se explicar, eu entendo perfeitamente.

Não sei como Lauren aguentava uma vida dessas. Me sinto tão egoísta por estar xingando mentalmente essa pobre criança só porque ela me tirou alguns minutos bons do dia de hoje ao lado da mulher de olhos verdes.

Camila: Você já almoçou?

Isso foi corajoso da minha parte, confesso. Soou como um convite, eu acho. Não tinha feito almoço e precisava fazer compras pela manhã de amanhã. Espero que ela já tenha almoçado, porque se não tiver e tiver entendido isso como um convite, ela vai comer arroz e ovo cozido aqui em casa.

Lauren: Já sim, muito obrigada.

Suspirei aliviada mexendo no meu notebook e olhando o celular ao mesmo tempo.

Mesmo que ela viesse, jamais oferecia só arroz e ovo pra ela. Penso enquanto sorrio para essa trapalhada. Jamais, ela mora no condomínio mais chique da região.

Camila: Por nada.

Achei que a conversa teria se encerrado por aí, por que na verdade teria que ser encerrada uma hora ou outra. Mas não foi bem assim que aconteceu.

Lauren: 👀 – 02h30 p.m.

Lauren: Bom...

Lauren: Você não me convidou, mas eu mesma me convido, não tem problema!

Lauren: Posso me redimir passando na sua casa mais tarde, o que acha?

Vi suas mensagens chegarem pela notificação da barra do celular, que vibrou em cima da mesinha.

Camila: Passar aqui?

Eu devo ter feito uma pressão psicológica enorme em cima dessa mulher para ela se convidar assim.

Pensar nisso me encheu de vergonha. Imagina só? Assustar Lauren por querer encontrá-la? Não, não, isso não está certo.

Camila: Não, não precisa😆 – 02h36 p.m.

Camila: Imagina, não se preocupe, Laur❤️ A gente pode marcar um almoço amanhã, não se preocupe com isso, de verdade mesmo.

Lauren: Isso é uma maneira educada de me dizer "não", senhorita? 😲

Ri de bochechas coradas de seu bom humor evidente. Lauren era uma pessoa dura na queda, até quando me abordou no show do Jorge e Mateus precisou ser paciente para que eu a aceitasse como companhia. Ela se esforçava para ficar perto e eu gostava disso. Gostava de me sentir cortejada e interessante, fazia um bom tempo que ninguém fazia isso por mim.

Camila: Qual horário?

Lauren: O mesmo de ontem.

Lauren: Esse é o horário que saio da escola e estou mais próxima da sua casa, okay?

Camila: Ai, Lauren! Só você mesmo para se preocupar com uma coisa dessa🥹

Lauren: Não sou de furar compromissos, linda.

Lauren: Palavras são palavras!🤞

Camila: Eu super topo, então!

Camila: Nos vemos em breve❤️

Lauren: Até mais.

Após aquela breve conversa, eu passei a trabalhar mais animada e eficiente. Queria terminar cedo para poder arrumar minha casa e preparar alguns aperitivos para degustarmos enquanto conversássemos, então assim o fiz.

Às seis horas tudo estava pronto e eu já tinha tomado banho e vestido uma calça jeans com blusa regata colada que mostrava um pouco do meu decote. Logo após, lembrei que não tinha queijo ou tira-gostos na minha geladeira. O que eu fiz? Sai de chinelo e mechas do cabelo molhadas pela rua e pedi um Uber. O mercado era quinze minutos de casa se eu fosse a pé, não compensaria gastar trinta minutos andando e depois chegar toda suada em casa.

No setor de frios, com a minha cestinha pendurada no braço, sinto alguém tocar meu ombro direito.

— Não acredito! — disse ele, mais entusiasmado que na hora do almoço. — Vou achar que está me seguindo, hein!

— Tecnicamente você que me abordou, Michel! — caí na gargalhada em conjunto com o rapaz. Ele estava com o carrinho cheio de coisa, entupido até a ponta. A maior parte delas era alimentos orgânicos, descobri nessa tarde que o garçom do restaurante da Dona Olga levava uma vida fitness. — Que bom revê-lo.

— O que vai comprar aí? — ele nem perguntou se podia, foi se juntando para mais perto e, de repente, já estávamos juntos novamente.

— Frios. Mussarela e Mortadela. – respondo.

— Eu odeio cada um, mas para uma mulher bonita como você, eu não só comeria, como também repetiria tudo!

Minhas bochechas coram e eu sinto vontade de me enfiar em algum lugar que o homem bonitão não pudesse me ver. Céus! Como era bom ser cortejada assim mais uma vez, me fazia se sentir no auge dos vinte anos, na faculdade, onde tecnicamente eu era uma jovem atraente.

Ficamos conversando na fila ao final de tudo. Peguei a fila do caixa com mais de quinze produtos apenas para acompanhá-lo naquele assunto que parecia não ter fim. Ele era tão bonito e atraente que me fazia se perder nos compromissos que eu havia planejado.

— Madrinha!!! — meu coração quase saiu pela boca ao ouvir o gritinho saltitante e feliz do meu afilhado, João Lucas, filho de Dinah, atrás de mim. — Madrinha, que saudade!!! — ele pulou no meu colo como quem não me visse há meses, o garoto me adorava e tinha sete anos.

Eu sempre achei que não levava jeito com crianças até cuidar do João. Nunca gostei da tarefa de educar uma criança porque nunca me achei preparada o suficiente para tanto. Me admira pessoas como Lauren ou Dinah. E me admira ainda mais garotos tão comportados e gentis feito o meu afilhado.

