Boa noite, Aquiles ✓

By sofianeglia

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" O olhar dava medo e eu quase perdi o sorriso o qual tentava seduzir ela do rosto. - Esquece, porque i... More

intro + sinopse
0. prólogo
1. ela procura
2. ele tem que sair
3. ela se nega
4. ele cozinha e convence
5. ela estabelece as regras
6. ele quebra uma das regras
7. ela não consegue dormir
8. ele chega de madrugada
9. ela conhece o resto do grupo
10. ele não quer ela no grupo - pt.1
10. ele não quer ela no grupo - pt.2
12. ele quebra mais uma regra - pt.1
12. ele quebra mais uma regra - pt.2
13. ela tenta ser simpática - pt.1
13. ela tenta ser simpática - pt.2
14. ele conquista algo
15. ela vira gelo
16. ele é fogo
17. ela vê o que não quer
18. ele sente o que não queria
19. ela cozinha e chora (repostado)
20. ele fica
epílogo
epílogo olímpios
nota final
OLIMPIOS REESCRITO!!

11. ela não consegue dormir de novo

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By sofianeglia

i n d i c a ç õ e s  p/  e s t e  c a p í t u l o: 

everybody loves you → charlotte lawrence

smoke & mirrors → demi lovato

i'm a mess → ed sheeran 



11. ela não consegue dormir de novo

     Eu estava indo até um restaurante. Usava um vestido solto e branco com um casaquinho por cima, salto alto e tinha prendido o meu cabelo de uma forma que minhas mechas não aparecessem tanto. Meu cérebro simplesmente comandando e meu corpo de acordo, o medo ficando maior a cada passo que eu dava para mais perto do lugar.

     Me sentia ridícula de novo, usada e podre. Mas eu fui, seguindo as informações daquela mensagem do meu ex sobre nos encontrarmos.

     Tinha sido uma mensagem simples, até, mas fazendo questão de dizer o jeito que eu tinha que me vestir, sabendo exatamente o que tinha no meu guarda roupa. Disse que tínhamos que conversar e que se arrependia de ter saído do apartamento do jeito que tinha feito.

     Eu não respondi, não querendo parecer desesperada demais para saber como que ele estava e também sabendo que ele detestava quando eu respondia rápido demais ou se quer respondia suas mensagens. Não sabia exatamente o que ele ia dizer, e não sabia o que esperar, também. Gostava de pensar que ele pediria perdão pelas coisas que fez eu passar, perdão por me manipular de um jeito e fazer eu pensar que não precisava perdoar nada.

     Entrando no restaurante, acenei para a recepcionista que tinha aberto a porta de vidro para eu entrar. Era um lugar chique, as mesas eram brancas e brilhantes, os pratos de salada dispostos com os garfos de prataria perfeita faziam toda a visão ser pura e limpa.

     Era um restaurante de comida italiana, a recepcionista informou conforme me questionou se já tinha ido lá. Respondi que não, e ela foi me contando os detalhes do menu de só quatro pratos clássicos, os vinhos e a salada e a sobremesa que faziam parte daquele dia. 

     — A senhora vai esperar alguém ou jantará sozinha? — Me perguntou, ajeitando com os braços magros e longos o vestido preto que usava. Ela era incrivelmente elegante, e o pensamento de que o modo como eu estava vestida fazia eu ser parte da decoração me veio a cabeça.

      Limpando a garganta, agarrei com mais força a minha bolsa. — Eu vim encontrar alguém. A reserva deve estar no nome de  "Lucas". 

     Os seus olhos abriram um pouco, em surpresa, e a sua boca também. Ela me examinou, e então levantou um lado da sua boca, juntando as mãos na sua frente. — O senhor Lucas disse mesmo que esperava alguém para uma reunião. Me acompanhe, por favor. 

      Eu encarei ela sem conseguir expressar o quão confusa estava. Sentia como se estivesse quebrando o meu corpo em pedaços e a noção de que eu estava fazendo de novo tudo o que ele pedia enchia meu coração com desgosto. Eu voltei para a caixa imaginária e sufocante, com o meu corpo apertado, os braços quebrados e o peito sendo pressionado com força a ponto de não me permitir respirar.

