O Morro dos Ventos Uivantes...

By KateBrasil23

11.2K 743 22

Esta é uma história de amor e obsessão. E de purgação, crueza, devastação. No centro dos acontecimentos estão... More

*Comunicado *
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34

CAPÍTULO 14

97 9 0
By KateBrasil23

Assim que acabei de ler esta carta, fui informar o patrão de que a irmã chegara ao Alto dos Vendavais e me tinha escrito uma carta dizendo o quanto lamentava o estado em que se encontrava Mrs. Linton e que desejava muito vê-lo; mostrava-se ainda esperançada em que ele lhe enviasse por mim, o mais depressa possível, um sinal de perdão.

--Perdão?! exclamou Linton. --Não tenho nada a perdoar-lhe, Ellen. Se quiseres, podes ir ainda esta tarde ao Alto dos Vendavais e diz-lhe que não estou zangado, mas tão só triste por tê-la perdido: acima de tudo, porque acho que ela jamais será feliz. Ir vê-la está, porém, completamente fora de questão, uma vez que estamos separados para sempre. E, se quiser realmente fazer-me um favor, que tente persuadir o patife com quem casou a deixar esta região.

--E o senhor não quer ao menos escrever-lhe um bilhetinho?--perguntei, quase implorando.

--Não. --respondeu --É desnecessário. O nosso contacto com a família de Heathcliff deverá ser tão raro como o da família dele com a minha. Não deve existir sequer!

A frieza de Mr. Edgar deprimiu-me por demais e, no caminho da Granja para o Alto dos Vendavais, dei voltas à cabeça para descobrir uma maneira de, ao repetir o recado, pôr mais sentimento nas palavras dele e suavizar a sua recusa em escrever algumas linhas para confortar a irmã. Era capaz de jurar que estava à minha espera desde manhã. Vi-a espreitar por detrás da janela e acenei-lhe ao atravessar o jardim, mas ela afastou-se como se receasse estar a ser observada.

Entrei sem bater à porta. Nunca tinha visto aquela sala, outrora tão alegre, tão sinistra e tão sombria! Confesso que, se estivesse no lugar da jovem senhora, teria pelo menos varrido o chão e espanado o pó das mesas. Mas o espírito de desleixo já se tinha apoderado dela. O seu lindo rosto estava pálido e tinha um ar de indiferença; as madeixas de cabelo comprido e liso caíam-lhe pela cara abaixo, mantendo-se outras atabalhoadamente enroladas à volta da cabeça. Provavelmente, ainda não tinha mudado de roupa desde que chegara. Hindley não estava. Mr. Heathcliff, sentado a uma mesa, folheava alguns papéis. Quando cheguei, levantou-se e perguntou-me como tinha passado, mostrando-se afável e oferecendo-me uma cadeira. Era o único que tinha um ar decente; julgo mesmo que nunca o vira com melhor aspecto. As circunstâncias haviam alterado tanto a situação, que um estranho o tomaria a ele por um cavalheiro de nascimento e educação e à mulher por uma desleixada. Isabella correu para mim, para me cumprimentar, de mão estendida para receber a desejada carta.

Abanei a cabeça negativamente, mas ela não percebeu e foi atrás de mim até ao louceiro onde pousei a minha touca. E, num sussurro, pediu-me que lhe desse o bilhete que trouxera. Heathcliff, apercebendo-se do que se passava, disse: -Nelly, se trouxeste alguma coisa para Isabella, entrega-lha. Não precisam de fazer segredo. Entre nós não há segredos.

--Lamento, mas não trouxe nada! --disse, pensando que seria melhor dizer logo a verdade de uma vez por todas. O meu patrão ordenou-me que dissesse à irmã que não esperasse da parte dele qualquer carta ou visita. Minha senhora, o seu irmão deseja-lhe as melhores felicidades e perdoa-lhe todo o sofrimento que a senhora lhe causou, mas acha que, daqui em diante, o melhor será cortar as relações entre as duas famílias, pois nada de bom daí advirá se forem mantidas. O lábio de Mrs. Heathcliff tremeu ligeiramente e ela voltou a sentar-se junto da janela. O marido encostou-se ao rebordo da chaminé, perto de mim, e começou a interrogar-me a respeito de Catherine. Contei-lhe o que achei que podia contar, factos relacionados com a origem da sua doença, e culpei-a, como merecia, por atrair a desgraça sobre si própria; terminei, dizendo que esperava que ele seguisse o-exemplo de Mr. Linton, evitando daí em diante futuras intromissões na família dele.