— Ôh, meu amor! — deixei a cesta com os frios descansado no chão do supermercado antes de me agachar para recebê-lo de braços abertos. Não existe alegria mais pura e contagiante que a de uma criança. Eu senti sua energia me infectar inteira, era sempre muito bom vê-lo no dia a dia. — Ai que felicidade! — o apertei quase que o esmagando em meus braços. Ele ainda tinha aquele cheirinho de bebê que eu tanto amava. Seus cabelos eram encaracolados e cheirosos. Seu olho era castanho semelhante aos de seu pai. Parecido com Dinah, apenas a mente. O resto era a cara e a personalidade inteira de Thiago, marido da minha melhor amiga. — Como você está?!

— Acabou de voltar do hospital, Chan. — e por falar nela... Dinah empurrava o carrinho de supermercado, estava de roupa social, provavelmente viera do banco diretamente para o supermercado. Estava muito elegante, muito linda. — Ele passou mal na escolinha, a sorte que a professora dele percebeu o rosto que ficou todo vermelho e correu para levá-lo na enfermaria.

João deixou de me apertar, e se separou dos meus braços, beijando minhas duas bochechas. Seus olhos brilhavam em me ver, tocar, cheio de saudades.

— Oh, meu Deus, o meu nenemzinho ficou doente, Chee? — fiz um biquinho comovente, apertando as duas bochechas de João. Enquanto isso, a filava andava e Michel mantinha-se conosco, observando tudo em silêncio e com um sorriso nos lábios. — E você nem para me avisar? Eu poderia ter ido buscar ele na escola. O colégio é mais próximo da minha casa do que do seu trabalho e-

— Ele é atentado, Camila. Essa criança puxou o Thiago inteirinho! — o fitou de maxilar cerrado, como quem estivesse brava e tudo que fiz foi também olhar para João, que guardava no rosto um sorriso sapeca. Ele tinha aprontado. — Fala pra ela, João Lucas. Fala o que você fez que quase te causou uma reação alérgica e te fez morrer na sala?!

João colocou as mãos para trás, balançando o pezinho direito de um lado para o outro feito um bom menino.

— Agora ele fica quieto na frente da madrinha, Camila. Mas ele sabe que está errado. Já está grandinho e precisa assumir os erros.

— O que você fez, João?

Vestia o uniforme da escola das cores azul marinho, branco e amarelo. Ele estudava em uma das escolas mais caras e renomeadas da região.

— Eu comi o sanduíche que a tia Jô fez e não sabia que tinha pasta de amend-

— O que eu já falei sobre mentiras, João? — o menino correu até se segurar nas minhas pernas, onde se escondeu atrás de mim. Dinah jamais levantou a mão para ele, mas impunha respeito e ele sabia que estava encrencado. — Continua mentindo mesmo que daqui a pouco o homem do saco vai vir te buscar e vai te pegar no quintal de casa. Eu não vou fazer nadinha para te salvar dessa vez. — Jane empinou o nariz e eu sorri com a mão na boca. — Fala pra ele, Camila.

— E leva mesmo, viu? A madrinha tinha uma prima muito mentirosa do interior que foi levada depois de tanto mentir para a mãe dela. O nome dela era Griselda, coitada. — João era um garoto muito obediente e inteligente, mas isso ainda não o impedia de sentir medo das lendas urbanas que eu e Dinah o contávamos vez ou outra.— Ela mentiu uma vez, duas, e na terceira... — coloquei a mão na testa, negando a cabeça em falsa lamentação.

— O quê? O quê?! — ele perguntou quase que roendo as unhas.

— Oh, João... na terceira não teve mais chances para a Griselda. No outro dia, minha prima desapareceu... para sempre. O homem do saco levou ela.

— Eu lembro dela, coitada, tão nova e bonita, Chan..

— Vocês estão mentindo! — ele alegou, cheio de medo, apontando para mim e para a mãe malvada dele.

— Nós? — coloquei a mão no peito, fingindo estar ofendida com a acusação. — Não, não. — neguei mais uma vez a cabeça. — Eu e sua mãe jamais mentiríamos. — e como Dinah e eu gostávamos do mal feito... — Morremos de medo do homem do saco levar a gente igual levou a prima Griselda, que Deus a tenha, pobrezinha.

O garoto parou de agarrar minhas pernas com suas mãos minúsculas e cruzou os braços, retornando ao lado de sua mãe.

— O que aconteceu? — pergunto só para minha amiga ouvir.

— A Thaís passou na Unifesp e eu precisei contratar uma nova babá. — Dinah disse. — Nisso, esse menino se aproveitou, porque hoje foi o primeiro dia da nova babá e eu mal tive tempo de explicar pra Joana o que ele não podia comer. Ele sabia que não podia comer amendoim e mesmo assim pediu pra Joana fazer um sanduíche de pasta de amendoim para levar pra escola. Ou melhor, "pasta de amendoim de sanduíche", porque eu nunca vi tanto recheio em um pão só, como esse de hoje. Quase morre sem respirar e agora está assim, rindo e achando graça de tudo. Eu posso com uma criatura dessas, Camila? — soltou um suspiro longo fechando os olhos, o que me fez lembrar o benefício de não ser a mãe nessas horas. — Me diz?

— Estou muito decepcionada, João. — proferi com semblante negativo. Ele olhava para o chão, todo tímido. — Você poderia ter sofrido algo bem pior. Alergia não é brincadeira, estou realmente decepcionada porque para mim você já era uma homenzinho.

— Eu sou, madrinha!

— Ele sabe que vai ficar sem videogame por uma semana já. Fala pra madrinha, filho.

— Eu vou ficar sem videogame... — respondeu com a animação de um trabalhador CLT na segunda-feira de manhã.

— Deus o livre sua professora não está lá e você passa mal? Nunca mais faça isso, mocinho. Espero estar entendida com você.