      Seguindo ela, senti a minha testa começar a ganhar algumas gotas de suor, e ao ver ele conversando com um garçom, com um sorriso no rosto, fui até ele no automático.

       A recepcionista nos deixou, o garçom me ajudou a sentar na sua frente, e meus olhos começavam a marejar, me culpando por ter estragado tudo e ao mesmo tempo sabendo que eu estava sendo fraca por causa dele. Nem tudo era a minha culpa, mas eu sentia como se fosse.

     — Lívia, bom saber que tu conseguiu vir. — Ele disse. Meu nome saiu da sua boca como se sentisse prazer em ver, mas o tom da sua voz mostrava que aquilo era só para acobertar a verdade.

     Ele estava sendo o que ele era fora do apartamento. Fazendo com que todos amassem o seu jeito divertido, o sorriso grande, o cabelo arrumado. Advogado, tinha dinheiro, uma reputação e a simpatia de todos. Ele fazia com que acreditassem que tudo era combinado, mas nós sabíamos que eu ia lá mesmo que não pudesse, mesmo que não quisesse.

     Eu acenei a cabeça, sem conseguir falar. Como que tinha mandado ele embora aquele dia? O que tinha que fazer para achar essa força de novo? Não tinha respostas, mas várias perguntas, e a noção de que ele e todas suas características haviam sumido no momento em que ele tinha ido embora. 

      — Então, como que tu tá? — Perguntou, assim que o garçom trouxe uma porção pequena de salada. 

       De mãos trêmulas, peguei o guardanapo de tecido e estiquei ele no meu colo. — Eu estou bem. — Respondi com o máximo de certeza que possuía. 

       Eu estava bem, melhor do que qualquer momento em que estava com ele, mas estava me odiando por querer sofrer de novo só para ficar do seu lado. Me odiando por ter deixado tudo chegar naquele ponto e odiando como meus olhos já estavam se enchendo de água, minha boca pronta para implorar.

       — Consigo ver...tu engordou um pouco. Conseguiu fazer a comida da geladeira durar mais de uma semana? 

        No meio das lágrimas, acabei abrindo um sorriso ao lembrar do último bilhete que Aquiles deixou junto a uma das marmitas daquela semana, dizendo que a lasanha que tinha feito só não era tão gostosa quanto eu. Eu tinha ganhado peso, sim, todo o peso que tinha perdido durante o meu namoro e ainda o tempo que fiquei sem ninguém no apartamento. 

      — Sim, consegui. — Falei, comendo uma garfada da salada e olhando diretamente para seus olhos. Como resposta, ele abriu um sorriso, não acreditando completamente que eu tinha a capacidade de viver sem a sua ajuda.

      — Deu o quê para conseguir o dinheiro? — Perguntou, ainda com o sorriso no rosto, agora fechado e mais diabólico enquanto mastigava. Eu balancei a cabeça sem força e sem conseguir responder aquilo. 

      Abaixando a voz e terminando a sua salada, Lucas se pôs para frente na mesa, arrumando a gravata para que esta não ficasse bagunçada. — Lívia, pode falar meu amor. Tu fez a mesma coisa comigo com outro, pra que ele te desse tudo o que tu tem, não foi? Pode me dizer.

     — Eu não fiz isso. — Falei, largando o garfo na mesa com cuidado para que não chamasse a atenção do resto das pessoas. 

       Eu conseguia ver tudo o que ele estava tramando. Era claro, nas suas intenções e na definição da palavra. Tudo aquilo era para que eu me sentisse a decoração mesmo. A roupa que ele tinha escolhido tão clara quando o ambiente para que eu simplesmente me misturasse com o fundo, o lugar quieto para que eu não começasse uma briga, aquele papo só para que eu lembrasse os motivos de eu começar a odiar carinho. Queria que eu lembrasse como coisas brancas ficam manchadas de vermelho, e memórias que não são claras não deixam espaço para a certeza do que fazer, só para o medo. 