--Mrs. Linton está a recuperar, mas nunca mais será a mesma. Contudo, a sua vida já não corre perigo. Se realmente ainda tem :, algum respeito por ela, não ouse atravessar-se-lhe no caminho Desapareça de vez das redondezas. Não tenha pena de partir. Desde já o aviso de que Catherine Linton esta tão diferente da sua amiga Catherine Earnshaw como esta é diferente de mim. Se a sua aparência mudou radicalmente, mais ainda mudou o seu carácter. E aquele que por força da necessidade é seu companheiro só manterá o seu afeto por ela doravante em nome do que ela foi outrora, do sentido de humanidade e do dever!

--É possível. --Retorquiu Heathcliff, esforçando-se por parecer calmo. É possível que o teu patrão não sinta por ela mais do que sentido de dever e humanidade; e acaso julgas que vou deixar Catherine entregue ao sentido da humanidade e do dever do marido? Achas possível comparar o que eu sinto por ela com o que ele sente? Antes de te ires embora desta casa, preciso que me prometas que vais conseguir arranjar-me um encontro com ela. Quer ela concorde, quer não, tenho de vê-la!

Que dizes, Nelly?

--Eu digo que o senhor não deve fazer tal coisa, e muito menos por meu intermédio. Outro encontro entre o senhor e o meu patrão poderá ser fatal para a minha senhora!

--Com a tua ajuda, isso poderá ser evitado prosseguiu. --E, se isso acarretar algum perigo, se ele lhe causar mais preocupações, então todos os meus atos extremos estarão justificados. Quero que me digas, com toda a sinceridade, se Catherine sofreria muito se o marido morresse. Este é o meu único receio e, por isso, me abstenho de qualquer ato: assim se pode ver a diferença entre os nossos sentimentos. Se eu estivesse no lugar dele e ele no meu, embora o odeie profundamente, jamais levantaria um dedo que fosse contra esse homem. Acredita, se quiseres! Eu nunca o teria banido da vida dela, se isso fosse contra a sua vontade. No momento em que o interesse dela acabasse, arrancar-lhe-ia o coração e beber-lhe-ia o sangue. Mas, por ora... Se não acreditas em mim é porque não me conheces. Porém, enquanto tal não acontecer, prefiro morrer a tocar-lhe num só fio de cabelo que seja!

--E, no entanto, --interrompi-o --não tem quaisquer escrúpulos em deitar por terra todas as nossas esperanças numa completa recuperação da senhora, avivando-lhe recordações, agora que ela quase o esqueceu, reacendendo angústias, discórdias e escândalos.

--Nelly, achas que a senhora me esqueceu mesmo?

--perguntou ele. --Sabes bem que não! Sabes tão bem como eu que por cada :, minuto que ela perde a pensar no Linton, gasta mil a pensar em mim!

No período mais infeliz da minha vida, ou seja, no Verão passado, tive a sensação de que ela me esquecera, temor que me perseguiu desde que vim morar para aqui. Porém, somente a sua confissão me faria admitir esta ideia hedionda. E, se assim fosse, que importância teriam Linton, Hindley e todos os sonhos que construí? Só duas palavras poderiam descrever o meu futuro --Morte e Inferno. A minha vida depois de a perder seria um inferno. Todavia, cheguei a pensar que ela desse mais valor à amizade de Edgar do que à minha. Que loucura! Nem que ele a amasse com toda a força da sua vil existência, seria capaz de a amar tanto em oitenta anos como eu num só dia. Catherine tem um coração tão profundo como o meu. Seria mais fácil meter o mar dentro de uma selha, que toda a afeição dela ser monopolizada por ele. O sentimento que ela nutre pelo marido é pouco mais intenso que o que ela nutre pelo cão ou pelo cavalo. Não faz parte da natureza dele ser amado, como eu sou. Como pode Catherine amar o que esse homem não possui?

--Catherine e Edgar sentem um pelo outro o que qualquer casal sente! gritou Isabella, inesperadamente. --Ninguém tem o direito de falar assim do meu irmão, e muito menos na minha presença, sem que eu me manifeste.

--O teu irmão também é muito teu amigo, não é? --observou Heathcliff com desdém. --Deixou-te sozinha no mundo com surpreendente desenvoltura.