Tem pessoas que nascem para determinadas profissões e eu acho isso simplesmente esplêndido. Essa professora, por exemplo, poderia estar em qualquer outro compromisso desimportante. Que sorte a nossa que ela estava ali e que bom que socorreu o meu afilhado.

— Você conhece ela, Camila. — minha amiga prontamente me corta dos pensamentos. — É a... Luana? — estreitei minha sobrancelha. Laura era minha pedicure, o que ela estava fazendo na sala de João? — Lívia?

— Quê? — questionei ainda que franzindo o cenho.

Livia era o nome da atual mulher de Gabriel.

— Laur... Lauren! Isso.

Lauren? A minha Lauren?

— Lauren? — repeti suas palavras, sentindo que Dinah estava tão atolada de problemas, cheia de coisas para resolver e um filho de sete anos para cuidar, que simplesmente estava ditando os primeiros nomes que viessem à mente. — Que Lauren?

— A Lauren do show do dia 23, lembra?

Fiquei pálida ao ouvir o nome da mulher de olhos verdes. Era mesmo da minha Lauren que ela estava falando.

Fico me questionando quanto tempo levaria para eu chegar na equação básica: Colégio de gente rica + aula de história para criança entre 7 anos = meu afilhado é da turma de Lauren Jauregui.

— Que bacana. — foi tudo que respondi com um sorriso amarelo nos lábios, me lembrando muito bem que horas atrás eu estava xingando mentalmente a criança que fizera Lauren cancelar o nosso almoço no restaurante da Dona Olga. — Que bacana que ela pode o ajudar, Chee. O mundo é um ovo mesmo.

– Nem me diga, amiga. Ela salvou esse menino.

— O rapazinho é realmente corajoso.

E por falar no restaurante da Dona Olga...

— Corajoso, Michel? — questionei com um sorriso sem graça, ele não podia estimular esse tipo de comportamento, ainda mais do lado da criança. — Isso foi a coisa mais perigosa e irresponsável que o João poderia fazer. — corrigi-o imediatamente, tendo em vista que o garoto ouvia tudo que falávamos. — Não o incentive, por favor.

— Não estou incentivando.

— E ele...? — Dinah o analisou de cima a baixo, o mediu para ter certeza do que estava vendo. E sendo extremamente sincera? O homem ao meu lado era um pedaço de mau caminho. Sarado, alto, lindo e inteligente. Dinah o olhava como quem tivesse se deparado com uma celebridade. Ele pareceria uma se não fosse pelas roupas baratas e um pouco gastas que não estava usando. — Quem é? — cochichou para mim.

— Ah, pessoal, me desculpe. Esse é o Michel, meu amigo. — o apresentei com um sorriso nos lábios. — Michel, esse é o pessoal. Dinah é a minha melhor amiga e o Joãozinho é o meu afilhado do coração.

João acenou para o garçom e Dinah continuou olhando incrédula para mim e para ele, de maneira que eu rapidamente entendesse seu contato visual. Ela estava chocada com aparência física do rapaz.

— Desde quando você conhece ele?

— Eu o conheci hoje, Chee. — respondo. — Não é surreal? Ele trabalha por aqui, mas nunca tinha o visto antes.

Dinah me chamava de Chancho e eu costumava a chamar de Chee desde o nosso primeiro semestre na faculdade, onde nos conhecemos no trote para calouros. Ela cursou economia enquanto eu, jornalismo na USP. Era um apelido particular nosso, muito fofo na minha concepção embora não tivéssemos mais nossos vinte anos de idade.

— Ele é muito bonito, mas achei que você preferisse loiros. — disse só para eu ouvir. Dinah estava mais próxima de mim do que Michel, que neste instante estava entretido brincando com João. — Você só beijou loiros desde que te conheço por gente, querida.

— É.. — e eu realmente gostava de loiros, sempre foi a minha preferência majoritária. — A fila anda e os gostos mudam, não é mesmo?

— Gostei de ouvir isso, combina muito mais essa skin com você do que aquela "Era Deprê" antes do show.

Dinah falar aquilo tão abertamente me fez rir de verdade. Era bom saber que ela ou nossos amigos não me viam mais como a "coitadinha" que vivia no país coitadolândia, apenas se lamentando. Queria que a nossa amizade voltasse a ser como era antes, antes de Gabriel.

— Até parece que aquele show do Jorge e Mateus te raptou e nos trouxe a velha Camila de volta. Não parece a mesma pessoa e isso é ótimo.

Eu parei pra pensar e realmente... realmente meu modo de pensar, a forma que eu estava me portando ou enxergando o mundo mudou. Era muito bom poder se sentir assim novamente.

— Concordo, Chee.

— Fico feliz, amiga. De verdade. Fico realmente feliz que tudo esteja se ajustando para você, ficamos muito preocupados que isso levasse tempo o bastante e você acabasse perdendo bons momentos por uma pessoa que não merece mais suas lágrimas.

— Sim, por sinal, eu-

"Camila?"

— Oi? — me virei com um sorriso, parecia a voz de uma pessoa familiar feminina. Meus olhos percorrendo cada centímetro do supermercado, caixa por caixa, fila por fila para ver se eu enxergava a pessoa que havia chamado pelo meu nome. — Oi?

"Camila?!"

Agora foi um pouco mais aflito e desesperado. Eu odiava que me chamassem por aquele tom. Me arrepiava até a espinha, no mal sentido da frase.

— Oi?!

— O que foi? — Dinah questionou. Michel e João pararam de brincar e passaram a olhar pra mim.

— Alguém me chamou. — olhei para trás, realmente parecia a voz de uma pessoa extremamente querida e familiar.

Era a primeira vez no dia que eu a ouvia novamente. Ontem, foram duas vezes.

— Ninguém te chamou, Camila. — Dinah respondeu. A voz vinha detrás de mim.