     — Tudo bem se tu estiver fazendo, meu amor. — Falou, dando de ombros e sorrindo para o garçom que trazia o prato principal que ele já tinha escolhido, aparentemente, antes de eu chegar. — Me dá mais razão para não te querer mais. — Completou, levantando os ombros e assim que o outro terminou de nos servir e saiu.

      De repente eu voltei para o sufoco, as mãos paradas em cima dos talheres. — Como? — Perguntei em um suspiro, deixando uma lágrima finalmente cair. O meu corpo todo agia em dor, querendo ele mas o odiando pelo o que ele tinha feito comigo.

     — Eu te chamei pra gente acertar as coisas, afinal tudo naquele apartamento fui eu que dei pra ti. Me arrependo de já não ter organizado isso.

     Encarando ele, falei o seu nome, tentando pedir que me desse um tempo para pensar, mas ele não se importou. 

      — Assim... Não chamei tu aqui pra que a gente acertasse entre a gente. Foi só para ver se tu estava mesmo te saindo tão bem quanto tu achou que ia e marcar para pegar as minhas coisas.

     — Eu estou. — Falei, respirando fundo e querendo acreditar que estava tão bem quanto imaginei, mas aquela afirmação dele só fazia eu me perguntar se estava realmente, todas as noites chorando e não conseguindo dormir vindo como a comprovação de que não estava. 

      — Tu e essa mania idiota de responder só uma coisa que eu falo..raiva disso. — Falou, suas narinas abrindo e fechando com rapidez. 

     — Desculpa. — Falei, antes que conseguisse controlar. 

      Como resposta, Lucas relaxou suas expressões e começou a rir, dando uma garfada no risoto servido anteriormente. Ele levou a comida até a sua boca, mastigando com cuidado. Com uma cara de insatisfeito, largou o garfo no prato e limpou a boca no guardanapo como se estivesse horrível demais para o seu gosto. 

     Tratando a comida como estava me tratando. 

      Me olhando, Lucas vestiu uma expressão diferente, quase de felicidade.

     —  E eu queria pedir que tu parasse com as mensagens. É triste como tu fica achando que dessa vez eu vá voltar, Lívia. — Ao terminar, ajeitou o paletó e de dentro do bolso interno, retirou a sua carteira. — Mas, eu fico com pena, de verdade... aqui está um pouco pra te ajudar a superar e te manter em pé. 

      Deslizando pra mim um montinho de notas de 50, Lucas se levantou da cadeira e abotoou o paletó. 

     — Pra isso que tu me chamou? — Perguntei. Eu olhava a mesa com o prato ainda na minha frente, o dinheiro do lado, o resto das pessoas conversando. Não tinha ficado ali mais do que 30 minutos.

     — Foi bom conversar contigo, Lívia. — Falou, sorrindo. 

      Uma onda de energia passou até os meus dedos e assim que ele foi passar por mim estiquei o braço, não deixando que ele fosse embora ou passasse por mim. Me olhando com cara de confuso mas me fuzilando com os olhos, Lucas virou o corpo na minha direção, cruzando os braços. Naquela posição pensei sobre tudo o que ele podia fazer comigo, o que ele já tinha feito. 

      — T-tu... Tu se quer quis tentar? Se quer me amou de verdade? — Perguntei, meus lábios movendo e a voz saindo, mas não sabia como que tinha conseguido falar aquilo. 

      — Não seja boba, Lívia. Foi só divertido. — Disse, afirmando que a diversão vinha do fato de ele me enlouquecer.

     Eu pisquei, visualizei ele acenando com a cabeça na minha direção e então saindo dali, não me dando mais nenhum minuto do seu tempo, mas deixando claro que os longos meses que eu passei com ele foram jogados fora.

      A recepcionista apareceu novamente, indo conversar com ele e perguntando porque ele ia embora tão cedo. Eles tocavam um no braço do outro, rindo e conversando sobre coisas que eu não tive a capacidade de prestar atenção. 

      Fiquei parada durante um longo tempo, encarando tudo mas não enxergando nada, escutando o barulho do garçom retirando os pratos de outros.