--Ele não sabe o quanto sofro respondeu ela. --Nunca lho disse.

--Mas deves ter-lhe dito alguma coisa, pois tens-lhe escrito, não tens?

--Escrevi-lhe para lhe comunicar que tinha casado. Tu viste o bilhete.

--E nunca mais lhe escreveste desde então?

--Não.

--A menina tem um ar mais triste desde que casou--acrescentei. --Desconfio que há aqui alguém que não a ama como devia. Claro que sei quem esse alguém é, mas talvez não deva dizê-lo.

--Só pode ser ela própria ripostou Heathcliff. Está a tornar-se insuportável! Depressa se cansou de me tentar agradar. Podes não acreditar, mas na própria noite de núpcias chorou para :, voltar para casa. Contudo, e não sendo demasiado bonita, enquadra-se melhor nesta casa modesta, e tomarei as providências necessárias para que não me deixe ficar mal, andando por aí na vadia gem.

--Bem, o senhor lembre-se de que Mrs. Heathcliff está

habituada a ter criados e foi criada como filha única, uma menina a quem todos faziam as vontades. O senhor devia arranjar-lhe uma criada para lhe manter as coisas arrumadas e devia tratá-la com delicadeza. Seja qual for a sua opinião sobre Mr. Edgar, não pode por em dúvida a capacidade da sua esposa em alimentar sentimentos profundos. Caso contrário, não teria abandonado os amigos e o conforto da sua antiga casa para se instalar consigo neste ermo de livre vontade.

--Abandonou tudo para ir atrás de uma ilusão --respondeu ele. Fez de mim um herói romanesco, esperando condescendência ilimitada da minha devoção e cavalheirismo. Não consigo imaginá-la como uma criatura racional, já que tão obstinadamente se agarrou a uma ideia fantasiosa do meu carácter, agindo de acordo com as falsas imagens em que acreditava. Mas penso que começa finalmente a conhecer-me. Já não lhe vislumbro os sorrisos idiotas e os trejeitos que, a princípio, tanto me irritavam; nem a sua insensata incapacidade para discernir sinceridade nas minhas palavras, quando lhe dava a minha opinião sobre ela própria e a sua paixão doentia. Foi-lhe necessário um rasgo de perspicácia para descobrir que eu não a amava. A dada altura, cheguei a acreditar que nada a faria entender isso; mesmo assim, aprendeu mal a lição, pois esta manhã informou-me, num rasgo de inteligência que, finalmente, eu tinha conseguido que ela me odiasse! Um verdadeiro trabalho de Hércules, podes crer! Se conseguir isso, tenho de lhe agradecer. Posso confiar em ti, Isabella? Tens a certeza de que me odeias? Se eu te deixasse sozinha por meio dia, não voltarias para mim com suspiros e lamentos? Bem sei que ela preferia que eu me mostrasse afetuoso à tua frente; fere-lhe o orgulho ver a verdade assim exposta. Mas eu não me importo que se saiba que a paixão não é recíproca, e nunca lhe ocultei a verdade. Ela não pode acusar-me de simular uma falsa gentileza, pois a primeira coisa que me viu fazer, quando me vim embora da Granja, foi enforcar a sua cadelinha; e, quando me suplicou que não o fizesse, as primeiras palavras que proferi foram que desejava poder enforcar todos os membros da sua família, excepto um: possivelmente, pensou que era ela a :, excepção. Todavia, nenhuma brutalidade a impressionou. Suponho que possui uma admiração inata pela brutalidade, desde que ela própria se sinta em segurança! Não é o cúmulo do absurdo e da estupidez que esta criatura servil e mesquinha pudesse pensar que eu a amava? Nelly, diz ao teu patrão que eu nunca, em toda a minha vida, conheci uma pessoa tão abjeta quanto ela: é a vergonha do bom nome da família Linton; e que, às vezes, só por pura falta de imaginação, me abstenho de continuar as minhas experiências para ver até que ponto ela é capaz de suportar humilhações e, não obstante, voltar para mim a rastejar com o rabinho entre as pernas. Diz-lhe também que aquiete o seu coração de irmão e de magistrado, pois eu manter-me-ei dentro dos limites da lei. Até ao momento, tenho evitado dar-lhe qualquer pretexto para ela poder requerer a separação, e, além disso, ela não agradeceria a ninguém que viesse separar-nos. Se ela quiser partir é livre de o fazer. O incômodo da sua presença é bem maior que o prazer de a poder atormentar!