— Eu não ouvi nada também. — Michel diz, empurrando o carrinho. Era sua vez de ser atendido no caixa.

Envergonhada, peguei minha cesta do chão e passei a ignorar o assunto. Me sentia louca nesses instantes. Não era possível que só eu ouvi uma mulher chamar pelo nome em alto e bom tom.

— Será que é a prima Griselda voltando? — meu afilhado, medroso, correu para abraçar as pernas da mãe alta.

— Quieto, João.

Repleta de vergonha, começo a ajudar Michel a descarregar o carrinho. Ele comprou tanta coisa, que parecia haver suprimentos das marcas mais baratas para o equivalente à uma família de oito pessoas.

— Você vai ter um trabalhão para levar tudo isso ao seu carro, Mi.

— Carro? — soltou uma gargalhada enquanto colocava no carrinho as coisas que já haviam passado pela moça do caixa. — Ah, aquela parada do carro no restaurante foi brincadeira, linda. Eu vou de busão pra casa.

Abri um sorriso amarelo e tenho certeza que Dinah fizera o mesmo logo atrás de mim. Com aquilo tudo no carrinho, ou ele pediria um táxi, ou ele reservaria metade dos assentos e espaço de uma ônibus para caber tudo.

Era impossível Michel ir de busão para casa com aquele tanto de coisa.

— Eu não tenho carro, linda.

— Você vai pedir um Uber, então? — perguntei enquanto olhava para a tela que mostrava o saldo da conta a pagar. Estava beirando os novecentos e trinta reais, e a moça do caixa chamada Aline não tinha passado tudo ainda.

— Uber? – riu nasal. — Só se o Joãozinho pagar.

— Eu não! — meu afilhado rebate como quem não tivesse entendido a piada. Óbvio que era uma piada. Foi a piada menos engraçada que ele contou hoje, mas ainda assim era uma piada.

Michel pega a carteira do bolso e retira dali seu vale alimentação. Não querendo mais invadir sua privacidade e disposta a ajudá-lo a pagar um Uber para que ele pudesse voltar para casa, como presente em agradecimento à maravilhosa companhia que ele me fez no restaurante, voltei a conversar com Dinah quando, de repente, ouvimos:

— Mila, pode vir aqui rapidinho, meu amor?

— Ele me chamou de "meu amor"? — perguntei para Dinah, toda boquiaberta, incrédula, eu estava ouvindo tantas coisas ao longo dessa semana, que tenho medo de ter ouvido sozinha Michel me chamar de "meu amor".

— Chamou, Chan. Você se deu bem. Eu falei que ele estava caidinho por você. — ela me deu um tapinha no ombro em puro incentivo para eu me aproximar do rapaz metido a galã.

Ajeito meu cabelo e blusa regata, onde, cuidadosamente, volto à parte principal do caixa. Queria parecer atraente. Todo mundo me invejaria se eu saísse ao lado de uma pessoa tão bonita feito o Michel.

— Me chamou? — aqueles lábios carnudos, aquele cabelo liso e moreno que me deixava louca... ele era a primeira pessoa que me chamava de "meu amor" após meu ex noivo. Isso de certa forma, para mim, soou especial e completamente novo e convidativo.

— Eu estou com um problema, linda... – cochichou no meu ouvido. — Meu vale alimentação acabou e ainda está faltando quatrocentos reais pra pagar. Você pode pagar pra mim que assim que eu receber da Dona Olga eu te faço um pix, por favor?

Meu sorriso se desfez mais rápido que as chances do Brasil vencer a Alemanha na copa de 2014.

O olhar da moça do caixa foi como um balde de água fria, acompanhado de um sorriso que parecia dizer: "Ah, claro, mais um casal apaixonado na fila do supermercado". E, de repente, a ficha caiu: Michel não estava sendo romântico, ele estava apenas sendo... espertinho demais.

Enquanto tentava manter uma expressão digna de um Oscar, minha mente divagava: eu ajudou ou não ajudo esse menino? Tudo bem que ele é bonito, mas nós mal nos conhecíamos, quem iria me garantir que na data de pagamento ele iria reembolsar meus mais de quatrocentos reais?

Enquanto tentava recuperar minha compostura, não pude deixar de rir internamente da ironia da situação. Ontem, foi um cara rico, mais feio que um cão chupando manga e mais burro que uma porta. Hoje, um galã inteligentes, duro de grana feito uma tábua de madeira. O que o destino estava reservando para mim com tanta peculiaridade, céus?

Eu era muito idiota mesmo de achar que um cara bonito desses poderia estar a fim de mim. O que tinha de lindo tinha de pé rapado, e homem encostado, para mim, só perdia para homem brocha e eu não queria contato com nenhum dos dois.

— Desculpa, Michel, mas não posso te ajudar a pagar um valor desses. — escutei meu cérebro ao invés do coração e me senti extremamente orgulhosa por essa atitude, porque sou o tipo de mulher que não consegue falar não, que tem dificuldade em evitar conflitos ou se posicionar. — Tira do carrinho e deixa só o que você conseguiu pagar.

O dinheiro era dele, ele deveria saber quanto tinha de saldo antes de entupir a merda do carrinho com Whey. Eu não estava sendo babaca, certo? Se eu não estivesse aqui, ele teria que deixar as coisas de uma forma ou de outra.

— Nossa, você vai mesmo fazer isso comigo? – ele questionou de sobrancelhas franzidas, onde me fez se sentir egoísta e ao mesmo tempo mesquinha por não ter lhe emprestando dinheiro, ainda que tivesse um bom saldo em conta.

Manipulador. Era isso que ele era.

— "Isso" o quê?