      Eu olhei de novo para o dinheiro, arrastando minha mão sobre, peguei ele e guardei do melhor jeito que pude dentro da minha bolsa, o ódio que eu sentia por Lucas voltando para mim e tudo o que eu tinha me transformado. Eu estava aceitando aquilo e não sabia porque, mas tinha a leve ideia de que no fundo era o que eu merecia. 

      Deixando a comida para trás, me levantei quase derrubando a cadeira no processo. Eu passei pela recepcionista e o meu ex, que ainda conversavam, meu vestido uma trilha de tecidos atrás de mim. Sem saber o que fazer, caminhei pelas quadras perto do restaurante, ignorando qualquer pessoa na minha volta e tentando, de alguma forma, encontrar o que faltava em mim para superar tudo. 



       Eu respirava fundo antes de entrar em casa. Nervosa por lembrar de tempos onde Lucas ainda morava lá, porque muitas daquelas coisas que eu tanto amava teriam que sair dali, e também porque simplesmente queria conversar com Aquiles, sentada no sofá e escutando ele dizer coisas que me irritavam e me tiravam do estresse que tinha acontecido. 

      De todas as confusões aquela era a maior de todas, mas eu me permiti entrar. 

      No momento em que o fiz e logo fechei a porta, meu nariz recebeu o cheiro de comida. Eu me virei para a cozinha e para onde o som de uma música de rock vinha baixinho de um celular. Aquiles estava mexendo uma panela funda pelo cabo de metal dela, o vapor subindo a cada movimento seu. 

     Não era extremamente tarde da noite, e talvez Lucas tivesse tido sucesso em fazer eu perder mais tempo ainda pensando no que tinha acontecido com a gente, mas ali estava Aquiles, fazendo a janta como se soubesse exatamente o horário que eu ia chegar. 

     — Sonho! — Me chamou, abrindo um sorriso e virando para mim. Sua mão ainda segurava uma colher de madeira e os olhos estavam de um azul mais escuro. — A janta tá quase pronta. Tu não jantou ainda, né? 

      Na sua pergunta havia algum tipo de esperança, laçada com uma decepção profunda caso eu respondesse que já. 

     Quieta e ainda sem muita energia, balancei a cabeça. — Não jantei, não. — Respondi. 

     Com a minha resposta, Aquiles abriu um sorriso largo e eu acenei de novo na sua direção antes de ir até o meu quarto. Trocando a roupa nojenta que eu estava vestindo, fechei os meus olhos tentei acalmar tudo o que se passava e conseguir respirar direito. 

      Vestindo uma camiseta de banda e uma calça de moletom que ia até meus calcanhares, voltei para a sala e aos poucos voltei a ter a minha visão de novo, sem aquela constante névoa nublando os detalhes ou a luz nos cantos dos olhos que não me deixavam enxergar direito, tudo efeito da ansiedade. 

      Quando eu me senti segura lá dentro, reparei em como a mesinha de centro da sala tinha se transformado em uma sala de jantar, e os pratos não estavam acompanhados de talheres e sim de hashi. 

      Antes que eu pudesse falar algo esperto e tentar manter aquela rotina de detestar o seu jeito, uma rotina que cada vez mais eu não me sentia certa ao fazer, Aquiles veio com dois pratos recheados de comida para a mesinha, largando eles um em cada canto. Eu reparei no Frango Xadrez onde ele tinha engenhosamente colocado batatas assada embaixo, no macarrão frito com molho shoyu e então no outro que ele trouxe com guiozas      

      Sentando no chão, Aquiles virou o rosto pra mim com um sorriso de criança, os lábios fechados. Com olhos queimando de tanta felicidade, ele levantou uma das mãos e apontou pro lugar onde o outro prato me esperava. 

     Dobrando as pernas, me sentei na sua frente. — Tem alguma coisa de especial acontecendo pra tu estar em casa? — Perguntei, ignorando o jeito como a minha voz irritada parecia forçada demais e como eu não estava encontrando nada de errado naquela situação, em como ele me fazia esquecer desde quando mudara pra lá de Lucas, mesmo que me lembrasse de todo o resto.

