Girei a maçaneta e abri a porta ainda sorrindo em satisfação. Chegamos um pouco tarde porque resolvemos ir para outra área da cidade entregar comidas para aqueles que não tem condições de comer. Marcelo disfarçou o fato de ficar emocionado com a minha atitude, eu percebi quando ele virou o rosto e levou rapidamente os dedos a bochecha secando-a. E fazer aquilo fez com que eu esquecesse o comportamento de Alberto mais cedo.
Entrei em casa encontrando Vinícius e Mariana sentados em um jantar íntimo e simples, sorri com a cena.
Ele tinha a mão esquerda na coxa dela enquanto comiam e sorriam.
Confesso que não gostava muito dele mas estava me conquistando aos poucos com algumas atitudes diárias que eu presenciava.
— Boa noite — Joguei a bolsa em cima do sofá disposta a interromper o jantar romântico.
Sorri maléfica. Olhei para trás encontrando o olhar zombeteiro de Marcelo para a cena a nossa frente.
Eles responderam e, duas vozes agudas e infantis me chamaram atenção.
Me virei confusa e meu coração parou de bater ao ver o garotinho, Jordan, sentado ao lado de Vinícius, de onde eu estava quase não podia vê-lo. Alice, filha do grandão também jazia ao seu lado sorrindo com as bochechas gordinhas e os cabelos loiros devidamente soltos e revoltos.
— Jordan!
Exclamei surpresa atraindo atenção de todos.
— Vocês se conhecem? — Mariana Inquere confusa.
Não respondo. Minha atenção está focada no menino assustado do outro lado da ilha me olhando como se eu fosse um fantasma.
Não estou menos surpresa que ele.
— Nos conhecemos sim — falo baixo para não assustá-lo ainda mais e me viro para Mari.
Porque na verdade o que quero fazer é ir até ele para abraça-lo apertado com toda a minha força.
— Estamos jantando, venham se juntar a nós, tem torta no forno, e arroz também.
— Eu só vou tomar um banho e volto rapidamente.
Ainda sem entender, caminho para o meu quarto enquanto meu irmão se junta a eles na mira do olhar cerrado de Vinícius, percebi antes de sair totalmente da cozinha. Ele morre de ciúmes da minha prima até com o padeiro da esquina.
Abro a porta, entro para em seguida fecha-lá atrás de mim. Me livro das peças de roupas, e após juntar todas jogo-as no cesto. No banheiro, a água choca contra minha pele trazendo o alívio e sensação de limpeza, suspiro levando o braço ao azulejo descansando minha testa sobre ele ao mesmo tempo que a água cai em minhas costas, fico assim alguns poucos minutos.
Involuntariamente minha mente me leva até Anderson, as palavras saindo com naturalidade da sua boca ao dizer que se preocupa comigo e quer nós dois juntos.
Eu só quero que fiquei ciente de uma coisa Deise. Me preocupo com quem gosto, e, se eu achar que está acontecendo alguma coisa que possa vir a prejudicar eu sempre dou um jeito de descobrir.
Estremeço e me arrepio inteira. Essas palavras... Elas estão até agora alojadas em minha mente, o jeito como ele não leva em conta o fato de me conhecer a poucos dias. De querer e insistir em um namoro com uma mulher como eu. Dou risada.
Ele é louco e não tenho mais duvidas, e é bastante invejável sua perseverança. Porque após tantas recusas estamos aqui em uma espécie de relacionamento, não sei se posso considerar um, mas, dada a minha ação de não desejar homens alheios estou indo bem.
Vou ver no que vai dar. Não pretendo me entregar de cabeça mas não vou ser difícil também.
Saio do banho, enrolo a toalha e me ponho para fora do banheiro.
Estou vestindo um vestidinho soltinho e fresco quando meu celular vibra em cima da cama onde joguei.
Quero te levar em um lugar amanhã a noite.
É o que a mensagem diz quando pego e desbloqueio.
Depende.
Respondo sorrindo, rapidamente ele retorna.
De quê? Pondero fazer tudo o que quiser para tê-la comigo amanhã a noite.
Gargalho alto.
Lugares em mim palpitam em ansiedade de vê-lo.
Contando que no final da noite eu esteja sobre você tem a minha resposta.
Decido provoca-lo e queria ser um mosquito só para confirmar que nesse momento o seu grunhido se fez presente.