— Poh, linda. Você sabe onde eu trabalho, tem meu número, faz essa por mim, vai? Estou precisando real chegar em casa e preparar a janta. Me ajuda aí, depois eu te recompenso de uma maneira ainda melhor...

Ai que nojo, quem ele pensa que eu sou?!

— Oi?— abri um sorriso irônico após vê-lo e ouvi-lo me cobrar como se eu tivesse sido a pior pessoa do mundo e, como se não bastasse, logo em seguida insinuar que devolveria meu dinheiro com um sexo que eu sequer estava interessada. A partir daquele instante, parei de cochichar apenas para ele ouvir. Não me importei se as pessoas ao redor iriam me ouvir. Michel precisava tomar vergonha na cara. — Eu nem sou nada sua, garoto. E quer saber mais? Se eu fosse você, teria vergonha de pedir para uma mulher que conheceu há poucas horas pagar sua conta e depois a colocar contra a parede como se ela estivesse fazendo errado ao negar o seu pedido idiota.

Falar aquilo foi como descarregar uma vida inteira sendo passiva a pedidos sem pé nem cabeça das mais variadas pessoas. Me fez se sentir dona de mim, sem a necessidade de aprovação de uma rapaz bonito, inteligente, mas extremamente babaca como foi o caso do garçom do restaurante da Dona Olga.

— Calma... — ele pediu. Todo mundo olhava pra nós dois, para ele especificamente.

— Vamos, Dinah. — foi o que eu disse, pegando minha cestinha do chão e me encaminhando para outra fila. — Vamos para outro caixa.

Deixamos o pé rapado com as compras na antiga fila e partimos para outra, bem longe dele, com Dinah tirando uma da minha cara enquanto o apelidava de "Caio Castro".

Cheguei em casa cerca de meia hora depois, sete e pouca da noite. Naquele momento, minha mente estava menos ansiosa e eu só sabia rir de toda a situação, além de me parabenizar internamente por ter conseguido se posicionar nesta tarde.

Tomei os remédios da Dr. Martinez e após preparar a mesa, com aperitivos e vinho chileno postos sob a mesa, descansei no sofá a espera da verdadeira e única companhia que valia a pena esperar.

Lauren, como uma boa mulher de compromisso, às oito em ponto bateu na minha porta. Segundo o porteiro, desde a madrugada do dia 24 eu havia liberado sua entrada sem necessidade de identificação.

— Boa noite!

Aberta foi como a porta e minha boca ficaram após ver Lauren Jauregui adentrar a sala do apartamento com uma calça social preta, saltos e uma camiseta branca do mesmo segmento, dobrada até os braços.

Ela estava incrivelmente, absurdamente linda trajada da cabeça aos pés de social, elegante de uma forma que nunca vi ou esperei ver Lauren Jauregui, professora de história, antes. O cabelo liso e ondulado nas pontas, lindo, linda demais, que mulher linda, meu Deus.

Antes de entrar, me cumprimentou com um beijo na bochecha e um abraço, estava para nascer pessoa mais educada e cheirosa que ela.

Me encantava seu jeito despercebido.

Fico pensando se ela fazia todas essas coisas apenas para me agradar ou se já era de sua natureza ser assim. De qualquer forma, eu amava, amava seu jeitinho.

— Obrigada por me receber... — com as mãos atrás das costas, Jauregui me mostra o presente que trouxe. — Esse é o meu pedido de desculpas por ter furado o nosso almoço.

Segurava um pequeno buquê de rosas vermelhas. E quando me entregou, eu passei a segurar a vontade de abraçá-la para sufocar. Se tornava tão difícil não me viciar em sua companhia dessa forma. Eu precisava urgentemente agradar essa mulher, fazê-la ficar, querer ficar perto de mim. Além de cheirar muito bem, ela torna o meu dia muito melhor. Seria esse o significado de carma reverso?

— Ai, não precisava ter se preocupado assim! — cheiro as flores, sorrindo abertamente para Lauren enquanto fecho a porta. — Sério, você não existe, Lauren. Que amor!

— Você gostou? — colocou a bolsa em cima do meu sofá, estava morrendo de vergonha por usar uma calça jeans é uma regata básica, enquanto ela, estava de arrancar o ar dos pulmões de qualquer homem que a visse tão linda e bela. Eu não sei explicar. Era atraente, muito atraente. Senhor, era muito linda e sexy, parecia ter saído de um filme de comédia romântica.

— Eu amei! Mas você não precisava ter gastado comigo... Ter se preocupado e... — Que flores lindas e cheirosas, pareciam a mulher que as comprou. — Ai, eu amei!

Eu sempre vou te trazer algo quando vier te visitar.

As bochechas ruborizadas no tom da minha timidez denunciavam o quão intimidada eu estava. Eu sentia vontade de abraçá-la com força. Primeiro, por ter salvado meu afilhado. Depois, pela surpresa maravilhosa das flores. Ela era incrível, linda em cada detalhe, eu estava extremamente fissurada naquela mulher e me surpreende ter percebido isso só após ela me visitar hoje, com as flores e aquele olhar de que se preocupava comigo e queria o meu melhor.

Suspirei.

— Lauren, posso te falar uma coisa? — diferente do que se viu no supermercado, dessa vez a voz do meu coração se sobressaiu a da mente.

— Até duas, neném.

Ai como ela era engraçadinha e linda...

Meu corpo costumava a reagir bem a todos os apelidos que ela me dava. Não era coisa que qualquer outra amiga já tenha me chamado, claro, mas não me importo. Eu gostava.

— O homem que se casar com você um dia será um homem de muita, muita sorte.

Ela me olhou com aquele sorriso de lado, negando a cabeça ao que se aproximava de mim com passos calmos e calculados.