      — Eu descobri que essa era a tua comida favorita de tele-entrega com o porteiro. Decidi fazer pra ti... pra me desculpar pela outra noite. 

      Aquiles pegou meu prato e foi me servindo sem que eu pedisse, aparentemente fazendo de tudo para que eu não ficasse irritada com ele. 

      — E tu que fez tudo isso? — Perguntei, apontando com os hashi a comida e examinando a perfeição dos guioza, como tudo estava tão bonito e arrumado. A sala não tinha uma almofada fora do lugar, e tudo cheirava a algum produto leve de limpeza, como se ele já tivesse limpado a casa algumas horas antes. 

     Com um aceno de cabeça, Aquiles me entregou o prato e começou a se servir. Era difícil desprender a ideia de que tudo aquilo que ele estava fazendo era pra me seduzir, que aquilo era ele de novo e de novo me agradando com pequenas coisas só pra me levar pra cama e então me deixar sozinha naquele apartamento. 

      Mas eu estava ficando cansada demais de fingir pra ele. Omitir que na realidade tudo o que estava acontecendo comigo, aquela confusão e a raiva que eu tinha, eram exatamente porque eu queria que ele me seduzisse. Me fizesse parar de pensar, dia após dia, no meu passado. Que ele me mostrasse um futuro, e que ele fosse verdadeiro como naquelas conversar intoxicadas que tinha comigo. 

     O que eu sentia ao lembrar do que tinha sido com Lucas, e como era com Aquiles até mesmo nos dias que ele não estava. Que mesmo não estando ali ele me tranquilizava, mas arruinava todas as minhas esperanças... porque eu sabia que não ia conseguir fazer alguém mudar. 

     Comendo em silêncio e sem falar nada, escutei ele contando como que tinha sido o seu dia na sua voz alegre e quase como um adolescente, rindo em relação as suas coisas. Escutei como ele tinha dito a Iara que não tinha me dado o livro, mas que tinha feito ela prometer entregar pra mim pessoalmente, ou como ele tinha muito rápido pego um prato que estava prestes a cair de uma das mesas da cafeteria. Ele ganhou aplausos até, ele disse, em meio a um sorriso de moleque e algumas outras risadas.

      Os seus olhos me examinavam profundamente, provável que enxergando um rosto pálido e sem emoção, escondendo coisas demais. 

      Mas ele não desistiu de tentar arrancar um sorriso, não parou de preencher meu silêncio nenhum momento, nem mesmo quando a comida já tinha terminado, o que fez ele se elogiar, dizendo como ele era muito mestre em fazer exatamente o necessário. 

      Queria perguntar por que era realmente necessário me agradar daquele jeito se fosse somente para pedir desculpas. Já tinha deixado aquela noite e o sentimento de ver alguém com ele completamente de lado. Tinha esquecido as partes ruins, o modo como ele fedia a bebida e tudo mais, e focado no seu jeito mais sincero, e o modo como ele estava vestido, mostrando os seus músculos sob a camiseta enquanto mostrava o lado frágil ao abraçar a almofada. 

      A almofada estava sendo abraçada por mim naquele momento, enquanto ele levava as coisas para a cozinha. 

     — Aquiles, pode deixar a louça que eu lavo depois. — Falei quieta. 

      Ele não disse nada, mas pela sua expressão achou o que eu tinha dito bem esquisito. 

       Sentando de novo perto da mesinha, ele ficou me encarando enquanto eu estava sentada no sofá, pensando se devia ou não realmente contar pra ele o que tinha acontecido, se devia permitir que admitisse todos os meus sentimentos. A segunda coisa não necessariamente pra ele. 

     — Eu oficialmente não tenho mais namorado. — Disse, os olhos que estavam evitando ele achando então o seu rosto e a mudança da leveza que ele tinha até aquele segundo para algo completamente diferente. 

     — Uau... — Falou, e eu balancei a cabeça, esperando que ele visse através de mim, através das minhas palavras, através das suas vontades carnais, pelo menos só naquela hora. 