Ou por baixo ;)
Que filho da puta. Como sou petulante, levo isso como um desafio envio a última mensagem com um aviso:
Veremos senhor Bragança. Ainda estando por cima, nunca estará sobre, mesmo pensando o contrário. ;)
Faço questão de colocar uma piscadela no final repetindo a sua ação.
Jogo o aparelho de volta no colchão e levanto para dá atenção ao que realmente importa no momento. Me acerto com Anderson depois. Sinceramente, estou ansiosa para amanhã a noite, quero ver o desenrolar, conhecer mais do que ele pode e tem a me oferecer.
~
Ao chegar a sala todos já estão devidamente sentados e assistindo um desenho. É sobre um cavalo selvagem que é capturado e tentam doma-lo.
Sorrio ironicamente com a semelhança entre eu e ele, o cavalo.
Um pouco afastado está Jordan, ele tem as mãozinhas unidas nas pernas e olha atentamente para a televisão.
Todos tentam não prestar atenção nele mas falham miseravelmente, é como se estivessem ansiosos por qualquer reação do garotinho a qualquer coisa.
Meu irmão levanta sorrateiramente e se despede, tem um compromisso agora a noite e não poderá se atrasar, mas deixa o aviso de que qualquer dia desses vem para cumprirmos a promessa de tomar pinga das boas.
Assim que ele se vai ganho atenção de Mariana. Gesticulo apontando para o meu quarto. Precisamos conversar. Eu não sabia que eles conheciam Jordan. Estou feliz e emocionada porque ele está aqui, conosco. Eu não sei porque fico assim cada vez que me refiro a ele, foi uma conexão só isso explica, Jordan não veio comigo aquele dia por medo mas agora está aqui.
Entro no quarto e me acomodo na cama. Não demora nada e Mariana já adentra também fechando a porta atrás de si.
— Me explica tudo porque eu estou confusa. — Peço.
— Antes de falar preciso saber da onde você conhece ele.
Dobro uma das pernas embaixo da bunda e suspiro antes de começar a falar, assim que termino percebo seus olhos marejados.
— Nossa Deise que atitude linda e humana. — se emociona. — Não sabe como estou feliz por você. Não gosto e sempre evitei tocar no assunto, mas isso não me incomoda e não diminui nada o que sinto por você, contudo você não pode ignorar, muito pelo contrário. É hora de olhar para trás e ver onde chegou.
Engulo seco para não chorar. Mariana no modo orgulhosa e emocionada te faz chorar.
— Enfim, e todos os dias eu passava pelo mesmo lugar e não o encontrava e foi assim até hoje. — Concluo.
— Nossa. — Assobia baixinho.
— Pois é.
Ri baixo.
— Bom, no dia em que fui atropelada e levada para o hospital um garotinho inteligente e lindo anotou a placa do carro e entregou a Vinícius. Em meio ao desespero ele deu dinheiro ao menino ao perguntar se ele já tinha se alimentado e a resposta foi um pouco óbvia. — Ela respira fundo antes de continuar. De fato que o assunto mexe muito com todos — Quando recebi alta, após chegarmos em casa, de longe eu pude ver um pacotinho encolhido quando Vinícius apontou. Fomos até lá... Eu não aguentei Deise, o senti meu ali quando o vi entende? — As lágrimas escorrem — Ele estava tão sujo e com medo, meu garotinho... Ele segurava alguns livros dentro de uma sacola, provando a todos que o mundo ainda não está perdido... Que independente da situação em que Jordan se encontrava ele não perdeu a fé. Eu acabara de perder um bebê que não sabia da existência e Deus colocou na minha vida esse menino, não para substituir, mas sim para me provar que ele sabe o que faz.
Não seguro as lágrimas quando elas insistem em cair.
— Vinícius e eu estamos lutando para adotá-lo, vamos mover céus e terra para isso Deise, você sabe que quando eu quero eu consigo.
Levanto para me aproximar e rodear meus braços ao seu redor.
— Te amo. — soluço.
— Você acredita que ele que escolheu o próprio nome? Ele assistiu um filme uma vez e viu o nome do ator Michael B. Jordan e gostou, dando para ele mesmo o último nome do ator negro famoso.
Rimos em meio às lágrimas.
— Eu não sei o que falar Mari. É tão maravilhoso tudo isso, essa história. Tão maravilhosa de tão inacreditável.
Eu queria tanto abraça-lo agora mas tenho medo de assustá-lo.
Queria tanto que todas as crianças que passa por isso encontrassem uma família assim como eu e Jordan, sim, porque eu sei que ele fará parte da família.