— Do que está rindo? — perguntei sem entender. Ela me olhava com aqueles olhos verdes para lá de atraentes. Me analisava. Me preenchia e novamente me analisava em seguida. Eu não sabia explicar o que estava sentindo, só sabia que estava perdidamente hipnotizada por aquele olhar de Lauren.

A gente já falou sobre isso, linda.

— Sobre o quê? — caminhei até a cozinha para que Lauren não percebesse o quão envergonhada e feliz eu estava com toda aquela situação. Uma excitação que nunca senti por nenhuma amiga, a felicidade de tê-la comigo, era tão bom... nunca senti isso por ninguém, por pessoa alguma.

— No dia do show. A gente já falou sobre isso, você não se lembra?

— Desculpa, como disse? — esbocei um meio sorriso amarelo, completamente desentendido. Minha cabeça tornou a doer, atingida por pontadas que me deixavam zonza e inconsciente por alguns segundos.

— Você me perguntou sobre eu me casar com um homem um dia. E eu te respondi que já falamos sobre isso, logo após a nossa dança, no show do Jorge e Mateus.

À medida que as palavras de Lauren ressoam em meus ouvidos, meu coração começa a disparar em um frenesi de emoções que eu sequer entendia do que se tratavam. Sinto um aperto no peito, como se todas as memórias estivessem se aglomerando, lutando para sair. Minha respiração se torna rápida e irregular. Era loucura aquela sensação. Loucura pura.

Eu olhei para Lauren e depois ao redor.

A jarra que eu peguei e segurava para encher de água e colocar o buquê, caiu no chão.

Naquele momento, eu entendi sobre o que ela estava falando, porque me lembrei sobre o que tínhamos conversado no dia 23 de setembro de 2023.

Flashback ON

[...] O clima descontraído do lugar me fez relaxar nos braços dela, sem se importar com as pessoas que nos olhavam dançar, e logo eu estava rindo junto de Lauren, aproveitando o momento. Me sentia uma mulher livre, e por isso cantarolei enquanto olhava diretamente nos olhos verdes e bonitos dela:

— Eu só preciso viver o resto dessa vida com você!

Eu cantei aquela frase a plenos pulmões enquanto me mantinha abraçadinha a ela, dançando.

Seus olhos piscaram mais vezes que o normal e eu acho que esse gesto involuntário da minha parte nos fez parar de dançar, porque Lauren deixou a pista sem mais nem menos, sem me dar explicações. Saiu em passos apressados e foi direto para bar, comprar cerveja. Quando retornou, trouxe duas latinhas para mim e uma para ela. Ela estava dirigindo nesta noite, não poderia exagerar no álcool, e por isso tinha sobre nossa mesa uma garrafinha de água. Na pior das hipóteses, de acordo com ela mesma, voltaria de Uber para casa, o que na minha visão seria o mais correto.

Sem ser convidada, retornei à mesa junto da mulher de olhos verdes, que não parecia mais interessada em dançar. Todos os homens ao redor olhavam para ela, todos, até os comprometidos.

— Uau, você está chamando a atenção de todo mundo desse lugar, Lauren. — comentei quando mais próxima. — Os rapazes não param de olhar para vo-

— Pega uma gelada aí. — ela disse, me cortando imediatamente.

Em seguida, aceito de muito bom grado a cerveja que ela me ofereceu, onde juro que só com aquela música, dançando um pouquinho com Lauren, minha garganta já tinha ficado seca e eu precisava preenchê-la com algo gelado e gostoso. A cerveja veio a calhar na hora certa!

— Você dança super bem. Não pareceu nem um pouco inexperiente no ramo, Karla. — mudou de assunto.

— Você quem me guiou, deixa disso.

— Não me engane... eu sou professora de sertanejo universitário, sei muito bem quando uma aluna não sabe ou já tem algum conhecimento da dança. Você, de maneira alguma, é inexperiente nisso, linda.

— Eu já tinha dançado algumas vezes antes. – confessei ao abaixar, tímida, a minha cabeça. Lauren me olhava como se eu fosse muito mais importante que o show do Jorge e Mateus que rolava solto durante nossa conversa.

— Então mentiu pra mim? — ela me provocou com um sorriso de canto. Jauregui não tinha aberto a latinha de cerveja que segurava, enquanto eu, já estava na metade da minha, e nem tinha me assentado no banco junto à mesa ainda. — Mentiu para não dançar comigo, é isso?

Não, Lauren, eu só não queria entrar no mérito de te explicar como ou quando comecei a me apaixonar pela dança do sertanejo universitário. Não quero falar sobre a pessoa que me apresentou esse hobbie. Quero falar ou pensar em qualquer coisa, menos nisso, menos em Gabriel.

Virei a latinha de cerveja em um piscar de olhos. Lauren ficou assustada ao me ver bebendo-a como se fosse água. Eu só queria me divertir e matar a sede. Nada demais, certo?

— Não, não menti. Não sou boa nisso. Dancei apenas algumas vezes, nada muito específico.

— Pois está super convidada para as minhas aulas de quinta. Será um prazer recebê-la.

— Depois me lembra de pegar seu número, te peço por mensagem o dia e local que você estará lá. – pisquei para Lauren, abrindo a segunda cervejinha. — Será um prazer voltar a dançar sob a sua tutoria.

Eu senti que precisava ser legal com Lauren a partir daquele momento. Além de ser uma ótima companhia, ela também estava me pagando bebidas, dançando comigo e, se não estivesse bêbada, com certeza iria me levar em casa, então a partir dessa reflexão passei a tratá-la melhor que nos últimos cinquenta minutos anteriores.

— Ai, meu Deus, que merda... — resmunguei ao ver Gustavo, irmão de Gabriel, se aproximar com aquele sorriso de hétero inconveniente. — Eu vou no banheiro, Lauren.