     — Por favor, guarda as tuas cantadas pra depois. Não estou com saco pra aguentar elas. — Falei, passando as mãos no rosto e tentando realmente me acalmar e não pensar em todas as suas investidas, assim como não pensar no dinheiro que continuava pesado e guardado dentro da minha bolsa. 

     Aquiles se ajustou, sentando para mais perto do sofá e de mim, porém eu não me afastei e senti mesmo naquela distância o calor que veio dele, arrepios correndo pelo meu corpo por causa do medo de ter ele tão perto e a apreensão de se quer sentir aquilo por outro alguém que não fosse Lucas. 

     — Eu não ia falar nada. — Disse, abrindo um sorriso de lado. — Não hoje pelo menos. 

     Balançando a cabeça novamente, revirei os olhos. — Certo. 

     O silêncio continuou na nossa volta por alguns segundos, até ele falar de novo, a sua mão massageando o próprio joelho e a testa enrugando. 

     — Sinto muito que ele tenha te magoado. — Começou, e eu quis dizer que ele não fazia ideia, mas fiquei quieta, não querendo estragar o pouco de admiração que eu sabia que ele tinha em relação ao meu corpo. — Ele é um baita idiota.

     Caindo no sofá, abracei mais uma almofada e ignorei como o braço de Aquiles que estava apoiado no sofá estava perto do meu joelho. 

     — Eu to falando sério, Lívia. Tu é forte demais e incrível demais pra um cara como ele. 

     — Tu não me conhece. — Falei, sem forças, querendo acreditar no que dizia. Era como se aqueles elogios dele não conseguissem se fixar em mim, porque eu não acreditava que eu era. 

     — Conheço. 

     — Aquiles, simplesmente para. — Pedi. Não queria que ele parasse definitivamente de falar, mas que tentasse parar de me vender uma ideia do que ele via em mim. 

      — Lívia... Eu te conheço mesmo, todos dias cada vez mais. E eu posso dizer que tu é dedicada, que faz as coisas sem nem perceber o quão incrível tu é, e artística... — Insistiu. Colocando a cabeça em cima das mãos, apoiando ela em um movimento que parecia mania, não terminou de falar. — E eu posso te dizer que à partir de hoje eu vou te ajudar a manter aquele cara o mais longe o possível. 

      — Claro. — Respondi, irônica. 

      Sorrindo, Aquiles colocou a outra mão em cima do sofá, apenas perto de mim, e abriu um sorriso. — É óbvio. Assim ele não consegue te machucar com facilidade, e se ele machucar, eu vou estar lá...É mais fácil de tirar umas lasquinhas também. 

     Rindo, Aquiles tinha os olhos pequenos, o sorriso forte demais. — Aquiles! — Falei alto e chamando a sua atenção. Tinha pedido que não fizesse nada do tipo, mas aquele comentário fora exatamente o que me fez sorrir. Por saber que era o seu jeito moleque atravessando a conversa séria, e por saber que dentro da minha imaginação ele tirar umas lasquinhas de mim não parecia tão horrível do que quando aconteciam coisas do tipo na prática. 

     — Parei, parei. — Falou, ainda sorrindo e desta vez levantando as duas mãos no ar, se rendendo.

     Eu olhei ele, pensando se era errado demais falar do que tinha acontecido naquela noite, e sem que eu pudesse escolher ou não se contava, acabei dizendo pelo menos o final.

     — Ele deixou dinheiro pra mim, como se eu não conseguisse viver sem a ajuda dele. 

      Cerrando as sobrancelhas, Aquiles não tinha mais um sorriso na cara. — Quanto? 

     — Mil reais. — Falei, lembrando como que foi contar todas as notas de 50 que formavam aquele valor, e como eu me senti idiota e humilhada, mesmo que soubesse que a escolha do tipo de nota tinha sido feita por Lucas só pra me humilhar mais ainda. 

     — O que tu vai fazer com o dinheiro? — Perguntou, olhos azuis grandes indo de preocupados para divertidos em alguns segundos. — A gente pode muito bem contratar uma gurizada pra jogar tinta no carro dele. 