--Mr. Heathcliff --disse eu --depois de tudo que me disse, não posso crer que esteja no seu perfeito juízo, e a sua esposa, provavelmente, está convencida de que o senhor está louco. Só por essa razão, tem ela suportado tudo pacientemente; mas agora, que tem autorização para se ir embora, sem dúvida alguma o fará. A senhora não está assim tão enfeitiçada ao ponto de ficar com este homem de livre vontade, ou será que está?

--Cuidado Ellen! respondeu Isabella com os olhos cintilantes de raiva; pela expressão do seu rosto, não restavam dúvidas do total sucesso do marido em conseguir que ela o odiasse. Não acredites numa só palavra que ele diz. Ele não é um ser humano. É uma criatura maquiavélica e mentirosa, um autêntico monstro. Já me disseram que podia tê-lo deixado há mais tempo; cheguei a tentar, mas não me atrevo a repetir a experiência! Só te peço que me prometas, Ellen, que não vais contar uma única palavra desta conversa ao meu irmão ou à Catherine. Por mais que ele queira esconder as suas intenções, o que realmente deseja é levar Edgar ao desespero. Diz que casou comigo só para ter poder sobre ele; mas não o conseguirá, nem que eu morra primeiro! Só espero, e rezo, para que ele descure a sua prudência diabólica e me mate! Os únicos desejos que eu consigo albergar são morrer ou vê-lo morto!

--Aí está, já chega por agora! --disse Heathcliff. --Se fores chamada a depor em tribunal, lembra-te das palavras dela, Nelly! E repara bem na expressão do seu rosto. É a mais adequada para o :, que me convém. Não, Isabella, tu não estás em condições de seres independente; e eu, sendo o teu tutor legal, tenho de te manter sob a minha custódia, por mais desagradável que essa obrigação possa ser. Vai lá para cima, que eu tenho de falar em particular com a Ellen Dean. Não é para aí. É lá para cima, já te disse! Então é esse o caminho para o andar de cima?

Agarrou-a e empurrou-a para fora da sala, posto o que regressou a resmungar.

--Não tenho um pingo de compaixão! Não tenho um pingo de compaixão! Quanto mais os vermes se enroscam, mais me apetece esmagá-los! Disse-ia uma dentição moral: quanto mais força faço a ranger os dentes, tanto maiores as dores que sinto.

--O senhor sabe o significado da palavra compaixão? --perguntei-lhe, apressando-me a ir buscar a minha touca. --Alguma vez na vida sentiu compaixão por alguém?

--Pousa isso outra vez! --atalhou ele, apercebendo-se da minha intenção de partir. --Não te vás já embora, Nelly, anda cá. Tenho de persuadir-te a ajudar-me a mim e à Catherine o mais rapidamente possível. Juro que não tenho más intenções. Não quero causar-lhe mais problemas, nem exasperar ou insultar Mr. Linton. Só quero ouvir da boca dela como se sente e por que razão ficou enferma; e perguntar-lhe se lhe poderei ser útil em alguma coisa. A noite passada estive seis horas no jardim da Granja. E esta noite vou voltar lá. E todas as noites seguintes, até conseguir entrar. Se me cruzar com o Edgar Linton, não hesitarei em dar-lhe um murro com toda a força, de forma a que ele não me incomode enquanto eu lá estiver. E, se os criados oferecerem resistência, mostrar-lhes-ei esta pistola. Mas, diz lá, não seria preferível evitar o confronto com os criados e com o patrão? Tu poderias consegui-lo facilmente!

Avisar-te-ei quando chegar e tu deixas-me entrar, à socapa, assim que ela estiver sozinha, e ficas de sentinela até eu me ir embora. Fica com a consciência tranquila, pois assim evitarás muitos conflitos.

Protestei, novamente, recusando desempenhar um papel de traidora na casa do meu patrão, além de que estaria, com o meu gesto, a alimentar a sua crueldade e egoísmo, deixando -o perturbar a tranquilidade de Mrs. Linton por mero capricho.

--Até as coisas mais corriqueiras lhe causam angústia e sofrimento disse eu. Ela está muito nervosa e tenho a certeza de que não aguentaria a surpresa. Não insista, Mr. Heathcliff!