— O que houve? — ela olhou para os lados, procurando a tal assombração que meu olhar identificou e a alertou.

— O irmão sem noção do meu ex noivo está vindo e ele vai dar em cima de mim. Eu não aguento mais rejeitá-lo indiretamente.

E ele estava se aproximando para provavelmente me chamar para uma dança.

Eu precisava sair daqui.

— Se você fugir agora, ele volta depois. Não acha melhor resolver isso agora?

— Não, Lauren. Confie em mim, a família desse daí não sabe receber um "não" e eu não quero que ele estrague o meu show e o dos meus amigos por ter o ego ferido. Vai fazer uma tempestade num copo d'água, não duvide de mim. Vamos. — estendi minha mão para Lauren, deixando minha latinha de cerveja em cima da mesa com a outra. Gustavo tinha um rostinho bonito e provavelmente daria em cima da bela mulher de olhos verdes se eu a deixasse sozinha aqui, correndo perigo. — Vamos, porque ele já parece estar bêbado e se ele for igual ao irmão, fica ainda mais insuportável quando está assim. Vem!

— Okay!

Se levantou sem hesitar, onde fomos de mãos dadas até o banheiro, atravessando a multidão para chegar naquele local para lá de escondido e privado. Soltei a mão de Lauren ao pararmos em frente à porta e entrarmos posteriormente.

— Ah, essa foi por pouco! — escorei minhas duas mãos na bancada da pia, olhando como minha maquiagem parecia borrada e nada atraente. Lauren ficou ao meu lado, não estávamos sozinhas no banheiro, haviam três cabines... duas cabines, haviam duas cabines ocupadas, a terceira passou a ficar vazia quando duas mulheres saíram do último banheiro, provavelmente estavam se agarrando lá dentro, que loucura. — Uou... — olhei para Lauren de olhos arregalados, elas nem disfarçaram o que estavam fazendo, ficaram ao nosso lado lavando as mãos e sorrindo toda safada uma para a outra enquanto eu tentava apenas limpar a minha maquiagem e fugir de Gustavo. — Eu jamais faria algo assim no banheiro, sabia? — comentei completamente horrorizada com a situação assim que o casal de mulheres deixou o banheiro. — Aqui é tão nojento e.. nossa, elas não se importam que estamos vendo e sabendo de tudo que elas fizeram?

Lauren passou a retocar o batom e delineado ao meu lado, nós passamos a conversar se entreolhando através do enorme espelho horizontal que cobria as nove pias do banheiro. Ela tinha tudo no bolso da calça, era uma mulher precavida e inteligente.

— Você liga? – respondeu de maneira simples e aquilo me pegou desprevenida. Ela parecia o tipo de mulher que tinha a resposta para tudo.

— Eu nunca beijei ninguém no banheiro, para ser sincera. Não tenho muito o que falar. — parei de ajeitar minha maquiagem e a entreolhei diretamente, sem ser pelo espelho. Jogo o pedaço de papel que estava segurando, para limpar a minha maquiagem borrada, no lixo do banheiro. — Você já?

Lauren soltou uma lufada de ar irônica pelo nariz. Com aquele gesto, deu a entender que tinha acabado de rir da minha pergunta e aquilo me deixou curiosa.

— Heim? — insisto.

— Nunca também. — respondeu com uma risadinha... sarcástica?

Sim! Ela foi sarcástica! Essa filha da mãe foi sarcástica comigo enquanto eu abri todo o meu coração para ela, falando de toda a minha vida para Lauren devido ao simples fato de ter me pagado duas cervejas. Por sinal, deixei a minha segunda latinha dando sopa em cima da mesa e espero que Gustavo não tenha a furtado.

— Que risada maliciosa foi essa? Você pega homens no banheiro também, Jauregui? É isso? — a coloquei metaforicamente contra a parede. Eu gostava de questioná-la apenas para ouvir um pouco mais de sua voz rouca e sem igual. Fato era que Lauren é uma mulher muito atraente, não era à toa que despertava olhares de todo mundo ao redor no que simplesmente... caminhava.

— Homens, Karla? Sério? — agora ela arqueou a sobrancelha e riu nasal. O que eu tinha falado de errado? — Me impressiona você ainda achar que sou hétero nessa altura do campeonato, sabia?

Meu coração bateu mais forte no peito. Em compensação, meus olhos piscaram mais rápido que o necessário.

— Você já me incentivou a beijar dezenas de homens, está me dizendo de meia em meia hora como os rapazes estão me desejando, e não te causou nenhuma dúvida sobre eu não ter correspondido a nenhuma dessas tentativas, Karla?

Ela guardou o batom e delineador no bolso da calça no que eu engolia em seco, completamente em silêncio, espantada que esse tempo todo julguei a sexualidade dessa mulher errado, sendo que na verdade...

— Eu gosto de mulheres desde que me entendo por gente. E não, não estou dando em cima de você só porque sou lésbica. — senti algo estranho tomar posse do meu corpo assim que ela proferiu aquela palavra com tamanha propriedade.

Ela é uma mulher bonita, independente e tinha um excesso de liberdade e confiança que eu nunca havia encontrado em pessoa alguma. Aquilo me deixava curiosa e enlouquecida por dentro.

— Por incrível que pareça, temos histórias de amor parecidas, terminei há poucos meses com minha ex noiva, ela se mudou para o Canadá com uma outra mulher três dias após terminarmos. Você foi a primeira pessoa capaz de me compreender nesse lugar em um show exclusivamente para casais.