      Aquiles riu, e permaneceu com um lado do lábio levantando até mesmo quando eu não consegui sorrir pra ele, por mais que eu quisesse. 

     — Ele que pagava as coisas antes de eu chegar? — Perguntou e eu acenei. — O que ele fez ou deixou de fazer não anula o que tu é, Sonho, e tu é muito forte. De verdade. 

      Olhando pra ele, não encontrei um pingo de dúvida no seu olhar. Ele acreditava em mim, acreditava que eu ia achar um jeito de usar aquele dinheiro, superar tudo o que tinha acontecido... mas eu não conseguia continuar encarando ele. 

     — Obrigada pela janta, Aquiles. Eu realmente valorizo isso... — Disse, tentando não parecer tão horrível em levantar dali para ir para o meu quarto sem dar um boa noite ou sem querer conversar com alguém que era tão disposto em alguns momentos a falar comigo e me escutar. 

     Ainda não conseguindo sentir energia através do meu corpo, fechei a porta do meu quarto e chorei. 

      Aquiles tinha dito exatamente o que eu esperava de um amigo, mas a sua voz ao me elogiar mudavam todo o significado da sua frase. Parecia não falar como se estivesse me protegendo e me ajudando, e sim me ajudando a entender que se fosse ele, com aquela sua convicção, iria tentar o máximo nunca me machucar como Lucas. 

     Mas eu tinha medo igual. Porque ele poderia não querer me machucar, mas o meu corpo não estava preparado ainda para aquilo. Não tinha medo do seu carinho, tinha medo do seu toque se transformar no de Lucas, me fazendo lembrar de novo e de novo dos flashes de memória que eu tinha daquela noite uma semana antes de Lucas me pedir em namoro, basicamente para calar a minha boca, violando minha fala e me maltratando, mas fazendo com que eu fosse dependente dele. Fazendo eu pensar que se ele ficava era por algum motivo, mas fazendo eu cada vez mais pensar que eu não tinha nenhum valor. 

     E se o toque de Aquiles, alguém que me deixava tão confusa mas tão valorizada, se tornasse o toque do outro abaixando as minhas calças enquanto eu dizia "não" com dificuldade e sem conseguir aumentar a minha voz? Se os seus lábios carnudos se tornassem os sem carinho algum de Lucas quando ele mordeu a minha garganta e meu corpo todo antes de eu não lembrar de nada por concreto?

     Balancei a cabeça, caindo ao chão do meu quarto e deitando a cabeça em um pedaço do tapete que eu tinha. Não conseguiria nem me deitar na minha cama, não depois do que tinha acontecido. 

      Eu tinha terminado de uma vez por todas. Ele tinha terminado. Mas a qualquer coisa me fazia lembrar, principalmente Aquiles. Porque ele era irritante, bêbado mas charmoso, quem eu pensava em beijar e ter algo a mais no meio dos lençóis. Quem eu não achava força pra quebrar o seu dedo ou empurrar caso ele chegasse perto demais por não suportar a ideia de machucar o seu corpo, ou expulsar ele de um jeito que ele nunca mais voltasse. 

     Eu admiti. Não queria deixar de alimentar a pequena raiva que eu sentia com seus maneirismos porque esta raiva me impedia de me machucar mais e de me entregar pro que ele poderia me fazer esquecer e sentir. 

     Ele me chamava de "sonho", mas quem sonhava com ele e a possibilidade de uma vida normal era eu. 

     Chorando, não consegui parar de me lembrar do pouco de memória que eu tinha, da vida que antes era normal e do que eu ainda tinha que fazer para esquecer. Eu suspirei, de novo e de novo, e me encostei na porta quando da sala um leve som de um filme começou. 


n o t a  d a  a u t o r a: 

Eu sou uma péssima pessoa pra atualizações, mas espero que curtam o capítulo. 

Hoje não temos a pergunta do dia, só um pedido para me dizerem o que estão achando da história! 

Um beijo! 

Não esqueçam de votar, comentar e compartilhar. 

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