Senão, ver-me-ei obrigada a alertar o meu patrão quanto às suas intenções. E ele tomará as devidas precauções para proteger a casa e os que lá moram de intrusões não autorizadas!

--Nesse caso, tomarei também as devidas providências para me proteger de ti! -exclamou Heathcliff. --Não sairás daqui até amanhã de manhã. A história que me contaste é completamente descabida. Com que então, Catherine não suportaria ver-me! Como não desejo surpreendê-la, deves prepará-la para o nosso encontro. Pergunta-lhe se posso ir visitá-la. Dizes que nunca menciona o meu nome e que ninguém o profere na sua presença. A quem deveria ela mencioná-lo, se eu sou assunto proibido naquela casa? Ela acha que são todos espiões do marido. E não tenho qualquer dúvida de que todos vós lhe fazeis a vida num inferno! Posso adivinhar pelo seu silêncio o que ela sente. Dizes que está muitas vezes inquieta e ansiosa... É isso prova de tranquilidade? Falas-me do seu espírito perturbado... E como raio querias que estivesse, se vive num isolamento aterrador? E aquela criatura insípida e mesquinha a tratar dela por dever e humanidade! Por compaixão e caridade! Mais lhe valia plantar um carvalho num vaso de flores e esperar que ele crescesse, que imaginar que lhe podia restituir a vitalidade com os seus carinhos! --Vamos combinar tudo muito bem: ficas tu aqui e vou eu bater-me pela minha Catherine contra Linton e os seus lacaios? Ou continuas a ser minha amiga, como até agora, e fazes o que te peço? Vá decide-te! Não há motivo para eu perder nem mais um minuto, se continuares a ser teimosa!

Olhe, Mr. Lockwood, eu queixei-me, discuti e recusei cinquenta vezes o que ele me pedia. Mas, depois de tanto me negar, acabei por ceder. Comprometi-me a levar uma carta dele à minha senhora e, se ela consentisse, prometi-lhe que o avisaria da próxima ausência de Mr. Linton e de quanto tempo se demoraria ele por fora, para Heathcliff tentar entrar como pudesse; Eu não estaria presente e os meus colegas estariam igualmente fora do caminho. Estaria isto certo ou errado? Eu temia que estivesse errado, mas era necessário, pois com a minha cumplicidade evitavam-se mais conflitos, e poderia ainda contribuir para uma evolução favorável da doença mental de Catherine. Lembrei-me, então, da repreensão severa de Mr. Edgar por eu lhe ter contado certas histórias, e tentei afastar a inquietação, repetindo a mim mesma frequentemente que seria esta a última vez que eu trairia a sua confiança. Não obstante, o meu regresso foi mais triste do que a ida. E hesitei muito antes de entregar a carta a Mrs. Linton.

--Aí vem o Dr. Kenneth, Mr. Lockwood. Vou mas é para baixo dizer-lhe que o senhor melhorou bastante. A minha história já vai longa, como se costuma dizer, e o melhor é deixar o resto para amanhã.

_Longa e triste! pensei eu, enquanto aquela boa alma descia a escada para receber o médico; não era exatamente o tipo de história que eu escolhesse para me distrair, mas não importa! Extrairei remédios balsâmicos das ervas amargas de Mrs. Dean. Porém, tenho, antes de mais, de tomar cuidado com o fascínio que espreita nos olhos cintilantes de Catherine Heathcliff. Iria meter-me num lindo sarilho, se o meu coração sucumbisse aos encantos dessa jovem senhora, e a filha se revelasse a segunda edição da mãe!

Continue Reading

You'll Also Like

23.5K 471 4
Finalista do the wattys 2022. Aurora trabalha na pizzaria dos pais durante a noite, mas passa o dia enfurnada nos livros, pois almeja prestar o vesti...
685K 59.4K 66
Os irmãos Lambertt, estão a procura de uma mulher que possa suprir o fetiche em comum deles. Anna esta no lugar errado na hora errada e assim que cru...
2.6K 428 46
Capítulos 4, 16 e 17 em revisão por tempo indeterminado! "Eu quero sair. Quero quebrar essa prisão e transformá-la em destroços que um dia serão cham...
89.7K 12.7K 25
[Concluída]Jeon Jaehyuk ouviu com bastante atenção seu appa Jungkook dizer que não era para ter vergonha se seus coleguinhas do colégio o chamavam de...