Passei a sentir várias coisas durante nossa conversa no banheiro. Constrangimento foi a primeira delas, após ficar de minuto a minuto lhe elogiando e dizendo o quão interessado os rapazes ao redor estavam nela. E se fôssemos parar para pensar, haviam mulheres fissuradas tanto quanto os rapazes. Lauren era o tipo de mulher que chamava a atenção sem necessidade de se expressar ou fazer muito. Tinha uma beleza imensurável, um charme para lá de natural... ao meu ver, em nenhum momento deu em cima de mim e sem falar que ela estava em um show sertanejo, o que jamais me faria desconfiar que essa mulher era... lésbica.

Por algum motivo sublime, pensar sobre isso me causava outras sensações que eu sinceramente não conhecia.

— Lauren, eu peço desculpas por ter sido inconveniente e-

Em toda a minha vida, eu só tinha dado um beijo em uma mulher e isso aconteceu durante uma festa universitária, há muitos anos atrás. Sexualmente falando, jamais experimentei por conta de ter perdido minha virgindade com Gabriel e ter o amado desde então, seja para homens, seja para mulheres, nunca tive interesse em outra pessoa senão o meu ex noivo.

Constatar mentalmente esses pontos me deixava confusa, porque de repente passei a questionar meus valores, minha sexualidade. Por que eu estava levantando esses pontos?
Por que passei a olhar para os lábios de batom retocados de Lauren ao invés de seus olhos, como eu fazia cerca de dois minutos atrás?

— Gosto da sua companhia, tem sido algo que me distrai e gosto da forma que você me olha como se eu fosse a pessoa mais desinteressante do mundo, porque adoro a parte de conquistar uma amizade. — disse Lauren.

Ela era delicada em cada gesto, completamente segura de si, parecia não haver nenhum resquício de ansiedade em suas palavras, diferente de mim.

Olhei para o movimento de sua mão direita, que jogou o cabelo de lado, e as mechas que lentamente se esparramaram feito cascata por seus ombros torneáveis e bonitos.

— Sobre as duas mulheres que estavam se pegando no banheiro, esse é um dos benefícios de beijar a boca de uma pessoa do mesmo sexo. — concordei com a cabeça de forma distraída, eu estava pensando muitas coisas a respeito de Lauren enquanto ela falava. — E geralmente quando duas mulheres se beijam na cabine de um banheiro, linda, é porque não estão se aguentando do desejo que as consome de dentro para fora. — não sabia se era pelo efeito das cervejas, mas aquela frase, dita exclusivamente no tom rouco e tranquilo daquela mulher de olhos verdes para mim, arrepiou todos os pelos do meu corpo. — Eu entendo elas. Entendo mesmo. Você provavelmente não entenderia o que estou falando, porque claramente é uma mulher heterossexual, mas beijar uma mulher no banheiro é sinônimo de insanidade, quando o sentimento transborda e queima o corpo por completo. Eu recomendo...

Ela era tão profunda em suas palavras. Até o momento eu não havia ouvido futilidade alguma que saiu de sua boca, e eu adorava estar próxima de pessoas inteligentes, isso soava extremamente sexy e convidativo para mim. Lauren era uma mulher madura, inteligente e muito, muito segura de si. Aquilo de alguma maneira pareceu pesar dentro da minha mente. Nossas histórias de romance eram parecidas e trágicas, e eu não sabia mais se estava me identificando com Lauren Jauregui, querendo superar a fase do luto e ser exatamente como ela ou...

Ou beijá-la dentro de alguma cabine desse banheiro, porque eu acho que os meus sentimentos estavam transbordando naquele instante e a culpa era exclusivamente dela.

— ... que faça isso um dia desses com algum parceiro que sinta interesse. Leve eles para o banheiro e apimente as coisas antes de ir para casa ou algum motel.

Por alguma razão, tudo que senti após ela mencionar os rapazes foi extrema e absoluta frustração. Tudo bem que eu só estava falando de homens até descobrir sobre sua sexualidade, mas estávamos em um banheiro de um show, sozinhas na pia, não tinha necessidade de ela mencionar isso em um momento que eu me encontrava extremamente confusa, olhando para Lauren e conseguindo capturar pouco, muito pouco do que ela me contava.

— C-certo! — dito isso e com um sorriso amarelo desenhado no rosto, sai do lugar que estava e entrei com passos apressados em direção da penúltima cabine do banheiro.

Me encostei sobre à porta, colocando a mão direita no peito ao que respirava fundo, tentando entender o que eu estava sentindo e o porquê do meu corpo reagir daquela forma à Lauren após ela expor de maneira natural sua sexualidade a mim.

Flashback OFF

— Karla, está tudo bem?! — ela correu para me ajudar a despistar os cacos de vidro que se esparramaram pelo chão, aquela lembrança me fez derrubar a jarra de vidro vazia que eu segurava para colocar o buquê de flores.

Começo a tomar ciência das sensações que senti por Lauren no dia 23 de setembro de 2023.

Começo a reparar que o que eu estava sentindo por ela naquele instante não se tratava apenas de uma simples admiração de amigas ou por gostar bastante de sua companhia.

— Oi? Você está bem? — ela segurou toda delicada a minha mão e eu senti meu corpo vibrar de dentro para fora com aquele toque macio, repleto de preocupação. — Ai meu Deus, Karla! Onde tem pá e vassoura para eu te ajudar a varrer tudo isso?

Eu sentia desejo por Lauren Jauregui e eu estava disposta à contar para ela sobre isso nessa noite.

🧊🧊🧊

COMO FOMOS? Como estamos????? ALGUÉM AQUI TEM TEORIAS? Me conteeeeeemmmmmm❤️❤️❤️❤️❤️

Espero que tenham gostado! Pf, não se esqueçam de votar e compartilhar a fic com uma pessoa próxima ou grupo de fanfics❤️🥹 isso me estimula a voltar mais rápido!

Aliás, um beijo para o meu DP de Cubo Mágico, amo cada uma!





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